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PGR avalia denúncia contra Bolsonaro unindo tentativa de golpe, joias e fraude em vacinas

Por  e — Brasília / O GLOBO

 

A revelação do plano golpista que previa os assassinatos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, do vice Geraldo Alckmin e do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes foi avaliada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) como mais um elemento que reforça a possibilidade de uma única acusação criminal, em várias frentes, contra o ex-presidente Jair Bolsonaro e aliados. A Polícia Federal suspeita da existência de uma organização criminosa no entorno do ex-mandatário que atuou para tentar um golpe de Estado, atacar instituições, vender joias ilegalmente, fraudar cartões de vacinação e espionar adversários.

 

O procurador-geral da República, Paulo Gonet, deve receber nos próximos dias a conclusão da PF sobre a trama golpista. Auxiliares dele analisam que é necessário examinar a suposta participação do ex-presidente nas tentativas golpistas em conjunto com os outros inquéritos para fechar as conexões.

Bolsonaro não se manifestou após os novos desdobramentos, mas em outras ocasiões negou que tenha participado de uma tentativa de ruptura institucional. Em entrevista ao GLOBO há duas semanas, ele disse que houve debates sobre a decretação de estado de sitio, mas afirmou que “não é crime discutir a Constituição”.

 

Mesmo ‘modus operandi’

 

Na decisão em que decretou a prisão de quatro militares e um policial federal pelo envolvimento no plano, Moraes apontou cinco eixos de investigação envolvendo Bolsonaro e seu entorno. Segundo ele, uma das linhas trata de “ataques virtuais a opositores”, em investigação dentro do inquérito das milícias digitais.

 

Há ainda apurações sobre ataques às instituições e às urnas; tentativa de golpe de Estado; uso do Estado para “obtenção de vantagens”, como inserção de dados falsos em cartões de vacina e desvios de joias; e ataques aos imunizantes e às medidas sanitárias na pandemia. De acordo com a PF, o grupo que tramou pelo golpe usou o mesmo “modus operandi da milícia digital” que promoveu ataques contra instituições e disseminou informações falsas sobre o processo eleitoral.

 

Há, ainda, uma investigação em curso que apura se uma estrutura paralela na Agência Brasileira de Inteligência (Abin) foi usada durante o governo Bolsonaro para espionar ilegalmente adversários e disseminar ataques contra eles. A PF suspeita que o policial preso nesta semana, Wladimir Matos Soares, que forneceu informações sobre a segurança de Lula no fim de 2022 aos militares que arquitetaram o plano, tinha relação com um integrante do grupo que agia à margem na Abin.

 

Soares foi interrogado pela PF na terça. Segundo o Jornal Nacional, ele afirmou em depoimento que soube do plano de golpe e foi cooptado a participar do grupo por um agente, que é investigado pelo suposto esquema paralelo na Abin. Essa equipe faria a segurança de Bolsonaro caso um golpe fosse consumado. O policial preso fez parte da equipe de segurança de Lula na transição.

 

A lógica por trás dessa análise ampla por parte da PGR é fazer com que uma eventual acusação ligue todos esses elementos, fortalecendo a argumentação de que o ex-presidente agiu de forma direta na ocorrência de um plano golpista após as eleições de 2022, quando perdeu para Lula. A expectativa é que a investigação da PF termine nos próximos dias, com a possibilidade do indiciamento de Bolsonaro e seu entorno.

 

“Os elementos trazidos aos autos comprovam a existência de gravíssimos crimes e indícios suficientes da autoria, além de demonstrarem a extrema periculosidade dos agentes, integrantes de uma organização criminosa, com objetivo de executar atos de violência, com monitoramento de alvos e planejamento de sequestro e, possivelmente, homicídios do então presidente do TSE, do presidente eleito e do vice-presidente eleito”, disse Moraes na decisão.

 

No curso das investigações, a PF já apontou conexões entre as diferentes investigações que tratam das ações de Bolsonaro e aliados — é justamente por haver relação entre os inquéritos que todos tramitam sob a relatoria de Moraes.

 

Conforme os investigadores, a PF apura a “articulação de pessoas” do círculo próximo a Bolsonaro, “com tarefas distribuídas”. Além dos alvos que aparecem em mais de um inquérito — casos de Bolsonaro e do ex-ajudante de ordens Mauro Cid , por exemplo —, a PF identificou relação entre os acontecimentos. O ex-presidente, segundo esta linha de apuração, só teria ido aos Estados Unidos no fim de 2022 porque não conseguiu respaldo da cúpula das Forças Armadas para o golpe. Na viagem, a comitiva dele levou parte das joias desviadas do acervo presidencial, segundo a PF.

 

O dinheiro da venda dos itens, segundo a investigação, foi usado para custear a estadia na Flórida. Além disso, para a PF, Bolsonaro, Cid e seus familiares teriam fraudado os seus cartões de vacinação para evitar problemas na hora de entrar em países que cobravam a imunização contra a Covid-19, como os EUA.

 

Mauro Cid é elo

Cid é visto pela PF como peça-chave nessa teia de investigações. Enquanto debatia a possibilidade de golpe, como mostram mensagens apreendidas pela PF, ele também buscava saídas para o antigo chefe caso a empreitada não fosse adiante. No caso das vacinas, o mais avançado judicialmente, Cid revelou que recebeu ordens de Bolsonaro para que inserisse os dados dele e de sua filha no sistema de controle de vacinação do SUS. A PF identificou que os cartões com os dados falsos de imunização foram emitidos no Palácio do Planalto.

 

O caso das joias, em que Bolsonaro foi indiciado, foi considerado o estopim para a decisão de Cid de fechar um acordo de colaboração premiada, que está em reavaliação (leia mais na página 6). Esse inquérito também conta com vasto acervo probatório que mostra seu elo com o ex-presidente no cometimento de supostos crimes. A PF identificou que o ex-ajudante de ordens viajou e vendeu itens recebidos pelo ex-mandatário. Dados do celular de Cid confirmam o trajeto e coincidem com a venda dos objetos nos Estados Unidos.

