‘Quem se assustou tome um chá de camomila’, diz Maduro após Lula questionar ‘banho de sangue’
Por Redação / O ESTADÃO DE SP
O ditador da Venezuela Nicolás Maduro sugeriu nesta terça-feira, 23, que “quem se assustou” com suas declarações tomasse um “chá de camomila”, um dia depois do presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva ter questionado os avisos do mandatário venezuelano sobre um “banho de sangue” caso a oposição vença as eleições marcadas para o próximo domingo, 28.
“Que tome um chá de camomila”, disse Maduro. “Eu não disse mentiras. Apenas fiz uma reflexão. Quem se assustou que tome um chá de camomila”, afirmou Maduro sem mencionar diretamente Lula. “Na Venezuela, irá triunfar a paz, o poder popular, a união cívico-militar-policial perfeita”.
Na segunda-feira, 22, Lula disse ter ficado assustado com as palavras de Maduro em um comício, no qual ele disse que poderia haver um “banho de sangue” se ele perdesse a eleição e não conseguisse se reeleger.
“Fiquei assustado com as declarações de Maduro, de que se ele perder as eleições haverá um banho de sangue. Quem perde as eleições toma um banho de votos, não de sangue”, afirmou o presidente brasileiro. “Maduro tem que aprender: quando você ganha, fica (no poder). Quando perde, vai embora. E se prepara para disputar outra eleição”, acrescentou em uma coletiva de imprensa com agências internacionais em Brasília.
Maduro se defendeu afirmando que “se, negado e transmutado, a direita extremista (...) chegasse ao poder político na Venezuela, viria um banho de sangue”. ”Não estou inventando, é que já vivemos um banho de sangue, em 27 e 28 de fevereiro”, declarou Maduro, fazendo referência ao Caracazo, uma explosão social em fevereiro de 1989 que deixou milhares de mortos, segundas denúncias, embora o saldo oficial tenha sido de cerca de 300 falecidos.
“Eu prevejo para aqueles que se assustaram que na Venezuela teremos uma maior vitória eleitoral da história”, insistiu o presidente venezuelano, que aspira a um terceiro mandato que o projetaria a 18 anos no poder.
O diplomata Edmundo González Urrutia é o candidato da principal aliança opositora, que o respaldou devido à impossibilidade de apresentar a ex-deputada María Corina Machado, favorita nas pesquisas, mas impedida de exercer cargos públicos por uma sanção administrativa.
Também nesta terça-feira, o ex-presidente da Argentina, Alberto Fernández, que atuará como observador das eleições venezuelanas, sugeriu que Maduro aceitasse o resultado.
“Se for derrotado, o que deve fazer é aceitar, como disse Lula: quem ganha, ganha, e quem perde, perde [...] vou fazer o que me pediram, ser um observador das eleições para que tudo funcione bem”, disse Fernández, em entrevista a uma rádio sobre o pleito venezuelano./AFP.
Lula critica imposto sobre herança e diz que no Brasil não há interesse em ‘devolver o patrimônio’
Por Caio Spechoto (Broadcast) e Sofia Aguiar (Broadcast) / O ESTADÃO DE SP
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse nesta terça-feira, 23, que o imposto sobre herança no Brasil é “nada”, e por isso doações de patrimônio para educação e outras áreas são raras. Ele deu a declaração em cerimônia de homenagem aos dez anos do campus Lagoa do Sino, da UFSCar. A unidade, que fica em Buri, no interior de São Paulo, foi construía em uma área doada pelo escritor Raduan Nassar.
“Nos Estados Unidos, como o imposto é caro, tem muitos empresários que fazem doação”, disse o presidente da República. “Aqui no Brasil não tem ninguém que faça doação, porque o imposto sobre herança é nada, é só 4%. Então a pessoa não tem interesse em devolver o patrimônio dele”, disse.
O presidente repetiu que destinar recursos públicos para saúde e educação é investimento, não gasto. “País importante não é aquele que só exporta soja, milho e minério de ferro. É aquele que exporta inteligência, aquele que exporta conhecimento, aquele que exporta gente para produzir coisas de valor agregado. É com esse País que eu sonho. E por sonhar eu digo para os meus ministros: não utilize nunca a palavra gasto quando estiver falando de educação”, afirmou.
