Governo nunca esteve disposto a negar eleição de Maduro
Por Merval Pereira / O GLOBO
Ao se antecipar com a nota de apoio à eleição de Maduro, o PT mostra que daqui a pouco o governo fará o mesmo. Impossível imaginar que vá contra PT e Maduro ao mesmo tempo. Se fizer isso, é sinal que mudou completamente.
Acredito que o governo está com dificuldade de afirmar que a eleição foi legal, mas vai acabar fazendo, porque nunca esteve disposto a negar a vitória do Maduro. Ficarei gratamente surpreso se tiver uma atitude diferente de dizer que a eleição foi correta e limpa. Duvido que diga que Maduro ganhou com fraude. E o PT não soltaria a nota sem consultar Lula. O partido não tem cacife para confrontar Lula e deixar governo dele em situação delicada.
O mundo todo está se pronunciando contra a eleição e será ridículo se o Brasil não se pronunciar - nem contra, nem a favor - e só achar que a vida continua!
Desde o início achei um erro estratégico do Lula, do ponto de vista do governo, mandar Celso Amorim a Caracas. Porque, ao mandá-lo, é praticamente certo que terá que apoiar, a não ser que queira romper com a Venezuela. Se Lula chegou à conclusão de que é melhor romper com a Venezuela, vamos ter outro tipo de avaliação. Mas do jeito que as coisas vão, Celso Amorim foi lá para apoiar.
Ninguém manda um assessor especial como ele a um país amigo para romper relações. É quase nula a chance de Lula falar alguma coisa diferente do que o PT disse. Ficarei muito feliz se ele me desmentir.
Governo congela R$ 4,5 bi do PAC e R$ 1,1 bi em emendas. Saúde é o ministério mais afetado
Por Geralda Doca e Manoel Ventura— Brasília / O GLOBO
O governo publicou, no fim da noite desta terça-feira, o decreto do presidente Lula que detalha as áreas afetadas pelo congelamento de R$ 15 bilhões em gastos públicos, confirmado na semana passada. O objetivo é convergir as contas públicas para a meta de déficit zero estabelecida para 2024.
O detalhamento foi aguardado hoje o dia todo. Os investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento e do Ministério da Saúde são os mais atingidos.
No total, o governo reteve as seguintes despesas:
- R$ 4,5 bilhões do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
- R$ 1,095 bilhão em emendas de comissão
- R$ 153 milhões de emendas de bancada. As emendas individuais foram poupadas.
- Também foram congelados R$ 9,2 bilhões em despesas discricionárias do Poder Executivo. Somando esses valores, chega-se ao congelamento de R$ 15 bilhões. Essa contenção de gastos é a maior já feita neste terceiro mandato do presidente Lula.
O PAC é uma das principais vitrines do governo Lula. O programa é comandado pelo chefe da Cassa Civil, Rui Costa, com quem o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, acumula divergências no governo.
Saúde
Dentro do universo de R$ 15 bilhões, há a divisão considerando emendas parlamentares e o PAC e também a divisão entre os ministros. Considerando os ministérios, o da Saúde foi o mais afetado, com R$ 4,4 bilhões. A lista segue com o Ministério das Cidades (R$ 2,1 bilhões), dos Transportes (R$ 1,5 bilhão) e da Educação (R$ 1,2 bilhão). Os demais órgãos tiveram bloqueios abaixo de R$ 1 bilhão.
- Endividamento público: Dívida do governo sobe para 77,8% do PIB, maior nível desde novembro de 2021
Bloqueio e contigenciamento
No total, R$ 15 bilhões foram congelados do Orçamento. Desse universo, foram bloqueados R$ 11,2 bilhões por conta da alta de gastos com os benefícios. Além disso, o governo também contingenciou R$ 3,8 bilhões de modo a cumprir a meta fiscal deste ano diante da frustração com a arrecadação.
O governo bloqueia gastos para cumprir o limite de despesas previsto no arcabouço. E faz contingenciamento de despesas para chegar à meta fiscal — que neste ano prevê um déficit zero.
As estimativas de gastos fixos com aposentadorias e com o Benefício de Prestação Continuada (BPC) subiram R$ 11,3 bilhões e são o principal motivo por trás do bloqueio de despesas no Orçamento.
Detalhamento discutido com Lula
O decreto que detalhou os cortes por áreas foi discutido com integrantes da Junta de Execução Orçamentária (JEO) e o presidente Lula, no fim da tarde desta terça-feira.
A JEO é composta pelos ministros da Fazenda, Fernando Haddad, pela ministra do Planejamento, Simone Tebet, da Gestão, Esther Dweck e pelo ministro da Casa Civil, Rui Costa. Com os titulares da pastas em férias e em viagem, caso de Costa, substitutos participaram das discussões finais do decreto.
Segundo integrantes do governo, o tamanho do congelamento orçamentário de R$ 15 bilhões foi um dos pontos que dificultaram os ajustes finais do decreto, prometido para essa terça-feira em edição extra do Diário Oficial da União.
Governo do Ceará assina acordo de cooperação técnica com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública
REDAÇÃO DIARIONORDESTE
O governador do Ceará, Elmano de Freitas (PT), assinou nesta segunda-feira (29) um acordo do Comitê Estratégico de Segurança Integrada do Ceará (Coesi) com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP). O documento estabelece que haverá cooperação técnica entre os três Poderes e a entidade nacional.
