Disputa bilionária mobiliza parentes de ministros do STF nas defesas
Uma disputa bilionária em diferentes tribunais entre gestores financeiros e Walter Faria, dono do Grupo Petrópolis, das cervejas Itaipava e Petra, mobilizou nos últimos anos pelo menos dez familiares de membros da cúpula do Judiciário brasileiro, que atuam como advogados nas causas.
Entre os que defendem ou defenderam algum dos lados do litígio estão parentes dos ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) Gilmar Mendes, Alexandre de Moraes, Cristiano Zanin e Kassio Nunes Marques.
Também participa do processo um filho do ministro Luis Felipe Salomão, vice-presidente do STJ (Superior Tribunal de Justiça).
Os familiares dos ministros atuam ou atuaram como advogados de um dos lados de processos que tramitam no STJ, na Justiça do Paraná e na Justiça Federal em Brasília. A causa tem possibilidade de chegar ao Supremo.
Caso isso aconteça, pode causar uma enxurrada de impedimentos de ministros nas ações. O motivo é que, segundo a legislação, um magistrado não pode julgar uma causa na qual seu cônjuge ou parente tenha atuado.
Walter Faria e os empresários Renato Mazzucchelli e Ruy del Gaiso brigam desde 2019 pelo controle da Imcopa, empresa paranaense de produção de derivados de soja que está em recuperação judicial desde 2013. Os créditos da recuperação foram estimados em mais de R$ 3,3 bilhões.
O primeiro acusa os demais de terem dado "um golpe" durante sua prisão na Operação Lava Jato, em 2019. Ele foi investigado por suspeita de manter uma estrutura de pagamento de propinas e de agir em conluio com a Odebrecht. Em 2022, o ministro Gilmar Mendes anulou decisões tomadas em instâncias inferiores sobre o caso e determinou o arquivamento de ações penais.
Faria diz que tinha um acordo com Mazzucchelli, Gaiso e Naede de Almeida, seu ex-braço direito, de que eles investiriam recursos seus na Imcopa, para que ele não aparecesse publicamente como interessado. Segundo Faria, o combinado era o de que ele se tornaria o dono dos créditos da Imcopa, mas passou a ser impedido de exercer esse direito por meio de uma suposta alteração fraudulenta em contrato.
Os outros negam qualquer manobra e afirmam que Faria é quem tenta modificar termos acordados previamente. Mazzucchelli e Gaiso dizem que Faria concordou que a operação seria encabeçada por eles e abriu mão, em carta, de resgatar seu investimento antes do vencimento, estipulado para 2025.
A briga judicial tem diversos ramos. No STJ, discute-se a responsabilidade de cada tribunal para tomar decisões específicas a respeito do imbróglio e da recuperação judicial.
No ano passado, o ministro Antonio Carlos Ferreira derrubou determinações feitas no Paraná, por entender que invadiam a competência da Justiça Federal no DF. O caso ainda deverá ser levado a análise de colegiado no STJ.
Atualmente, a Imcopa é administrada pelo Grupo Petrópolis, que teve decisões favoráveis em Brasília e no Paraná.
Na disputa judicial, a família do ministro do STF Gilmar Mendes tem representantes nos dois lados envolvidos.
Em setembro do ano passado, Laura Schertel Ferreira Mendes, sua filha, foi incluída como uma das advogadas do Petrópolis no processo que tramita no STJ. Um mês depois, ela deixou o caso, e entraram Maria da Conceição Sabo Mendes e Pedro Anísio Sabo Mendes, filhos do juiz federal Italo Mendes, que foi presidente do TRF-1 (Tribunal Regional Federal da 1ª Região) e é primo do ministro do Supremo.
Maria Carolina Feitosa Tarelho, enteada de Gilmar Mendes e filha da advogada Guiomar Mendes, esposa do ministro, também fez parte da equipe de advogados do Petrópolis na disputa.
Do outro lado do processo estão as representantes da Crowned, empresa criada em Luxemburgo e que foi usada para receber recursos de Faria e investir em créditos da Imcopa.
Guiomar Mendes e sua filha Daniele, irmã de Maria Carolina (advogada da Petrópolis) e também enteada do ministro, foram contratadas para compor a equipe de advogados da Crowned. As duas trabalham para o escritório Sergio Bermudes. Valeska Zanin Martins, esposa de Cristiano Zanin, ministro do STF, também foi integrada ao grupo.
A Crowned, no entanto, também atravessa briga pelo controle. Na sexta-feira (16), um dos lados da disputa, o advogado Ricardo Bocchino Ferrari, solicitou a destituição de toda a equipe jurídica da empresa para que Tiago Limongi assuma o caso no STJ.
A R2C Holdings, de Mazzucchelli e del Gaiso, protocolou uma contestação em que afirma que Ferrari não é proprietário da Crowned e não tem poderes para substituir advogados. A peça é assinada por Guiomar, Daniele, Valeska e outros advogados.
Além dos já citados, o Grupo Petrópolis também tem como advogados no processo Karine Nunes Marques e Viviane Barci de Moraes, respectivamente irmã de Kassio Nunes Marques e esposa de Alexandre de Moraes, ministros do STF, como mostrou a coluna Painel, da Folha, e Luis Felipe Salomão Filho, filho de Luis Felipe Salomão, ministro do STJ.
Procurados, os ministros do STF e do STJ não quiseram se manifestar sobre o tema. Também procurados, não se pronunciaram Valeska Zanin Martins, Karine Nunes Marques, Viviane Barci de Moraes e Salomão Filho.
Guiomar Mendes afirma que, assim como em outras áreas, filhos de advogados muitas vezes buscam seguir carreiras jurídicas e que as relações familiares não influenciam nos desempenhos profissionais dos que trabalham no caso em questão.
Ela também diz que que não atuou ao mesmo tempo que Maria Carolina (advogada do Petrópolis) no litígio, pois a filha deixou o caso ainda em 2023. Por fim, afirma que continua a trabalhar no processo, independentemente da tentativa de destituição por parte de Ricardo Ferrari.
