Fazenda planeja enviar ainda neste semestre proposta para taxar big techs
Adriana Fernandes / folha de sp
O Ministério da Fazenda trabalha para propor ao Congresso Nacional ainda neste semestre a taxação das gigantes da tecnologia —as big techs.
A proposta não está relacionada à elaboração do PLOA (Projeto de Lei Orçamentária) de 2025, que será encaminhado ao Legislativo na próxima sexta-feira (30) pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Mas, se a taxação for aprovada ainda em 2024, pode ajudar a compor as receitas do governo no ano que vem. Nesse cenário, a Fazenda não espera mais do que R$ 4 bilhões a R$ 5 bilhões em arrecadação adicional, de acordo com um auxiliar do ministro Fernando Haddad.
O foco dessa agenda é a recomposição da base tributária do governo federal para 2026, movimento que está em curso desde o primeiro ano do governo Lula.
Uma opção em análise, que tem a preferência da Receita Federal, é fazer a taxação por meio da CIDE (Contribuição de Intervenção sobre o Domínio Econômico) e não necessariamente pelo Imposto de Renda, segundo uma integrante da área econômica que participa da elaboração da proposta.
A tributação das big techs está alinhada com a tendência internacional e em discussão na OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico). Entre as maiores big techs, estão a Meta (dona de Facebook, Instagram e WhatsApp), Google e Amazon .
Essas companhias alegam que já são tributadas no Brasil. Um exemplo é nos contratos de publicidade que fecham com as empresas instaladas no país.
Mas a Fazenda avalia, por exemplo, que a publicidade de uma empresa chinesa ou alemã, que incide sobre a população brasileira e gera receitas, porque as compras estão sendo feitas no Brasil, não é computada.
A avaliação técnica é que, do ponto de vista econômico, essa é uma taxação mais relevante do que os contratos nacionais de publicidade. É sobre ela que deverá incidir a tributação adicional.
A área econômica trata o tema com cautela para que a medida não se misture e nem seja usada para embates políticos com a oposição bolsonarista.
Estudo do Centro de Políticas, Direito, Economia e Tecnologias da UnB (Universidade de Brasília) feito para a Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações), como mostrou a Folha, aponta que as empresas digitais com subsidiárias no Brasil têm encontrado instrumentos jurídicos para driblar a tributação do Imposto de Renda e outros tributos, além de possíveis mecanismos de planejamento tributário concentrarem os lucros extraordinários nas sedes ou em países com baixa tributação.
Ao mesmo tempo que a equipe econômica conclui o PLOA de 2025, técnicos da Fazenda já estão concentrados nas medidas que serão apresentadas depois do projeto de Orçamento, o que deve inclui a regulamentação no Brasil do imposto mínimo global.
A proposta do imposto mínimo global, que prevê a cobrança de uma alíquota efetiva de 15% sobre o lucro das multinacionais, também está em fase avançada. O envio da proposta, porém, pode ficar mais para o final do ano, segundo auxiliares do ministro.
O governo quer aprovar a medida até o fim de 2024 para começar a cobrança em 2025. O imposto global já entrou em vigor em janeiro deste ano na União Europeia, no Reino Unido e em outras grandes economias.
As discussões em torno da proposta de reforma tributária da renda também avançaram na área técnica, mas o timing do seu envio ao Congresso não está certo e depende do presidente Lula.
A reforma da renda é uma discussão mais ampla, que envolve a volta da taxação dos dividendos e um novo modelo de contribuição sobre a folha de pagamentos das empresas. Mesmo que seja enviada ainda em 2024, não se espera a sua aprovação até o final do ano.
Na semana passada, Haddad descartou a possibilidade de a reforma dos impostos que incidem sobre a renda ser usada para fechar as contas do orçamento de 2025. Segundo o ministro, ela será neutra. "Qualquer acréscimo que no futuro venha a acontecer do imposto sobre a renda, ele vai ser compensado com a redução do imposto ao consumo", afirmou.
Haddad disse que é muito provável que ela chegue ao Congresso neste ano. "Eu diria que seguramente nos próximos 60 dias, se o presidente entender que pode antecipar", afirmou Haddad. Para ele, a discussão estará amadurecida dentro do governo.
Para o PLOA, o governo vai enviar um projeto de lei com o aumento da alíquota da CSLL (Contribuição Social sobre Lucros e Dividendos) e do JCP (Juros sobre Capital Próprio).
Os aumentos estarão condicionados e serão levados adiante caso haja frustração nas receitas com as medidas aprovadas pelo Senado para compensar a desoneração da folha de empresas de 17 setores e de municípios.
Apesar dessas duas medidas terem sido rejeitadas nas negociações do Senado do projeto de desoneração, o Ministério da Fazenda acredita que tem chances de serem aprovadas em projeto separado.
A área econômica também vai apresentar ao presidente Lula um novo conjunto de medidas de cortes de despesas para 2025. Se o presidente Lula der aval para o envio de medidas de corte de despesa ao Congresso até o final do ano, elas poderão ajudar o orçamento de 2025.
Para o ano que vem, o governo vai prever no PLOA um corte de R$ 25,9 bilhões de despesas obrigatórias. A medida já foi anunciada pelo governo e será detalhada nesta quarta-feira (28) pelo Ministério do Planejamento e Orçamento.
Transição energética de Lula é balela
Quando se trata de transição energética, em qualquer lugar do mundo, o desafio é encontrar meios de substituir a queima de combustíveis fósseis, que agrava a mudança climática, por fontes limpas de energia. Não no Brasil de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), porém.
O pacote recém-lançado pelo Planalto, apesar da alcunha "verde", enganosa, tem os olhos no passado. Quase tudo nele se volta a fomentar o consumo de gás natural, outro fóssil a jorrar dos campos do pré-sal, numa reprise do delírio estatizante que tantas brechas abriu, não faz muito, para a corrupção.