“A palavra gasto vale para qualquer coisa, só não vale para cuidar da educação e cuidar da saúde, porque cuidar da saúde é investimento. Uma pessoa com saúde trabalha melhor, vive melhor, está mais feliz”, disse o petista.
Na segunda-feira, 22, o governo confirmo o congelamento de R$ 15 bilhões em despesas. O detalhamento de quanto cada órgão do Executivo terá de economizar será divulgado na próxima terça-feira, 30.
PEC da Segurança Pública de Lula turbina PF para combater crime organizado e milícias
Por Guilherme Caetano / O ESTADÃO DE SP
A proposta de emenda à Constituição (PEC) em elaboração pelo governo Lula amplia as atribuições da Polícia Federal (PF) e permite que a corporação combata o crime organizado e ainda milícias. Se aprovado, o projeto também vai estender a atuação da PF para áreas de matas, florestas, áreas de preservação e unidades de conservação, sendo possível operações interestaduais e até internacionais.
Idealizado pelo ministro da Justiça e Segurança Pública (MJSP), Ricardo Lewandowski, o texto está em análise na Casa Civil e propõe alterações no artigo 144 da Constituição. Esse artigo trata da Segurança Pública e do papel de cada esfera de Poder. Hoje, o texto constitucional estabelece que cabe à PF “apurar infrações penais contra a ordem política e social ou em detrimento de bens, serviços e interesses da União”. Estabelece ainda que a instituição federal tem competência para apurar “outras infrações cuja prática tenha repercussão interestadual ou internacional e exija repressão uniforme”.
A proposta de Lewandowski inclui nesse artigo a possibilidade de a PF atuar nas áreas de preservação como matas e florestas e explicita que o órgão também poderá combater “organizações criminosas e milícias privadas”.
Símbolo do aparelhamento ideológico sob o governo de Jair Bolsonaro, a Polícia Rodoviária Federal (PRF) é outro ponto-chave da proposta. Hoje centrada em rodoviais, a atuação da corporação será ampliada para ferrovias e hidrovias, além de bens e serviços de órgãos federais. Com isso, ela deve ser rebatizada para Polícia Ostensiva Federal.
A PEC permitirá que governadores solicitem a atuação dessa nova polícia de forma emergencial, sendo necessária autorização do governo federal.
O texto da PEC é aposta para marcar presença em um assunto que tem potencial para desgastar o governo federal. Lewandowski e o secretário nacional de Segurança Pública, Mario Sarrubbo, entendem ser preciso uma polícia de patrulha para trabalhar no mesmo âmbito da PF, cuja competência é investigativa. A ideia é que essa nova força de segurança tem perfil ostensivo, de caráter civil.
“A ideia do ministro é criar uma simetria no campo federal. Os Estados têm a polícia judiciária e a ostensiva. A PRF ganharia atribuições e se transformaria numa força ostensiva nacional, ampliando um pouco o leque de atuação”, diz Sarrubbo.
Tanto Lewandowski quanto Sarrubbo têm tido cautela em discutir o assunto para deixar claro que não querem interferir na competência estadual de segurança pública. O objetivo é ter uma força complementar para fortalecer o combate ao crime organizado, que tem se expandido pelo País e fora dele sem que as polícias consigam detê-lo. Como cada Estado tem suas próprias corporações, regimentos e sistemas de informação, a cooperação entre diferentes entes é considerada complexa e custosa.
No ano passado, secretários estaduais de Segurança Pública de São Paulo, Mato Grosso do Sul, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul fundaram um grupo para facilitar a integração de ações policiais de combate ao crime desses territórios. Liderada pelo secretário paulista Guilherme Derrite, a iniciativa tem como foco fazer frente ao Primeiro Comando da Capital (PCC), mas encontra obstáculos na atuação das forças envolvidas, já que agentes de segurança não podem atuar em outros estados livremente.
A PEC também deve incluir na Constituição o Sistema Único de Segurança Pública e o Fundo Nacional de Segurança Pública, somado ao Fundo Penitenciário Nacional (Funpen). A aprovação da proposta é considerada crucial para Lewandowski. O alto escalão do governo entende haver poucos instrumentos a nível federal para determinar políticas de segurança pública para todo o país.
A partir da aprovação do projeto, seria possível cobrar de cada Estado, por exemplo, a determinação de planos estratégicos para redução de homicídios, da letalidade policial e de retomada territorial de organizações criminosas e milícia, além de padronizar bancos de informação para registro de facções e procurados. Hoje não há uma diretriz obrigando a uniformização de dados, tampouco uma plataforma que permita aos gestores estaduais acesso a informações de outros estados — algo que o MJSP quer resolver.
