O barato que sai caro
Por Notas & Informações / O ESTADÃO DE SP
No fim de agosto, o governo alterou normas estabelecidas pelo decreto que regulamentou a Lei do Gás de 2021 sob o argumento de que é necessário baratear o gás, exatamente o principal objetivo da legislação de três anos atrás. Recorrendo ao mais puro arbítrio estatal, o presidente Lula da Silva aumentou, por decreto, os poderes da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) e da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) para, na prática, interferir diretamente nos planos de negócios elaborados pelas empresas.
Mais do que desconsiderar as complexidades de um setor que está a léguas de atingir níveis de competitividade capazes de baratear o produto conforme as irrevogáveis leis de mercado, o governo misturou no mesmo balaio questões tão complicadas quanto diferentes, que carecem de debates em separado, como explicou em entrevista ao Estadão Edmar Almeida, pesquisador do Instituto de Energia da PUC-RJ e presidente da Associação Internacional de Economia em Energia. E ainda tratou todo o setor de óleo e gás como um instrumento estatal.
Temas como transição energética, preço do gás e revisão de planos de desenvolvimento de campos de exploração de petróleo se embaralharam, com a finalidade óbvia de atender aos interesses do governo Lula e sua controversa política desenvolvimentista. Mas a questão de maior relevância, que é a concorrência, capaz de puxar preços para baixo, foi ignorada. A partir da abertura do mercado de gás, várias empresas passaram a vender gás e, como lembrou Almeida, onde há mais competição, como no Nordeste, o gás é mais barato do que em locais onde a Petrobras é ainda monopolista ou detém grande parte do mercado.
O decreto parte da premissa de que ampliar a oferta de gás fará cair o preço. Para isso, criou instrumentos como o plano integrado das infraestruturas de gás – principalmente para construção de gasodutos – e a revisão dos planos de desenvolvimento de produção de petróleo e gás que, além do alto potencial intervencionista, só terão efeito a muito longo prazo. A região do pré-sal da Bacia de Santos, alvo principal da medida, já tem projetado o terceiro gasoduto, o Rota 3, e qualquer volume adicional ao já previsto vai depender da construção de novas rotas, o que demanda não apenas alto investimento, como tempo, já que obras desse porte costumam se estender por cinco anos.
Em 2009, durante o segundo governo de Lula da Silva, foi criado o Plano Decenal de Expansão da Malha de Transporte Dutoviário (Pemat), que, como a legislação atual, também tinha caráter determinativo, mas apenas para a parte de transporte. O primeiro projeto decorrente daquele plano só saiu em 2014, cinco anos depois. É um exemplo dado pelo próprio governo lulopetista de que não basta ordenar que um investimento seja feito para que ele se materialize, como num passe de mágica. Mesmo a Petrobras, mais estatal do que privada, tem de imprimir alguma razoabilidade a seu plano de negócios.
O decreto de Lula da Silva determina que os investimentos da indústria vão se dar a partir do planejamento feito pela EPE, que vai indicar os novos gasodutos, sistemas de escoamento, unidades de processamento, oferta e demanda. Como afirmou Edmar Almeida, além do desafio técnico de atender a um projeto que não saiu de suas pranchetas, as empresas poderão também pressionar o governo para que seus próprios projetos estejam no plano. Ou seja, o governo pode estar apenas incentivando pressões lobistas e atrasando ainda mais o desenvolvimento do setor de gás.
O decreto, como já dissemos neste espaço, passa ao largo de questões fundamentais, como qual será a fonte de financiamento desse plano de ampliação de gasodutos. O Rota 3, da Petrobras, por exemplo, é estimado em torno de US$ 2,5 bilhões. Determinar a construção é a parte mais fácil e, sendo uma deliberação federal, imagina-se uma parceria com o setor privado.
O dinheiro para tanto é o enigma do decreto, que prevê limitar a exportação de gás, reduzir a injeção de gás na produção de petróleo e estabelecer a remuneração dos donos de dutos – enfim, piorar o ambiente de negócios.
Governo aposta contra a saúde
Por Notas & Informações / O ESTADÃO DE SP
Não é exagero afirmar que as apostas online, conhecidas como bets, colocam em risco a saúde mental e financeira de jogadores, e que os efeitos nocivos desse hábito, quando patológico, podem lançar o Brasil em uma epidemia. Tampouco é exagero dizer que o governo Lula da Silva tem sido, no mínimo, negligente ou, na melhor das hipóteses, omisso no enfrentamento de uma iminente crise de ludopatia.
Só isso pode explicar o fato de repousar em alguma gaveta do Ministério da Fazenda, desde o segundo semestre do ano passado, uma proposta de força-tarefa para prevenir e tratar o vício em jogos de azar. A reportagem do Estadão teve acesso a uma minuta de decreto e a uma nota técnica que defendiam a instituição de um grupo de trabalho com representantes da Fazenda, da Saúde, do Esporte e da Advocacia-Geral da União (AGU).
A exposição de motivos do decreto, assinada pelo ministro Fernando Haddad, destacava a necessidade de se “endereçar, com urgência e vigor, a influência deletéria que a exploração do mercado de apostas esportivas pode ter sobre os apostadores”. Se havia urgência, parece ter sido dissipada diante da sanha arrecadatória em um mercado que, segundo projeções da Strategy& Brasil, consultoria da PwC, já movimenta R$ 100 bilhões por ano.