"O gás é nosso" poderia ser o lema dessa recaída no estilo varguista de propelir o desenvolvimentismo nacionalista com hidrocarbonetos enterrados há milhões de anos. Trata-se de um recurso finito e condenado à obsolescência pela luta contra o aquecimento global.
Até incentivos para a moribunda indústria naval o programa traz, à revelia dos fracassos no setor e na contramão da política da Fazenda de rever benefícios tributários.
Nem mesmo se empregou a tese de acelerar os fósseis para financiar a transição no sentido de energias descarbonizadas, como a eletricidade eólica e solar fotovoltaica.
A espinha dorsal da política é ampliar a geração em usinas termelétricas a gás, em detrimento de recursos renováveis como vento e luz solar. Eis um rumo certo para sujar a matriz energética nacional, uma das mais limpas da Terra.
Para tanto, o governo pretende reduzir a reinjeção de gás nos poços petrolíferos, recurso empregado para otimizar a retirada de óleo. Verdade que a parcela de reinjeção no país é alta, 56%, contra a média internacional de 25%; também é fato que a queima do gás para produzir eletricidade emite menos carbono que a de óleo ou carvão.
Hoje, a decisão sobre quanto gás será reinjetado cabe à empresa detentora do campo, de olho na rentabilidade. Agora o governo quer autorizar a Agência Nacional do Petróleo a interferir no processo e estipular a proporção de gás reintroduzido no poço, com vistas a aumentar a oferta do combustível.
Mais gás no mercado contribuirá para baixar seu preço, favorecendo indústrias que já optaram por essa energia, mas tende a encarecer o sistema como um todo, pela necessidade de infraestrutura de distribuição. Foi assim com as emendas que impuseram termelétricas a gás em estados do Nordeste onde não havia gasodutos.
Há quem aponte ainda que o pacote estaria em conflito com a Lei do Gás de 2021, por criar obrigações e restringir direitos de produtores. A mudança não poderia em princípio ser feita por meio de decreto intervencionista, como agora.
O desenho apresentado pelo Planalto passa longe, longe demais, de um plano efetivo de transição energética. Não está à altura do que o Brasil almeja e a atmosfera do planeta necessita.
Eleições na Venezuela: Itamaraty impõe sigilo de 5 anos em documentos enviados ao TSE
Por Rafael Moraes Moura— Brasília / O GLOBO
O Itamaraty colocou sob sigilo de cinco anos os seis ofícios que enviou ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sobre as eleições presidenciais na Venezuela. A posição da diplomacia brasileira foi enviada à equipe da coluna após o pedido para obter os documentos via Lei de Acesso à Informação.
A reportagem solicitou os ofícios após revelar que o governo Lula pressionou o TSE a enviar servidores para acompanhar in loco a tumultuada eleição presidencial venezuelana. O tribunal depois recuou e não enviou seus funcionários.
O resultado da eleição não é reconhecido pela maioria da comunidade internacional até hoje por conta da postura do governo Maduro de não divulgar publicamente as atas com os números de cada seção eleitoral, o que permitiria uma verificação por instituições independentes não controladas pelo chavismo.
Os seis ofícios do Itamaraty enviados ao TSE vieram da divisão de Colômbia, Guiana, Suriname e Venezuela do Itamaraty e foram classificados como “reservados” (com sigilo de cinco anos) pelo embaixador João Marcelo Galvão de Queiroz, diretor do Departamento de América do Sul do Itamaraty. Em todos os casos, as razões para a classificação estão escondidas sob uma tarja preta.
Segundo o Itamaraty, os primeiros três documentos tratam de temas como “observação internacional às eleições presidenciais venezuelanas” (tema do primeiro ofício, enviado em 15 de abril deste ano), “registro eleitoral nas eleições venezuelanas” (7 de maio)” e “convite a representantes do TSE para que observem as eleições presidenciais venezuelanas” (17 de maio). Esses três ofícios foram enviados ao TSE ainda na gestão de Alexandre de Moraes, que deixou o comando do tribunal no início de junho.
Em nota divulgada em 30 de maio, no fim da gestão de Moraes, o TSE comunicou que não mandaria ninguém para a Venezuela.
Depois que Cármen tomou posse como presidente do TSE em 3 de junho, mais três ofícios foram enviados pelo Itamaraty à Corte Eleitoral, com os seguintes tópicos: “missões internacionais de observação eleitoral nas eleições locais” (28 de junho), “exercício de simulação das eleições presidenciais venezuelanas” (3 de julho) e “observação internacional às eleições presidenciais venezuelanas” (12 de julho), indicando que, apesar da posição pública da gestão Alexandre de Moraes, o Itamaraty ainda insistia no assunto após a troca no comando do tribunal.
A princípio, deu certo. Em 17 de julho, o TSE de Cármen Lúcia confirmou que enviaria dois servidores da área técnica do tribunal para Caracas, mudando radicalmente a postura adotada na gestão Moraes.
Embora os técnicos escolhidos para a missão fossem experientes e respeitados no TSE, a decisão de Cármen provocou mal-estar na Corte Eleitoral e levantou o temor de que o envio de servidores do Poder Judiciário brasileiro fosse interpretado como um endosso a um pleito marcado por ameaças de Maduro antes mesmo de os venezuelanos irem às urnas, conforme informou o blog.
Mas após as críticas infundadas de Maduro ao sistema brasileiro de votação, Cármen desistiu de enviar os dois servidores, que não chegaram a embarcar para a Venezuela. O recuo ocorreu a quatro dias da realização das eleições presidenciais.
Fundamento legal
Ao impor sigilo sobre os ofícios enviados pelo Itamaraty ao TSE, o embaixador Galvão de Queiroz recorre ao trecho da Lei de Acesso à Informação que prevê que são consideradas “imprescindíveis à segurança da sociedade ou do Estado” e, portanto, “passíveis de classificação” as informações que possam “prejudicar ou pôr em risco a condução de negociações ou as relações internacionais do País, ou as que tenham sido fornecidas em caráter sigiloso por outros Estados e organismos internacionais”.