A PEC em gestação no governo está sendo bem avaliada pela corporação que pretende turbinar, de acordo com o presidente da Federação Nacional dos Policiais Rodoviários Federais (FenaPRF), José Henrique dos Santos.
“Precisamos ter o texto todo para fazer esse debate com os nossos policiais. Mas, da forma como está chegando, a PEC é muito bem-vinda por trazer segurança jurídica nessa atuações que fazemos fora das rodovias federais, quando outros órgãos nos requisitam”, diz Santos.
O texto não deve passar por grandes alterações após análise técnica, dizem fontes da Casa Civil. Após essa etapa, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deve reunir os ministros que um dia foram governadores, como Rui Costa (BA), Wellington Dias (Piauí) e Camilo Santana (Ceará), para consultá-los sobre potenciais pontos sensíveis da PEC.
A preocupação do presidente é que, como o projeto envolve um assunto que pode resvalar em interesses de governos estaduais, que têm a atribuição constitucional de cuidar da segurança pública, a proposta possa criar algum tipo de ruído e colocar os governadores contra a ideia. Antes de enviar a PEC ao Congresso, Lula deve convocar os 27 governadores para então consultá-los sobre o tema.
Bolsonaristas vêm se adiantando para disputar com o governo federal a paternidade de uma reforma nas competências federais na segurança pública. Assim que a PEC de Lewandowski foi elaborada, o senador Marcos do Val (Podemos-ES) começou a coletar assinaturas para propor o seu próprio projeto.
A PEC de Do Val, que tinha antes do recesso no Legislativo oito das 27 assinaturas necessárias para ser protocolada e começar a tramitar no Senado, também insere na Constituição o Sistema Único de Segurança Pública e um fundo nacional para financiar políticas na área. O autor diz que seu texto foi elaborado antes do de Lewandowski e se encontra mais completo.
“Por exemplo, a nossa PEC propõe uma atuação integrada e hierarquizada das ações e serviços de segurança pública, estabelecendo uma rede eficiente e coordenada em todo o país”, declara o senador. Ele diz confiar que seu projeto vai tramitar paralelamente ao que está sendo elaborado no governo federal.
O estado onde o PT prevê seu pior resultado nas eleições de 2024
Por Bela Megale / O GLOBO
“Massacre”. É essa palavra que tem sido usada por petistas, inclusive dentro do alto comando do partido e do governo Lula, para descrever o cenário previsto para as eleições municipais para o interior de São Paulo.
A sigla tem hoje quatro prefeituras em todo estado e considera que sua principal missão é manter o PT no comando de, pelo menos, essas cidades, sendo elas Araraquara, Diadema, Mauá e Matão. São Paulo tem 645 prefeituras. Mesmo com a máquina na mão nesses municípios, integrantes da sigla consideram que será um desafio manter essas prefeituras. A avaliação é que a melhor estratégia é fazer alianças amplas para enfrentar a extrema direita.
A aliança mais ampla firmada até o momento pelo PT no interior paulista foi em torno da pré-candidata à prefeitura de Araraquara, Eliana Honain, apoiada por 12 partidos, do PSOL ao PSDB.
A leitura que tem sido feita dentro do PT é que o interior de São Paulo apresenta o cenário mais crítico do Brasil, por ter uma base orgânica ampla alinhada ao bolsonarismo, em especial, em regiões do agronegócio.
Em 2012, o sigla viveu seu auge no estado, conquistando 73 das 645 prefeituras paulistas. Foi naquele ano que Fernando Haddad se elegeu prefeito da capital. Em 2024, o PT vai apoiar a candidatura de Guilherme Boulos (PSOL) para a prefeitura de São Paulo.
No início do ano, a meta traçada pelo partido era conquistar entre 15 e 20 prefeituras no estado, mas, nos bastidores, o número já é considerado “alto demais” por membros da legenda.
