Pisa: alunos mais ricos da rede particular do Brasil têm nota igual à de países do top 5
Por Renata Cafardo / O ESTADÃO DE SP
As notas dos alunos mais ricos que estudam em escolas particulares no Brasil na prova de Leitura do Pisa, mais importante avaliação internacional, é equivalente às registradas pelas nações do topo do ranking, como Estônia e pela Coreia do Sul. O desempenho seria suficiente para colocar o Brasil na 5ª posição global do ranking, divulgado nesta terça-feira, 5.
Se considerar as redes pública e particular, os jovens brasileiros estão em 52º lugar (de 81 avaliados), entre a Moldávia e a Jamaica. Os números expõem como as diferenças de aprendizagem se acentuam conforme mais baixa é a origem socioeconômica do aluno quando um país não investe na educação para eliminar esse déficit.
Fatores como baixa escolaridade dos pais, acesso a uma alimentação de qualidade, a oportunidades culturais e o tempo livre para estudar impactam os alunos mais vulneráveis. Já a qualidade do ensino é alavancada, principalmente, por uma boa formação dos professores e pelas expectativas mais altas de aprendizagem entre os jovens da rede privada.
A tabulação foi feita para o Estadão pelo Interdisciplinaridade e Evidências no Debate Educacional (Iede), instituto que pesquisa dados de educação. Foram usados dados do Pisa, de brasileiros de 15 anos apenas de nível sócio econômico comparável ao da média da OCDE e que estudam na rede privada. O índice inclui renda e bens.
Em Ciência, o desempenho dos jovens mais ricos também é alto (509 pontos), equiparando-se ao da Finlândia e ao da Austrália, que estão nas 9ª e 10ª posições.
Já em Matemática, os brasileiros de classe alta ficariam em 29º, um ponto abaixo da média dos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Mesmo assim, acima dos Estados Unidos e Noruega, com 471 pontos.
O Pisa não tem escala máxima ou mínima de pontos. As nações são divididas em uma escala, sendo que cada 20 pontos significam a diferença de um ano de escolaridade.
“O Pisa reforça mais uma vez a nossa grande desigualdade”, diz o diretor executivo do Iede, Ernesto Faria. “Não querendo comparar o ensino do público e o privado, que têm condições e perfis de alunos bem diferentes, mas a nossa educação permite uma maior aprendizagem aos mais ricos”, completa.
“O cenário só muda um pouco para Matemática, onde há desafios importantes mesmo nas escolas que cobram altas mensalidades”, afirma Faria. Outros estudos do Iede também têm mostrado a dificuldade histórica de aprendizagem e a falta de priorização do ensino da Matemática no País.
Na nota geral, que considera alunos de todas as classes econômicas, os estudantes brasileiros ficaram com 379 pontos em Matemática, no 65º lugar, atrás de Colômbia e até do Cazaquistão. Em Ciência, na nota geral, o Brasil aparece em 61º, abaixo da Argentina e do Peru, e com 403 pontos.
O desempenho dos estudantes em Matemática e Leitura nos países desenvolvidos durante a pandemia teve a maior queda da história do Pisa. Já com notas bastante baixas ao longo das edições do exame, a nota do Brasil se manteve praticamente estável.
Para o ministro da Educação, Camilo Santana, a queda menor do que em outros países no Brasil foi reflexo do “esforço de Estados e dos governadores, mesmo na ausência do MEC” durante a crise da covid-19.
Camilo também ressaltou que “nem os alunos das escolas privadas” se saem bem em Matemática. De fato, a disciplina é a única em que os estudantes da rede particular - independentemente do nível socioeconômico - não atingem a média da OCDE (472 pontos).
O ex-ministro da Educação da gestão Jair Bolsonaro, Victor Godoy, afirmou que esperava que a pandemia tivesse um “impacto maior” no resultado do País no Pisa, e que embora o rendimento tenha apresentado uma estabilidade em relação à última avaliação, as métricas nacionais ainda estão “aquém do potencial que o Brasil possuí”.
“O ministro (Camila Santana) não está errado. Houve um esforço importante dos governos estaduais para a implementação, mas contou com o incentivo do governo federal”, disse Godoy, ao Estadão.