Ao que tudo indica, saúde não é uma prioridade. Do contrário, os diagnósticos da nota técnica jamais teriam sido ignorados. Segundo o texto, os jogadores patológicos “podem gastar grandes quantias de dinheiro e tempo” e recorrer a “medidas desesperadas, como roubar ou vender bens”. Ademais, afirma a nota, o vício em jogos “absorve progressivamente as energias psíquicas e físicas do jogador até destruir tudo o que lhe é mais importante”, ameaçando seu patrimônio e, sobretudo, sua harmonia familiar.
O grupo interministerial, segundo os documentos, teria de se reunir quinzenalmente para elaborar uma política de jogo responsável, com campanhas educativas e imposição de exigências às bets. Mas essas recomendações parecem não importar para o governo, que já sabia havia bastante tempo de todos os perigos e nada fez para contê-los.
Enquanto isso, psiquiatras veem cada vez mais pacientes chegarem aos seus consultórios e questionam a capacidade do Sistema Único de Saúde (SUS) de responder à demanda por tratamento. Especialistas em finanças, por sua vez, avisam reiteradamente que apostas, cuja perda de dinheiro é certeira, não são investimento. Apesar de tantos alertas, as bets seguem onipresentes em intervalos comerciais na TV, publicidade em redes sociais e patrocínio de clubes de futebol. O Congresso começa acertadamente a debater, mesmo que com atraso, propostas para equipará-las ao álcool e ao cigarro e, assim, restringir a publicidade.
De posse de informações preciosas, o governo Lula da Silva optou por deliberadamente ignorar os riscos dessa “influência deletéria”, como diz a exposição de motivos do decreto abandonado. Ninguém poderá alegar surpresa com a potencial explosão do vício ou o surgimento de famílias dilaceradas. Não terá sido por falta de aviso.
Cobrança extra na conta de luz deve durar pelo menos até o ano que vem
Por Luciana Collet (Broadcast) e Wilian Miron (Broadcast) / O ESTADÃO DE SP
O clima mais seco e quente que vem sendo observado no País, combinado com uma perspectiva negativa para a hidrologia, deve manter os preços da energia elevados e fazer as bandeiras tarifárias permanecerem vermelhas pelo menos por mais um mês, durante o mês de outubro, segundo especialistas consultados pelo Estadão/Broadcast Energia.
Para novembro e dezembro, há mais dúvidas sobre qual será a cor da bandeira por causa das incertezas sobre o início do próximo período úmido e qual volume de chuvas será observado. Ainda assim, um retorno ao patamar verde, sem cobrança adicional na conta de luz, é esperado por parte dos especialistas do setor apenas para 2025.
Na Comerc Energia, por exemplo, os estudos indicam bandeira vermelha Patamar II (R$ 7,87 a cada 100 quilowatt-hora) para outubro, passando para Vermelha Patamar I (R$ 4,46 a cada 100 quilowatt-hora) em novembro e Amarela em dezembro. O retorno para o patamar verde, em que não há custo adicional, é esperado apenas a partir de janeiro do ano que vem.
A diretora de Assuntos Regulatórios e Institucionais da Comerc Energia, Ana Carla Petti, explica que a perspectiva atual de bandeira Vermelha Patamar 2 para outubro reflete tanto o cenário hidrológico de setembro, com afluência em 47% da média histórica no Sistema Interligado Nacional (SIN), como uma perspectiva para outubro de situação também pouco confortável, embora “não tão severa”. “Ainda não estamos enxergando chuva para outubro, começou a aparecer uma chuvinha ali no início daquele mês, mas ainda não é algo firme que vai acontecer”, diz.
De acordo com ela, em novembro a expectativa é de que o cenário melhore, mas ainda mantendo a perspectiva de afluência abaixo da média histórica, em patamar entre 60% e 70% do esperado para o mês.
No entanto, Petti alerta que o mês de outubro é muito sensível e que se os volumes pluviométricos forem mais elevados, os preços da energia caem e melhora toda a projeção à frente, enquanto se chover muito pouco, os preços subirão significativa, propagando a expectativa ruim para os meses subsequentes.
A análise da Thymos Energia vem na mesma linha. A empresa trabalha com a perspectiva de bandeira vermelha para outubro, mas no patamar 1, e um retorno à bandeira verde apenas em 2025. “A tendência é que o mês de outubro permaneça com bandeira vermelha, devido ao cenário de afluência que eleva os preços e reduz a geração hidrelétrica, diminuindo o GSF.
Para os meses seguintes, novembro e dezembro, há uma incerteza relacionada ao início do período úmido. Em alguns cenários de melhor afluência, a bandeira voltaria a ser amarela”, diz a diretora de Regulação e Estudos de Mercado, Mayra Guimarães.
Já o diretor-presidente da comercializadora Armor Energia, Fred Menezes, acredita que dadas as circunstâncias atuais, de tempo seco e um possível atraso no início das chuvas, é possível que a bandeira permaneça vermelha até os primeiros meses de 2025. “Há um mês não estava (no radar a mudança na bandeira. A maioria dos agentes e também dos economistas projetava o risco de bandeira vermelha apenas para o fim do ano. A deterioração dos reservatórios foi mais rápida do que o esperado”, comenta.
Para o sócio da comercializadora Ecom Energia Marcio Sant’Anna, o retorno das chuvas no início do período úmido pode permitir um rápido retorno à bandeira Verde. De acordo com ele, as avaliações preliminares dos meteorologistas têm apontado para um início da temporada de chuvas mais fraca do que de costume em outubro, “mas ainda nada aponta que vai ter atraso ou que o período úmido não vai existir”, destacou.