Pedro e Maria Sabo Mendes afirmam que atuam como advogados do Petrópolis desde antes do litígio com a Crowned (no caso dele, desde 2009; no dela, há mais de cinco anos) e que quando passaram a trabalhar nos processos do grupo não havia qualquer cruzamento familiar. Eles também afirmam que não existem possíveis interferências no exercício do trabalho.
Em nota, a R2C, de Mazzucchelli e del Gaiso, que constituíram a Crowned em Luxemburgo com o advogado Ricardo Ferrari, afirma que "levou em consideração o notável saber jurídico de todos os escritórios contratados, atuantes em processos de recuperação judicial e contencioso estratégico e envolvidos nas mais complexas demandas no Brasil e no exterior".
Em nota, o Grupo Petrópolis diz que o processo que discute o controle da Imcopa em Brasília "já foi sentenciado pela Justiça Federal e todos os pedidos do Grupo Petrópolis contra Ruy del Gaiso e Renato Mazzucchelli foram julgados procedentes" e que Ferrari, "após tomar conhecimento dos crimes praticados pela dupla, trocou os advogados que representavam a companhia".
"Logo, nos dias de hoje, a Crowned não é representada por nenhum advogado que seja parente de ministro do STF ou do STJ", diz a nota.
"Todas as contratações [de advogados] foram feitas pelo Grupo Petrópolis levando-se em conta critérios exclusivamente técnicos. Nenhuma dessas contratações ocorreu após o litígio objeto da matéria, mas todas elas foram feitas em momento anterior", diz a empresa.
Ex-chefe do Exército apresenta versão branda sobre golpismo de Bolsonaro e leva bronca de Moraes
Ex-comandante do Exército, o general Marco Antônio Freire Gomes apresentou uma versão mais branda nesta segunda-feira (19) ao STF (Supremo Tribunal Federal) sobre as reuniões que teve com Jair Bolsonaro (PL) em que o ex-presidente apresentou alternativas para dar um golpe de Estado após a eleição de Lula (PT).
Diante do que foi entendido como uma mudança de versão, o ministro Alexandre de Moraes deu uma bronca no general. "A testemunha não pode omitir o que sabe. Vou dar uma chance para a testemunha falar a verdade. Se mentiu para a Polícia Federal, tem que dizer que mentiu para a polícia", disse.
O general Freire Gomes presta depoimento como testemunha da acusação no processo da trama golpista. Ele confirmou que foi ao Palácio da Alvorada em 7 de dezembro de 2022, convocado por Bolsonaro, para participar de uma reunião.
No encontro, um assessor do ex-presidente apresentou um documento que sugeria uso das Forças Armadas em medidas como GLO (Garantia da Lei e da Ordem), estado de defesa ou estado de sítio após o resultado eleitoral.
Freire Gomes disse que essa primeira versão do documento não causou espanto nos chefes militares. "Ele apresentou esses considerandos, todos eles embasados em aspectos jurídicos, dentro da Constituição. Não nos causou espécie. Como ainda ia ser estudado e aprofundado, nós aguardamos uma outra manifestação do senhor presidente", afirmou.
O general disse que se reuniu com Bolsonaro em outras oportunidades no fim de 2022. Em um desses encontros o assunto foi retomado. Freire Gomes disse que foi nessa oportunidade que ele manifestou contrariedade a uma possível ruptura democrática.
"Pelo que me lembro, ele apenas comentou o estudo. O brigadeiro Baptista Júnior [ex-chefe da Aeronáutica] falou que não faria qualquer coisa e eu informei ao presidente, de forma bastante cordial, que as medidas que ele quisesse tomar deveriam considerar vários aspectos: o apoio internacional e nacional, o Congresso, a parte jurídica."
Freire Gomes negou que tenha dado voz de prisão contra Bolsonaro. A versão do general contraria o depoimento do brigadeiro Baptista Júnior, que afirmou à Polícia Federal que o chefe do Exército teria dito que seria obrigado a prender Bolsonaro caso avançasse com os intentos golpistas.
O ex-comandante do Exército afirmou ainda que o então chefe da Marinha, almirante Almir Garnier Santos, manifestou apoio a Bolsonaro durante uma reunião em que se tratou sobre os planos golpistas. Ele disse, porém, que "não interpretei como qualquer conluio".
O gabinete do ministro Alexandre de Moraes iniciou nesta segunda-feira (19) a fase de depoimento das testemunhas do processo contra o núcleo central da trama golpista de 2022.
O grupo tem como réus o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), Alexandre Ramagem (deputado federal e ex-chefe da Abin), Almir Garnier (ex-comandante da Marinha), Anderson Torres (ex-ministro da Justiça), Augusto Heleno (ex-ministro do GSI), Mauro Cid (ex-ajudante de ordens de Bolsonaro), Paulo Sérgio Nogueira (ex-ministro da Defesa) e Walter Braga Netto (ex-ministro da Casa Civil e da Defesa).
Eles são acusados pelos crimes de organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado pela violência e grave ameaça contra o patrimônio público e deterioração do patrimônio tombado. Somadas, as penas máximas podem passar de 40 anos de prisão.
O depoimento do general Freire Gomes era um dos mais esperados pelas partes envolvidas no processo. O militar confirmou à Polícia Federal que Bolsonaro convocou os chefes das Forças Armadas para apresentar um plano de intervenção no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) após a eleição de Lula (PT) —ação que daria início a um golpe de Estado.
"Que confirma que o conteúdo da minuta de decreto apresentada foi exposto ao declarante nas referidas reuniões. Que ressalta que deixou evidenciado a Bolsonaro e ao ministro da Defesa [general Paulo Sérgio Nogueira] que o Exército não aceitaria qualquer ato de ruptura institucional", disse Freire Gomes, segundo o termo de depoimento.
O ex-chefe do Exército afirmou à PF que o documento apresentado por Bolsonaro tinha conteúdo idêntico à minuta de decreto encontrada na casa do ex-ministro da Justiça Anderson Torres —também réu pela trama golpista.