Professores temporários: novo PNE do Governo Lula permite que até 30% dos docentes não sejam concursados
A cada 10 professores da educação básica no Brasil, aquela que atende estudantes do infantil ao ensino médio, 6 eram efetivos e os outros 4 temporários, em 2023. No Ceará, a realidade é que a cada 100 professores das escolas públicas, 54 são concursados e outros 46 estão em outros regimes de contratação, conforme o painel de monitoramento do Plano Nacional de Educação (PNE), do Governo Federal. A contratação de professores não concursados deveria ser exceção, mas no Brasil, tanto nas redes estaduais como nas municipais, tem sido a regra. Na nova proposta do PNE, que tramita na Câmara Federal, esse é um dos pontos polêmicos e que tem gerado críticas.
Os impactos do elevado número de professores temporários ou sem vínculo mais estável como o concurso são diversos e vão desde a repercussão na aprendizagem dos alunos à desvalorização da atividade docente.
Na proposta do novo PNE - lei federal que norteia ações na área da educação durante uma década - enviada pelo Governo Federal à Câmara em junho deste ano, (Projeto de Lei 2614/2024) uma das críticas das entidades de defesa dos trabalhadores da educação é a flexibilização da proporção permitida de contratação de professores temporários.
Já na nova proposta, cujo prazo de validade projetado é de 2024 a 2034, o Governo Federal ampliou essa margem e em uma das meta estabelece que até o final da década ao menos 70% dos professores da rede pública devem ter vínculo estável por meio de concurso público. Na prática, há uma maior permissividade com esse tipo de contratação que antes era admitida em 10% das contratações e agora tem uma margem de 30%.
COMO É A SITUAÇÃO NO CEARÁ
No Ceará, conforme já mostrado pelo Diário do Nordeste, o número de contratação de professores temporários na educação básica, tanto na rede estadual como nos municípios é elevado.
Conforme o painel de monitoramento do PNE, do Governo Federal, a situação dos docentes na rede pública cearense em 2023 era a seguinte:
- Rede Federal: dos 1.432 professores, 94,4% são efetivos
- Rede Estadual: dos 19 mil professores, 41,4% são efetivos
- Rede Municipal: dos 69 mil professores, 56,1% são efetivos
- Total: dos 87 mil professores, 54,2% são efetivos
Nesse sentido, a rede estadual tem a menor proporção de docentes efetivos. A doutora em Educação e professora da Universidade Estadual do Ceará (Uece), Eloisa Vidal, explica que a ênfase na história dos professores temporários “começa a acontecer já em 2015 quando se começa a perceber que, embora os estados tenham feito concurso, esses concursos foram muito mais para o quadro de reposição e não conseguiu suprir a demanda crescente em função da própria ampliação carga horária”.
Com a reforma do Ensino Médio, acrescenta ela, quando se criam as disciplinas eletivas, essa situação também é acentuada pois “não há como suprir a rede (estadual) somente com o quadro de professores efetivos”.
Outro ponto que, segundo a pesquisadora, interfere para um maior número de temporários é a obrigatoriedade do cumprimento da Lei do Piso do Magistério. “A contratação do professor temporário é uma estratégia que os os entes federados usam para essa folha. Porque se o professor é concursado e efetivo na rede, por força de lei ele tem que pagar o piso salarial. Quando eu coloco o professor temporário eu pago por hora-aula, então, pago um salário muito menor. E esse profissional não vai, no futuro, para minha folha de inativos, já que terminou o contrato ele é dispensado”, destaca.
NOVO PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO
A situação vivenciada no Ceará não destoa da realidade nacional. No Brasil, segundo dados do monitoramento do PNE, apenas no Rio de Janeiro, Rondônia, Rio Grande do Norte, Paraná, Roraima e Bahia mais de 70% dos professores são efetivos.
O secretário de Comunicação do Sindicato dos Professores e Servidores da Educação do Estado e Municípios do Ceará (APEOC) e secretário de Política Sindical da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Alessandro Sousa Carvalho, reforça que as duas entidades analisam a proposta de flexibilização de 10% para 30% de contratação de temporários apresentada no novo PNE como “negativa” e vão atuar para modificar esse ponto nas casas legislativas (Câmara e Senado).
Ele também pondera que “o fato de uma rede ter elevado número de professores contratados por tempo determinado pode dificultar a formação continuada, uma vez que esses profissionais estão sujeitos a uma alta rotatividade e, principalmente, não têm acesso às carreiras em suas cidades ou estados. Não havendo acesso às carreiras e consequentemente à progressão remuneratória, não há estímulo à formação”.