 

Papel semelhante foi verificado pela PF nas investigações da tentativa de golpe. Cid contou que Bolsonaro recebeu uma minuta de um decreto golpista com diversas páginas elencando supostas interferências do Poder Judiciário no Executivo e propondo medidas antidemocráticas. O militar também contou que Bolsonaro se reuniu com a cúpula das Forças Armadas e ministros militares e discutiu detalhes dessas minutas. De acordo com as apurações, os então comandantes do Exército, Freire Gomes, e da Aeronáutica, Baptista Júnior, não embarcaram na ofensiva golpista.

 

As ligações entre os casos que tiveram origem em episódios distintos já levaram Moraes a determinar o compartilhamento de provas entre diferentes inquéritos. Em julho, quando novas descobertas sobre a “Abin paralela” vieram à tona, ele ordenou que as informações também passassem a integrar as apurações sobre as milícias digitais e a tentativa de golpe. De acordo com o ministro, havia “conexão probatória” entre os casos — opinião semelhante à da PGR, para quem a estrutura ilegal na agência é “apenas uma célula de uma organização criminosa mais ampla”.

Liberdade para a gestão pública

Por Notas & Informações / O ESTADÃO DE SP

 

A reforma administrativa é uma questão de cidadania. Como já dissemos neste espaço, as arbitrariedades e disfuncionalidades da administração pública a tornam uma máquina de gerar desigualdades, pobreza, injustiça social e conflito civil.

 

Desigualdade, porque em média os trabalhadores do setor público ganham acima de seus pares na iniciativa privada e a disparidade entre as carreiras do topo e da base é maior que no setor privado. Pobreza, porque uma máquina custosa e ineficiente pressiona as contas públicas, contraindo os investimentos estatais e afugentando os privados. Injustiça social, porque os mais pobres sofrem mais com a carência de serviços básicos. E conflito, porque estas distorções e perversões incitam a descrença do cidadão em relação ao Estado Democrático de Direito e desencadeiam um ciclo vicioso de vilanização dos servidores públicos retroalimentada por sua vitimização.

 

Um dos vícios de origem mais deletérios desse sistema é o Regime Jurídico Único estabelecido pela Constituição, que impõe, tanto à administração direta quanto indireta, um formato uniforme, rígido e centralista de contratação de funcionários, independentemente da função.

 

Qualquer democracia prevê, por exemplo, estabilidade de carreira para garantir a continuidade dos serviços e a proteção de políticas de Estado e dos servidores contra pressões dos governos de turno. Mas em geral a estabilidade é restrita a carreiras típicas de Estado, como juízes, diplomatas, policiais e fiscais. No resto, há diferentes categorias de servidores e regimes, garantindo à gestão pública flexibilidade para se adaptar a uma realidade em constante transformação. O modelo brasileiro é uma aberração sem paralelo no mundo.

 

Para corrigi-la, o Congresso aprovou uma Emenda à Constituição permitindo a contratação de parte dos servidores pelo regime da CLT. Isso foi no século passado, em 1998. E, no entanto, só agora a norma passará a valer.

 

Isso porque em 2000, os suspeitos de sempre – PT, PDT e outras legendas de esquerda – entraram com uma ação na Suprema Corte, que, em 2007, suspendeu liminarmente os efeitos da emenda. O julgamento foi iniciado apenas em 2020 e concluído somente agora, pasme o leitor.

 

O mais estupefaciente é que nem sequer se tratava de questão de mérito. Os autores da ação alegavam inconstitucionalidade na alteração de um dispositivo que não havia sido aprovado em votação de dois turnos. Mas, como entendeu o voto vencedor na Corte, tratava-se apenas de uma mudança de local no texto, que não justificaria nova votação.

 

Se uma questiúncula procedimental, que poderia ter sido apreciada em poucos dias, só o foi após 24 anos, não é, evidentemente, em razão de intrincadas divergências doutrinais, mas por pressão de lobbies corporativistas. Na prática, o Judiciário protelou por 26 anos a entrada em vigor de uma norma perfeitamente legítima aprovada pelo Legislativo, com prejuízos incalculáveis para os cidadãos.

 

Toda essa miserável e dispensável saga é ela mesma um exemplo da disfuncionalidade, ineficiência e onerosidade da máquina estatal e serve de alerta à urgência de reformas.

Moraes e PF não demonstraram que conversas e desejos formam um plano coerente e real de golpe

Por J.R. Guzzo / O ESTADÃO DE SP

 

Uma das novidades da vida cotidiana no Brasil de hoje é o dever quase-legal de acreditar num absurdo por dia. São coisas que dizem com a cara, a formalidade e a segurança de um texto do Diário Oficial, e que não fazem nenhum nexo por qualquer tipo de raciocínio lógico – mas nas quais o cidadão é obrigado a acreditar, sem perguntar nada, sob pena de incidir nos delitos de “fascismo”, “nazismo”, “ato contra a democracia”, “extrema direita”, “golpismo” e “negacionismo”

 

É a criminalização do ato de pensar – por decisão do STF, da Polícia Federal e da porção da mídia que reproduz mecanicamente o que ambos lhes entregam para publicar. Você tem que acreditar, por exemplo, que um tubo de batom é “substância inflamável”; Alexandre de Moraes escreveu isso. Houve uma tentativa de golpe armado, com estilingues e bolas de gude, em 8 de janeiro de 2023. O mesmo ministro diz que foi agredido no aeroporto de Roma, mas o STF mantém em sigilo há mais de um ano as imagens gravadas do episódio.

Esse “crê ou morre”, como no Islã, é do tipo pega geral. Em política é obrigatório dizer que o presidente Lula não perdeu nada nas eleições municipais de 2024 – o PT ficou com menos de 5% das prefeituras e o candidato de Lula foi incinerado em São Paulo, mas isso é porque ele “se preservou”. Em economia está decidido que um crescimento de 3% ao ano, igual ao do último ano do governo anterior, é “robusto”. Em conduta, a mulher do presidente dirige palavras de baixo calão a Elon Musk, mas é ele quem propaga o “discurso do ódio”.