O general conta ainda que o então chefe da Marinha, almirante Almir Garnier Santos, teria concordado com a proposta de ruptura democrática apresentada pelo ex-presidente.
"Que ele e Baptista [Júnior, ex-chefe da Aeronáutica] afirmaram de forma contundente suas posições contrárias ao conteúdo exposto. Que não teria suporte jurídico para tomar qualquer atitude. Que acredita, pelo que se recorda, que o almirante Garnier teria se colocado à disposição do presidente da República", disse o militar, segundo a PF.
O depoimento de Freire Gomes foi uma das bases da denúncia da PGR contra o núcleo central da trama golpista. As revelações do general se tornaram públicas em março de 2024.
O depoimento do ex-comandante militar no Supremo era esperado pelas partes envolvidas no processo por motivos diversos.
A acusação esperava que o general reforçasse o testemunho sobre as pressões por um golpe de Estado que recebeu no fim de 2022. As defesas pretendiam aproveitar possíveis deslizes do militar para questionar seu depoimento.
A fase de depoimento de testemunhas começou nesta segunda com mais de 80 pessoas listadas para serem ouvidas pelo Supremo em duas semanas de audiências. Os primeiros depoentes são os escolhidos pela PGR.
O STF definiu que jornalistas credenciados e advogados das partes podem acompanhar os depoimentos no plenário da Primeira Turma do STF. As audiências, por videoconferência, serão transmitidas nos telões do colegiado.
A imprensa, porém, está impedida de fazer gravações de áudio e vídeo das sessões. O Supremo diz que a proibição tem como base o artigo 210 do Código de Processo Penal, que diz que as testemunhas serão inquiridas cada uma por vez "de modo que umas não saibam nem ouçam os depoimentos das outras".
O primeiro dia de depoimentos tem quatro testemunhas com participação prevista. São elas Marcos Antônio Freire Gomes (ex-comandante do Exército), Clebson Ferreira de Paula Vieira (ex-integrante do Ministério da Justiça), Adiel Pereira Alcântara (ex-diretor da PRF) e Éder Lindsay Magalhães Balbino (dono de empresa contratada pelo PL para fiscalizar o processo eleitoral).
O ex-comandante da Aeronáutica brigadeiro Carlos de Almeida Baptista Júnior teve o depoimento adiado para quarta-feira (21). Ele está em viagem, fora do país.
Na Presidência, Bolsonaro acumulou uma série de declarações golpistas às claras, provocou crises entre os Poderes, colocou em xeque a realização das eleições de 2022, ameaçou não cumprir decisões do STF e estimou com mentiras e ilações uma campanha para desacreditar o sistema eleitoral do país.
Após a derrota para Lula, Bolsonaro incentivou a criação e a manutenção dos acampamentos golpistas que deram origem aos ataques do 8 de Janeiro e, como ele mesmo admitiu publicamente, reuniu-se com militares e assessores próximos para discutir formas de intervir no TSE e anular as eleições.
Saudosista da ditadura militar (1964-1985) e de seus métodos antidemocráticos e de tortura, o ex-presidente já foi condenado pelo TSE por ataques e mentiras sobre o sistema eleitoral e é réu no STF sob a acusação de ter liderado a trama golpista de 2022. Hoje está inelegível ao menos até 2030.
Caso seja condenado pelos crimes de organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado pela violência e grave ameaça contra o patrimônio público e deterioração do patrimônio tombado, a pena pode passar de 40 anos de prisão.
Político de Ubajara é afastado em operação que investiga desvio de recursos do município
Uma operação do Ministério Público do Ceará e da Polícia Civil afastou um agente político de Ubajara do mandato por 90 dias, nesta quarta-feira (14). A sua identidade não foi divulgada pelos órgãos. Ele, que teve sua residência e seu gabinete revistados nas diligências por suspeita de integrar esquema criminoso na Prefeitura, pode responder por crime contra a Administração Pública.
Os agentes da 3ª fase da Operação “Castelo de Cartas” apreenderam um aparelho celular, um computador e uma agenda com anotações que irão subsidiar as investigações. Ele é apontado como um dos beneficiários do arranjo criminoso comandado por um servidor municipal de Ubajara, que consistia em se apropriar de peças de veículos e combustíveis comprados pela Prefeitura para a manutenção da frota do município.
Outras quatro pessoas, entre empresários e “laranjas”, também participavam do esquema, segundo as investigações. Além disso, uma empresa de autopeças e um posto de combustíveis davam suporte às infrações. Os cinco investigados foram alvos da 1ª fase da operação, deflagrada em 26 de dezembro de 2024, e o servidor municipal, na 2ª fase, que ocorreu quatro dias depois.
Ações contra Cabral são enviadas ao STJ após decisão do STF sobre foro especial
Italo Nogueira / folha de sp
Quatro ações penais contra o ex-governador Sérgio Cabral já foram enviadas pela Justiça Federal no Rio de Janeiro ao STJ (Superior Tribunal de Justiça) em função da decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) de alterar seu entendimento sobre a aplicação do foro especial.
É a segunda reviravolta nesses processos, três dos quais já tiveram condenações a Cabral revertidas após os tribunais considerarem irregular a concentração de ações penais com o juiz Marcelo Bretas.
Em dois processos, os magistrados que receberam os autos já haviam validado as decisões do antecessor, mas interromperam a atuação após a mudança de entendimento no Supremo.
Outras ações devem seguir o mesmo destino. Processos no Tribunal de Justiça e no TRE (Tribunal Regional Eleitoral) aguardam manifestação das defesas. O Ministério Público do Rio de Janeiro já se posicionou de forma favorável ao envio para o STJ.
Procurada, a defesa de Cabral não quis se manifestar sobre as decisões.
Em março, o STF decidiu que o foro por prerrogativa de função permanece mesmo após a autoridade deixar o cargo. Cabral acumula mais de 30 ações penais decorrentes da Operação Lava Jato por supostos crimes cometidos quando era governador (2007-2014).