Incêndios e seca devastam pontos turísticos naturais pelo Brasil
Por Juliana Domingos de Lima / O ESTADÃO DE SP
Em setembro de 2024, áreas de preservação federal e parques estaduais foram fechados devido aos incêndios florestais que atingem grande parte do País. Segundo o ICMBio, no Parque Nacional da Chapada dos Guimarães, próximo a Cuiabá (MT), os principais atrativos (Morro São Jerônimo, Véu de Noiva, Circuito das Cachoeiras, Cachoeirinha e Cachoeira dos Namorados) estão fechados.
A Floresta Nacional de Brasília também segue fechada nesta segunda-feira, 9, assim como o percurso do morro Araçoiaba na Floresta Nacional de Ipanema, a 120 km da cidade de São Paulo.
Segundo informações da Secretaria de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística (Semil) do Estado de SP, 81 parques estaduais paulistas também se encontram fechados desde o início do mês.
No momento, a Semil informa que há focos ativos em dois deles: no Parque Estadual da Cantareira, onde o combate está sendo feito pelo ar por ser de difícil acesso, e no Parque Estadual do Itapetinga, onde as chamas vem sendo controladas pela terra e pelo ar.
Desde a última quinta-feira, 5, o fogo também atinge o Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros, em Goiás, declarado Patrimônio Mundial Natural pela Unesco. O primeiro foco, localizado na região do Paralelo 14, já foi controlado. Mas ainda há focos ativos na região de Simão Correa e também fora do parque, na região de Segredo - 70 brigadistas estão atuando no combate.
A unidade está aberta e funciona normalmente, já que, segundo a Parquetur, concessionária responsável pela gestão do parque, “os locais do incêndio estão distantes das trilhas acessadas por turistas”.
O ICMBio informa que, até o momento, foram queimados 2.729 hectares no Parque Nacional da Chapada dos Guimarães, 2.176 hectares na Floresta Nacional de Brasília e 7 mil hectares no Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros.
Parques atraem turistas e fomentam preservação
Em 2023, os parques nacionais do País atingiram a marca histórica de 11,8 milhões de visitantes. Ao atraírem turistas, eles movimentam a economia local e fomentam a preservação dos ecossistemas.
O ecoturismo tem sido responsável por 60% do faturamento do turismo no Brasil, segundo uma pesquisa do Sebrae Nacional realizada com o apoio do Ministério do Turismo.
Em nota, a pasta informou que “o fortalecimento do ecoturismo sustentável é um dos principais pontos do Plano Nacional de Turismo (PNT) 2024-2027, lançado em agosto, que finca as bases para que a sustentabilidade seja palavra de ordem nas ações do MTur”.
Além do Centro-Oeste, destinos turísticos no Cerrado de Minas Gerais também estão queimando. No último fim de semana, o recanto ecológico da pousada Vale do Céu em Delfinópolis (MG), na Serra da Canastra, foi devastado pelo fogo. Um incêndio já havia atingido o Parque Nacional da Serra da Canastra na semana passada, mas foi controlado.
A serra mineira abriga as nascentes das bacias dos rios São Francisco, Araguari e Santo Antônio, além de numerosas espécies em extinção.
Impacto na receita e segurança hídrica de municípios
Servidor há 14 anos do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), órgão ligado ao Ministério do Meio Ambiente, o coordenador de manejo integrado do fogo João Morita vê em 2024 um cenário “muito parecido, senão pior” do que o de 2020 em relação ao fogo que atinge concomitantemente unidades de conservação administradas pelo instituto.
Segundo ele, além da ocorrência de focos em várias unidades ao mesmo tempo, a semelhança também está no comportamento extremo do fogo e em sua propagação violenta novamente em 2024, facilitada pelo tempo seco, o vento forte e as temperaturas altas.
A guia turística Marcia Marisa Bortoluzzi, que atua há sete anos na Chapada dos Guimarães predominantemente como autônoma, estima uma queda de 60% em sua renda oriunda da atividade neste mês.
“Estamos vivendo dias difíceis. O fogo acaba impedindo que a gente atue”, diz. Com o fechamento do parque nacional, ela só conseguiu trabalhar por dois dias em setembro, realizando passeios em cachoeiras menores, em áreas externas à unidade de conservação.
Mesmo estando na baixa temporada, ela relata que costuma haver movimento nesse período, relacionado ao feriado de 7 de setembro. Também é quando começam as cotações para janeiro.
Devido aos incêndios, porém, clientes têm entrado em contato para remarcar ou, na pior das hipóteses, cancelar passeios agendados para as próximas semanas e até para os próximos meses.
“O visitante está acessando o restaurante, a lojinha de souvenir, está abastecendo o carro na cidade, tem a hotelaria, além do gasto no atrativo (turístico). É uma cadeia de serviços que fica prejudicada”, diz a guia de turismo.
Além dos prejuízos econômicos para a comunidade local provocados pelos incêndios, o coordenador de manejo integrado do fogo do ICMBio, João Morita, enfatiza o dano ambiental e os impactos de longo prazo para a região e seu entorno.
“Os parques não só possibilitam a interação da população com a natureza, gerando benefícios de forma direta, mas são protegidos também por causa das nascentes”, afirma Morita.
No caso de Brasília, onde vive, ele aponta que a Floresta Nacional é responsável pelo abastecimento hídrico de todo o norte do Distrito Federal. Ela protege nascentes e trechos de córregos da Bacia do Paranoá e teve quase metade de sua área queimada neste ano.