 

A conferência do G-20 ora encerrada no Rio de Janeiro, e que deveria ser a obra prima da política externa de Lula, acabou com um dos comunicados mais indigentes na história do grupo – uma sopa de palavras tão aguada, e tão inútil, que ninguém achou motivo para vetar nada no texto. Mas a alternativa era não sair nem isso, o que parece ter deixado o Itamaraty em princípio de pânico. Como, no fim, arrumou-se alguma coisa para colocar no papel, a verdade oficial é que a diplomacia brasileira deu um show.

 

A última obrigação expedida pelo ministro Moraes e a PF estabelece que se leve a sério uma “Operação Punhal Verde-Amarelo” – um segundo golpe de Estado de Jair Bolsonaro contra Lula, ou a continuação do primeiro, que já está sendo investigado há quase dois anos, por outros meios. Não parece claro se é uma coisa ou outra, mas a principal novidade é que Lula, nesta versão, seria envenenado. Moraes, que antes seria executado na estrada que vai de Brasília a Goiânia, continua da lista de assassinatos dos golpistas. Iam matar, também, Geraldo Alckmin – coisa que jamais passou pela cabeça de ninguém até hoje.

 

No golpe como ele era até agora, segundo Moraes e a polícia, a prova mãe era a “delação premiada” do coronel Cid e as suas “minutas do golpe”. A delação, aparentemente, não está valendo mais; nem o ministro e nem a PF estão satisfeitos com ela. As “minutas” não serviriam como prova nem num júri de centro acadêmico. Se o ministro Toffoli decidiu que confissões voluntárias de corrupção ativa são “imprestáveis”, por que as minutas do coronel seriam prestáveis? As provas da polícia, agora, são “conversas entre militares”.

 

O que a PF mostrou para os jornalistas até agora é uma maçaroca de diálogos idiotas e de orações sem verbo, sujeito, predicado, começo, fim e, sobretudo, sem pé nem cabeça – algo no nível do “quem tomar vacina pode virar jacaré” e outros grandes momentos do governo Bolsonaro. Como iriam envenenar Lula? Com formicida? Não está claro quantos militares tomariam parte no golpe. “Já temos uns vinte”, diz um dos denunciados pela PF. E os outros 220.000 homens que estão no efetivo do Exército? A verba total para financiar o golpe era de R$ 100.000, diz a polícia.

 

Nem o ministro Moraes e nem a PF demonstraram que essas conversas e desejos formam um plano coerente de golpe, e menos ainda de tentativa real de golpe. Talvez sejam o que se chamam de “atos preparatórios” do desejo de cometer um crime, se ficar provado que conseguiriam mesmo preparar alguma coisa. Mas “atos preparatórios”, na lei brasileira, não são nada. Não foi demonstrada, menos ainda, qual poderia ter sido a participação do maior suspeito da PF e de Moraes nesse golpe – Bolsonaro.

 

Não há nenhuma declaração gravada de algo que ele tenha dito, ou algum papel assinado, ou uma mensagem de WhatsApp. Tudo o que existe, segundo a PF, é gente falando a respeito de Bolsonaro – e principalmente a respeito do que ele não disse. Mais do que qualquer outra coisa, talvez, você está intimado a considerar que o ex-presidente é o grande culpado por trás disso tudo, só que não está preso. Se o ministro e a polícia estão certos de que o responsável é Bolsonaro, ou gatos gordos como o general Braga, por que eles estão soltos?

 

A incompetência das investigações chega ao ponto de trabalharem num caso durante dois anos e não levantarem prova alguma que fique de pé? Não há nada, pelo menos, que o STF tenha considerado suficiente até agora para prender Bolsonaro. Caso contrário, é óbvio que ele estaria na cadeia, não é mesmo? São dúvidas formalmente proibidas para o cidadão brasileiro. A democracia recivilizada do Brasil estabeleceu que é ilegal perguntar.

 

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Opinião por J.R. Guzzo

Jornalista escreve semanalmente sobre o cenário político e econômico do País

Inquérito sobre plano golpista que mira Bolsonaro, Braga Netto e militares deve ser concluído nos próximos dias

Por  — Brasília / O GLOBO

 

Polícia Federal (PF) avalia que a Operação Contragolpe, deflagrada nesta terça-feira, não irá atrasar a conclusão do inquérito sobre a trama golpista que mira o ex-presidente Jair Bolsonaro, ex-ministros e militares de alta patente. A expectativa entre investigadores é que o caso seja encerrado nos próximos dias.

 

O encerramento da investigação foi postergado recentemente após as descobertas de fatos importantes. Um deles é o suposto plano que veio a público nesta terça-feira, elaborados por militares com objetivo de matar o ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o vice Geraldo Alckmin.

 

Mensagens interceptadas indicam que os militares estavam "posicionados" para agir, mas a missão foi abortada. Outro fato que demandou uma análise mais cuidadosa foi a possível conexão entre os golpistas e a chamada "Abin paralela". Parte das informações da investigação veio de mensagens apagadas do celular do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro.

 

A Polícia Federal considerou que ele omitiu dados de seu acordo de delação premiada, que agora está sendo analisado pela Procuradoria-Geral da República. Cabe ao ministro Alexandre de Moraes a última palavra sobre a validade da colaboração.

 

As conversas constam de um relatório da PF, que teve o sigilo retirado nesta terça-feira. Ex-número dois da Secretaria Geral da Presidência do governo Bolsonaro, o general da reserva Mario Fernandes é apontado como um dos homens fortes da gestão passada que mais estimulou o golpe de Estado no fim de 2022. Ele teria tentado convencer o comando do Exército a aderir à trama e orientado "caminhoneiros e o pessoal do agro" no acampamento em frente ao Quartel General do Exército, além de ter conversado com o ex-presidente sobre a trama.

 

A PF irá se debruçar nos próximos dias sobre o material apreendido em endereços dos alvos. Conforme a coluna de Lauro Jardim, Bolsonaro deve ser indiciado na investigação sobre o plano golpista, assim como Braga Netto, Mario Fernandes, o deputado federal Alexandre Ramagem, ex-chefe da Abin, entre outros.

 

Os crimes atribuídos aos alvos da investigação são de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado e organização criminosa.