O antigo chefe do MEC analisou que políticas educacionais implementadas quando ele esteve à frente da pasta, como o programa de recuperação de aprendizagem, que consistiu em promover o reforço personalizado para estudantes que apresentam atraso na compreensão de conteúdos, pode ter contribuído para evitar uma queda brusca na avaliação.
“Acredito que esse processo de recuperação de déficit de aprendizagem, que começamos em 2022, tenha tido algum impacto na avaliação do Pisa, já que chegou a envolver mais de 6,4 milhões de estudantes”, disse Godoy.
Para Claudia Costin, presidente do Instituto Singularidades e ex-diretora de Educação do Banco Mundial, o fato de alunos de escolas particulares também terem dificuldade em Matemática pode ser explicado tanto pela formação precária dos professores como pelo modelo de ensino.
“Não ensinamos a pensar matematicamente nas escolas públicas e nas particulares e às vezes é o mesmo professor que dá aula nas duas. E o tempo para uma aula mais dialogada é pequeno, já que o Brasil optou por tempo parcial de aula, diferentemente de outros países, cujos alunos ficam muito mais tempo na escola.”
Na rede pública, as notas ficam abaixo das médias gerais do País, mas se mantiveram próximas das registradas na edição anterior do Pisa, em 2018. Em Matemática, o resultado foi de 366 pontos; ante 367 no exame passado. “Em parte isso é bom, pois conseguimos manter o patamar de 2018 mesmo com a pandemia. Mas em parte ruim: o que demonstramos no Pisa não são conhecimentos e habilidades esperadas para jovens de 15 anos, e sim, para crianças de 11, 12 anos”, diz Faria, do Iede.
“O que precisamos é recuperar as defasagens de modo a ensinarmos em sala de aula o esperado para cada série. Não podemos aceitar a grande maioria dos alunos abaixo do nível 2.″ O desempenho da escola pública seria equivalente ao da Indonésia (69ª colocada), quatro abaixo do que está o Brasil hoje. Mais de 70% dos alunos do Brasil estão abaixo do nível considerado básico para aprendizagem em Matemática, segundo a OCDE. /COLABOROU CAIO POSSATI
A Lei das Estatais empaca no STF
O ESTADÃO DE SP
O pedido de vista do ministro Kassio Nunes Marques interrompeu, mais uma vez, o julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a constitucionalidade das restrições impostas na Lei das Estatais a nomeações para a alta administração de empresas públicas. O colegiado começou a julgar a questão em março, duas semanas depois da liminar do então ministro Ricardo Lewandowski, hoje aposentado, que suspendeu temporariamente os efeitos da lei, em atendimento a uma ação movida pelo PCdoB.
Em primeiro lugar, a ação deveria ter sido rejeitada de pronto pelo STF, por ser inepta, claramente movida por inconformados derrotados em votação no Congresso. Isso não só não aconteceu, como o ministro Lewandowski decidiu suspender a lei numa canetada – abrindo uma janela preciosa para uma nova farra de nomeações políticas. Quando o Supremo afinal resolveu julgar o caso, o ministro André Mendonça fez um pedido de vista. Pelas normas do STF, o julgamento deveria ter sido reiniciado, no máximo, 90 dias depois, no fim de junho, mas foi retomado apenas agora, em dezembro, com o voto divergente de Mendonça.
Foi a vez, então, de Nunes Marques requerer o processo para exame. Tem até março para devolvê-lo.
De vista em vista, a medida “emergencial” – o que é, no fim das contas, o caráter básico de uma liminar – de Lewandowski caminha para completar um ano, permitindo ao governo descumprir um dos principais instrumentos de governança corporativa da Lei das Estatais. A liminar em si já é uma barbaridade; a demora do Supremo em analisá-la, ainda mais acintosa.
A Lei 13.303, conhecida como Lei das Estatais, foi promulgada em 2016 com o objetivo específico de moralizar a nomeação de dirigentes e membros do Conselho de Administração das empresas públicas. Àquela altura, diretamente atingidas por denúncias de corrupção e uso político, as estatais, tendo à frente Petrobras, Eletrobras e suas controladas, atravessavam uma série crise de depreciação.