Prevenção ao fogo e turismo como parte da solução
Segundo Morita, nem todas as unidades de conservação são de propriedade exclusiva do Estado; em algumas delas, há sobreposição com territórios indígenas e quilombolas e pessoas morando dentro das reservas, o que torna complexa a gestão do fogo.
Ao mesmo tempo, com o treinamento das brigadas voluntárias e a criação de espaços de governança que congreguem essas populações e as instituições responsáveis pela prevenção e combate ao fogo, habitantes dos territórios podem ser os maiores aliados para evitar os incêndios florestais.
Para Morita, isso envolve investir mais em ações de prevenção e fortalecer instâncias como o Comitê Nacional do Manejo Integrado do Fogo e o Centro Integrado Multiagências de Coordenação Operacional Nacional, de modo a combinar e otimizar esforços das diversas instituições que participam do enfrentamento ao problema.
Esses espaços foram fixados por lei na Política Nacional de Manejo Integrado do Fogo, sancionada em julho de 2024.
A lei federal regula o uso do fogo no meio rural, definindo diretrizes para queimadas controladas (para fins agropecuários) e prescritas (para fins de conservação), mediante autorização prévia dos órgãos competentes, entre outras medidas de prevenção.
De acordo com Morita, as queimas prescritas realizadas neste ano nas Chapadas dos Veadeiros e Guimarães evitaram que o fogo chegasse à área de visitação, no caso da primeira, e ajudaram a controlar frentes de fogo, no caso da segunda. Mas as queimas não bastam por si só, e precisam ser somadas às estratégias já mencionadas e à educação ambiental.
Nesse ponto, a especialista em turismo e mudanças climáticas Isabel Grimm afirma que “o turismo pode atuar como agente transformador, incentivando os visitantes a adotarem comportamentos responsáveis nas áreas naturais e preparando guias e operadores turísticos para colaborar na detecção precoce e na rápida resposta a possíveis focos”.
Para ela, o turismo também pode se tornar uma ferramenta de apoio à preservação e de recuperação das áreas afetadas por incêndios através do incentivo ao desenvolvimento do turismo sustentável e regenerativo.
Segundo a professora do Programa de Mestrado da Universidade de Vassouras e da Universidade Santa Úrsula e diretora-geral do Instituto Superior de Administração e Economia, o ecoturismo pode ainda ajudar desenvolver planos de contingência mais eficazes em parceria com agentes de interesse e promover o engajamento comunitário em programas de preservação, “oferecendo incentivos para que essas comunidades atuem como guardiãs dos parques”.
Resposta de Lula a seca e fogo esbarra em desarticulação, verba, estrutura e Congresso
O Brasil enfrenta em 2024 uma disparada das queimadas cujos efeitos são vistos e sentidos no ar de várias regiões do país, mas as atuais medidas do governo federal estão aquém do necessário para fazer frente ao problema.
A crise de fogo ocorre em meio à pior seca já registrada no país desde o início da atual série histórica, em 1950, segundo o Cemaden (Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais).
Apesar do incremento orçamentário e estrutural em relação à gestão de Jair Bolsonaro (2018-2022), que promoveu um desmonte no setor, as ações do governo Lula (PT) necessitam de priorização e organização mais robusta do que as apresentadas até agora, além da mobilização de estados, municípios e Congresso, dizem especialistas.
A resposta do Executivo em 2024 foi superior à de 2023, mas o manto de fumaça que cobre o céus de várias regiões do Brasil é uma prova a olho nu de que está longe de ser a ideal.
O desmatamento caiu na amazônia e parou de crescer no cerrado, e houve antecipação das ações de prevenção.
Se por um lado o número de brigadistas do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) subiu de 2.109 para 2.255 entre 2023 e 2024, no ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade) caiu de 1.415 para 981 —o governo diz que irá repor o déficit por meio de crédito extraordinário.
O primeiro Orçamento proposto por Lula (em 2023, para 2024) cresceu substancialmente em relação ao último apresentado pela gestão Bolsonaro, mas teve parte cortada pelo Congresso.
Com forte atuação da bancada ruralista, que é historicamente oponente da defensora das bandeiras ambientais, o Congresso reduziu a principal verba do Ibama para prevenção e combate às queimadas de R$ 318 milhões para R$ 298 milhões.
Essa verba acabou sendo recuperada no decorrer do ano —segundo o Ministério do Meio Ambiente, a aprovação de crédito extraordinário elevou a verba total de R$ 459 milhões em 2023 para R$ 502 milhões em 2024, e houve mais R$ 55 milhões de suplementação—, mas em patamares que se mostraram insuficientes.
Só em julho o Congresso aprovou o projeto de lei de manejo do fogo, após seis anos de tramitação e três temporadas de queimadas devastadoras. O Congresso também foi o responsável por barrar a implantação, prometida por Lula, da criação de uma autoridade climática, o que mantém a gestão ambiental federal descentralizada e muitas vezes atropelada por prioridades de outras pastas.
A Folha procurou os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), mas não houve resposta.
O próprio presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho, disse à Folha em junho, no auge das queimadas no pantanal, que o Brasil não tem, no caso do fogo, uma estrutura à altura da crise climática. Entre outros pontos, ele defendeu a criação de uma frota permanente de aeronaves para combate às queimadas.
O Brasil enfrenta uma situação crítica pelo menos desde junho deste ano. O número de focos de incêndio na amazônia no mês de agosto foi o maior em 14 anos. Por volta das 10h desta segunda-feira (9), São Paulo tinha a pior qualidade de ar entre as metrópoles do mundo todo, de acordo com o site suíço IQAir.