Outros dois inquéritos que tem como alvo Bolsonaro estão para ser concluídos: o caso da "Abin paralela" e o das fake News. Há uma tese central que liga as três apurações: o governo Bolsonaro teria se utilizado da máquina do Estado para obter "vantagens indevidas de ordem política e econômica", segundo um relatório da PF. Relator dos três casos no Supremo, Moraes já autorizou o compartilhamento das provas entre as investigações.

Ação contra o IJF pode tornar réus Sarto e secretário e bloquear R$ 20 milhões da Prefeitura

Marcos Moreira / DIARIONORDESTE

 

O cenário de precarização do Instituto Dr. José Frota (IJF) está no radar da Justiça. O Ministério Público do Estado do Cerará (MPCE) ingressou com uma Ação Civil Pública (ACP), em 7 de novembro, a partir da 137ª Promotoria de Justiça de Fortaleza, após os problemas de abastecimento de remédios e insumos na unidade persistirem desde o início do ano. Caso seja acatado, o processo pode bloquear R$ 20 milhões da Prefeitura de Fortaleza.

 

 

Em 11 de novembro, a ACP do Ministério Público teve o primeiro desdobramento: os envolvidos têm 72 horas para apresentar manifestação após serem notificados. A medida judicial, inclusive, pode tornar réus o município de Fortaleza, o IJF, o prefeito José Sarto (PDT), o secretário municipal de Saúde, Galeno Taumaturgo Lopes, e o superintendente do hospital, José Maria Sampaio Menezes Júnior. Todos foram citados nominalmente na decisão da 10ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Fortaleza, órgão responsável pelo caso. 

A reportagem do Diário do Nordeste procurou a Prefeitura e o IJF para tratar da situação do hospital, mas ainda não teve resposta.

Em maio deste, o IJF e o MPCE fecharam um acordo que previa uma solução para o caso em até três meses. À época, já eram apontados prejuízos no fluxo de atendimento, aumento do tempo de internação e adiamentos de cirurgias. As carências não foram resolvidas, culminando na ACP.

"Desde o ano passado que a gente vem acompanhando isso aí. Eram faltas pontuais, tinha uma falta aqui, outra falta acolá. E a gente notificava e eles providenciavam, eles tomavam medicamento emprestado de outros hospitais, mas resolviam. E agora, do meio do ano para cá, a coisa se agravou muito. As pessoas ficam internadas mais tempo aguardando por cirurgia, ocupa muito mais tempo no leito, a situação da pessoa se agrava, fora que estressa toda a equipe de saúde”
Ana Cláudia Uchoa
Promotora de Justiça do MPCE
 
“O juiz vai analisar e vai acatar ou não o nosso pedido. Mas eu acredito, eu tenho fé que ele vai acatar, porque isso aí é um problema grave para a população. O nosso pedido é de que, caso o IJF não comprove que abasteceu suficientemente, que seja bloqueado o valor de 20 milhões e que seja determinado que o superintendente adquira os medicamentos e insumos que estão em falta. E, junto a isso, seja aplicada uma multa diária, pessoalmente, ao prefeito, ao superintendente do IJF e ao secretário de Saúde do município”, defende a promotora. 
 
Por conta da transição entre o governo Sarto e Evandro Leitão (PT), prefeito eleito de Fortaleza, a ação requer também que o abastecimento tenha uma autonomia de 60 dias. Nesse sentido, o MP faz uma exigência: a retomada do estoque não deverá ocorrer à custa da retirada de materiais de outros hospitais da rede – um prática comum em outros momentos, segundo Uchoa. 
 

Entre outras cobranças, o MPCE solicita a criação de um comitê para acompanhar todo o processo, incluindo questões ligadas aos recursos necessários, e pede, ainda, que a Prefeitura ou o IJF mantenha um site com informações atualizadas acerca dos processos licitatórios para aquisição dos itens em falta.  

51,26%
Percentual de déficit no estoque de insumos médicos do IJF, de acordo com denúncias recebidas pelo MPCE

“O objetivo é facilitar a fiscalização tanto pela Promotoria, quanto pelos demais órgãos fiscalizadores e pela população em geral, constando dados acerca do prazo para conclusão do processo, previsão de assinatura de contrato e previsão de data para o fornecimento dos produtos”, divulgou o órgão.

'Crise do lençol' no IJF

O Diário do Nordeste também mostrou parte dos problemas que vivem usuários e funcionários do equipamento. No hospital, há a falta de medicamentos, de insumos básicos, suspensão de cirurgias e até a demora na distribuição de comida. É o que apontam relatos de usuários, sindicatos e profissionais que atuam na unidade ouvidos pelo Diário do Nordeste

A reportagem conversou com alguns acompanhantes e cuidadores que convivem no IJF, durante uma visita ao local, na manhã da última quinta-feira (14). Os depoimentos têm pontos em comum: inexistência de medicações e itens essenciais, como fraldas e lençóis, cancelamento de cirurgias, falta de estrutura para acompanhantes - que precisam dormir no chão, em papelões - e demora na entrega das refeições. 

Denúncias sobre o local foram recebidas pelo MPCE, dentre elas, a de que 279 dos 375 medicamentos estariam com estoque zerado no Instituto. Ao mesmo tempo, 263 insumos médicos, como agulhas, sondas, drenos, fios de sutura, entre outros, não estariam disponíveis – do total de 513 itens.

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PF faz operação que mira ‘kids pretos’ e investiga plano para matar Lula, Alckmin e Moraes

Por  / O GLOBO

 

A Polícia Federal realiza uma operação nesta terça-feira no inquérito que apura se houve uma tentativa de golpe após a eleição de 2022, quando o ex-presidente Jair Bolsonaro foi derrotado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A operação mira os “kids pretos”, formado por militares das Forças Especiais. De acordo com a PF, havia um plano de execução de Lula e seu vice, Geraldo Alckmin, e do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).

 

Ao todo, foram expedidos cinco mandados de prisão preventiva, três mandados de busca e apreensão e 15 medidas como a proibição de contato entre os investigados, a entrega de passaportes em 24 horas e a suspensão do exercício de funções públicas. Um dos alvos é o general da reserva Mário Fernandes, que foi secretário-executivo, segundo posto mais importante, da Secretaria-Geral da Presidência no governo Bolsonaro e hoje é assessor no gabinete do deputado Eduardo Pazuello, ex-ministro da Saúde.