A assinatura ocorreu durante a segunda reunião do Coesi no Palácio da Abolição, onde foram discutidas agendas para combate ao avanço do crime organizado no Estado.
O Comitê Integrado foi estabelecido mês passado para coordenar e sistematizar ações conjuntas dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, "especialmente entre órgãos da Segurança Pública e do Sistema de Justiça em prol do combate ao crime em todo o território cearense".
Primeira reunião definiu reforços
A primeira reunião do Comitê Estratégico de Segurança Integrada do Ceará (Coesi) definiu ações contra o crime organizado nesta sexta-feira (21). Haverá aumento de pessoal e reforço de estrutura em segmento do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará (TJCE), do Ministério Público (MPCE) e da Polícia Civil (PCCE).
Elmano pontuou o desafio que é combater a criminalidade e reforçar a Segurança Pública, e afirmou que o Estado "não vai recuar" em nenhuma ação.Foi indicado ainda que uma das ações é o alinhamento entre Governo Federal e os estados para ser construído um plano nacional de combate à violência
Ministérios gastam R$ 8,8 bilhões em uma semana e tentam escapar de congelamento no Orçamento
Por Daniel Weterman / O ESTADÃO DE SP
Os ministérios do governo Lula empenharam R$ 8,8 bilhões em despesas não obrigatórias na última semana antes do congelamento que será feito nas contas públicas em 2024. O empenho significa, na prática, que o Executivo federal está comprometendo aquela despesa no Orçamento e faz com que o dinheiro não seja cortado.
Desde que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, anunciou um congelamento de R$ 15 bilhões no Orçamento do governo federal, os ministérios começaram uma verdadeira “corrida” em busca de salvar uma parte das verbas. Os órgãos alegam que os gastos dizem respeito ao andamento normal das ações; mas os empenhos, na prática, garantem a liberação dos recursos.
O governo deve publicar nesta terça-feira, 30, um decreto detalhando quais ministérios serão alvo da contenção. Nos bastidores, ministros atuam para garantir o menor corte possível para cada área. O ministro-chefe da Casa Civil, Rui Costa, afirmou que todas as pastas serão afetadas.
Entre o dia 18 de julho e a última sexta-feira, 26, os ministérios aumentaram o ritmo de gastos de ações que ficam sob controle dos órgãos federais. A corrida incluiu um empenho recorde de R$ 3,4 bilhões em gastos no dia 19 – um dia depois do anúncio de Haddad, valor recorde para um único dia no ano.
O Ministério dos Transportes liberou R$ 2,4 bilhões em verbas em uma semana, priorizando obras em rodovias e o Programa de Aceleração do Crescimento (Novo PAC). O Ministério da Saúde empenhou R$ 1,4 bilhão no mesmo período, incluindo verbas para hospitais e para o programa Farmácia Popular.
Serão R$ 11,2 bilhões bloqueados (despesas congeladas para cumprir o limite do arcabouço fiscal e compensar o aumento de gastos obrigatórios, como Previdência) e R$ 3,8 bilhões contingenciados (despesas congeladas para cumprir a meta fiscal, mediante a frustração de receitas). As duas medidas têm o efeito prático de congelar as programações no Orçamento.
O bloqueio e o contingenciamento só podem ser desfeitos se o Executivo voltar a ficar em dia com as contas e verificar que não há mais risco para o arcabouço e para a meta. A dinâmica, porém, está na contramão, com arrecadação menor do que o esperado e gastos obrigatórios cada vez maiores, especialmente com benefícios previdenciários e assistenciais. A equipe econômica quer transformar o congelamento em cortes definitivos
Em resposta à reportagem, o Ministério do Planejamento e Orçamento afirmou que o empenho é “uma etapa normal da execução orçamentária e do próprio funcionamento da máquina pública”. A pasta disse ainda que o valor da contenção por órgão será estabelecido no decreto. Depois disso, cada ministério terá até o dia 6 de agosto para decidir onde vai aplicar o congelamento.
O Estadão procurou os ministérios que realizaram o maior volume de empenhos na última semana. O Ministério dos Transportes afirmou que o valor empenhado estava previsto pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) e não se relaciona ao plano de congelamento. “O Ministério dos Transportes informa que aguarda o decreto e a divulgação oficial sobre o valor do contingenciamento referente à pasta, sem informações prévias a oferecer neste momento”, disse.
O Ministério da Educação, o Ministério das Cidades e o Ministério da Previdência Social afirmaram que os empenhos correspondem ao andamento normal das ações e obras dos órgãos. “Após conhecer o valor do contingenciamento, o ministério irá analisar e reprogramar suas despesas”, afirmou o Ministério das Cidades. O Ministério de Portos e Aeroportos e o Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional não comentaram os valores gastos, mas informaram que também aguardam o decreto para avaliar os impactos do congelamento. As outras pastas não se manifestaram.
Governo quer autorização para cortar até 100% das despesas bloqueadas
A equipe econômica quer liberdade para cortar integralmente as despesas que serão bloqueadas e tirá-las do Orçamento para dar suporte ao crescimento dos gastos obrigatórios. O presidente Lula enviou um projeto de lei ao Congresso Nacional neste mês pedindo essa autorização. Hoje, a lei orçamentária autoriza cortar apenas 30% das programações para cobrir as despesas obrigatórias.