O PNE é o documento federal que define as ações a serem tomadas na área da educação. A existência do PNE é prevista na Constituição Federal que estabelece ainda que a lei tem validade de 10 anos. Portanto, é revisada a cada década. O novo PNE proposto pelo Governo tem 18 objetivos, 58 metas e 253 estratégias que vão da educação infantil à superior, incluindo valorização dos profissionais da educação, infraestrutura, gestão democrática e financiamento da educação.
IMPACTO NA DOCÊNCIA
Os contratos temporários também trazem prejuízos para a docência em si, conforme avaliam as fontes ouvidas pelo Diário do Nordeste. O representante da APEOC e da CNTE, Alessandro Sousa Carvalho, analisa que os professores contratados de forma temporária estão “sempre apreensivos quanto à manutenção de seu emprego, deixando de se preocupar exclusivamente com o ensino, integração e formação pedagógica, o que enfraquece o processo ensino e aprendizagem e culmina em um grande prejuízo não só para o aluno, mas para toda a comunidade escolar”.
A doutora em Educação e professora da Uece, Eloisa Vidal, também reforça que o professor concursado, geralmente, tem mais autonomia do ponto de vista de gestão, com uma participação mais proativa e equitativa.
“O professor temporário está muito submetido a gestão, então, ele precisa agradar na sua totalidade a gestão porque no semestre seguinte, uma vez contrariado os interesses da gestão, ele pode não receber a mesma carga horária. Além disso, hoje ele está numa escola, amanhã ele está noutra. O professor temporário é um sujeito migrante na rede”.
Ela ressalta inclusive que desde o momento da lotação, os professores temporários acabam não sendo prioridade, visto que a preferência nesta definição é dos efetivos. “Essa diferença entre os dois tipos de contratação leva o professor temporário a uma situação de instabilidade muito maior do que o professor efetivo”.
O QUE DIZ O MEC?
Questionado pelo Diário do Nordeste sobre a flexibilização, o MEC informou em nota que “o aumento da presença de professores com contrato temporário de trabalho nas redes de ensino é fator de atenção e grande preocupação”, já que “a alternância dos professores nas escolas não assegura estabilidade do trabalho pedagógico”.
O Ministério também destaca que os professores necessitam de estabilidade, “razão pela qual a realização de concursos é imprescindível e, também, incontornável consideradas as determinações constitucionais”.
O MEC reconhece que os profissionais temporários “não gozam dos direitos dos professores efetivos tais como a seleção por concurso público, o piso salarial nacional definido em Lei, a progressão profissional estabelecida em plano de carreira, jornada de trabalho que contempla tempo reservado para planejamento de aulas, além de direito à formação permanente”.
Na proposta atual (PNE 2024-2034), diz o Ministério, “várias metas e estratégias foram formuladas para enfrentar esse problema”. A meta de, no mínimo, 70% de professores concursados nas redes, segundo o órgão, “leva em conta que há afastamentos por razões de saúde, para cursos e atividades formativas, licenças gestantes, processos de readaptação, cessões, designações para cargos nos órgãos públicos”.
TRANSPARÊNCIA
Os dados mencionados nesta matéria podem ser consultados no painel de monitoramentodo Plano Nacional de Educação (PNE), do Governo Federal, neste link.
Penduricalho cria passivo bilionário no TCU e deve render R$ 112 milhões a escritório de governador
Ranier Bragon / FOLHA DE SP
O TCU (Tribunal de Contas da União) recebeu uma notificação para incorporar ao salário de parte de seus servidores um penduricalho relativo aos anos 90 cujo retroativo está estimado, atualmente, em R$ 1,12 bilhão.
A ação judicial movida pelo Sindilegis (Sindicato dos Servidores do Poder Legislativo Federal e do Tribunal de Contas da União) foi conduzida pelo escritório de advocacia do atual governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), com honorários de 10% da causa, ou seja, R$ 112 milhões.
O penduricalho bilionário do TCU teve origem na antiga regra segundo a qual servidores públicos incorporavam ao salário um determinado valor —"quintos", "décimos"— por ano em que exerciam funções comissionadas, ou seja, de chefia.
A AGU (Advocacia-Geral da União), que é o órgão responsável pela defesa jurídica dos interesses da União e, mais especificamente, do Poder Executivo, enviou recentemente ao TCU um parecer de força executória sobre o caso.