O governo ainda não tomou ação para estimular o aumento da pena contra crimes ambientais, apesar da elevação do número de inquéritos policiais. Até o final de agosto, a Polícia Federal tinha 32 apurações em aberto, número que saltou para 52 na primeira semana de setembro. A punição para o crime de incêndio hoje é de, no máximo, oito anos de prisão.
O Dia do Fogo de 2019 —quando fazendeiros se articularam para queimar a amazônia simultaneamente— não levou a nenhuma responsabilização, e as fazendas voltaram a ter fogo nos anos seguintes.
"Está na hora de usar a força dos outros ministérios, porque é um problema de todos. A Casa Civil precisa editar medidas provisórias e decretos; a Defesa, quando for planejar a manutenção das aeronaves, tem que levar em conta a disponibilidade para o período de seca; a Agricultura tem que começar a fazer campanha contra o desmatamento", diz Marcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima.
"Os alertas estavam aí, e até existiu algum preparo do governo, mas talvez esse contexto mostre para nós que a questão precisa ser elevada a um nível de prioridade muito maior", afirma Cristiane Mazzetti, porta-voz do Greenpeace Brasil.
As ONGs citam, por exemplo, a necessidade de um plano de prevenção que consiga dizer, entre outros pontos, quais ações são necessárias, quanto vão custar e em quanto tempo serão necessárias.
"A resposta melhorou em termos de estrutura e de qualidade da intervenção, de perceber o tamanho do problema. Adiantaram as ações, contrataram mais brigadistas, o governo se mobilizou mais neste ano. Agora, a gente precisa de uma coordenação nacional disso, e os estados precisam entender o tamanho da urgência", diz Astrini.
Estados da Amazônia ainda não proibiram o uso do fogo mesmo diante do recorde de incêndios na região.
A ministra Marina Silva (Meio Ambiente) defende a criação do marco regulatório da emergência climática para dar segurança legal e orçamentária às ações de prevenção e mitigação dos efeitos do clima, mas a medida segue em estudo pelo Planalto, sem definição.
O cientista Carlos Nobre afirma que a gravidade da crise de 2024 não era previsível, mas o governo falhou.
"O governo melhorou, desde 2023, as condições de combater as emergências aos desastres climáticos, mas a recuperação foi modesta em comparação com o desmonte [da gestão anterior]. É necessário investir muito mais em criar os sistemas de adaptação e resiliência", afirma, citando, por exemplo, o fortalecimento de órgãos como o Cemaden.
Governo diz que há articulação e investimento
A Casa Civil destaca que o governo contratou cinco novas aeronaves para o Ibama neste ano, incrementou o orçamento do Ministério do Meio Ambiente e que atua, por meio de salas de situação temporárias, na integração entre diversas pastas no combate aos incêndios e às secas.
"O governo atua desde primeiro de janeiro de 2023 na retomada da política ambiental e climática. São exemplos de coordenação a recuperação do Comitê Interministerial de Mudança do Clima, do Comitê Interministerial de Combate ao Desmatamento, do Fundo Clima e do Fundo Amazônia", disse a pasta, em nota.
O Ministério do Meio Ambiente afirma que o orçamento da pasta foi reforçado, por meio de recomposição e créditos extraordinários, e que haverá contratação de mais brigadistas.
O presidente Lula visitará na manhã de terça (10) comunidades afetadas pela seca no Amazonas. De tarde, se reunirá com prefeitos e anunciará medidas de combate à seca na amazônia, na sede da Suframa (Superintendência da Zona Franca de Manaus).
Gás eleitoral
Por Notas & Informações / O ESTADÃO DE SP
O governo Lula da Silva anunciou que pretende quadruplicar o gasto com o Auxílio Gás dos atuais R$ 3,4 bilhões para R$ 13,6 bilhões até 2026. Na nova versão, o programa será rebatizado de Gás para Todos e passará a atender quase 21 milhões de famílias às vésperas da eleição presidencial. Atualmente, o Auxílio Gás atende 5,6 milhões de famílias, que recebem um benefício equivalente à compra de um botijão de gás a cada dois meses.
A partir de agora, a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) e a Caixa Econômica Federal ganharão protagonismo na operacionalização do programa. A ANP deverá credenciar as revendedoras que desejarem participar do programa e definir um preço-teto para o botijão, e a Caixa receberá repasses diretos da União e da estatal Pré-Sal Petróleo (PPSA) para remunerar o comércio.
Na avaliação do governo, a forma como o programa original foi elaborado não combate a pobreza energética, dado que os botijões são caros e os beneficiários preferem gastar o dinheiro que recebiam por meio do Auxílio Gás com outros itens, recorrendo ao uso de lenha, álcool e carvão para cozinhar – fontes mais baratas e perigosas.
Se esse é o problema, o programa não vai resolvê-lo. Ao contrário: tende a aumentar a demanda e a fazer com que os preços dos botijões subam ainda mais. Estabelecer um preço-teto nesse cenário será inócuo. Ademais, nada impede que os beneficiários revendam o botijão ou troquem-no por outros produtos.
Para as distribuidoras, de fato, a medida do governo é excelente, pois terão a garantia de que esses recursos chegarão a elas, uma reclamação recorrente do setor sobre o desenho atual do Auxílio Gás. Hoje, os beneficiários precisam ser “convencidos” a gastar os recursos que recebem com os botijões, um incentivo para que elas pratiquem preços mais baixos ou ao menos mais competitivos que os de seus concorrentes.