O Ministério do Planejamento afirmou que a proposta tem a finalidade de facilitar a adequação orçamentária, “uma vez que as dotações bloqueadas devem ser utilizadas para atendimento de despesas obrigatórias”.
O congelamento deverá afetar, principalmente, a manutenção do dia a dia dos ministérios e dos órgãos federais. Além disso, custeio de serviços de saúde, bolsas de ensino, programa de escola integral, Auxílio Gás, obras em rodovias, Minha Casa, Minha Vida e o Farmácia Popular poderão ser alvos da “tesourada”.
Até a última sexta-feira, 26, o governo tinha R$ 57,2 bilhões em despesas não obrigatórias que ainda não haviam sido empenhadas e que poderão ser congeladas – o equivalente a 35% do Orçamento do ano inteiro. Tirando os pisos de saúde e educação, porém, sobravam R$ 28,9 bilhões.
Algumas ações de saúde e educação não são classificadas tecnicamente como obrigatórias, mas acabam sendo rígidas pois servem para atingir os mínimos. Então, mesmo que o governo bloqueie essa parcela, precisará liberar os valores até o fim do ano para cumprir os pisos.
Além dos gastos que ficam sob controle direto dos ministérios, o congelamento também deve afetar as emendas parlamentares, recursos indicados por deputados e senadores para seus redutos eleitorais. Dos R$ 3,8 bilhões contingenciados, R$ 843 milhões devem recair sobre as emendas. Até o momento, porém, 76% das emendas previstas para o ano (R$ 37,3 bilhões) já foram liberadas pelo governo e escaparam do ajuste.
Transferência de renda não é suficiente para acabar com a fome. Especialistas dizem o que falta
Por João Sorima Neto e Vinicius Neder— São Paulo e Rio / o globo
O relatório anual da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre acesso a alimentos mostrou uma redução da quantidade de pessoas famintas no Brasil em 2023. Segundo o documento, publicado ontem por cinco agências da entidade, com a FAO (alimentação e agricultura) à frente, 8,4 milhões de brasileiros passaram fome entre 2021 e 2023, ou 3,9% da população, menos do que dos 9 milhões (4,2%) de 2020 a 2022, quando o país ainda amargava os efeitos da pandemia de Covid-19.
O Brasil havia saído do Mapa da Fome, mas retornou após a pandemia. Em discurso ontem em encontro ministerial do G20, o grupo das maiores economias do mundo, mais a União Europeia e a União Africana, no Rio, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva prometeu que o país sairá do Mapa da Fome da ONU até 2026, último ano de seu governo
Os números divulgados pela ONU mostram que, apesar de a extrema pobreza estar no menor nível histórico, a insegurança alimentar ainda é maior que em 2013, apesar da melhora recente, afirma o economista Marcelo Neri, diretor do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getulio Vargas (FGV Social).
Para ele, esses dados mostram que políticas de transferência de renda, como o Bolsa Família, e melhoria do mercado de trabalho são condições necessárias, mas não suficientes para resolver o problema da insegurança alimentar.
—Fatores como a alta do preço dos alimentos, com a guerra na Ucrânia, falta de apoio à agricultura familiar, atraso na entrega da merenda escolar, pioraram as condições de insegurança alimentar no país — explica ele, ponderando que não se sabe o peso de cada uma delas no número final e que quando se olha apenas 2023 houve melhora em ambos indicadores (extrema pobreza e insegurança alimentar).
Por isso, diz Neri, programas como o Bolsa família têm impacto direto para redução da pobreza, mas não na redução da insegurança alimentar.
Para o economista, tanto os dados da ONU, através da FAO, lançados a cada três anos, e os divulgados pelo governo, considerando condições de segurança alimentar severa, são indicadores importantes.
— O dado da FAO capta a situação a cada três anos e tem flutuações que podem não refletir as condições brasileiras. Já os dados do IBGE seguem a Escala Brasileira de Insegurança Alimentar e são muito bem feitos. Entretanto, são dados que não são comparáveis.
O economista José Giacomo Baccarin, professor da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias da Unesp, e um dos fundadores do Instituto Fome Zero, avalia que a melhoria de renda, seja via aquecimento do mercado de trabalho ou programas sociais, como o Bolsa Família, explicam a redução do número de pessoas em insegurança alimentar.
Alta menor de alimentos
Baccarin lembra que, quando se olha apenas para 2023, a redução da insegurança alimentar é ainda maior. Ele observa que, no ano passado, houve queda no preço dos alimentos, o que também contribui para a melhora dos dados, já que a população mais pobre gasta entre 30% a 40% do orçamento com comida.
— E a melhora deve continuar este ano. Acredito que até 2026 seja possível sair do Mapa da Fome. O principal fator para isso é o aumento de renda, que é acesso garantido ao alimento. A população com renda mais alta melhora tanto a situação financeira quanto psicológica, deixando de ter a alimentação como preocupação principal — explica ele.
Mariana Pereira, colíder da Força-Tarefa Segurança Alimentar da Coalizão Brasil, avalia que, apesar da melhora do indicador, 8,4 milhões em situação de fome ainda é um patamar elevado. Ela diz que os números devem continuar melhorando.