 

A investigação, segundo a PF, indica que os kid pretos utilizaram conhecimento técnico-militar para planejar, coordenar e executar ações ilícitas durante os meses de novembro e dezembro de 2022.

 

A PF aponta ainda que foi identificado um plano denominado “Punhal Verde e Amarelo”, que previa, para o dia 15 de dezembro de 2022, o homicídio dos candidatos eleitos à Presidência e Vice-Presidência da República. Além disso, a ação incluía a prisão e execução do ministro Alexandre de Moraes, do STF, que estava sendo monitorado como parte da trama golpista.

 

O plano golpista também previa a criação de um “Gabinete Institucional de Gestão de Crise”, que seria integrado pelos próprios envolvidos, para gerir os conflitos decorrentes das operações. O cumprimento dos mandados contou com o acompanhamento do Exército Brasileiro e ocorreu nos estados do Rio de Janeiro, Goiás, Amazonas e no Distrito Federal. A PF apura se os envolvidos no esquema praticaram os crimes de organização criminosa, abolição violenta do Estado Democrático de Direito e golpe de Estado.

 

Quem são os 'kids pretos'

Os chamados "kid pretos", segundo a PF, estiveram em reuniões que tinham o intuito de delinear estratégias para a ofensiva golpista, segundo a PF. Nos ataques de 8 de janeiro de 2023, chamou a atenção de investigadores a presença de manifestantes com balaclavas e desenvoltura na linha de frente da invasão. Um grupo organizou uma ofensiva para furar o bloqueio da Polícia Militar, orientou manifestantes a entrar no Congresso pelo teto, transformando gradis em escadas, e os instruiu a acionar mangueiras para diminuir os efeitos das bombas. Destroços de uma granada de gás lacrimogêneo usada em treinamentos militares foram encontrados, segundo a CPI dos Atos Golpistas.

 

O apelido "kids pretos" , segundo o Exército, é um nome informal atribuído aos militares de operações especiais, por usarem um gorro preto. Nos livros de história militar, o termo faz referência ao codinome utilizado para definir o comandante da unidade que combateu guerrilheiros do Araguaia.

 

Para integrar as forças especiais, o interessado precisa ser sargento ou oficial e fazer cursos de paraquedista, por seis semanas, e de “ações de comandos”, que dura quatro meses e é a etapa mais dura. Um exercício comum é ficar em ambientes fechados com gás lacrimogêneo sem máscara. Restrições de sono e de alimentação também integram a rotina, além de testes físicos.

 

Há ainda uma terceira fase com foco estratégico. Um exemplo de ação desta etapa, que leva cinco meses, é a infiltração em outro estado por meio de salto de paraquedas para, em simulações, cumprir determinada missão, como o resgate de um refém.

 

Os “kids pretos” também já atuaram em operações de grande porte, como a missão no Haiti, e eventos como a Copa do Mundo — neste último caso, dedicados a evitar ataques terroristas. O efetivo é reduzido: a maior parte fica no 1º Batalhão de Forças Especiais, em Goiânia. O Exército não informa a quantidade exata, mas estimativas apontam para 400 militares. Há, ainda, a 3ª Companhia de Forças Especiais, em Manaus, com cerca de 150 integrantes.

 

Em relatório, a PF afirmou que houve um “planejamento minucioso para utilizar, contra o próprio Estado brasileiro, as técnicas militares para a consumação do golpe de Estado”. A conclusão parte de uma troca de mensagens em que o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, e o coronel Bernardo Romão Correa Neto, combinam encontros com integrantes das forças especiais em novembro de 2022.

 

O objetivo seria refinar o planejamento e ampliar, entre os militares, a adesão à trama golpista. “Só chamamos os FE”, escreveu Correa Neto a Cid. O advogado do ex-ajudante de ordens afirmou que não teve acesso aos autos. A defesa de Correa Neto não foi localizada, enquanto a de Bolsonaro diz que ele não atacou a democracia.

STF decide que pobres são incapazes

Por Notas & Informações / O ESTADÃO DE SP

 

O colegiado do Supremo Tribunal Federal (STF), em decisão unânime, confirmou a liminar do ministro Luiz Fux que obriga o governo federal a adotar mecanismos técnicos para impedir que beneficiários do Bolsa Família utilizem recursos do programa em apostas online, as chamadas bets. Decerto todos os ministros do STF acreditam ter dormido o sono dos justos na noite do dia 14 passado, seguros de terem tomado mais uma daquelas decisões “iluministas” – agora no sentido de resguardar os brasileiros mais desvalidos dos males dos jogos de azar. A demão de virtude, porém, mal esconde o autoritarismo, o preconceito, a incoerência e a afronta à Constituição que subjazem à suposta boa intenção.

 

Senão vejamos. A decisão do STF é autoritária porque determina como uma parcela dos cidadãos deve dispor de seu próprio dinheiro. O Bolsa Família, deveria ser ocioso lembrar após tantos anos de vigência do programa, não é necessariamente voltado à alimentação dos beneficiários. Fosse assim, seria o caso de o governo federal substituir o Bolsa Família por um “cartão alimentação”, utilizável apenas em vendas e supermercados para compra de comida. Além disso, por que proibir o uso desse dinheiro apenas em apostas, e não, por exemplo, em bebidas alcoólicas, cigarros ou prostituição? Pensando bem, diante do ânimo paternalista do Supremo, é melhor não dar ideias.

 

Cada brasileiro tem o direito de dispor de sua renda como bem entender, mas, para os doutos ministros do Supremo, isso não se aplica aos cidadãos cuja renda deriva da transferência do Bolsa Família. Estes, conforme o entendimento dos magistrados, são incapazes de tomar suas decisões e de arcar com as consequências delas.

 

A decisão do STF também é preconceituosa porque trata os brasileiros mais pobres como uma massa de incapazes que precisam ser tutelados pelo Estado, como se a pobreza, por si só, os tornasse ignorantes em termos de dinheiro. Os prejuízos individuais e familiares – sociais e financeiros – do vício em jogos de azar recaem sobre os cidadãos em geral, inclusive, e sobretudo, sobre os que mais têm recursos para apostar nas tais bets. E não consta que os ministros do Supremo cogitem de determinar como esses cidadãos mais abonados, não necessariamente mais ricos, vão dispor de seu patrimônio. Por que, então, fazê-lo em relação aos beneficiários do Bolsa Família, senão por uma visão enviesada sobre eles apenas em razão da fonte de sua renda?