Há também problemas fiscais relacionados à iniciativa. Como não há espaço no Orçamento para elevar esses gastos, o governo pretende fazer repasses diretos à Caixa para bancar o programa. O projeto também autoriza a PPSA a enviar ao banco os valores equivalentes às receitas de comercialização da venda do excedente em óleo do pré-sal, que serão deduzidos das obrigações da empresa com a União em um encontro de contas.
Na Exposição de Motivos do projeto de lei, o governo afirma que a proposta é “meramente autorizativa” e “não implica redução de receita pública”. Não parece crível, e cabe à equipe econômica esclarecer algumas questões, entre elas a forma como as receitas e despesas do programa serão contabilizadas no Orçamento – se é que os recursos vão transitar por lá.
O secretário executivo do Ministério do Planejamento, Gustavo Guimarães, disse não saber o tamanho da renúncia, que dependerá do desenho final da proposta, e afirmou que é possível que o programa exija ajustes, via redução de gastos obrigatórios ou discricionários ou redução de espaço das despesas no futuro.
Já o secretário executivo do Ministério da Fazenda, Dario Durigan, atribuiu a autoria do projeto ao Ministério de Minas e Energia e afirmou que a Fazenda avaliou somente a compatibilidade da proposta com o arcabouço fiscal e o Orçamento. Segundo ele, o programa não consumirá o corte de gastos de R$ 25,9 bilhões previsto para 2025.
O governo tem todo o direito de propor políticas públicas como a ampliação do Auxílio Gás, desde que siga os dispositivos da Lei de Responsabilidade Fiscal e arque com o custo político e econômico de suas decisões. Bastaria prever, na peça orçamentária, a elevação das alíquotas de impostos, ampliação da base de cálculo ou criação de novos tributos e submetê-las ao Congresso.
Enquanto cobra austeridade do Congresso, o governo recorre a subterfúgios para financiar uma proposta que mira o horizonte eleitoral e que parece driblar o arcabouço fiscal. Em meio ao embate sobre a participação das emendas parlamentares no Orçamento, fica a impressão de que há dois pesos e duas medidas em se tratando de gastos, e que a ideia só é ruim quando ela não vem do governo.
Lula já impôs ao indicado ao BC um difícil teste de credibilidade
Por William Waack / O ESTADÃO DE SP
Dois grandes problemas de naturezas distintas estão no caminho do indicado ao Banco Central. E a origem das duas questões localiza-se no Palácio do Planalto.
A primeira delas são as consequências de uma política fiscal que expande os gastos públicos e busca o equilíbrio das contas via arrecadação. Gabriel Galípolo já assinou comunicados do Banco Central com alertas exatamente para esse ponto — uma política fiscal crível é um dos grandes componentes da taxa de juros.
Mas Lula, que o indicou, não acredita nisso. Em parte, por não entender exatamente como funcionam os delicados mecanismos de formação de preços numa economia moderna (e juros são um deles).
E em parte pelo primado que impôs da política eleitoreira sobre os rumos fiscais do governo. No horizonte de curtíssimo prazo no qual Lula opera, gasto é vida política, sim.
A segunda das questões essenciais para o novo presidente do BC é mais complexa, com profundas raízes históricas e sociais. É a maneira como as figuras públicas no País enxergam as instituições.
Lula divide com antecessores (inclusive o mais recente deles) a mesma compreensão de que, tendo vencido eleições, as instituições são “suas”. E estão ali para servir aos seus interesses, ou suas visões políticas, entendidos então como interesses da Nação.
Nessa perspectiva, as nomeações vitais são aquelas que pretendem ocupar instituições com alguém “seu”. Lula já sofreu grandes decepções quando nomeações dele para o STF, por exemplo, não produziram os resultados por ele esperados (caso do Mensalão).
Em outras palavras, não cabe nesse jeito de entender o mundo que instituições possam ser “de Estado”, independentes (como agências reguladoras), ou que funcionem de acordo com os critérios que suas burocracias (no sentido de Max Weber) estabeleceram. Não há separação entre o indivíduo e seu papel institucional.
Lula continua lutando contra a autonomia do Banco Central, que ele declarou que teria de ser “seu”. Na sua visão, o presidente dessa instituição deve lealdade pessoal e política a quem o indicou — o mesmo com o STF.
Criou assim um formidável teste de credibilidade para o indicado ao BC. Há uma notória diferença entre o que agentes econômicos esperam da condução de um Banco Central e o que agentes da política governamental desejam que aconteça.
Essa diferença é crescente, pois os agentes econômicos desconfiam da capacidade do governo de equilibrar as contas públicas. E o governo desconfia que o Banco Central só dá ouvidos para os desconfiados (o tal “mercado”) por interesses econômicos e/ou políticos.
No meio disso tudo, Gabriel Galípolo vai precisar também de muita sorte.
Adutora de Pedra Branca, no Ceará, é vandalizada e destruída um dia antes da inauguração
DIARIONORDESTE
A Adutora de Pedra Branca, localizada no Sítio Cachoeira dos Germanos, em Pedra Branca (CE), foi vandalizada na manhã desta terça-feira (27), um dia antes da inauguração oficial do governo do Ceará. Conforme a Secretaria dos Recursos Hídricos (SRH), a ação causou "danos severos" no Reservatório Especial do Dispositivo de Quebra de Pressão da Adutora.