— Os números caíram num percentual importante e isso pode ter sido reflexo do aumento do valor do Bolsa Família nos últimos anos. É preciso lembrar que o país voltou a figurar no Mapa da Fome da ONU durante a pandemia — disse Mariana Pereira.
Em 2022, ano da eleição, o Auxílio Emergencial dado no governo Bolsonaro chegou a R$ 600. No ano passado, o programa voltou a ter o nome de Bolsa Família, nesse mesmo patamar, mas o governo Lula deu um valor adicional para as famílias com gestantes, crianças e adolescentes, com pagamento extra de R$ 150 por cada criança da casa com até seis anos e de R$ 50 para os dependentes de sete a 18 anos incompletos. Gestantes também passaram a receber mais R$ 50.
Agricultura familiar
Mariana cita ainda o aumento do crédito rural em 43,3% para agricultura familiar, com juros mais baixos. O novo Plano Safra da Agricultura Familiar 2024/2025 trouxe mais incentivos para quem produz alimentos básicos. Quem produzir arroz, por exemplo, encontrará juros reduzidos para 3%:
— Essa agenda de produzir alimentos em maior quantidade e com mais qualidade está atrelada às mudanças climáticas e é muito importante.
Para Rodrigo Kiko Afonso, diretor-executivo da Ação da Cidadania, entidade fundada pelo sociólogo Herbert de Souza para atuar no combate à fome, os dados da ONU mostram que as políticas públicas importam no enfrentamento do problema.
Na visão dele, a retomada do Bolsa Família, com a volta das regras de contrapartidas, como exigir vacinação e frequência escolar das crianças, fez a diferença para reduzir a fome no país em 2023. O avanço não bastou para tirar o país do Mapa da Fome, em parte, porque a retomada das políticas sociais leva tempo.
— Tenho plena certeza de vamos melhorar os níveis de 2014 (quando o Brasil saiu do Mapa da Fome). É o exemplo que o mundo precisa para concretizar na cabeça que é a política pública que resolve a questão da fome. A fome é uma decisão política — afirma Afonso.
Não faz sentido sigilo de cem anos sobre documento de ministro
Por Editorial / O GLOBO
É contraditório que o governo Luiz Inácio Lula da Silva mantenha sigilo de cem anos sobre documentos oficiais, prática tão criticada pelo próprio Lula durante a gestão Jair Bolsonaro. A negativa mais recente diz respeito a dados fornecidos ao Planalto pelo ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, para avaliar conflitos de interesse no cargo. O pedido negado foi feito por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI) pelo portal UOL.
Como medida de transparência, ministros têm de apresentar uma Declaração de Conflito de Interesses. Além de dados patrimoniais, fiscais e pessoais, ela informa se parentes até terceiro grau exercem atividades que podem ser incompatíveis com a função. A Comissão Mista de Reavaliação de Informações alegou que “o documento está integralmente protegido por sigilo fiscal”. O Ministério de Minas e Energia argumentou que a LAI “classifica automaticamente informações de caráter pessoal com status restrito”. A Casa Civil informou que “se trata do estrito cumprimento das normas legais vigentes, e não de imposição de sigilo”.
Entende-se que o documento em questão possa conter informações sensíveis, mas o zelo pela transparência exige separar o que deve ser sigiloso e liberar o que é de interesse público. Uma das mudanças feitas na LAI no ano passado trata justamente de documentos sob sigilo de cem anos que contêm informações íntimas. É fundamental mesmo preservar o que é de caráter exclusivamente privado. Mas, nesses casos, os dados pessoais devem ser ocultados, e o restante liberado.
Impor sigilo de cem anos sobre o que quer que seja sempre desperta desconfiança. Lula sabe disso. Em debate com Bolsonaro na disputa pela Presidência, ele afirmou: “Farei um decreto para acabar com seu sigilo de cem anos para saber o que esse homem esconde por cem anos”. Um dos documentos trancados na gestão anterior era o cartão de vacinação de Bolsonaro, cujo sigilo foi suspenso em 2023. O documento é alvo de investigação policial por suspeita de fraude. O decreto de Lula realmente saiu, mas a prática se manteve.
Lula não pode nem alegar que o caso de Silveira seja excepcional. O governo mantém sob sigilo também as visitas à primeira-dama, Janja Lula da Silva; gastos com o uso do helicóptero presidencial e com alimentação no Palácio da Alvorada; além de visitas dos filhos do presidente ao Palácio do Planalto. Imagens de câmeras de segurança durante a invasão do 8 de Janeiro também foram consideradas segredo, mas acabaram liberadas pelo Supremo.
O sigilo sobre documentos da administração pública só deveria ser decretado em situações necessárias, mediante justificativas razoáveis. Infelizmente não é o que vem acontecendo. Dependendo da conveniência, governos sempre poderão alegar razões pessoais ou de intimidade para carimbar dados como sigilosos, desrespeitando o direito à informação.
É preciso preservar o espírito de transparência da LAI. A sociedade tem direito de saber o que se passa na administração pública. Como disse o próprio Lula, o que se tenta esconder por cem anos?