O Supremo alterou o entendimento anterior, segundo o qual o foro especial se encerrava com o fim do mandato. Foi baseado nesse entendimento, de 2018, que todos os processos da Lava Jato e seus desdobramentos foram julgados em primeira instância.
A decisão do Supremo afirma que estão preservados os atos praticados pelo STF e os demais juízos com base na jurisprudência anterior. Há dúvidas, porém, sobre o impacto em processos que já tiveram condenação em primeira instância.
Eles atualmente estão na segunda instância para análise de apelação. Não se sabe se, ao receberem os processos, os ministro do STJ avaliarão apenas os recursos ou o próprio mérito da ação, como ocorre em casos de foro.
O ex-governador é acusado de ter cobrado 5% de propina sobre os grandes contratos de sua gestão. As investigações apontaram contas com cerca de R$ 300 milhões no exterior em nome de laranjas, além de joias e pedras preciosas usadas, segundo o Ministério Público Federal, para lavagem de dinheiro.
Inicialmente, o ex-governador negava as acusações. Dois anos depois da prisão, decidiu confessar os crimes. No fim de 2019, fechou um acordo de delação premiada com a Polícia Federal, depois anulado pelo STF em maio de 2021. Após sair da prisão, voltou a negar as denúncias.
Cabral ficou seis anos preso preventivamente enquanto respondia a 37 ações penais, 35 relacionadas aos desdobramentos da Lava Jato. Está em liberdade desde dezembro de 2022, mas permanece com um passivo de 33 processos criminais (32 da Lava Jato).
As penas, somadas, chegaram a ultrapassar os 400 anos de prisão. Com a anulação de sentenças e mudanças na dosimetria, elas agora atingem 274 anos.
O juiz Alexandre Libonati, da 2ª Vara Federal Criminal, foi o responsável pelo envio de três ações penais ao STJ.
Elas tratam da suposta propina paga pelo empresário Arthur Soares, outra pelo empresário Marco Antônio de Luca, e da acusação de corrupção para compra de votos de membros do COI (Comitê Olímpico Internacional) para a escolha do Rio de Janeiro como sede das Olimpíadas de 2016.
Todas haviam gerado condenações a Cabral e outros acusados, mas tiveram a sentença anulada após Bretas ser declarado incompetente para julgá-las.
Na ação do caso de Luca, referente à Operação Ratatouille, o magistrado já havia ratificado as decisões e provas colhidas por Bretas, restando apenas a elaboração de nova sentença.
Nos demais casos, vinculados à Operação Unfair Play, o magistrado enviou os processos para Brasília antes de avaliar se validava atos do magistrado anterior ou não. Caberá ao STJ a decisão sobre a ratificação dos atos da investigação.
O quarto processo enviado ao STJ era de responsabilidade do juiz Vitor Valpuesta, da 3ª Vara Federal Criminal. Ele trata da Operação Fatura Exposta, que apura suposto esquema de corrupção na Secretaria de Saúde na gestão Cabral.
Nesse caso, o envio foi consequência de uma decisão tomada por Valpuesta em outro processo, vinculado à Fatura Exposta mas que não tem Cabral como réu.
O magistrado atendeu a pedido da defesa de Jair da Veiga, apontado como responsável por licitações suspeitas na secretaria e no Into (Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia). Ela alegou que, como a investigação teve origem numa apuração contra o ex-governador, também estava sujeita à mudança de interpretação do STF.
Valpuesta concordou com a argumentação e enviou ao STJ o processo principal, da Fatura Exposta, da qual Cabral é réu, e outras cinco ações penais vinculadas a ela.
Ajuda do 'CV', compra de votos e ameaças: Justiça cassa mandato de Braguinha em Santa Quitéria (CE)
O prefeito Braguinha (PSB) e o vice-prefeito Gardel Padeiro (PP), de Santa Quitéria, no Ceará, tiveram seus diplomas cassados pela 54ª Zona Eleitoral do Ceará nessa quarta-feira (7) por abuso de poder político e econômico. Devem ser realizadas eleições suplementares para as funções, após trânsito em julgado. Eles são acusados de receber ajuda da facção criminosa Comando Vermelho (CV) para as práticas de compra de votos, inclusive, com a doação de entorpecentes a potenciais eleitores e de ameaças a adversários políticos e seus apoiadores, segundo as investigações. Há indícios de que o método também tenha sido adotado nas eleições de 2020.
Ao longo de 90 páginas, o juiz Magno Gomes de Oliveira fundamentou sua decisão. Por meio de nota, a defesa de Braguinha disse ver o desdobramento "com tranquilidade". Ressaltou, ainda, que recorrerá da sentença em instâncias superiores da Justiça Eleitoral.
"A defesa mantém plena confiança na Justiça Eleitoral e acredita, com firmeza, na improcedência das acusações que motivaram o pedido de cassação. Por fim, destacamos que todas as medidas cabíveis já estão sendo adotadas para a salvaguarda dos direitos políticos do prefeito reeleito, na certeza de que a verdade e a justiça prevalecerão", completou.
A dupla ainda foi declarada inelegível por oito anos, pena também aplicada à suplente de vereadora Kylvia de Lima (PP) e aos ex-servidores da Prefeitura Francisco Leandro Farias de Mesquita e Francisco Edineudo de Lima Ferreira, que teriam ajudado no esquema. A defesa dos citados não foi localizada pela reportagem.
Além das repercussões políticas, em abril, o Tribunal Regional Eleitoral do Ceará (TRE-CE) aceitou uma ação penal com o mesmo assunto e com mais dois réus. A Corte também afastou o prefeito e o vice dos seus cargos, que sequer chegaram a assumir em 1º de janeiro deste ano devido a mandado judicial.
Na ocasião, Braguinha foi preso prestes a assumir a Prefeitura, que passou a ser ocupada pelo seu filho, Joel Barroso (PSB), presidente da Câmara Municipal. Na linha de sucessão, em caso de vacância, é o chefe do Legislativo quem assume o Executivo.