 

Não bastasse tudo isso, a decisão do STF de determinar que o Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome impeça o uso do Bolsa Família para apostas online é ainda incoerente. Desde o início, o programa de transferência de renda prioriza as mulheres, em particular as mães chefes de família, como as responsáveis pelo recebimento do benefício. O Estado sempre tratou essas cidadãs como as mais aptas para gerir os recursos, sem jamais tolher sua capacidade de decidir onde e como empregar o Bolsa Família. No máximo, há algumas contrapartidas muito razoáveis, como, por exemplo, manter a vacinação dos filhos em dia, matriculá-los na escola, entre outras. Pois esse mesmo Estado, representado por sua mais alta Corte de Justiça, agora parece não vê-las assim tão responsáveis como outrora.

 

Por fim, mas não menos importante, a decisão do STF é afrontosa à Constituição, por incrível que possa parecer, em particular ao princípio da dignidade da pessoa humana consagrado no artigo 1.º da Lei Maior. Está claro para este jornal que um Estado que considera uma expressiva parcela de seus nacionais incapaz de tomar decisões que afetam diretamente sua vida apenas porque recebe um benefício público é um Estado que a trata de forma indigna.

 

Os males da jogatina nada têm a ver com pobreza. É possível que, a depender do caso, o impacto das apostas online na renda e no patrimônio de um beneficiário do Bolsa Família seja até proporcionalmente menor do que a dilapidação de grandes fortunas em decorrência do vício em jogos de azar entre os mais ricos. É de paternalismo, puro e simples, que se está tratando.

Justiça Eleitoral multa André Fernandes em R$ 1,2 milhão após ação de Evandro Leitão

Escrito por Alessandra Castro / DIARIONORDESTE

 

Justiça Eleitoral multou o deputado federal André Fernandes (PL) em R$ 1,250 milhão, por não ter veiculado, durante a campanha eleitoral, direito de resposta concedido a Evandro Leitão (PT) durante a disputa pela Prefeitura de Fortaleza. A decisão foi proferida nessa terça-feira (5), pelo juiz da 115ª Zona Eleitoral de Fortaleza, Victor Nunes Barroso. 

Então adversários na disputa do segundo turno, André deveria ter inserido 25 direitos de respostas do petista durante o seu tempo de propaganda eleitoral gratuita no rádio. Como descumpriu a determinação liminar, o valor total da multa chegou ao montante de R$ 1.250.000,00 agora — já que é R$ 50 mil por cada inserção. O valor deve ser pago à União. Ainda cabe recurso. 

A ação foi impetrada pela campanha de Evandro Leitão, que reclamava direito de resposta devido a "ataques veiculados pelo representado que ultrapassam a simples crítica política e configuram uma tentativa de difamação e calúnia, ao associar o candidato e seu partido a práticas censuráveis e criminosas sem apresentar qualquer prova concreta". 

A propaganda do então candidato do PL teria trazido mensagens de que o "PT é a favor das drogas, prostituição, promove o aborto e exclui Deus das escolas e da sociedade", conforme alegou a defesa de Leitão na ação. No pleito do segundo turno, Evandro foi eleito prefeito de Fortaleza com 50,38% dos votos válidos.

A reportagem entrou em contato com a assessoria de André Fernandes e aguarda retorno.

 

‘Ativismo judicial’ atropela reforma trabalhista e gera custos bilionários a empresas, aponta estudo

Por Daniel Weterman / O ESTADÃO DE SP

 

BRASÍLIA – Decisões do Judiciário vêm mexendo significativamente na rotina das empresas e aumentado os custos de se investir no Brasil, conforme estudo coordenado pelo sociólogo José Pastore, professor da Universidade de São Paulo (USP) e presidente do Conselho de Emprego e Relações do Trabalho da FecomercioSP. Em alguns casos, o impacto econômico de um conjunto de ações sobre o mesmo tema supera R$ 1 bilhão. Segundo o levantamento, o chamado “ativismo judicial” na área trabalhista afasta investimentos, compromete o crescimento econômico do Brasil e pode provocar desemprego.

 

O estudo, ao qual o Estadão teve acesso, explorou casos reais em que os autores identificaram ativismo judicial – quando um juiz toma uma decisão que não está prevista em lei ou até mesmo contraria a legislação – em dez temas, incluindo concessão de gratuidade em processos judiciais, terceirização, horas extras e prevalência do negociado sobre o legislado.

 

“Todo direito tem custo, todo benefício gera despesa. Os juízes não compreendem essas coisas e, para querer proteger e fazer justiça social, passam por cima das leis”, diz José Pastore ao Estadão. Leia a entrevista completa.

 

Essa visão, porém, é questionada pelo presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), ministro Aloysio Corrêa da Veiga. “Os juízes brasileiros, em especial os da Justiça do Trabalho, são cientes de suas responsabilidades e do papel dos Poderes da República. Juízes não passam por cima de leis”, disse ao Estadão. Procurado, o Ministério do Trabalho e Emprego não se manifestou.

 

Os especialistas não revelam os nomes das empresas e dos empregados envolvidos, mas apontam uma tendência que pode neutralizar os efeitos da reforma trabalhista aprovada em 2017. O total de processos na Justiça do Trabalho atingiu 5,4 milhões no ano passado. O número havia diminuído após a aprovação da medida, mas voltou a crescer em decorrência das decisões.

Um dos casos reais do estudo coordenado por Pastore cita que o Tribunal Superior do Trabalho (TST) decidiu pela ilegalidade da terceirização do empregado de um banco entendendo que ele exercia atividades típicas de uma instituição financeira, enquanto a empresa alegava que o trabalhador atuava apenas na triagem e contagem de documentos, e não no atendimento ao público, venda de produtos bancários ou autenticação de documentos nos caixas.