Greve no INSS cresce, ameaça revisão de gastos e governo vai à Justiça contra paralisação
Idiana Tomazelli / FOLHA DE SP
O governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) acionou a Justiça nesta terça-feira (23) para pedir a suspensão da greve nacional de servidores do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social). O órgão também vai cortar o ponto dos grevistas, descontando do salário os dias de paralisação.
O Executivo decidiu endurecer a postura nas negociações diante do risco de o movimento comprometer as ações de revisão de gastos, cruciais para fechar as contas do Orçamento de 2024 e 2025, e anular os esforços de redução da fila de espera de segurados.
O diagnóstico de que o movimento cresceu nos últimos dias acendeu uma luz amarela dentro do governo.
Representantes da categoria, por sua vez, reivindicam o cumprimento de acordos anteriores e melhorias salariais. "A greve é para causar impacto, mesmo. Pressionar o governo a atender o mais rápido possível a reivindicação dos servidores", diz a diretora da Fenasps (Federação Nacional dos Sindicatos de Trabalhadores em Saúde, Trabalho, Previdência e Assistência Social), Viviane Peres.
Segundo a entidade, mais de 400 agências do INSS, situadas em 23 estados e no Distrito Federal, estão fechadas ou funcionando de modo parcial.
Servidores em regime de teletrabalho também aderiram ao movimento. O SINSSP-BR (Sindicato dos Trabalhadores do Seguro Social e Previdência Social no Estado de São Paulo), que atua na greve em âmbito nacional, estima que cerca de 40% das tarefas dos servidores em teletrabalho foram afetadas pela paralisação.
A greve foi deflagrada em 10 de julho, mas ganhou força a partir do dia 16 e tem tido impacto crescente nos atendimentos presenciais e também na análise de requerimentos.
Procurado pela Folha, o INSS disse que 9,6% dos servidores em todo o país aderiram à greve, de acordo com balanço desta terça. Isso representa 1.634 dos 17.067 servidores. O percentual de adesão varia conforme a região e é maior no Nordeste (14%) e no Sul (10%).
O órgão confirmou que os dias parados serão descontados dos salários. Segundo o INSS, trata-se de uma regra geral em caso de paralisações, e os funcionários do órgão já foram comunicados sobre a norma.
A ação judicial contra a greve dos servidores do INSS foi protocolada pela AGU (Advocacia-Geral da União) junto ao STJ (Superior Tribunal de Justiça), sob o argumento de que os servidores do INSS não podem paralisar a prestação de um serviço essencial à sociedade.
Segundo relatos de dois integrantes do governo, o INSS vinha minimizando os impactos da greve em tratativas nos bastidores, dizendo que a adesão era baixa. As mobilizações dos últimos dias, porém, dispararam um alerta dentro do governo, que conta com as ações do órgão para equacionar o Orçamento de 2024 e 2025.
Neste ano, o governo incorporou às estimativas de despesas uma expectativa de economia de R$ 9 bilhões com a revisão de gastos, sendo a maior parte com a Previdência Social. Já em 2025, a promessa é cortar R$ 25,9 bilhões em gastos obrigatórios.
Para isso, o Executivo traçou um plano de revisão de benefícios como auxílio-doença, aposentadoria por invalidez e BPC (Benefício de Prestação Continuada), pago a idosos e pessoas com deficiência de baixa renda. Cumprir o cronograma desse pente-fino é tido como essencial para alcançar a economia projetada.
Na avaliação de um dos técnicos, o momento é grave, pois a continuidade da greve atrasará as revisões de benefícios, previstas para começarem em agosto.
Outro membro do governo afirma que há o risco de novo represamento de pedidos na fila. Isso ajuda a segurar a despesa no curtíssimo prazo, mas gera uma fatura maior na hora de regularizar os pagamentos no futuro. Se o benefício é concedido, o pagamento é devido desde o momento do requerimento —ou seja, quanto maior a demora, maiores são o valor retroativo e a incidência de juros.
Nos últimos meses, o governo fez um esforço para reduzir a fila do INSS. Em junho, o estoque de requerimentos estava em 1,35 milhão, contra 1,8 milhão em igual mês de 2023.
Viviane Peres, da Fenasps, afirma que a categoria defende melhores condições de trabalho e valorização da carreira. A falta de pessoal é uma das reclamações —o INSS chegou a ter 25 mil servidores em 2015.
Os servidores também afirmam haver um "sucateamento do parque tecnológico do INSS", com "sistemas lentos, que param por horas quase que diariamente", o que leva à demora no atendimento dos segurados.
A categoria cobra ainda a incorporação de gratificações ao vencimento básico dos servidores. Segundo Peres, as gratificações são hoje a maior parcela da remuneração dos funcionários do INSS.
O Ministério da Gestão e Inovação, responsável pela política de pessoal do governo, apresentou uma proposta de reajuste de 18%, sendo 9% para 2025 e 9% para 2026.
No entanto, a diretora da Fenasps disse que o reajuste é focado nas gratificações. Segundo ela, a categoria tem uma reunião nesta quarta-feira (24) com o presidente do INSS, Alessandro Stefanutto. "A gente já espera que aí seja sinalizada a instalação da mesa de negociação da greve", afirma.