Mas para a diretora executiva da ONG Transparência Brasil, Juliana Sakai, a postura do Itamaraty contraria o interesse público e levanta suspeitas.
“O que se sabe que está acontecendo na Venezuela que a população não pode saber? Qual a avaliação do governo Lula sobre o regime do Maduro que a população brasileira não pode saber?”, questiona.
“No final das contas, a gente começa a especular por que isso precisa ser tirado da informação das pessoas e acaba levantando suspeitas de que há mais problemas do que se sabe. A falta de transparência contraria o interesse público e sempre gera desconfiança.”.
Procurado pela equipe da coluna, o Itamaraty informou que os ofícios enviados ao TSE foram classificados como sigilosos por retransmitirem ao tribunal o “teor de telegramas sigilosos da Embaixada em Caracas ou por encaminharem àquele tribunal documentos e correspondências oficiais de missões diplomáticas”, que são invioláveis, segundo a Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas.
Lula diz que não repetirá ‘erro’ de Dilma e promete não interferir em eleição na Câmara
Por Vera Rosa e Eduardo Gayer / O ESTADÃO DE SP
BRASÍLIA – O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse, na noite desta segunda-feira, 26, que não vai repetir o “erro” da então mandatária Dilma Rousseff, que, em 2015, apoiou um candidato do PT para concorrer ao comando da Câmara contra o deputado Eduardo Cunha. Eleito, Cunha autorizou a abertura do processo de impeachment contra Dilma, dez meses depois.
Em reunião com líderes de 19 partidos da base aliada, no Palácio do Planalto, Lula assegurou que não interferirá nas eleições do Congresso porque isso “sempre dá errado”. Fez a afirmação diante de dois pré-candidatos à sucessão do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL): Elmar Nascimento (União Brasil-BA) e Antônio Brito (PSD-BA).
Lula sustentou que Lira tem o direito de escolher quem quer ver como seu sucessor. Argumentou, porém, que ele só precisa verificar se o seu candidato é o nome que a Câmara quer. Em 2015, Dilma apoiou o deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP), mas o preferido pelo plenário foi Cunha, que virou inimigo da petista.
Neste momento, Elmar pediu a palavra. O líder do União Brasil disse ao presidente que Lira era seu melhor amigo e, se não conseguisse convencê-lo de que era o melhor candidato, desistiria da disputa.
O Estadão apurou, porém, que Elmar nem de longe tem essa intenção. Lira vai conversar com Lula, ainda nesta semana, sobre o candidato que julga com mais condições de ser o seu sucessor. Levará ao presidente o nome de Elmar, que enfrenta resistências no Planalto.
Diante dos deputados, o presidente afirmou que não vetará qualquer indicado nem para a Câmara nem para o Senado. As eleições que vão renovar o comando das duas Casas estão marcadas para fevereiro de 2025.
“Estou há quase dois anos escutando a narrativa de que o senhor ia me vetar. Fico feliz de saber que não”, disse Elmar. De acordo com relatos de participantes do encontro, Lula balançou a cabeça e garantiu que nunca faria isso.
Antonio Brito observou, por sua vez, que o plenário da Câmara será soberano para decidir. Declarou, ainda, que pretende ir até o fim da disputa. O outro candidato é o presidente do Republicanos, Marcos Pereira (SP), que não estava presente.
“Presidente, o senhor pode ter certeza que, seja qual for o escolhido, o senhor não terá problema na condução do seu mandato”, insistiu Elmar.
Deputado faz defesa de emendas parlamentares
O líder da Maioria na Câmara, André Figueiredo (PDT-CE), defendeu ali as emendas parlamentares ao Orçamento. Na última terça-feira, 20, representantes do Planalto, do Congresso e do Supremo Tribunal Federal (STF) anunciaram um acordo para dar mais transparência à execução das emendas. Como mostrou o Estadão, no entanto, o encontro da semana passada não selou a harmonia entre os Poderes.
Há preocupação de deputados, principalmente do grupo de Lira, sobre como ficará a transferência do dinheiro das emendas no momento em que os partidos negociam apoios para a sucessão no Congresso. A situação é mais confortável no Senado, onde a vitória do presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), é dada como certa. Alcolumbre tem o aval do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).
O destino das emendas, porém, não foi o principal tema da reunião. Na prática, Lula começou a fazer movimentos para se aproximar dos parlamentares porque o governo precisa de apoio para votações importantes, como a da regulamentação da reforma tributária, e sua base de sustentação é fragmentada. O presidente disse, naquela reunião, que o Planalto não pode ter “nenhuma fissura” com o Congresso.
Lula também destacou que as eleições municipais não afetarão a relação entre o governo e o Congresso. “Ele disse que, depois das eleições, todo mundo deve descer do palanque e seguir o projeto Brasil”, contou o líder do PSB, Gervásio Maia (RN).
As declarações de Lula, no entanto, foram rebatidas por André Figueiredo. Presidente nacional do PDT, Figueiredo ponderou que a entrada do chefe do Executivo na disputa de Fortaleza, a dois meses das eleições municipais, causou grande desconforto no partido.
Como informou a Coluna do Estadão, Lula comprou uma briga com o PDT ao participar da convenção que oficializou a candidatura de Evandro Leitão (PT) à prefeitura de Fortaleza, no último dia 3. A capital cearense, onde o prefeito José Sarto (PDT) tenta novo mandato, é o principal reduto eleitoral dos pedetistas.
A participação do presidente no ato político foi vista como uma afronta e falta de apreço do governo pelo PDT, partido do titular da Previdência, Carlos Lupi, e do ex-ministro Ciro Gomes. Dias depois, Figueiredo chegou a afirmar que o PDT precisava discutir sua permanência na base aliada de Lula.
Após a reunião desta segunda-feira, Lula puxou Figueiredo para uma conversa reservada. Disse a ele ter sido muito pressionado pelo PT do Ceará a participar da convenção de Evandro Leitão, mas reiterou que respeita o PDT. Os principais líderes do PT no Estado são o ministro da Educação, Camilo Santana, e o líder do governo na Câmara, José Guimarães (CE).