As exigências impostas pela nova legislação aprovada pelo Congresso, de tão elementares, deveriam estar implícitas em qualquer critério de escolha desde sempre. Ficavam proibidas as nomeações de ministros, secretários estaduais e municipais, dirigentes de partidos políticos e sindicatos, parlamentares, diretores de órgãos reguladores ligados à empresa e funcionários de assessoramento superior da administração pública.
A profissionalização dos Conselhos de Administração – instância máxima das decisões estratégicas das empresas – é uma medida largamente adotada no mundo. Há cursos específicos de especialização em boa governança. Quanto mais independente o Conselho de Administração – obviamente composto por pessoas habilitadas e com profundo conhecimento do setor e da empresa que assessoram –, mais isentas se mostrarão as decisões tomadas. No Brasil, contudo, sucessivas gestões federais acostumaram-se a transformar esses conselhos e os cargos de diretoria em moeda de troca e exercício de ingerência política.
Em gestões petistas passadas, a prática foi levada a um notório aparelhamento. Foi exatamente esse fenômeno que suscitou a criação da lei para blindar as companhias, que são do Estado, e não do grupo político cujo presidente exerce por um determinado tempo sua gestão. Administradores investidos no cargo com o propósito principal, se não único, de seguir a orientação dos governantes causam graves e, às vezes, irreversíveis prejuízos às empresas que representam. Investimentos despropositados e financiamentos a projetos governamentais são os problemas mais comuns.
Como se não bastasse o interesse político e ideológico, indicações dessa natureza servem muitas vezes apenas para garantir ao apaniguado um mero complemento salarial, pois há casos de indicados que não têm a menor afinidade com esse ou com qualquer outro trabalho. Além de escancarar um profundo desprezo pelo cargo de conselheiro administrativo, essas indicações são também um grande risco para a empresa, ainda que o indicado seja bem-intencionado. É essa distorção grave que o governo quer perpetuar – e cujo impedimento o STF insiste em adiar.
A visão atrasada de Lula sobre o BNDES
Por Notas & Informações / o estadão de sp
O presidente Lula da Silva tem um entendimento muito particular sobre a economia brasileira. Na avaliação dele, enquanto o Tesouro Nacional teria entre R$ 1 trilhão e R$ 2 trilhões guardados, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) estaria “comendo pão seco sem mortadela”.
É interessante como Lula desconsidera não só as experiências passadas em seu terceiro mandato, mas também a própria realidade. Para ele, há um problema – o BNDES estaria sem dinheiro – e há uma solução – o Tesouro Nacional tem dinheiro de sobra para gastar. Mas nem uma coisa nem outra é verdade, e quem diz isso são os números oficiais da instituição financeira.
Os resultados mais recentes do BNDES, relativos ao terceiro trimestre do ano, apontam para números robustos, muito distantes da penúria descrita pelo presidente Lula. Até setembro, as consultas haviam subido 94%, para quase R$ 200 bilhões; e as contratações, 43%, para R$ 94,2 bilhões. Os desembolsos aumentaram 20%, para R$ 75,4 bilhões; desse total, R$ 61,5 bilhões foram financiados a taxas de mercado, e a maior parte com recursos próprios.
A carteira de crédito do BNDES, por sua vez, atingiu R$ 495,2 bilhões, a maior desde o primeiro trimestre de 2019. Para chegar a esse tamanho, o BNDES contou com muita ajuda do Tesouro Nacional. Entre 2008 e 2014, o Tesouro emprestou R$ 440,8 bilhões à instituição financeira.
Sob o pretexto de conter os efeitos da crise financeira mundial, criou-se um orçamento paralelo, por meio do qual o banco cobrava juros artificialmente baixos para financiar grandes obras de infraestrutura e empresas que se tornariam “campeãs nacionais” – todas escolhidas a dedo pelo governo. Era, na verdade, uma forma de usar o banco para financiar políticas públicas que o Orçamento-Geral da União não tinha condições de arcar.