Lula critica imposto sobre herança e diz que no Brasil não há interesse em ‘devolver o patrimônio’
Por Caio Spechoto (Broadcast) e Sofia Aguiar (Broadcast) / O ESTADÃO DE SP
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse nesta terça-feira, 23, que o imposto sobre herança no Brasil é “nada”, e por isso doações de patrimônio para educação e outras áreas são raras. Ele deu a declaração em cerimônia de homenagem aos dez anos do campus Lagoa do Sino, da UFSCar. A unidade, que fica em Buri, no interior de São Paulo, foi construía em uma área doada pelo escritor Raduan Nassar.
“Nos Estados Unidos, como o imposto é caro, tem muitos empresários que fazem doação”, disse o presidente da República. “Aqui no Brasil não tem ninguém que faça doação, porque o imposto sobre herança é nada, é só 4%. Então a pessoa não tem interesse em devolver o patrimônio dele”, disse.
O presidente repetiu que destinar recursos públicos para saúde e educação é investimento, não gasto. “País importante não é aquele que só exporta soja, milho e minério de ferro. É aquele que exporta inteligência, aquele que exporta conhecimento, aquele que exporta gente para produzir coisas de valor agregado. É com esse País que eu sonho. E por sonhar eu digo para os meus ministros: não utilize nunca a palavra gasto quando estiver falando de educação”, afirmou.
“A palavra gasto vale para qualquer coisa, só não vale para cuidar da educação e cuidar da saúde, porque cuidar da saúde é investimento. Uma pessoa com saúde trabalha melhor, vive melhor, está mais feliz”, disse o petista.
Na segunda-feira, 22, o governo confirmo o congelamento de R$ 15 bilhões em despesas. O detalhamento de quanto cada órgão do Executivo terá de economizar será divulgado na próxima terça-feira, 30.
PEC da Segurança Pública de Lula turbina PF para combater crime organizado e milícias
Por Guilherme Caetano / O ESTADÃO DE SP
A proposta de emenda à Constituição (PEC) em elaboração pelo governo Lula amplia as atribuições da Polícia Federal (PF) e permite que a corporação combata o crime organizado e ainda milícias. Se aprovado, o projeto também vai estender a atuação da PF para áreas de matas, florestas, áreas de preservação e unidades de conservação, sendo possível operações interestaduais e até internacionais.
Idealizado pelo ministro da Justiça e Segurança Pública (MJSP), Ricardo Lewandowski, o texto está em análise na Casa Civil e propõe alterações no artigo 144 da Constituição. Esse artigo trata da Segurança Pública e do papel de cada esfera de Poder. Hoje, o texto constitucional estabelece que cabe à PF “apurar infrações penais contra a ordem política e social ou em detrimento de bens, serviços e interesses da União”. Estabelece ainda que a instituição federal tem competência para apurar “outras infrações cuja prática tenha repercussão interestadual ou internacional e exija repressão uniforme”.
A proposta de Lewandowski inclui nesse artigo a possibilidade de a PF atuar nas áreas de preservação como matas e florestas e explicita que o órgão também poderá combater “organizações criminosas e milícias privadas”.
Símbolo do aparelhamento ideológico sob o governo de Jair Bolsonaro, a Polícia Rodoviária Federal (PRF) é outro ponto-chave da proposta. Hoje centrada em rodoviais, a atuação da corporação será ampliada para ferrovias e hidrovias, além de bens e serviços de órgãos federais. Com isso, ela deve ser rebatizada para Polícia Ostensiva Federal.
A PEC permitirá que governadores solicitem a atuação dessa nova polícia de forma emergencial, sendo necessária autorização do governo federal.
O texto da PEC é aposta para marcar presença em um assunto que tem potencial para desgastar o governo federal. Lewandowski e o secretário nacional de Segurança Pública, Mario Sarrubbo, entendem ser preciso uma polícia de patrulha para trabalhar no mesmo âmbito da PF, cuja competência é investigativa. A ideia é que essa nova força de segurança tem perfil ostensivo, de caráter civil.
“A ideia do ministro é criar uma simetria no campo federal. Os Estados têm a polícia judiciária e a ostensiva. A PRF ganharia atribuições e se transformaria numa força ostensiva nacional, ampliando um pouco o leque de atuação”, diz Sarrubbo.
Tanto Lewandowski quanto Sarrubbo têm tido cautela em discutir o assunto para deixar claro que não querem interferir na competência estadual de segurança pública. O objetivo é ter uma força complementar para fortalecer o combate ao crime organizado, que tem se expandido pelo País e fora dele sem que as polícias consigam detê-lo. Como cada Estado tem suas próprias corporações, regimentos e sistemas de informação, a cooperação entre diferentes entes é considerada complexa e custosa.
No ano passado, secretários estaduais de Segurança Pública de São Paulo, Mato Grosso do Sul, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul fundaram um grupo para facilitar a integração de ações policiais de combate ao crime desses territórios. Liderada pelo secretário paulista Guilherme Derrite, a iniciativa tem como foco fazer frente ao Primeiro Comando da Capital (PCC), mas encontra obstáculos na atuação das forças envolvidas, já que agentes de segurança não podem atuar em outros estados livremente.
A PEC também deve incluir na Constituição o Sistema Único de Segurança Pública e o Fundo Nacional de Segurança Pública, somado ao Fundo Penitenciário Nacional (Funpen). A aprovação da proposta é considerada crucial para Lewandowski. O alto escalão do governo entende haver poucos instrumentos a nível federal para determinar políticas de segurança pública para todo o país.