Semana de queimadas teve saltos de 338% em SP e 236% em MT nos registros de incêndio
Lucas Lacerda / fdolha de sp
Registros de focos de incêndio saltaram ao longo da última semana em diferentes regiões com país, com aumentos de 338% em SP e de 236% em MT, segundo dados de satélite do BDQueimadas, programa do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).
A disparada dos registros em solo mato-grossense foi captada entre terça (20), com 459 focos, e quarta-feira (21), com 1.543. Já no estado de São Paulo, o aumento aconteceu entre quinta (22) e sexta-feira (23), com 430 e 1.886 pontos captados, respectivamente.
Na comparação de 19 a 25 de agosto deste ano com o mesmo período de 2023, os dados em todo o país mais que dobraram, saindo de 9.428 focos de incêndio para 19.767.
Além disso, os 3.482 registros de incêndio em São Paulo até 25 de agosto são praticamente dez vezes os registros de todo o mês em 2023, que teve focos 352 captados pelo Inpe.
No ano passado, pouco mais de 4 em cada 10 registros no período ocorreram no Amazonas (27%), que liderou entre as unidades federativas, seguido pelo Pará (22,3%). Já neste ano, a maior quantidade ficou registrada em Mato Grosso (21,5%), com o Pará também em segundo lugar (15,4%).
São Paulo foi a terceira unidade federativa com mais focos de incêndio entre 19 e 25 de agosto, com 14,3% dos casos. Em Ribeirão Preto, no interior do estado, foram dois registros na quinta, 30 registros na sexta e três no sábado.
Foi na sexta que incêndios de grandes proporções levaram ao bloqueio de 17 estradas na região da cidade, que teve dias de apreensão, cancelamento de voos e céu coberto pela fumaça, que chegou a antecipar a noite no sábado.
Embora os incêndios na região tenham contribuído para a grande névoa de fumaça formada sobre parte das regiões Norte, Centro-Oeste e Sudeste do país, a circulação de ventos também levou poluentes do fogo na amazônia até a região.
Com dados até o último domingo, agosto teve 25.193 focos de incêndio capturados pelos satélites, contra 17.373 em todo o mês do ano passado. Alta semelhante ocorre no recorte para todo o Norte do país, com 22.605 registros, contra 16.590 no mês cheio em 2023.
No Centro-Oeste, o salto foi de 333% na mesma comparação. Segundo nota técnica de julho do MapBiomas, os incêndios costumam ser favorecidos por secas prolongadas, e o pantanal tem sofrido com alta de queimadas também por causa da redução de sua superfície de água em 2023, sem reposição neste ano e com início antecipado da temporada de fogo.
O litígio da desoneração da folha
Por Notas & Informações / O ESTADÃO DE SP
O Senado finalmente aprovou o projeto de lei que prorroga a desoneração da folha de pagamento de 17 setores da economia e de pequenos e médios municípios de todo o País até 2027. O impasse durou meses, uma vez que o governo cobrava dos senadores que encontrassem formas de compensar a renúncia associada à proposta, estimada em R$ 25 bilhões.
Para a equipe econômica, as perdas teriam de ser ressarcidas com aumento de impostos, como determina a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Para defender a ideia, apelou inclusive ao Supremo Tribunal Federal (STF), transformando a desoneração no bode na sala a impedir o cumprimento da meta fiscal. Mas o Senado ganhou tempo engambelando o governo e recusando, uma a uma, as alternativas apresentadas pelo ministro Fernando Haddad.
Inicialmente, o governo enviou uma medida provisória para limitar o uso de créditos de PIS e Cofins pelas empresas. Depois, defendeu um aumento de 1 ponto porcentual na Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) das empresas. Por fim, propôs elevar de 15% para 20% a cobrança do Imposto de Renda sobre Juros sobre Capital Próprio (JCP), medida que só valeria a partir de 2025.
Ao fim e ao cabo, o líder do governo no Senado e relator do projeto, Jaques Wagner (PT-BA), teve de se contentar com as medidas paliativas que o Senado propunha desde o início das negociações, como a atualização de bens como imóveis na declaração do Imposto de Renda, a repatriação de ativos mantidos no exterior e a renegociação de multas e taxas aplicadas por agências reguladoras e já vencidas.
O governo não saiu completamente derrotado. Pela proposta, a União poderá restituir as perdas com recursos de depósitos judiciais retidos indevidamente pela Caixa, precatórios abandonados e recursos esquecidos em contas bancárias. Em conjunto, eles podem garantir R$ 20 bilhões extras. São receitas pontuais, que podem até salvar a meta fiscal deste ano, mas que não terão efeito estrutural sobre a arrecadação.
O Executivo também conseguiu incluir medidas no lado das despesas, como a revisão do cadastro do Benefício de Prestação Continuada (BPC), pago a idosos de baixa renda e pessoas com deficiência, e do seguro-defeso, destinado a pescadores artesanais. Nos últimos anos, eles têm crescido bem mais do que os técnicos estimavam, e, se houver indício de irregularidades ou fraudes, o benefício poderá ser bloqueado.
Para Haddad, foi um “avanço institucional”. O ministro não descartou a possibilidade de que medidas adicionais tenham de ser adotadas até dezembro caso as contas da desoneração não fechem, mas a hipótese parece improvável diante do calendário, das disputas municipais e da resistência do Congresso em elevar impostos.
O projeto foi aprovado de maneira simbólica, expressão do consenso que a proposta sempre reuniu na Casa. Ainda terá de passar pela Câmara, mas os deputados não devem impor dificuldades. Para as empresas e os municípios, nada muda neste ano. A reoneração da folha de pagamento será retomada de maneira gradual entre 2025 e 2027.
A exemplo do imbróglio das emendas parlamentares, a decisão do STF de suspender a desoneração deu alguma força para o governo reabrir as negociações com o Congresso sobre um assunto que já parecia encerrado.