O evento aconteceria às 9h de quarta-feira (28), no Centro de Pedra Branca, município localizado a 262 km de Fortaleza. Porém, depois de técnicos da Superintendência de Obras Hidráulicas (Sohidra) descubrirem a degradação da estrutura, a inauguração teve que ser adiada e o equipamento terá que ser reformado.
O crime de dano ao patrimônio público está sendo investigado pela Polícia Civil do Estado do Ceará (PCCE).
Abastecimento de água na região
Em nota, a SRH detalhou que a água não chegará do reservatório até a sede municipal devido ao vandalismo.
O dispositivo danificado é responsável por reduzir a pressão dos tubos da adutora, garantindo que a água captada no Açude Cachoeira seja injetada na rede de distribuição de água da cidade de Pedra Branca", afirmou.
A obra visava possibilitar um melhor abastecimento de água na região, que vem apresentando baixo volume do açude Trapiá 2.
Com o incidente, haverá prejuízos não apenas financeiros, mas também de abastecimento hídrico.
Investigações do caso
As investigações estão sendo conduzidas pela Delegacia Municipal de Pedra Branca.
Nesta terça, a Polícia Militar do Ceará (PMCE) está realizando as diligências pela área, busando identificar os suspeitos de envolvimento no crime.
Aneel formaliza repasse de R$ 451,4 milhões para a Amazonas Energia, alvo dos irmãos Batista
Por Renan Monteiro (Broadcast) / O ESTADÃO DE SP
BRASÍLIA – A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) aprovou nesta tarde de terça-feira, 27, repasses à distribuidora Amazonas Energia que, em conjunto, vão custar R$ 451,4 milhões, bancados pela conta de luz de todos os consumidores. Esse socorro foi possibilitado por uma medida provisória (MP), a nº 1.232, editada pelo governo federal em junho e de interesse da Âmbar, empresa dos irmãos Joesley e Wesley Batista, que negociam a compra da endividada empresa da Região Norte.
Os repasses são parte do esforço para diminuir o peso de obrigações financeiras e regulatórias do balanço da companhia e torná-la mais interessante aos olhos de possíveis investidores. A Âmbar, do grupo J&F, fez uma proposta para assumir a Amazonas Energia em 28 de junho. O pedido está em avaliação na Aneel. Procurado, o grupo J&F não se manifestou.
O pedido ocorreu poucos dias depois de o governo editar uma medida provisória prevendo a retirada dessas obrigações do balanço da companhia. Além de requisitos regulatórios, a MP retirou da empresa a obrigação de pagar pela energia comprada de usinas termoelétricas compradas pela J&F. Esses pagamentos foram repassados para a Conta de Energia de Reserva, embutida no valor da energia paga por todos os consumidores do País.
Os R$ 451,4 milhões serão repassados para a distribuidora da Conta de Consumo de Combustíveis (CCC). A CCC é o encargo para subsidiar os custos de geração de sistemas isolados e são bancados na tarifa de todos os consumidores.
São duas contas no prazo de quatro meses. A primeira se refere a parcelas mensais de R$ 39,06 milhões de custos operacionais flexibilizados. A segunda trata das parcelas mensais de R$ 73,8 milhões com o afastamento dos critérios de eficiência – ou seja, questões regulatórias. O total chega a R$ 451,4 milhões.
A Amazonas Energia foi privatizada em 2018, com o controle acionário sendo transferido para o consórcio Oliveira Energia. Para viabilizar a licitação, o governo Temer (2016-2019) permitiu um prazo de carência de cinco anos para a aplicação desses parâmetros de eficiência econômica e energética. Esses custos se tornaram, então, um crédito que a empresa tem a receber. O governo Lula prorrogou por mais 120 dias esse alívio.
A operação da Amazonas Energia tem histórico de sucessivos déficits, sem caixa suficiente para bancar os gastos com as atividades de distribuição, realizar investimentos e honrar o serviço das dívidas. A continuidade da operação se deu por meio de recorrentes empréstimos ou aportes da Eletrobras, que era controladora.
O governo justificou que a medida adotada foi necessária para que a situação econômico-financeira dessa concessão não se agravasse ainda mais no período de transferência do controle societário. Outra justificativa foi a continuidade do atendimento ao serviço público, sob risco de paralisação segundo a área técnica.
‘Litigância de má-fé’
Em paralelo, o procurador-geral da Aneel, Raul Lisboa, informou nesta terça-feira, 27, que o órgão regulador busca a condenação da Amazonas Energia por litigância de má-fé, em caso que envolve uma liminar da Justiça Federal no Amazonas. Foi determinado o prazo de 72 horas para a Aneel regulamentar a MP.
A procuradoria da Aneel constatou que esse processo foi distribuído quatro vezes em um período de 20 minutos. Isso foi entendido como uma forma da representação legal da concessionária tentar “escolher” o magistrado que julgaria a ação contra o órgão regulador. “Essa infelizmente é uma prática comum (em outros casos)”, citou o procurador, em conversa com jornalistas na Aneel. “Nós queremos a condenação da Amazonas Energia por litigância de má-fé”, acrescentou.
A liminar judicial cita que a Agência teria sido omissa na análise de processo sobre flexibilização regulatória para a Amazonas Energia. Independentemente da determinação da justiça, o órgão já havia anexado na pauta de hoje esse tema.
“Causou mais espanto ainda, que foi fundamento tudo isso no ofício 368 do MME (enviado pelo ministro Alexandre Silveira na semana passada), alegando alguns processos atrasados, o que ao meu ver não corresponde com a realidade”, mencionou o diretor Ricardo Tili.