Apesar disso, naquele julgamento, a Justiça Eleitoral validou o pedido de revogação da prisão domiciliar de Braguinha, que havia sido deliberado em 18 de março. A defesa do político havia apresentado relatório médico nos autos indicando ser necessário tratamento médico.
Entenda o processo
O juiz Magno Oliveira pontuou que, mesmo sendo impossível quantificar o número de eleitores expulsos de Santa Quitéria antes do dia do pleito, "é necessário reconhecer que a obstrução criminosa de um único eleitor já seria apta a viciar o resultado das urnas". Para ele, "o direito ao exercício do livre sufrágio em Santa Quitéria restou sepultado a partir de incontáveis condutas de ameaças, coações e expulsões de eleitores, notadamente aqueles residentes em bairros como a Piracicaba e Pereiros".
A ação julgada foi ajuizada pelo Ministério Público Eleitoral (MPE) em dezembro do ano passado. Entre outras informações, a procuradoria citou depoimento de Tomás Figueiredo (MDB), adversário de Braguinha, relatando a dificuldade, desde a primeira semana da campanha, de realizar seus eventos e de visitar eleitores, além das ameaças feitas por membros do CV a auxiliares da sua campanha.
"O prejuízo à normalidade das eleições municipais em 2024 foi de tamanha gravidade que até a Justiça Eleitoral foi atacada, tanto que em meados de setembro, o Cartório Eleitoral recebeu ligação de um integrante do Comando Vermelho, que se dirigiu a um dos servidores ameaçando atacar a unidade do órgão e matar todos, caso a Justiça não 'parasse' com as decisões contra os 'manos' do CV, conforme Termo de Oitiva do servidor e Chefe do Cartório Eleitoral desta 54ª Zona Eleitoral", lembrou na sentença.
Além da investigação no âmbito do MPE, há inquérito instaurado na Polícia Federal (PF) para apurar as denúncias. Assim, a PF chegou a Daniel Claudino Sousa, o "DA30", enviado pelo alto comando do CV do Rio de Janeiro a Santa Quitéria para ameaçar candidatos e eleitores.
"A organização criminosa adotou a estratégia de demonstrar claramente ser contra o TOMÁS e prejudicar a candidatura deste, mas não deixar transparecer o apoio ao candidato JOSÉ BRAGA BARROZO, a fim de, obviamente, não levantar suspeitas, nem prejudicar o candidato que eles pretendiam beneficiar, sendo certo que em várias conversas do grupo, os integrantes do CV mencionavam o candidato a prefeito com a sigla 'BG'", apontou ainda.
STF começa a julgar decisão da Câmara que suspende ação por golpe que tem Ramagem e Bolsonaro como réus
Por Mariana Muniz — Brasília / O GLOBO
A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) começa a julgar nesta sexta-feira, em sessão do plenário virtual, a decisão da Câmara que suspende a ação penal que tem como réus o deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ), o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e outros seis aliados. A análise começará às 11h e vai seguir até a próxima terça-feira.
A sessão foi marcada pelo presidente do colegiado, Cristiano Zanin, após pedido do relator da trama golpista, Alexandre de Moraes.
A suspensão da ação penal foi determinada na quarta-feira pela Câmara. Moraes dirigiu a solicitação a Zanin nesta quinta-feira, após o ofício com a decisão da Câmara chegar ao Supremo e ser encaminhado à Primeira Turma pelo presidente da Corte, Luís Roberto Barroso.
A maioria dos deputados optou por suspender toda a ação penal na qual Bolsonaro e aliados são suspeitos de tentarem um golpe de Estado. O entendimento de ministros do STF, contudo, é que isso só poderia ocorrer em relação ao deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ), o único parlamentar do grupo, e também somente em relação aos crimes supostamente cometidos após sua diplomação, em dezembro de 2022.
A Constituição determina que, caso uma denúncia contra um deputado ou senador "por crime ocorrido após a diplomação" seja recebida pelo STF, a respectiva Casa pode optar por "sustar o andamento da ação".
Já o regimento interno do STF estabelece que, em caso de a sustação ser aprovada, "o plenário decidirá sobre a suspensão". Entretanto Barroso apontou que, como a Corte alterou, em 2023, a competência para julgar ações penais do plenário para as turmas, a análise da suspensão também deve ser feita pelo colegiado menor.
No mês passado, Zanin já havia encaminhado um ofício a Hugo Motta para informar que não era possível que a ação penal contra Ramagem fosse integralmente trancada. No documento, explicou que o processo só poderia ser suspenso em relação a ele e especificamente quanto aos crimes que foram praticados após a diplomação como deputado.
Na mesma linha, ministros do STF ouvidos pelos GLOBO veem como inviável o trancamento de todo o processo e qualquer brecha para os demais acusados além de Ramagem. O benefício dado pela Câmara englobaria apenas crimes praticados no 8 de Janeiro, casos de deterioração de patrimônio tombado e dano qualificado pela violência e grave ameaça contra patrimônio da União. Ramagem também é réu por tentativa de golpe de Estado, abolição violenta do estado democrático de direito e organização criminosa armada.
Alexandre Ramagem e Jair Bolsonaro — Foto: Reprodução
Empresário ‘laranja’ de ‘Bebeto do Choró’, vereador, e chefe de facção são alvos de operação no Ceará
O empresário Maurício Gomes Coelho, apontado como ‘laranja’ do prefeito cassado ‘Bebeto do Choró’, um vereador de Canindé, e integrantes de uma facção criminosa foram alvos, nesta quinta-feira (8), de uma operação do Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE) e da Polícia Civil.
A ação, denominada de “Sórdida Pecúnia”, foi deflagrada para desarticular uma organização criminosa envolvida em lavagem de dinheiro oriundos do tráfico de drogas, fraudes em licitações e desvios de recursos públicos.