O Executivo errou ao ignorar o avanço do projeto no ano passado, ao vetá-lo e ao propor a retomada da reoneração em meio ao recesso parlamentar. Equivocou-se também ao adotar uma estratégia litigante que gerou um enorme desgaste e foi coroada pela humilhante devolução de trechos de uma medida provisória pelo Congresso. Mesmo pressionado pelo STF, o Senado conseguiu marcar posição e reafirmou não estar disposto a acatar tudo que o governo quer.
Por ora, a equipe econômica respira aliviada e provavelmente conseguirá atingir a meta fiscal deste ano. Terá, no entanto, de vencer muitas batalhas para cumpri-la em 2025 e 2026, sabendo que terá de convencer um Congresso avesso a aumentos de impostos e ao fim de benefícios fiscais.
Receitas extraordinárias e pentes-finos em benefícios sociais tampouco serão suficientes para dar conta da tarefa.
Mais um ardil na Codevasf
Por Notas & Informações / O ESTADÃO DE SP
O subterfúgio usado para manter no cargo o diretor de Governança da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), Gil Cutrim, ex-deputado federal pelo Republicanos e representante do Centrão na estatal, comprova que governança é algo que, definitivamente, inexiste na companhia. Conhecida como “a estatal do Centrão”, a Codevasf esteve no cerne da distribuição dos recursos do “orçamento secreto” e ainda hoje é apontada como instrumento de expedição de verbas de emendas cartoriais.
O mandato de Cutrim, como informou a Coluna do Estadão, expirou no último dia 10, e a renovação está fora de cogitação desde que o Supremo Tribunal Federal (STF) derrubou, por maioria, a liminar camarada do ministro aposentado – e atual ministro da Justiça de Lula – Ricardo Lewandowski, expedida em março do ano passado, que autorizava as indicações do governo para companhias públicas que feriam a Lei das Estatais. O STF demorou um ano e dois meses para julgar o mérito, mas terminou por reconhecer a validade da Lei das Estatais.
Mesmo assim, por unanimidade, os juízes da Corte permitiram, sob a alegação de que é preciso evitar instabilidade, que os que já haviam sido empossados, caso de Cutrim, poderiam permanecer até o fim dos respectivos mandatos. A autorização de Cutrim acabou, mas ele continuou, pendurado no expediente de que o estatuto da companhia, vinculada ao Ministério dos Portos e Aeroportos – cujo titular é Silvio Costa Filho, seu padrinho político –, permite a permanência até que um substituto seja indicado.
Esse é apenas mais um exemplo das artimanhas que envolvem a estatal criada durante a ditadura para atuar como veículo de desenvolvimento das margens do Rio São Francisco e há muitos anos é sinônimo de fisiologismo e corrupção. A mais recente reportagem do Estadão sobre desmandos na estatal mostrou, no fim de julho, que uma auditoria da Controladoria-Geral da União (CGU) detectou o superfaturamento no preço do asfalto usado em obras da Codevasf em dez Estados do País.
Em 2022, durante o governo de Jair Bolsonaro, a Polícia Federal (PF) no Maranhão deflagrou uma operação para investigar suspeitas de fraudes em licitações da empresa no Estado, uma “associação criminosa estruturada”, como descreveu a PF. Em junho deste ano, a Polícia Federal concluiu o inquérito e indiciou o atual ministro das Comunicações, Juscelino Filho (União Brasil), à época deputado federal pelo Maranhão, por suspeita de corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa no desvio de emendas parlamentares em seu Estado.
A Codevasf foi transformada em veículo para circulação de verbas orçamentárias usadas sem transparência e serve como sumidouro do dinheiro público. A cooptação pelo Centrão não foi à toa, e a dependência do governo Lula da Silva explica, por certo, a vista grossa do petista às inúmeras acusações e suspeitas que recaem sobre seus “ministros de coalizão”.
O governo Lula, com a ajuda do STF, conseguiu driblar a lei para avalizar arranjos políticos em estatais, mas a imoralidade, neste e em outros casos, grita.
Emendas Pix: Estados e DF copiam Congresso e distribuem R$ 8 bilhões sem transparência
Por Johanns Eller / coluna malu gaspar / o globo
No centro de um cabo de guerra entre o Legislativo e o Judiciário na última semana, contido pelo acordo entre representantes dos Três Poderes na última terça-feira (20), as emendas impositivas individuais e as especiais – chamadas de Pix no jargão de Brasília – inspiraram Assembleias Legislativas de todo o Brasil a criar modalidades idênticas no formato e na falta de transparência para o repasse de recursos nos estados.
Só neste ano de 2024 os parlamentos estaduais gastarão R$ 7,97 bilhões em emendas em condições precárias de rastreabilidade e fiscalização. É o que aponta um levantamento da equipe do blog a partir de dados das plataformas de transparência dos 26 estados e do Distrito Federal.
Esse movimento ocorreu nos últimos quatro anos, a reboque da criação das emendas Pix no Congresso. Copiando a "inovação orçamentária" de Brasília, deputados estaduais enxertaram nas constituições locais emendas individuais com a possibilidade de adoção da modalidade Pix. No caso das Assembleias, o dinheiro sai do caixa dos estados direto para os projetos indicados pelos deputados nos municípios ou no DF.
As emendas Pix, estabelecidas por um projeto de emenda à Constituição (PEC) em 2019, foram turbinadas no último ano como alternativa ao orçamento secreto, ou emendas RP9, depois que elas foram declaradas inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
O dinheiro das emendas Pix é enviado pelos parlamentares diretamente para a conta dos municípios e estados e sem destinação obrigatória. O prefeito ou governador pode fazer o que quiser com o dinheiro e, até janeiro deste ano, a prestação de contas era opcional. Essas mesmas regras foram reproduzidas nos estados.
Uma norma do Tribunal de Contas da União (TCU) tornou obrigatória uma prestação de contas minuciosa e com atualização anual das informações até a execução de toda a verba. Ainda assim, muitos municípios e estados não seguem a regra, o que levou a Procuradoria-Geral da República (PGR) a pedir a suspensão dos repasses, o que foi acatado pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Flávio Dino no último dia 8.