No documento, a AGU informa ao tribunal a série de reveses judiciais da União na ação movida pelo sindicato dos servidores e diz que, diante da inexistência de recurso com efeito suspensivo automático, seria preciso incorporar já na folha de pagamento de julho valores referentes a quintos salariais de servidores que exerceram função de chefia entre abril de 1998 e setembro de 2001.
De acordo com o Sindilegis, cerca de 400 funcionários do TCU serão beneficiados imediatamente com a decisão.
Os valores retroativos pelos mais de 20 anos decorridos, que beneficiariam mais de 1.000 servidores e ex-servidores, deverão ser pagos pela União por meio de precatório (reconhecimento oficial da dívida, pelo Estado), diz a AGU no parecer.
À Folha a AGU disse que o valor retroativo cobrado pelo Sindilegis está estimado em R$ 1,12 bilhão, em valores atualizados.
O sindicato afirmou que no momento da liberação desse precatório serão pagos honorários de 10% ao escritório fundado por Ibaneis —o governador está licenciado da atividade privada devido à sua função pública.
A AGU afirmou à Folha ainda que todas as medidas judiciais estão sendo tomadas contra a demanda do Sindilegis. Diz ainda que a demanda pelos quintos salariais dos anos 90 e início de 2000 estão presentes em outros órgãos da administração pública, em ações coletivas nos moldes da movida pelo Sindilegis.
Em nota, a presidência do TCU disse ter sido informada da decisão judicial desfavorável à corte, mas que a consultoria jurídica do Tribunal iria avaliar a decisão e discutir com a AGU outros recursos processuais. "No momento, não há decisão do TCU sobre os pagamentos."
No governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) a regra que previa a incorporação dos quintos aos salários foi extinta, mas controvérsias em torno de medidas provisórias que trataram do tema geraram uma disputa judicial sobre o direito a esse acréscimo relativo ao período de abril de 1998 a setembro de 2001.
No início dos anos 2000 o TCU considerou devida a incorporação dos quintos relativos a esse intervalo, o que levou vários órgãos da administração pública a elevar o salário dos servidores que exerceram cargo de chefia nesses anos, mas em relação aos servidores do próprio tribunal o pagamento não ocorreu e resultou em uma disputa judicial entre AGU e Sindilegis.
A União foi derrotada em primeira e segunda instâncias e também nos recursos apresentados nos tribunais superiores e o caso transitou em julgado —sem possibilidade de novos recursos— em 2017.
Ocorre que, dois anos antes da conclusão desse julgamento, em 2015, o STF (Supremo Tribunal Federal) havia considerado inconstitucional a incorporação dos quintos no período solicitado.
Após recursos, a mais alta corte do país modulou sua decisão em 2019, excluindo do seu escopo casos em que já houvesse decisão judicial transitada em julgado.
O litígio entre AGU e Sindilegis, então, voltou para a primeira instância em 2020 para a execução da sentença. A União prosseguiu na tentativa de bloquear a medida argumentando, entre outros pontos, que o trânsito em julgado da decisão ocorreu dois anos depois de o STF considerar ilegal a incorporação dos quintos.
A 4ª Vara da Seção Judiciária do Distrito Federal negou o pleito da AGU, com base na modulação da decisão do STF de 2019, o que resultou na notificação ao TCU.
O presidente do Sindilegis, Alison Souza, defendeu a ação, embora afirme que, no mérito, é contra a incorporação dos quintos.
"Em relação a esse processo judicial, não tem o que dizer porque é cumprimento de lei. A regra do jogo era aquela naquela época e os servidores têm o direito de receber", afirmou.
"Servidores públicos não recebem isso há mais de 20 anos. Eu sou contra hoje. Por exemplo, tem aquela PEC lá [no Senado] que estava querendo resgatar isso para juízes, eu hoje, apesar de ser sindicato, sou absolutamente contra. Acho que definitivamente não é uma boa política salarial, gera muita desigualdade, distorções."
O escritório Ibaneis Advocacia e Consultoria não respondeu às perguntas da Folha.
O governador do DF é um dos políticos com maior fortuna do país, tendo declarado patrimônio de R$ 80 milhões em 2022.
Em 2020, a Folha mostrou que pelo menos R$ 332 milhões de dinheiro público que deveria ter sido aplicado na manutenção e desenvolvimento da educação básica no país acabaram destinados a honorários de escritórios de advocacia contratados por prefeituras para obter recursos da União. Entre esses escritórios estava o Ibaneis Advocacia e Consultoria.