 

Mesmo que a reforma trabalhista tenha legalizado a terceirização para qualquer atividade, seja o trabalho direto de uma empresa (no caso do banco, um caixa) ou uma atividade-meio (segurança ou trabalhador da limpeza), magistrados têm anulado a contratação de serviços e imposto multa milionária para os empregadores.

 

“É verdade que, além das raízes paternalistas, ideológicas e psicológicas, o ativismo judicial decorre também da má qualidade de muitas leis e do próprio zigue-zague das decisões judiciais das cortes superiores que acabam pautando a orientação dos tribunais inferiores”, diz o estudo, que é assinado por Pastore e mais oito especialistas. “Entretanto, nada justifica as interpretações voluntaristas quando as leis são claras”, afirma o texto, citando as leis da terceirização e reforma trabalhista.

O ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), defendeu recentemente uma revisão do entendimento sobre a terceirização pelo Judiciário. “Acho que nós tínhamos que revisitar o tema, não para rever a jurisprudência, mas para delimitar até onde ela vai, porque hoje nós vamos virar uma nação de pejotizados”, afirmou Dino durante o julgamento de um recurso da Justiça do Trabalho que reconheceu o vínculo entre uma empresa de produção audiovisual e um assistente de iluminação.

 

Só no caso da terceirização, levantamento dos especialistas com dados da plataforma Datalawyer indicaram a existência de 40.209 processos com custo total de R$ 7,23 bilhões para as empresas entre janeiro de 2019 e julho de 2024. Considerando que 20% dessas ações sejam julgadas procedentes, um índice considerado conservador pelos analistas, o impacto para os negócios será superior a R$ 1,4 bilhão e muitos deles ficarão inviabilizados.

 

Empregado com duas BMW e uma Harley-Davidson ganha direito de não pagar custos de processo judicial

Os autores do estudo apontam motivações ideológicas e paternalistas nas decisões. “A insegurança jurídica é um resultado do ativismo judicial que busca, entre outros objetivos, preencher lacunas e/ou moldar o ordenamento jurídico para atender às necessidades sociais dos que mais sofrem”, diz o documento.

 

“Entretanto, isso é feito de forma custosa e prejudicial para as atividades econômicas e para o próprio Erário. Em última análise, a referida busca pelos fins sociais deixa de lado a finalidade econômica das empresas, requisito fundamental para impulsionar investimentos e gerar empregos.” O direito de uma pessoa entrar na Justiça sem pagar os custos do processo assinando uma mera declaração que não possui renda suficiente, mas sem comprovação, provocou uma explosão de ações após a reforma trabalhista ter diminuído a judicialização, segundo o estudo.

 

Em 2018, o número de processos distribuídos na primeira instância da Justiça do Trabalho caiu 31% (de 2,3 milhões para 1,6 milhão, em números aproximados) em relação ao ano anterior, quando houve aprovação da reforma trabalhista, enquanto que, entre 2022 e 2023, o volume aumentou 17% (de 1,5 milhão para 1,7 milhão).

 

Esse tipo de benefício é resultado de uma decisão do STF de outubro de 2022 e da interpretação que o Tribunal Superior do Trabalho deu à chamada justiça gratuita. Um empregado em um caso real ganhou o benefício mesmo possuindo dois veículos BMW avaliados em R$ 800 mil cada e uma motocicleta Harley-Davidson que custa aproximadamente R$ 240 mil.

 

Em outro processo, uma pessoa que declarou ter um salário de R$ 30 mil mensais ganhou a justiça gratuita ao assinar uma simples declaração dizendo que não possuía condições de pagar os custos. Os especialistas ressaltam que a mera declaração contraria a comprovação de falta de recursos exigida pela reforma trabalhista. A situação não provoca prejuízos apenas para as empresas, mas também para o próprio governo, que deixa de arrecadar, pois 76% das ações são pagas pelos cofres públicos.

 

O levantamento identificou 636.583 processos transitados em julgado em que houve o pedido de gratuidade entre 2019 e 2024. Do total, os juízes concederam o benefício a 486 mil ações, na maioria, com base em mera autodeclaração da parte, com um custo total estimado de R$ 56,6 bilhões. A estimativa é que o poder público deixe de arrecadar R$ 1,1 bilhão nesse montante. “Isso mostra que não há concessão sem custo. E, no caso, o custo para o erário é muito alto”, diz o estudo.

 

Estudo sugere submeter decisões a análise de custo-benefício e regular atuação de juízes

Uma das principais inovações da reforma trabalhista foi a prevalência do “negociado” sobre o “legislado”, ou seja, vale o que a empresa combina com os trabalhadores em acordo coletivo, mesmo que a negociação flexibilize alguma regra trabalhista. Uma empresa, no entanto, teve acordos coletivos anulados pelo TST e foi obrigada a pagar R$ 5,3 milhões para atender 92 ações trabalhistas desse gênero.

 

Em outro processo, o Tribunal Regional do Trabalho invalidou uma norma coletiva que previa a redução do intervalo mínimo para refeição e descanso em uma indústria – com a reforma, é possível negociar meia hora de almoço em troca de o trabalhador sair mais cedo, por exemplo. Em consequência, a empresa foi obrigada a pagar o adicional de 50% para todos os empregados em relação ao período do intervalo reduzido.

 

“No Brasil, o subjetivismo associado ao voluntarismo de muitos magistrados na prolação das sentenças gera um verdadeiro medo nos empreendedores, em especial, os pequenos e médios que não têm recursos para acompanhar as flutuações nas decisões judiciais sobre o mesmo assunto”, diz o relatório. “Por mais humanitária ou paternal que seja uma sentença judicial, se ela se descola das leis vigentes, o seu prejuízo é bem maior do que o seu benefício.”

 

Para conter os efeitos do ativismo judicial, os estudiosos sugerem adotar a prática de submeter projetos de leis, medidas provisórias, decretos e portarias a uma análise rigorosa de custo-benefício de curto, médio e longo prazos. Além disso, dar o mesmo tratamento ao processo de elaboração de normas no âmbito da Justiça do Trabalho e regular de forma explícita a liberdade de interpretação dos juízes em todas as instâncias do Judiciário.

 

Na opinião dos especialistas, também é importante aumentar a participação de empregados e empresas na elaboração das normas e modernizar os cursos de Direito, onde os magistrados se formam, com atenção aos custos dos direitos.