A partir da aprovação do projeto, seria possível cobrar de cada Estado, por exemplo, a determinação de planos estratégicos para redução de homicídios, da letalidade policial e de retomada territorial de organizações criminosas e milícia, além de padronizar bancos de informação para registro de facções e procurados. Hoje não há uma diretriz obrigando a uniformização de dados, tampouco uma plataforma que permita aos gestores estaduais acesso a informações de outros estados — algo que o MJSP quer resolver.
A PEC em gestação no governo está sendo bem avaliada pela corporação que pretende turbinar, de acordo com o presidente da Federação Nacional dos Policiais Rodoviários Federais (FenaPRF), José Henrique dos Santos.
“Precisamos ter o texto todo para fazer esse debate com os nossos policiais. Mas, da forma como está chegando, a PEC é muito bem-vinda por trazer segurança jurídica nessa atuações que fazemos fora das rodovias federais, quando outros órgãos nos requisitam”, diz Santos.
O texto não deve passar por grandes alterações após análise técnica, dizem fontes da Casa Civil. Após essa etapa, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deve reunir os ministros que um dia foram governadores, como Rui Costa (BA), Wellington Dias (Piauí) e Camilo Santana (Ceará), para consultá-los sobre potenciais pontos sensíveis da PEC.
A preocupação do presidente é que, como o projeto envolve um assunto que pode resvalar em interesses de governos estaduais, que têm a atribuição constitucional de cuidar da segurança pública, a proposta possa criar algum tipo de ruído e colocar os governadores contra a ideia. Antes de enviar a PEC ao Congresso, Lula deve convocar os 27 governadores para então consultá-los sobre o tema.
Bolsonaristas vêm se adiantando para disputar com o governo federal a paternidade de uma reforma nas competências federais na segurança pública. Assim que a PEC de Lewandowski foi elaborada, o senador Marcos do Val (Podemos-ES) começou a coletar assinaturas para propor o seu próprio projeto.
A PEC de Do Val, que tinha antes do recesso no Legislativo oito das 27 assinaturas necessárias para ser protocolada e começar a tramitar no Senado, também insere na Constituição o Sistema Único de Segurança Pública e um fundo nacional para financiar políticas na área. O autor diz que seu texto foi elaborado antes do de Lewandowski e se encontra mais completo.
“Por exemplo, a nossa PEC propõe uma atuação integrada e hierarquizada das ações e serviços de segurança pública, estabelecendo uma rede eficiente e coordenada em todo o país”, declara o senador. Ele diz confiar que seu projeto vai tramitar paralelamente ao que está sendo elaborado no governo federal.
Professores temporários: novo PNE do Governo Lula permite que até 30% dos docentes não sejam concursados
A cada 10 professores da educação básica no Brasil, aquela que atende estudantes do infantil ao ensino médio, 6 eram efetivos e os outros 4 temporários, em 2023. No Ceará, a realidade é que a cada 100 professores das escolas públicas, 54 são concursados e outros 46 estão em outros regimes de contratação, conforme o painel de monitoramento do Plano Nacional de Educação (PNE), do Governo Federal. A contratação de professores não concursados deveria ser exceção, mas no Brasil, tanto nas redes estaduais como nas municipais, tem sido a regra. Na nova proposta do PNE, que tramita na Câmara Federal, esse é um dos pontos polêmicos e que tem gerado críticas.
Os impactos do elevado número de professores temporários ou sem vínculo mais estável como o concurso são diversos e vão desde a repercussão na aprendizagem dos alunos à desvalorização da atividade docente.
Na proposta do novo PNE - lei federal que norteia ações na área da educação durante uma década - enviada pelo Governo Federal à Câmara em junho deste ano, (Projeto de Lei 2614/2024) uma das críticas das entidades de defesa dos trabalhadores da educação é a flexibilização da proporção permitida de contratação de professores temporários.
Já na nova proposta, cujo prazo de validade projetado é de 2024 a 2034, o Governo Federal ampliou essa margem e em uma das meta estabelece que até o final da década ao menos 70% dos professores da rede pública devem ter vínculo estável por meio de concurso público. Na prática, há uma maior permissividade com esse tipo de contratação que antes era admitida em 10% das contratações e agora tem uma margem de 30%.
COMO É A SITUAÇÃO NO CEARÁ
No Ceará, conforme já mostrado pelo Diário do Nordeste, o número de contratação de professores temporários na educação básica, tanto na rede estadual como nos municípios é elevado.
Conforme o painel de monitoramento do PNE, do Governo Federal, a situação dos docentes na rede pública cearense em 2023 era a seguinte:
- Rede Federal: dos 1.432 professores, 94,4% são efetivos
- Rede Estadual: dos 19 mil professores, 41,4% são efetivos
- Rede Municipal: dos 69 mil professores, 56,1% são efetivos
- Total: dos 87 mil professores, 54,2% são efetivos
Nesse sentido, a rede estadual tem a menor proporção de docentes efetivos. A doutora em Educação e professora da Universidade Estadual do Ceará (Uece), Eloisa Vidal, explica que a ênfase na história dos professores temporários “começa a acontecer já em 2015 quando se começa a perceber que, embora os estados tenham feito concurso, esses concursos foram muito mais para o quadro de reposição e não conseguiu suprir a demanda crescente em função da própria ampliação carga horária”.