A operação cumpriu mandados de prisão preventiva e de busca e apreensão, solicitados pelo Ministério Público de Canindé e expedidos pelo Poder Judiciário. A Justiça determinou ainda o afastamento cautelar do vereador Francisco Geovane Gonçalves, do município de Canindé, por 180 dias. Ele é suspeito de colaborar com as ações do grupo criminoso.
A reportagem apurou que um dos principais alvos dos cumprimentos das ordens judiciais é o ex-vigilante e empresário Maurício Gomes, o 'MK'. Ele é proprietário da empresa MK Serviços em Construção e Transporte Escolar Ltda, que venceu licitações e firmou contratos milionários com várias prefeituras do Estado do Ceará.
As defesas dos alvos da operação não foram localizadas pela reportagem. O espaço segue aberto para futuras manifestações.
Segundo a Polícia Civil, "a operação é fruto de uma investigação iniciada em outubro do ano passado, no dia da eleição, quando um homem foi vítima de uma tentativa de homicídio. Seguindo nos trabalhos investigativos, todos os executores do referido crime foram identificados e, a partir das apreensões realizadas na primeira fase, foi possível identificar as lideranças do grupo criminoso, bem como identificar outros membros e outros delitos graves".
No total, foram cumpridos 16 mandados de busca e apreensão, três mandados de prisão, sequestrados 20 veículos e três imóveis dos alvos da operação, com um total de bens apreendidos aproximadamente no valor de R$ 5 milhões.
PRISÕES
Fontes ouvidas pelo Diário do Nordeste indicam ainda que outro investigado é Francisco Flavio Silva Ferreira, o ‘Bozinho’, apontado como narcotraficante e que seria chefe de facção criminosa Guardiões do Estado (GDE) na região. 'MK' e 'Bozinho' foram alvos de mandados de prisão cumpridos no Sistema Penitenciário.
Maurício está preso por conta da investigação contra ‘Bebeto do Choró’ por organização criminosa e financiamento de campanha ilícito. Ele também é investigado por uma tentativa de homicídio.
Uma mulher, que seria esposa do traficante, também teve a prisão preventiva decretada, mas não foi localizada. Ela é considerada foragida pela Justiça.
INVESTIGAÇÃO
Procurado pela reportagem após a deflagração da operação, o promotor de Justiça Jairo Pequeno Neto afirmou que “os indícios apontam para a existência de uma relação cada vez mais estreita, complexa e perigosa entre organizações criminosas e a estrutura de contratações públicas, na qual o tráfico de drogas, a corrupção, a lavagem de capitais e a violência se retroalimentam”.
Para o promotor, “o cenário exige uma resposta articulada, coesa e enérgica de todas as instituições responsáveis pelo enfrentamento ao crime organizado”.
As investigações apontam que, além dos alvos já identificados, pelo menos 35 pessoas físicas e jurídicas estão envolvidas no esquema, diante da suposta prática dos delitos de tráfico de drogas, lavagem de dinheiro, corrupção e associação criminosa.
Durante as buscas realizadas por policiais civis sob o comando do delegado Cleidson Fernandes, titular da 2ª Delegacia Seccional do Interior Norte, foram apreendidos veículos de luxo, dispositivos eletrônicos, além de bloqueio de contas bancárias e sequestro de imóveis.
QUEM É MAURÍCIO GOMES
Maria do Rosário Araújo Pedrosa Ximenes, ex-prefeita de Canindé, afirmou em Termo de Declarações prestado ao promotor Jairo Pequeno Neto, da Promotoria de Justiça da Comarca de Canindé, em 26 de setembro de 2024, “que a empresa MK TRANSPORTES pertenceria, na verdade, a Carlos Alberto, ‘Bebeto’, e que Maurício seria o laranja dele.
Maurício atuou como vigilante contratado de uma empresa de segurança privada de 2014 a 2020: “não foram localizadas, durante as pesquisas realizadas em bancos de dados, elementos que justifiquem Maurício Gomes Coelho, vigilante com remuneração média nominal de R$ 2.418,77, a constituição de empresa com capital social de R$ 8.500.000,00 (oito milhões e quinhentos mil reais), sendo possível inferir, com forte grau de segurança, que Maurício Gomes atua como interposto de terceiros”, diz trecho do relatório da Polícia.
Policiais federais estiveram em endereços vinculados a Maurício e cumpriram mandados de busca e apreensão. Primeiro, os agentes foram ao escritório localizado no bairro Cocó. No local, “não foram arrecadados objetos no local, mas tão apenas registrada a presença de máquina contadora de cédulas e sacolas no local, o que confirma que no recinto há a circulação de dinheiro em espécie”.
Já no condomínio residencial, no bairro Damas, também em Fortaleza, foi apreendido um celular do investigado, com indicação da senha de acesso. Ambos mandados foram cumpridos em outubro de 2024.
Consta ainda no relatório da Força Integrada que toda a análise de informações é “apenas uma amostra e não exaure todo o conteúdo de dados que foram extraídos do celular do investigado Maurício Coelho Gomes”.
Maurício chegou a ser detido em um condomínio de alto padrão no bairro Benfica, em Fortaleza, no dia 8 de novembro de 2024. Na ocasião, com o empresário, foram apreendidos uma pistola 9 milímetros, 12 munições, três rádios comunicadores, dois celulares e um colete balístico. O suspeito também foi autuado em flagrante pelo crime de porte ilegal de arma de fogo de uso restrito.
TRE-CE desaprova contas de prefeito e vice de Baturité e determina devolução de R$ 160 mil
O Tribunal Regional Eleitoral do Ceará (TRE-CE) desaprovou as contas de campanha do prefeito reeleito de Baturité, Herberlh Mota (Republicanos), e do vice-prefeito, Irmão Carlinhos (PSB), na terça-feira (6). Além disso, determinou a devolução de R$ 160 mil em recursos não especificados.