Em termos de crescimento econômico, os retornos dessa política foram questionáveis, enquanto seus custos foram muito reais. É o que explica, em parte, a impressionante evolução da dívida bruta do governo, que saiu de 51,3% em 2011 para os atuais 74,7% do Produto Interno Bruto (PIB).
No governo Michel Temer, o banco finalmente adotou taxas mais compatíveis com a realidade do mercado. Além disso, reduziu sua participação e exposição ao risco no financiamento de obras de infraestrutura e retomou um papel fundamental no apoio e na estruturação desses projetos, sem os quais muitas das privatizações e concessões de infraestrutura não teriam sido possíveis, especialmente na área de saneamento. Passou, também, a pagar os empréstimos que havia tomado do Tesouro e devolveu um total de R$ 689 bilhões até agora.
Ainda faltava uma última parcela, de R$ 22,6 bilhões, que deveria ter sido quitada no fim de novembro. Mas o BNDES negociou um novo prazo com o Tesouro para pagar o restante até 2030, já avalizado pelo Tribunal de Contas da União (TCU). Sem o acordo, a liquidez do banco estaria comprometida, e os desembolsos teriam de ser interrompidos, algo que seria absolutamente indesejável.
Aparentemente, não está nos planos do BNDES retomar o gigantismo artificial que já teve no passado recente. Segundo o diretor de Planejamento e Estruturação de Projetos do banco, Nelson Barbosa, a ideia é que os desembolsos do banco saiam do atual 1,1% para 2% do PIB até 2026 – bem menos que os 4,3% de 2009.
É uma visão mais realista sobre o papel do banco na economia e sobre os limites de sua atuação. Não cabe ao BNDES assumir uma posição de protagonismo no mercado de capitais, privilegiar segmentos ou determinados grupos econômicos e financiar obras faraônicas sem considerar o risco dessas operações.
O processo de reorganização pelo qual o BNDES passou nos últimos anos tem garantido seu sucesso. Voltou a dar lucro, reduziu a inadimplência e hoje tem todas as condições de bancar suas operações com recursos próprios e taxas de mercado. A concepção que Lula tem do BNDES é atrasada, equivocada e custou muito caro ao País – e, sobretudo, desnecessária diante dos resultados financeiros do banco e da situação fiscal.
Datafolha: saúde é principal problema do país; Lula derrapa em segurança e corrupção
Igor Gielow / FROLHA DE SP
A saúde voltou a ser líder isolada do ranking de preocupações dos brasileiros entre as áreas que são consideradas sob responsabilidade do governo federal. O setor é o principal problema do país para 23% dos eleitores.
Foi o que aferiu o Datafolha em sua nova pesquisa sobre o tema, realizada na terça passada (5). O instituto ouviu 2.004 pessoas em 135 cidades, e o levantamento tem uma margem de erro de dois pontos para mais ou menos.
Em setembro, diziam estar mais preocupados com a saúde 17% dos entrevistados. O índice subiu agora seis pontos percentuais, descolando-se da segurança pública, que tinha os mesmos 17% há três meses e agora registra 10% de menções como problema principal.
Agora, a educação, que oscilou de 11% para 10%, empata com a violência na listagem.
Paradoxalmente o governo não pode comemorar muito a queda acentuada da preocupação com a segurança como obra sua —o Ministério da Justiça, do agora ministro indicado ao Supremo Flávio Dino, é o responsável pelo setor na área federal.
Segundo o Datafolha, 50% avaliam como ruim e péssima a gestão Lula (PT) na segurança, ante 29% que consideram regular e 20%, ótima ou boa. Na mesma altura do governo de Jair Bolsonaro (PL), em 2019, 27% aprovavam o trabalho do Planalto no setor.
Outros temas que preocupam o brasileiro são a corrupção (8%), a fome/miséria (7%), o desemprego (7%), a economia (6%) e a gestão do governo (4%). Empatados em 2% estão políticas públicas, área social, e inflação, com o meio ambiente marcando 1%.
Há bastante homogeneidade de opinião nos estratos socioeconômicos, com uma exceção notável na educação, que é a principal preocupação entre os mais ricos (23% dos que ganham mais de 10 salários mínimos) e instruídos (16% de quem tem diploma de curso superior). O Brasil patina na área, como mostrou o mais recente exame internacional Pisa.