Com a reforma do Ensino Médio, acrescenta ela, quando se criam as disciplinas eletivas, essa situação também é acentuada pois “não há como suprir a rede (estadual) somente com o quadro de professores efetivos”.
Outro ponto que, segundo a pesquisadora, interfere para um maior número de temporários é a obrigatoriedade do cumprimento da Lei do Piso do Magistério. “A contratação do professor temporário é uma estratégia que os os entes federados usam para essa folha. Porque se o professor é concursado e efetivo na rede, por força de lei ele tem que pagar o piso salarial. Quando eu coloco o professor temporário eu pago por hora-aula, então, pago um salário muito menor. E esse profissional não vai, no futuro, para minha folha de inativos, já que terminou o contrato ele é dispensado”, destaca.
NOVO PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO
A situação vivenciada no Ceará não destoa da realidade nacional. No Brasil, segundo dados do monitoramento do PNE, apenas no Rio de Janeiro, Rondônia, Rio Grande do Norte, Paraná, Roraima e Bahia mais de 70% dos professores são efetivos.
O secretário de Comunicação do Sindicato dos Professores e Servidores da Educação do Estado e Municípios do Ceará (APEOC) e secretário de Política Sindical da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Alessandro Sousa Carvalho, reforça que as duas entidades analisam a proposta de flexibilização de 10% para 30% de contratação de temporários apresentada no novo PNE como “negativa” e vão atuar para modificar esse ponto nas casas legislativas (Câmara e Senado).
Ele também pondera que “o fato de uma rede ter elevado número de professores contratados por tempo determinado pode dificultar a formação continuada, uma vez que esses profissionais estão sujeitos a uma alta rotatividade e, principalmente, não têm acesso às carreiras em suas cidades ou estados. Não havendo acesso às carreiras e consequentemente à progressão remuneratória, não há estímulo à formação”.
O PNE é o documento federal que define as ações a serem tomadas na área da educação. A existência do PNE é prevista na Constituição Federal que estabelece ainda que a lei tem validade de 10 anos. Portanto, é revisada a cada década. O novo PNE proposto pelo Governo tem 18 objetivos, 58 metas e 253 estratégias que vão da educação infantil à superior, incluindo valorização dos profissionais da educação, infraestrutura, gestão democrática e financiamento da educação.
IMPACTO NA DOCÊNCIA
Os contratos temporários também trazem prejuízos para a docência em si, conforme avaliam as fontes ouvidas pelo Diário do Nordeste. O representante da APEOC e da CNTE, Alessandro Sousa Carvalho, analisa que os professores contratados de forma temporária estão “sempre apreensivos quanto à manutenção de seu emprego, deixando de se preocupar exclusivamente com o ensino, integração e formação pedagógica, o que enfraquece o processo ensino e aprendizagem e culmina em um grande prejuízo não só para o aluno, mas para toda a comunidade escolar”.
A doutora em Educação e professora da Uece, Eloisa Vidal, também reforça que o professor concursado, geralmente, tem mais autonomia do ponto de vista de gestão, com uma participação mais proativa e equitativa.
“O professor temporário está muito submetido a gestão, então, ele precisa agradar na sua totalidade a gestão porque no semestre seguinte, uma vez contrariado os interesses da gestão, ele pode não receber a mesma carga horária. Além disso, hoje ele está numa escola, amanhã ele está noutra. O professor temporário é um sujeito migrante na rede”.
Ela ressalta inclusive que desde o momento da lotação, os professores temporários acabam não sendo prioridade, visto que a preferência nesta definição é dos efetivos. “Essa diferença entre os dois tipos de contratação leva o professor temporário a uma situação de instabilidade muito maior do que o professor efetivo”.
O QUE DIZ O MEC?
Questionado pelo Diário do Nordeste sobre a flexibilização, o MEC informou em nota que “o aumento da presença de professores com contrato temporário de trabalho nas redes de ensino é fator de atenção e grande preocupação”, já que “a alternância dos professores nas escolas não assegura estabilidade do trabalho pedagógico”.
O Ministério também destaca que os professores necessitam de estabilidade, “razão pela qual a realização de concursos é imprescindível e, também, incontornável consideradas as determinações constitucionais”.
O MEC reconhece que os profissionais temporários “não gozam dos direitos dos professores efetivos tais como a seleção por concurso público, o piso salarial nacional definido em Lei, a progressão profissional estabelecida em plano de carreira, jornada de trabalho que contempla tempo reservado para planejamento de aulas, além de direito à formação permanente”.
Na proposta atual (PNE 2024-2034), diz o Ministério, “várias metas e estratégias foram formuladas para enfrentar esse problema”. A meta de, no mínimo, 70% de professores concursados nas redes, segundo o órgão, “leva em conta que há afastamentos por razões de saúde, para cursos e atividades formativas, licenças gestantes, processos de readaptação, cessões, designações para cargos nos órgãos públicos”.
TRANSPARÊNCIA
Os dados mencionados nesta matéria podem ser consultados no painel de monitoramentodo Plano Nacional de Educação (PNE), do Governo Federal, neste link.