No fim de abril, o relator do caso, desembargador Daniel Carvalho Carneiro, votou pelo desprovimento do recurso da chapa, a fim de manter a desaprovação das contas dos candidatos e o recolhimento do valor ao Tesouro Nacional. Após vista do desembargador Luciano Nunes Maia Freire, o processo foi retomado nesta terça.
Ele chegou a argumentar pela diminuição da cifra, considerando que a dupla apresentou posteriormente comprovantes de R$ 130 mil recebidos pela campanha, mantendo-se a desaprovação das contas. Contudo, foi vencido pelos colegas.
O prefeito de Baturité, por meio de nota, ressaltou que ainda cabem recursos à determinação no próprio TRE-CE, por meio da interposição de embargos de declaração, o que torna a decisão não definitiva. Os referidos embargos têm por objetivo esclarecer pontos do julgamento e garantir o pleno exercício do direito à ampla defesa e ao contraditório, destaca, ainda.
"A equipe jurídica está no aguardo da disponibilização do acórdão do julgamento para, assim, analisando os fundamentos da decisão, para adotar as medidas cabíveis, dentro dos prazos legais, visando demonstrar a regularidade das contas de campanha. Reiteramos o compromisso do Prefeito e do Vice-Prefeito com a legalidade, a transparência e o respeito às instituições. Nosso principal objetivo é seguir transformando Baturité em uma cidade melhor para todos", completa a nota.
Turma do STF julga núcleo da trama golpista acusado de atacar autoridades e sistema eleitoral
Cézar Feitoza / FOLHA DE SP
A Primeira Turma do STF (Supremo Tribunal Federal) julga nesta terça-feira (6) o recebimento da denúncia contra o núcleo mais difuso definido pela PGR (Procuradoria-Geral da República) acusado de tentativa de golpe de Estado.
A lista inclui militares acusados de orquestrar ataques em massa contra os chefes das Forças Armadas contrários ao golpe, além de integrantes da chamada Abin paralela e de grupos que espalhavam desinformação sobre as urnas eletrônicas.
O recebimento da denúncia é a fase inicial dos processos penais. No julgamento, os ministros da Primeira Turma vão avaliar se a denúncia da PGR traz indícios mínimos de autoria e materialidade contra os acusados.
Caso isso aconteça, o que é provável, os acusados se tornam réus e passam a responder a uma ação penal no Supremo.
O STF já recebeu a denúncia da PGR contra dois núcleos da trama golpista, com total de 14 integrantes. O primeiro, chamado de núcleo central, era composto pelo ex-presidente Jair Bolsonaro e outros sete aliados, segundo a acusação.
O segundo grupo teve a denúncia recebida em 22 de abril e tinha ex-integrantes do governo Bolsonaro acusados de usar seus cargos para patrocinar a tentativa de golpe de Estado. Estão nesse núcleo o ex-assessor da Presidência Filipe Martins e o ex-diretor da PRF (Polícia Rodoviária Federal) Silvinei Vasques, entre outros.
O procurador-geral da República, Paulo Gonet, diz na denúncia que os sete denunciados desse núcleo mais difuso "propagaram notícias falsas sobre o processo eleitoral e realizaram ataques virtuais a instituições e autoridades que ameaçavam os interesses do grupo".
"Todos estavam cientes do plano maior da organização e da eficácia de suas ações para a promoção de instabilidade social e consumação da ruptura institucional", afirma Gonet.
São denunciados no núcleo Ailton Barros (capitão expulso do Exército), Ângelo Denicoli (major da reserva do Exército), Giancarlo Gomes Rodrigues (sargento do Exército), Guilherme Marques de Almeida (tenente-coronel do Exército), Reginaldo Vieira de Abreu (coronel do Exército), Marcelo Bormevet (policial federal) e Carlos Cesar Rocha (presidente do Instituto Voto Legal).
A denúncia da PGR cita que o grupo tinha três frentes distintas dentro da organização criminosa que buscava dar um golpe de Estado contra a eleição de Lula (PT).
Ailton Barros, militar expulso do Exército, é acusado de promover ataques virtuais contra oficiais-generais contrários às intenções golpistas do ex-presidente Bolsonaro. As principais provas contra ele estão em trocas de mensagens encontradas no celular.
Em uma delas, enviada ao comandante do Exército, general Freire Gomes, Ailton pediu para o militar "salvar o nosso Estado democrático de Direito" e tomar uma "atitude de patriota".
Ailton reencaminhou as mensagens ao ex-ministro Braga Netto. "Meu amigo, infelizmente tenho que dizer que a culpa pelo que está acontecendo e acontecerá é do Gen Freire Gomes. Omissão e indecisão não cabem a um combatente", respondeu o general.
Braga Netto ainda orientou o denunciado a "oferecer a cabeça dele [Freire Gomes] aos leões". Ailton respondeu: "Se FG tiver fora mesmo. Será devidamente implodido e conhecerá o inferno astral".
A PGR incluiu uma publicação de Ailton de cunho golpista nas redes sociais e afirmou que os ataques ocorreram de forma massiva.
O segundo grupo denunciado dentro desse núcleo era responsável, segundo a PGR, por divulgar informações falsas sobre as urnas eletrônicas. A campanha de desinformação teria o intuito de manter a mobilização de bolsonaristas em frente aos quarteis e incentivar o golpe de Estado.
Um dos principais nomes desse grupo, segundo a denúncia, é do major Ângelo Denicoli. A PGR diz que ele intermediou o contato entre os grupos bolsonaristas com o influenciador argentino Fernando Cerimedo, responsável por divulgar a tese falsa de que urnas eletrônicas de modelo antigo tinham registro atípico de votos favoráveis a Lula.
A principal evidência apresentada contra o major é o fato de que uma pasta no Google Drive disponibilizada por Cerimedo com as provas falsas contra as urnas continha um documento com arquivo de autoria do militar da reserva.
A defesa de Denicoli nega que ele tenha produzido o material e diz que ele teria apenas baixado o arquivo e o repassado a pessoas próximas.