Historicamente, a saúde é um foco de preocupações do brasileiro, tendo liderado o ranking do Datafolha durante todo o governo Bolsonaro.
Ali, a pandemia da Covid-19, que deixou até aqui mais de 707 mil mortos, exacerbou as percepções: em dezembro de 2020, no auge da crise, 30% apontavam o setor como prioritário.
O trabalho do governo Lula na saúde não é bem avaliado, mesmo tendo anulado o negacionismo científico que marcou a turbulenta era Bolsonaro no setor. Para 49%, ele é ruim ou péssimo, ante 31% que o consideram regular e 20%, ótimo ou bom. Neste mesmo momento do mandato, o antecessor marcava 15% de aprovação no setor.
O cenário mostrado pelo Datafolha não é muito confortável para o governo Lula em termos de avaliação dos 14 setores considerados obrigações federais, mas o Planalto pode celebrar que em 11 deles a aprovação é maior do que a registrada pelo antecessor e rival político em dezembro de 2019.
O petista é reprovado em uma área em que se costuma se orgulhar de suas iniciativas: o combate à fome e à miséria. Dos ouvidos, 40% acham que o trabalho é ruim ou péssimo, 31%, regular, e 28%, ótimo ou bom.
Já seus números sobre o combate à corrupção serão combustível para seus adversários, que costumam associar as gestões petistas a malfeitos, como os escândalos do mensalão e do petrolão. Aprovam o trabalho do governo Lula na área só 15%, ante 23% que dizem achá-lo regular e 59%, que o reprovam.
Os melhores desempenhos do governo surgem em áreas que eram relegadas ao segundo plano sob Bolsonaro. Esporte, mesmo com o loteamento da pasta da área para o centrão, tem 42% de menções positivas. Cultura, cujo ministério foi recriado, 43%, e turismo marca 42% de ótimo/bom.
Em duas áreas, o petista perdeu aprovação ante o Bolsonaro de dezembro de 2019: os 27% que aprovavam o antecessor na segurança pública e o combate à corrupção (29%). Na crucial área da economia, eles empatam (Lula com 24% de aprovação, Bolsonaro, com 25%).
Relator da LDO define teto do fundo eleitoral em R$ 4,9 bilhões, cinco vezes mais do que o proposto pelo governo
Por
Camila Turtelli eVictoria Abel /
— Brasília / O GLOBO
Diante do impasse no Congresso sobre o tamanho do fundo eleitoral, verba pública bilionária destinada a financiar campanhas políticas, o relator da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), deputado Danilo Forte (União-CE), decidiu colocar um teto de R$ 4,9 bilhões para o montante a ser destinado durante a as campanhas municipais de 2024. A definição sobre o valor exato e a origem dos recursos, no entanto, serão tomadas mais à frente, na votação da Lei Orçamentária anual (LOA). O valor supera em mais de cinco vezes o valor previsto pelo governo ao enviar o projeto: R$ 900 milhões
“As despesas relativas ao Fundo Especial de Financiamento de Campanha observarão o limite máximo correspondente ao valor autorizado para essas despesas no exercício de 2022”, diz um dos artigos do relatório de Forte.
Danilo Forte chegou a defender que o abastecimento do fundo fosse feito metade com investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e a parte com as emendas de bancada estadual, mas desistiu diante do impasse entre os colegas.
A fonte que garantirá o aumento do chamado fundão eleitoral, contudo, divide parlamentares. Parte deles age para retirar os recursos da Justiça Eleitoral, que no ano passado teve R$ 9,1 bilhões, enquanto outra ala defende que o dinheiro saia das emendas de bancada, como previsto atualmente em lei.
O nó está nos deputados do baixo clero — aqueles que não têm cargo de liderança e pouca influência na divisão dos recursos. Eles resistem em mexer nas emendas de bancada, usadas para financiar obras e serviços em suas bases eleitorais.