Efeito cascata
Questionado pela equipe do blog, o Supremo informou que as decisões de Dino que suspenderam tanto as emendas Pix quanto as emendas individuais impositivas (ou seja, de pagamento obrigatório) “por enquanto” só se referem às emendas do orçamento da União. Mas, no Congresso e entre especialistas, a leitura é de que haverá um “efeito cascata” nos estados.
Isso porque, ressaltam assessores da Câmara dos Deputados com experiência no acompanhamento de emendas e ouvidos pela equipe do blog, as Constituições estaduais estão subordinadas à Federal e ao regramento jurídico do Supremo.
A avaliação é compartilhada por Ariel Uarian, advogado e mestre em Direito Constitucional.
“Há um efeito cascata que precisa ser analisado pelo STF e que está sendo ignorado”, argumenta Uarian. “Conforme o próprio Supremo já decidiu, as normas do processo legislativo orçamentário são normas de repetição obrigatória”, completa, em referência aos regramentos federais que devem ser seguidos pelas Constituições estaduais.
Neste raciocínio, ainda segundo o advogado, os termos do acordo acertado na última terça-feira entre os Três Poderes também se aplicariam às verbas das Assembleias, que por sua vez são fiscalizadas pelos Tribunais de Contas estaduais. Apesar da negativa inicial do STF, o efeito dominó foi discutido no encontro entre representantes da Corte, do Congresso e do Palácio do Planalto, segundo reportou a colunista do GLOBO Renata Agostini.
Segundo a nota conjunta assinada por representantes do Congresso, do STF e do governo Lula, os repasses individuais e impositivos serão retomados desde que não haja empecilhos técnicos, como obras embargadas. Já as emendas Pix deverão ter a aplicação definida antes do dinheiro ser encaminhado, priorizar obras inacabadas e serão fiscalizadas pelo TCU.
Em ambos os casos, o prazo para a definição de critérios objetivos para garantir a fiscalização e a rastreabilidade dos recursos é de 10 dias. Até lá, o repasse das emendas continua suspenso por ordem do STF.
Divisão por estados
Minas Gerais, o segundo estado mais populoso do Brasil, lidera a lista de estados brasileiros com R$ 1,37 bilhão em emendas equivalentes às impositivas e Pix. São Paulo, no topo do ranking populacional, tem R$ 1 bilhão. O Rio de Janeiro, que é o terceiro mais habitado, está na décima posição, com R$ 190 milhões.
O levantamento da equipe do blog mostra que o volume de emendas previstas nos orçamentos de cada estado e do Distrito Federal é muitas vezes desproporcional em relação ao número de parlamentares.
O numero de parlamentares de cada assembleia varia de acordo com uma fórmula baseada no tamanho da bancada do estado na Câmara dos Deputados, que por sua vez é definida pela Constituição, conforme a população de cada unidade federativa. São Paulo, o estado mais populoso do país, tem 94 deputados estaduais, enquanto o Rio, em terceiro lugar, tem 70.
A unidade da federação que concentra mais dinheiro na mão de parlamentares é o Distrito Federal. São R$ 648 milhões do orçamento distrital destinados a estas transferências, que representam R$ 27 milhões para cada um dos 24 deputados distritais. Já o Rio está em 23º lugar, com R$ 2,7 milhões em emendas para cada um.
No top 10 nacional dos valores por parlamentar, chamam atenção ainda as Assembleias do Mato Grosso (R$ 24 milhões), em segundo lugar, apesar de não estar entre os 15 estados mais populosos; a do Amazonas (R$ 20,5 milhões) e as de Rondônia (R$ 11,6 milhões) e Tocantins (R$ 7,1 milhões) – ambos entre as cinco unidades menos habitadas, com menos de 25 deputados em cada Casa.
Mesmo se levado em conta o ranking da soma total de emendas disponibilizadas em cada estado, há outras discrepâncias. Paraná, Rio Grande do Sul e Ceará, respectivamente o quinto, sexto e oitavo mais populosos do país, estão entre as unidades que menos destinam emendas aos deputados estaduais e também as que concentram em menor grau a verba.
O Paraná aparece em último nos dois parâmetros – soma de emendas (R$ 52 milhões) e o valor recebido por parlamentar (R$ 962,9 mil). Roraima, o menos populoso, reserva R$ 127,4 milhões no seu orçamento (mais do que o dobro do que no caso do PR). Cada um dos 24 parlamentares tem direito a R$ 5,3 milhões, mais do que o quíntuplo dos parlamentares paranaenses.
Controvérsia das emendas
As transferências especiais, como são chamadas oficialmente no Congresso, estiveram no centro da disputa entre o Judiciário e o Legislativo deflagrada pela decisão de Dino de suspender os repasses – dessas e de todas as outras emendas de pagamento obrigatório, que ao todo representam R$ 42 bilhões.
Na decisão que suspendeu as emendas, Dino condenou essa falta de controle, argumentando que mantê-las sem aprimorar os mecanismos de rastreabilidade do dinheiro provocaria “um perigoso e inconstitucional ‘jogo de empurra’” no qual “ninguém se identifica como responsável pela aplicação de parcela relevante do dinheiro público”.
“Nesse atípico ‘jogo’, o parlamentar pode argumentar que apenas indica, mas não executa; o Executivo pode informar que está apenas operacionalizando uma ‘emenda impositiva’; e o gestor estadual ou municipal pode alegar ser mero destinatário de algo que vem ‘carimbado’”, escreveu o ministro, ao acolher um pedido da PGR pela suspensão das emendas Pix.
Já no caso das emendas impositivas, Flávio Dino decidiu suspendê-las seis dias depois sob o argumento de que a transferência dos recursos deve obedecer critérios técnicos de eficiência, transparência e rastreabilidade.