São acusados de incentivar os ataques às urnas, ainda, o coronel Reginaldo Vieira de Abreu, o tenente-coronel Guilherme Marques de Almeida e Carlos Cesar Rocha. Este último foi o responsável por produzir o relatório do Partido Liberal que levantava falsas hipóteses de fraudes nas urnas eletrônicas.
O terceiro grupo denunciado é composto por supostos integrantes da Abin paralela —um núcleo de funcionários da Agência Brasileira de Inteligência que teria usado sistemas estatais para perseguir opositores.
O policial federal Marcelo Bormevet é acusado de ser um dos líderes desse grupo criminoso. Segundo a PGR, ele indicava quem deveria ser alvo de monitoramento ilegal por meio do sistema FirstMile.
A Procuradoria apresenta provas de que Bormevet ainda orientava seus subordinados a iniciar ofensivas de desinformação nas redes sociais, com ataques pessoais contra os alvos do grupo.
O responsável pelo monitoramento ilegal seria o sargento do Exército Giancarlo Gomes Rodrigues. O militar estava cedido à Abin e era um dos integrantes da agência responsáveis por fazer pesquisas no sistema FirstMile.
Moraes concede prisão domiciliar a Collor e determina uso de tornozeleira
REDAÇÃO DA FOLHA DE SP
O ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), concedeu nesta quinta-feira (1º) prisão domiciliar, em caráter humanitário, para o ex-presidente Fernando Collor.
Moraes atendeu a um pedido da defesa do ex-presidente, reforçado por aval da PGR (Procuradoria-Geral da República) pela concessão do benefício. Collor deixou o presídio Baldomero Cavalcanti de Oliveira, em Maceió, em um comboio por volta das 19h.
Os advogados tinham argumentado que a prisão poderia agravar seus problemas de saúde. Um laudo médico incluído no processo mostra que o ex-mandatário, que tem 75 anos, trata as doenças de Parkinson, apneia do sono grave e Transtorno Afetivo Bipolar.
Segundo Moraes, a prisão domiciliar humanitária deverá "ser cumprida, integralmente, em seu endereço residencial a ser indicado no momento de sua efetivação".
Ele determinou também o "uso de tornozeleira eletrônica, a ser imediatamente instalada como condição de saída do preso das dependências da unidade prisional".
Em sua decisão, o ministro suspendeu ainda o passaporte de Collor e proibiu que ele receba visitas, "salvo de seus advogados regularmente constituídos e com procuração nos autos, de sua equipe médica e de seus familiares, além de outras pessoas previamente autorizadas" pelo STF.
O procurador-geral da República, Paulo Gonet, havia afirmado na quarta (30) que "a manutenção do custodiado [Collor] em prisão domiciliar é medida excepcional e proporcional à sua faixa etária e ao seu quadro de saúde, cuja gravidade foi devidamente comprovada" nos autos.
Mencionou ainda o risco de que esse quadro de saúde venha a ser ainda mais "vulnerado caso [Collor seja] mantido afastado de seu lar e do alcance das medidas obrigacionais e protecionistas que deverão ser efetivadas pelo Estado".
Na decisão, Moraes afirmou que foram comprovadas as enfermidades do ex-presidente.
"No atual momento de execução da pena, portanto, a compatibilização entre a dignidade da pessoa humana, o direito à saúde e a efetividade da Justiça Penal indica a possibilidade de concessão da prisão domiciliar humanitária a Fernando Affonso Collor de Mello, pois está em tratamento da Doença de Parkinson há, aproximadamente, seis anos, com a constatação real da presença progressiva de graves sintomas não motores e motores, inclusive histórico de quedas recentes", escreveu o ministro.
Por fim, o magistrado registrou em sua decisão que o descumprimento "da prisão domiciliar humanitária ou de qualquer uma das medidas alternativas implicará na reconversão da domiciliar humanitária em prisão dentro de estabelecimento prisional".
O relatório médico assinado por profissional de saúde do presídio Baldomero Cavalcanti de Oliveira havia dito que o sistema prisional alagoano tem condições de manter o tratamento de saúde de Collor.
O documento ressaltava a importância de se observar a idade dele e uma possível piora no quadro psiquiátrico do ex-presidente. Ele faz uso diário de oito remédios —a maior parte são antidepressivos.
Gonet afirmou que, apesar do laudo médico e do regime fechado para o cumprimento da pena, "revela-se recomendável e adequada a concessão de prisão domiciliar humanitária, uma vez que os requisitos estabelecidos pela legislação infraconstitucional devem guardar compatibilidade com os princípios da proteção integral e prioritária do idoso (arts. 230 da Constituição e 3º da Lei n. 10.741/2003) e da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da Constituição)".
"Há previsão inclusive constitucional estabelecendo que 'os programas de amparo aos idosos serão executados preferencialmente em seus lares'", acrescentou o procurador-geral.
Collor estava preso, em regime fechado, desde a sexta-feira (25). Ele foi condenado a oito anos e dez meses de prisão pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
Foi acusado pela PGR de receber R$ 20 milhões em propina para garantir a assinatura de contratos fraudulentos da BR Distribuidora, empresa subsidiária da Petrobras, com a construtora UTC.
Comprovantes encontrados no escritório do doleiro Alberto Youssef, além de depoimentos de colaboradores da operação, foram apresentados como elementos de prova na ação. Os crimes ocorreram de 2010 a 2014.
O processo contra o ex-presidente se encerrou na segunda (28) após o STF rejeitar o último recurso da defesa, confirmando a determinação de Moraes para o início do cumprimento da pena.
Foram 6 votos a 4 para mantê-los atrás das grades. Os ministros Gilmar Mendes, Luiz Fux e Kassio Nunes Marques votaram contra a decisão, juntando-se a André Mendonça, que havia aberto a divergência.
Flávio Dino, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Cármen Lúcia e Dias Toffoli seguiram Moraes e foram favoráveis à prisão. O ministro Cristiano Zanin se declarou impedido de julgar o caso por ter atuado como advogado em processos da Operação Lava Jato.