Na avaliação desses parlamentares, ter a garantia de uma emenda gorda, que poderá ser usada para lucrar politicamente, é mais vantajoso do que inflar o fundo eleitoral. Nas palavras de um deputado, que pediu para não ser identificado, ninguém vai concordar em reduzir o valor que poderá destinar à sua base para bancar “voo de helicóptero” de candidato.
— Houve uma discordância generalizada em relação à exclusividade das emendas de bancada. Acho que isso tem que ser distribuído por remanejamentos da área de investimento, de forma linear, para poder garantir a questão do fundo eleitoral—afirmou Danilo Forte antes da apresentação do relatório.
Pobreza em queda revela força e limites do Bolsa Família
EDITORIAL DE O GLOBO
Os brasileiros em situação de pobreza — renda inferior a R$ 637 por mês — caíram de 36,7% da população em 2021 para 31,6% em 2022, segundo o IBGE. Caiu também a pobreza extrema — rendimento inferior a R$ 200 mensais —, de 9% para 5,9%. A desigualdade, medida pelo índice de Gini, diminuiu de 0,544 para 0,518. Em termos absolutos, 6,5 milhões saíram da miséria e 10,2 milhões da pobreza. Num país como o Brasil, com milhões na penúria e uma das maiores desigualdades do mundo, o avanço merece celebração.
O melhor remédio contra a pobreza é, obviamente, a geração de riqueza. Só o crescimento econômico robusto e sustentado, aliado a uma política educacional capaz de promover mobilidade social, será capaz de erradicar a miséria em definitivo. Mas, enquanto ainda se patina para atingir tal objetivo, os programas sociais, mesmo com seus defeitos, têm desempenhado papel imprescindível. Pelos cálculos do IBGE, sem transferência de renda, a proporção de miseráveis seria 80% maior, a de pobres 12% maior, e a desigualdade 5,5% superior. Ainda que o nível de emprego tenha se recuperado, a ajuda governamental representou 67% do rendimento dos mais pobres em 2022.
Brasil e México são considerados inovadores em programas de transferência de renda. Por aqui, eles começaram com Fernando Henrique e ganharam vulto no primeiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. De lá para cá, o modelo foi adotado por mais de dez países nos cinco continentes. Mas o ineditismo não eximiu a iniciativa brasileira de erros.
O principal foi o uso para angariar votos, como ficou patente durante o governo Jair Bolsonaro, que rebatizou o Bolsa Família de Auxílio Brasil. Em julho de 2021, uma Medida Provisória elevou o benefício mensal para R$ 400. Seis meses depois, o valor estava em R$ 600. Depois de assumir, o governo Lula retomou o nome antigo e voltou a subir o valor médio para R$ 714. Como proporção do PIB, o gasto com o Bolsa Família quadruplicou, de 0,4% em 2018 para 1,6% neste ano.
Infelizmente, o valor maior não veio acompanhado de melhorias na gestão ou no desenho do programa. Pelo contrário. O ponto forte do Bolsa Família sempre foi o foco: fazer o dinheiro chegar a quem precisa. Foi o que permitiu a um programa que custava em torno de 0,4% do PIB gerar R$ 1,78 por real nele investido, segundo o Centro de Políticas Sociais, da FGV Social. Esse impacto equivale ao triplo do gerado por benefícios da Previdência e é 50% superior ao do Benefício de Prestação Continuada (BPC), destinado a idosos de baixa renda ou deficientes.
Porém, com o público-alvo ampliado para 55 milhões, em vez dos 12,7 milhões na pobreza extrema, o benefício perdeu foco. As irregularidades aumentaram. Não houve ênfase nas condicionalidades necessárias para quebrar a cadeia de transmissão da miséria de geração em geração. A exigência de caderneta de vacinação e frequência escolar dos filhos virou letra morta. O atual governo tentou corrigir alguns desses problemas.
Excluiu 1,5 milhão de famílias que recebiam de modo irregular, resgatou a progressividade na concessão do benefício e criou desincentivos para as famílias de um só integrante que proliferavam no Auxílio Brasil. Todos esses esforços devem ser mantidos, e a arquitetura do programa precisa resgatar o foco. É essa a lição que se espera ter sido aprendida.