Foi o suficiente para deflagrar uma guerra contra o Congresso com o aval tácito do governo Lula. Desde o início de seu terceiro mandato, o presidente ambiciona reduzir o poder do Congresso sobre o orçamento da União, que cresceu principalmente sob a presidência de Jair Bolsonaro.
O acordo assinado na última terça-feira pode ter servido para distensionar o ambiente na capital federal em clima de confraria, mas, até que sejam conhecidos os critérios para a retomada das emendas parlamentares, não resta claro se as mudanças serão suficientes para conferir às verbas a transparência necessária.
Decreto de Lula gera temores de interferência em agências em meio a rusgas com Aneel
Alexa Salomão / FOLHA DE SP
Decreto publicado nesta quarta-feira (21) no DOU (Diário Oficial da União) deu mais um passo na estratégia do governo de rever a regulação no país. Mas o contexto da nova medida trouxe temor de que as mudanças possam abrir caminho para interferências na autonomia das agências reguladoras.
O decreto estabeleceu a chamada "Estratégia Regula Melhor", com o argumento de difundir boas práticas dentro do Pro-Reg (Programa de Fortalecimento da Capacidade Institucional para Gestão em Regulação), instituído por outro decreto, de outubro de 2023. Pela proposta, um comitê gestor ficará responsável pela implementação das mudanças em várias áreas do governo, não apenas nas agências
O texto foi assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e pelo vice-presidente Geraldo Alckmin na terça-feira (20), mesmo dia em que o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, questionou a morosidade da Aneel, a agência do setor de energia elétrica.
Silveira enviou ofício para o diretor-geral da Aneel, Sandoval Feitosa, com um tom avaliado como incisivo para os padrões desse tipo de correspondência. Ameaçou intervir na agência, caso a diretoria não conclua a análise de demandas que são avaliadas como importantes para a pasta.
Feitosa afirmou ao Painel S.A., da Folha, que a agência não é um braço do governo e que os processos são pautados pelos diretores, que são independentes.
A divulgação quase simultânea do decreto e do ofício, com ameaça de intervenção, foi recebida com preocupação no setor, especialmente por que a investida ocorre num contexto de disputa por influência e cargos em diferentes organismos, incluindo na própria Aneel.
Desde o início do governo Lula 3, por exemplo, se ventilou a possibilidade de o TCU (Tribunal de Contas da União) invalidar a permanência do diretor-geral da Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações), baseado na tese de que teria extrapolado o tempo máximo de permanência no órgão que, independentemente do cargo, seria limitado a cinco anos.
Outros, no entanto, entendiam que o posto de diretor-geral deveria ser contado em separado. A decisão teria repercussões sobre outras agências, como a de energia. Em 7 de agosto, o TCU arquivou o caso, afastando o risco de Feitosa perder o cargo na agência.
Na Aneel, também há vaga na diretoria que está em disputa. O diretor Hélvio Guerra se aposentou. Ele foi indicado pelo MDB, que reivindica sugerir um novo nome.
Um dos pontos listados na queixa formal do MME à Aneel também toca na questões de indicações: a demora da agência em regulamentar a nova governança da CCEE (Câmara de Comercialização de Energia Elétrica). A estrutura do organismo foi alterada, também por decreto, em dezembro do ano passado.
Além de reconfigurar a diretoria, a medida criou um conselho. O governo tem a prerrogativa de indicar o presidente e três conselheiros, mas depende do crivo da Aneel para operar oficialmente. O processo está com a relatoria do diretor Ricardo Tili e não avança.
Os embates entre agências e governos são recorrentes e de longa data no Brasil, lembra Jerson Kelman, primeiro diretor-geral da Ana (Agência Nacional de Águas) e, depois, também diretor-geral da Aneel. Ainda em 2003, logo que Lula assumiu o primeiro mandato, a Casa Civil chegou a redigir um texto que acabava com as agências.
"Isso tem como origem o conhecido desconforto de integrantes do governo, incluindo do próprio Lula, com a autonomia das agências. Muitos não percebem que a real independência de uma agência garante o contrato de concessão —que ele não será capturado nem pelos consumidores, nem pelos concessionários ou pelo governo, que tem horizonte de curto prazo, quando as decisões de investimento na infraestrutura é de longo prazo", explica Kelman, que também é colunista da Folha.
"Tendo em vista a minha experiência pessoal quando estive nas agências, vejo a reedição da intenção de desidratar essa independência."
O governo passou o dia reafirmando que a sua proposta com a mudança na regulação é agilizar processos e reduzir custos, aprimorando o arcabouço como um todo.
Nesta quarta, no evento em Brasília em que ocorreu o lançamento da "Estratégia Regula Melhor", Andrea Macera, secretária de Competitividade e Política Regulatória do Mdic (Ministério de Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços), reforçou que não há intenção do governo em atuar contra as agências.
Macera já havia assinado artigo no site da Folha em que defende a ampla melhoria regulatória.
Em conversa com a Folha, Eduardo Nery, diretor-geral da Antaq (Agência Nacional de Transportes Aquaviários), foi na mesma linha.
"O decreto vem numa linha positiva, de melhorar a regulação num escopo amplo, não quer interferir na regulação. Foi uma coincidência o decreto sair junto com essas notícias envolvendo críticas às agências", afirmou.
Avaliando apenas o que está posto na norma, a proposta é uma espécie de carta de boas intenções do Executivo, avalia Giancarllo Melito, sócio da Barcellos Tucunduva Advogados para área de regulação.
"Tudo vai depender de como esse comitê gestor vai ser implementado e, depois, como ele vai agir", diz ele.
O advogado Rodrigo Campos, sócio do Vernalha Pereira para as áreas de infraestrutura e regulação, lembra comitê é formado por indicados de órgãos próximos ao núcleo do governo: AGU (Advocacia-Geral da União), CGU (Controladoria-Geral da União), Casa Civil, ministérios da Fazenda, do Planejamento e Orçamento, da Gestão e da Inovação, e do Mdic (Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços) que o presidirá o comitê.