Eleições antecipadas para presidências de Assembleias entram na mira do STF

José Matheus Santos / folha de sp

 

 

Eleições antecipadas para as presidências e outros cargos das mesas diretoras das Assembleias Legislativas são alvos de questionamentos recentes da PGR (Procuradoria-Geral da República) e de decisões do STF (Supremo Tribunal Federal).

Ao menos 11 estados tiveram votações para o comando do Legislativo contestadas no tribunal: Amazonas, Maranhão, Piauí, Roraima, Mato Grosso, Pernambuco, Paraíba, Tocantins, Amapá, Rio Grande do Norte e Sergipe. A maioria das contestações foi feita pela PGR, que entrou com oito ações desde outubro. Algumas também foram impetradas por partidos.

Os estados têm a regra de dividir as legislaturas em dois biênios, ou seja, cada mandato para os cargos das mesas diretoras dura dois anos —a exceção é o Rio Grande do Sul, que tem um presidente a cada ano. As contestações no STF se referem às votações para o segundo biênio, que começa em fevereiro de 2025.

Desde 2022, a jurisprudência da corte permite reeleição para os cargos das mesas diretoras das Assembleias, mesmo se ocorrer dentro da mesma legislatura. Uma das razões para o debate é que a Constituição não prevê datas para as votações nas Casas.

Há casos em que as Assembleias fizeram, no mesmo dia, as votações para os dois biênios, como no Piauí, na Paraíba e no Tocantins. Em outros, a antecipação permitiu a eleição para 2025/26 ainda ao longo do ano passado.

A Procuradoria-Geral da República contestou as eleições para o segundo biênio em oito estados. Dessas, sete ações são de autoria da gestão Paulo Gonet, enquanto uma, a do Maranhão, é do período de Augusto Aras.

Gonet argumenta que as eleições antecipadas comprometem a alternância do poder e a periodicidade de pleitos, além de ferir critérios de contemporaneidade e razoabilidade.

Um desses casos aconteceu no Amazonas, onde o deputado estadual Roberto Cidade (União Brasil) foi reeleito para o comando da Assembleia em abril de 2023. O partido Novo entrou com ação no STF contra a reeleição.

"O Supremo Tribunal Federal admite a eleição antecipada para a mesa diretora do segundo biênio da legislatura, mas desde que atendidos os critérios de contemporaneidade e de razoabilidade", escreveu o ministro Cristiano Zanin ao determinar que uma nova votação fosse realizada.

O novo pleito aconteceu no dia 30 de outubro, e Roberto Cidade foi reeleito em menos de dois minutos. Com isso, ele vai para o terceiro mandato seguido como presidente da Assembleia.

Apesar de não permitir três mandatos consecutivos, o STF entendeu em julgamento de 2022 que a nova regra não geraria inelegibilidade para eleitos em pleitos anteriores a 7 de janeiro de 2021, o que contempla a primeira votação que elegeu Roberto Cidade em 2020.

No Rio Grande do Norte, Ezequiel Bezerra (PSDB) foi eleito presidente para dois biênios, até o começo de 2027, em votação realizada no mesmo dia, em fevereiro de 2023. Ele comanda a Assembleia Legislativa desde 2015. O relator da ação sobre o caso no STF, ministro Gilmar Mendes, ainda não decidiu sobre o questionamento da PGR.

Em abril, o Supremo anulou a votação da Assembleia do Tocantins que elegeu o filho do governador Wanderlei Barbosa, o deputado estadual Léo Barbosa, para a presidência da Assembleia no biênio 2025/2026.

Em Sergipe, os deputados realizaram uma nova votação, que manteve a reeleição de Jeferson Andrade (PSD) para a presidência da Assembleia, quatro dias após decisão do ministro Alexandre de Moraes que anulou a votação que aconteceu em junho do ano passado.

A Assembleia de Pernambuco também fará uma nova escolha após determinação do ministro Flávio Dino, que anulou a votação que reelegeu Álvaro Porto (PSDB) em novembro de 2023, mais de um ano antes do segundo biênio.

"A supressão do intervalo temporal (...) elimina a oportunidade de avaliação do desempenho dos ocupantes atuais dos cargos e impede que o processo eleitoral reflita eventuais mudanças na vontade política dos parlamentares ou na composição das forças políticas dentro da Casa Legislativa", afirmou o ministro. Ele determinou que a votação aconteça a partir de dezembro.

Alguns estados se anteciparam a desfechos de ações no STF. A Assembleia do Maranhão, que já tinha feito a votação que reelegeu a presidente Iracema Vale (PSB) em junho de 2023, decidiu alterar o regimento interno para que a escolha seja feita a partir de novembro.

No Piauí, os deputados aprovaram, em outubro, uma emenda à Constituição estadual que prevê a votação para o segundo biênio a partir de outubro do segundo ano de mandato, mas a Assembleia diz que a nova regra não vai afetar a que já foi feita em 1º de fevereiro de 2023 e elegeu o deputado Severo Eulálio (MDB) para a presidência do biênio 2025/26. A Procuradoria da Casa pediu ao ministro Kassio Nunes Marques a extinção de uma ação do PSDB que contesta a votação.

Marcelo Labanca, professor de direito constitucional da Universidade Católica de Pernambuco, classifica as ações do STF como interferência do Judiciário no Legislativo.

"É uma leitura centralizada do federalismo brasileiro. Não existe norma na Constituição que diga que o mandato de uma mesa diretora tenha que ser de dois anos nas Assembleias Legislativas nem as datas das votações. A definição da data de eleição sempre foi algo interno do Legislativo."

Jean Menezes de Aguiar, advogado e professor de MBAs da Fundação Getulio Vargas, concorda com o entendimento de ministros do STF que determinaram novas votações.

"Isso visa fazer com que haja uma fiscalização dos próprios parlamentares das gestões dessas Casas. E aumenta o pluralismo político."

Para Aguiar, um dos pontos que podem ser ajustados é a definição do intervalo entre as datas, já que houve casos em que diferentes ministros permitiram votações a partir de outubro, e outros, apenas a partir de dezembro do segundo ano da legislatura.

 

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