Nesta terça-feira, 27, o diretor-geral da Aneel, Sandoval Feitosa, classificou como “indesejável” eventual interferência do Poder Judiciário e do Poder Executivo nas agências, se for feita de forma “exógena” ao processo regulatório dos órgãos.
Governo Lula vai encerrar ministério do RS, e Pimenta retorna à Secom após atuação sob cobranças
Sob forte cobrança em seu domicílio eleitoral, o ministro Paulo Pimenta (PT) reassumirá em setembro a Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República após quatro meses à frente da Secretaria Extraordinária criada para a resposta à tragédia das chuvas no Rio Grande do Sul.
O retorno de Pimenta está previsto para 12 de setembro, pouco antes do fim da vigência da medida provisória que criou a pasta durante o período de calamidade pública provocada pelas enchentes no estado.
A extensão do prazo exigiria a abertura de uma negociação com o Congresso Nacional. Pimenta assumiu o cargo no dia 15 de maio. A MP é válida até 25 de setembro, quando a medida é automaticamente extinta, caso não seja aprovada.
Há algumas semanas, o ministro admitiu a aliados que preferia retomar o cargo no Planalto, independentemente da vigência da medida provisória que o designou.
A leitura de aliados de Pimenta é que ele ficou em meio a um fogo cruzado no estado, entre opositores e aliados do governo, o que vai piorar até outubro, com a campanha eleitoral.
Com um desempenho consideradotímido na pasta do RS, o ministro volta ao Palácio do Planalto sob críticas também ao seu trabalho na Secom. Por isso, seu retorno desagrada alguns integrantes do governo.
Hoje, a Secom é interinamente ocupada pelo jornalista Laércio Portela. Segundo relatos, tem recebido elogios do presidente Lula (PT), mas não a ponto de garantir sua permanência na função.
A ideia do presidente é transformar o órgão que trata do Rio Grande do Sul, hoje com status de ministério, em uma secretaria subordinada à Casa Civil. O desenho da nova secretaria ainda não está concluído, mas, segundo integrantes do governo, a expectativa é que incorpore os cargos constituídos no ministério extraordinário.
Essa estrutura deverá funcionar até o fim do ano, embora tenha previsão de extinção apenas em fevereiro de 2025, segundo medida provisória que definiu sua configuração.
No estado onde tem projetos eleitorais, Pimenta tem sido cobrado pelas dificuldades de execução dos planos federais para o estado. Recaem sobre ele as críticas ao ritmo de realização das promessas do governo Lula, como reabertura do aeroporto Salgado Filho e do sistema de trens urbanos.
Segundo interlocutores, como representante do governo, o ministro ouve reclamações de empresários e produtores rurais. Entre as queixas dos empresários, está a dificuldade de acesso a crédito para retomada de empreendimentos e para manutenção de empregos.
Os produtores rurais reclamam das exigências apresentadas para a renegociação de dívidas.
Já na origem, a criação da secretaria extraordinária causou incômodo na equipe do governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB). Na época, o tucano nem agradeceu nominalmente Lula pela criação do órgão durante seu anúncio, junto com um pacote de ações federais para superação da crise no estado.
A ausência de um agradecimento direto a Lula não passou despercebida por integrantes do Palácio do Planalto e foi interpretada como demonstração de contrariedade do tucano com a nomeação de Pimenta.
Aliados do governador admitiram o incômodo com a designação de um político com pretensões eleitorais no estado. O governador queixou-se ainda à época de ter sido informado pela imprensa sobre a nomeação de Pimenta, como mostrou a coluna Painel, da Folha.
Lula foi acusado por opositores de tentar capitanear eleitoralmente com a tragédia do Rio Grande do Sul e dar uma plataforma eleitoral a Pimenta, um dos seus principais aliados. A reclamação foi grande também no Congresso. Em maio, uma ala do governo temia que a medida provisória de criação do ministério fosse derrotada pelos parlamentares.
Por isso, cogitavam naquele momento aguardar que ela caducasse —isto é, perdesse a vigência— para evitar uma derrota. Quando anunciou a criação do ministério, Lula afirmou que ele ficaria em funcionamento até fevereiro.
Em maio, o próprio Pimenta disse que pretendia permanecer de quatro a seis meses no estado. "Eu quero [ficar] de quatro a seis meses, ter todo o processo de convênios firmados entre todas as áreas de atuação do governo federal concluídos. E, a partir disso, cada um dos ministérios acompanha a execução", afirmou em entrevista à Folha.
Integrantes do governo questionaram se o deslocamento de Pimenta poderia ser o início de uma reforma ministerial, o que não se confirmou.
Colegas de Esplanada do ministro o acusam de cometer gafes e causar ruídos desnecessários em anúncios da governo. As reclamações são de que Pimenta age por conta própria e acaba por gerar deslizes evitáveis.
Em uma ocasião, em 2023, Pimenta deu declarações desencontradas a respeito da saída da então ministra do Turismo Daniela Carneiro (União Brasil) e provocou um princípio de crise na articulação política. O caso é frequentemente lembrado por opositores de Lula
Em outro momento, Pimenta anunciou que o novo presidente do IBGE seria o economista Marcio Pochmann, antes do próprio Lula anunciá-lo e antes que o presidente conversasse com a ministra Simone Tebet (Planejamento), a quem o órgão é ligado. O anúncio feito por Pimenta gerou a avaliação entre aliados de Tebet e outras alas do governo de que a ministra foi vítima de uma "bola nas costas".