"São ministérios palacianos, órgãos próximos ao núcleo do poder, e sem ligação direta com as agências de setores regulados, como óleo e gás, transportes, aviação, mineração, o que pode denotar que o governo quer ficar mais próximo desses setores, sem necessariamente intervir", afirma Campos.
"É preciso olhar como será feito a coordenação, o monitoramento e a avaliação das atividades necessárias a implementação da estratégia, e como fica a autonomia decisória das agências, algo que é importante para manter o ambiente de segurança jurídica no país. Esse é o ponto-chave de atenção."
Colaborou Paulo Ricardo Martins
Perda de áreas naturais no Brasil atinge a marca histórica de um terço do território nacional em 2023
Por Luis Felipe Azevedo— Rio de Janeiro / o globo
A perda de áreas naturais no Brasil chegou à marca histórica de um terço (33%) do território no ano passado. É o que aponta um levantamento do MapBiomas divulgado nesta quarta-feira que destaca uma aceleração do processo de deterioração ambiental desde 1985, quando o monitoramento pelos pesquisadores foi iniciado. Da chegada dos portugueses em 1500 até a metade dos anos 1980, o Brasil totalizava uma redução de 20% das áreas de vegetação nativa, da superfície de água e de áreas naturais não vegetadas, como praias e dunas, enquanto os outros 13% (110 milhões de hectares) correspondem ao período mais recente de 39 anos.
As áreas mais preservadas são as terras indígenas, que cobrem 13% do território nacional e, entre 1985 e 2023, perderam 1% de vegetação nativa. A perda nas áreas privadas foi de 28%. Especialistas ressaltam que essa redução nos biomas brasileiros tende a impactar negativamente a dinâmica do clima regional e diminui o efeito protetor durante eventos climáticos extremos.
O país ainda tem 64,5% do território coberto por vegetação nativa — número inferior aos 76% detectado em 1985. Ao todo, o Brasil tem 281 milhões de hectares de áreas modificadas pelo ser humano, sendo que 39% delas surgiram nos últimos 39 anos.
O Rio de Janeiro foi o único estado que teve aumento de vegetação nativa no período, passando de 30% para 32% do seu território. Os demais 26 entes da federação tiveram redução neste índice. As mais expressivas foram em Rondônia (de 93% para 59%), Maranhão (de 88% para 61%), Mato Grosso (de 87% para 60%) e Tocantins (de 85% para 61%).
Correspondente a 41% do país, a floresta foi a cobertura nativa que mais perdeu área desde 1985. Foram 61 milhões de hectares a menos, uma redução de 15%. Proporcionalmente, porém, a formação de savana, como no Cerrado, teve a maior perda, com uma queda de 26% e cerca de 38 milhões de hectares convertidos.
— As florestas no Brasil são muito diversas com características e espécies típicas de cada região, que estão sujeitas a diferentes graus de ameaça. Esta diversidade deve ser levada em conta em políticas públicas para conservação e bioeconomia — aponta Eduardo Vélez, pesquisador do MapBiomas.
No período, a área de pastagem expandiu 79% (72,5 milhões de hectares), e a de agricultura aumentou 228% (42,4 milhões de hectares). O crescimento expressivo do uso de terra para alimentação de gado ocorreu em Rondônia (de 6% para 38%), no Maranhão (de 5% para 29%), em Mato Grosso (de 6% para 24%) e no Tocantins (de 7% para 30%).
Se em 1985, 48% dos municípios tinham o predomínio da agropecuária, a dominância chegou a 60% dos municípios em 2023. O levantamento também destaca que mais da metade (60%) da perda de vegetação nativa no país está em propriedades privadas, onde a vegetação nativa já ocupa menos da metade.
Segundo os dados do MapBiomas, os estados com maior proporção de vegetação nativa são Amapá (95%), Amazonas (95%) e Roraima (93%). Por outro lado, os menores índices estão em Sergipe (20%), São Paulo (22%) e Alagoas (23%).
Em sua área total, os biomas Amazônia e Cerrado são os que mais perderam área de vegetação nativa. A redução no território amazônico foi de 55 milhões hectares (14%). O resultado indica que a Amazônia brasileira tem hoje 81% do seu território coberto por florestas e vegetação nativa, percentual próximo da margem estimulada por cientistas para seu ponto de não retorno (entre 75% e 80%).
No Cerrado, foram suprimidos 38 milhões de vegetação nativa (27%). No caso do Pampa, a perda foi de 28% (3,3 milhões de hectares). A redução no Pantanal foi mais acentuada na superfície de água, que passou de 21% em 1985 para 4% em 2023. A Caatinga, por sua vez, perdeu 14% de vegetação nativa (8,6 milhões de hectares) no período.
Resultado pós-Fundo Amazônico
O levantamento também apresenta um balanço de ganho e perda de vegetação nativa nos municípios desde 2008, ano em que foi instituído o Fundo Amazônia e editado um decreto que conferiu efetividade ao Código Florestal então vigente ao estabelecer multas para os casos de descumprimento das regras.
No período de 16 anos, 18% dos munícipios do país tiveram estabilidade no percentual correspondente a vegetação, ou seja, são os locais onde o ganho e perda foram menores que 2%. Em outros 37%, houve ganho de vegetação nativa. O bioma com maior percentual de municípios onde a área de vegetação nativa cresceu no período foi a Mata Atlântica (56%).
Entretanto, quase metade dos municípios brasileiros (45%) perderam vegetação nestes 16 anos. As reduções mais acentuadas ocorreram no Pampa (35%).
— Uma parte significativa dos municípios brasileiros ainda perde vegetação nativa; mas, por outro lado, os últimos quase um terço dos municípios brasileiros estão recuperando áreas de vegetação nativa — avalia o coordenador geral do MapBiomas, Tasso Azevedo.
Os estados com maior proporção de municípios com ganho de vegetação nativa são o Paraná (76%), Rio de Janeiro (76%) e São Paulo (72%). Os com maior perda, por sua vez, são Rondônia (96%), Tocantins (96%) e Maranhão (93%).