CPI das ONGs recebe relatório final e presidente concede vista coletiva
A comissão parlamentar de inquérito que investiga a atuação de organizações não-governamentais na Amazônia (CPI das ONGs) recebeu, nesta terça-feira (5), o relatório de conclusão de seus trabalhos. Apresentado pelo relator, o senador Marcio Bittar (União-AC), o documento apresenta seis projetos legislativos e pede o indiciamento do presidente do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), Mauro Oliveira Pires, por corrupção passiva e improbidade administrativa. O relatório será votado após o prazo de cinco dias de vista coletiva que foi concedido pelo presidente da CPI, o senador Plínio Valério (PSDB-AM).
Segundo Bittar, Mauro Pires cometeu infrações ao prestar consultoria de licenciamento ambiental por meio da empresa Canumã, da qual era sócio, enquanto era servidor público licenciado do ICMBio.
— Significa dizer que um servidor público pertencente a um órgão que participa dos processos de licenciamento ambiental passou a prestar serviços para empresas privadas exatamente nessa mesma área. Depois, ultrapassado o prazo da licença, ele retornou ao seu cargo para continuar se manifestando sobre pedidos de licenciamento ambiental, nos quais ele eventualmente pode ter atuado — explica Bittar.
O indiciamento é a condição que passa o investigado quando o inquérito aponta um ou mais indícios de que ele cometeu determinado crime. Caso o relatório seja aprovado, o pedido será apresentado à Procuradoria da República do Distrito Federal, que poderá ou não acatar a conclusão da CPI.
Segundo o Código Penal (Decreto-Lei 2.848, de 1940), comete o crime quem receber, direta ou indiretamente, ainda que fora da função mas em razão dela, vantagem indevida ou aceitar promessa de tal vantagem. Já a infração de improbidade administrativa por enriquecimento ilícito (Lei nº 8.429, de 1992) corresponde à atividade para pessoa que tenha interesse suscetível de ser atingido ou amparado por ação ou omissão decorrente das atribuições do agente público, durante a atividade.
Obras
O relatório apontou que organizações de preservação ambiental “instigam e patrocinam” procuradores e promotores a buscarem na Justiça a suspensão de obras que poderiam afetar o meio ambiente na Região Norte. Bittar também acusou o ICMBio e o Ibama de atrasarem as construções de infraestrutura com a demora em conceder licenças ambientais.
— As ONGs [que foram investigadas] colocam no bolso bilhões [de reais] e a Amazônia [continua] cada dia mais pobre. E elas se unem na hora de proibir qualquer obra de infraestrutura para a Amazônia. Não consigo compreender: se o interesse brasileiro é combater a pobreza, como vai combater se não pode fazer obras de infraestrutura: estradas, pontes, poços, hidrelétricas, e se não pode acessar os recursos naturais? — indagou Bittar.
O relatório lido apresenta um projeto de lei para restringir a atuações abusivas do Ministério Público que impliquem paralisação de obras estruturantes e um projeto de lei complementar que altera as regras de licenças ambientais.
Indígenas
Bittar afirmou que existe uma “complexa rede de interesses”, especialmente estrangeiros, que atua por meio de ONGs para impor obstáculos ao desenvolvimento nacional e à vida das populações indígenas e outras comunidades da região amazônica. Segundo ele, países desenvolvidos investem na preservação da Amazônia para “terceirizar” a compensação do desmatamento e da emissão de gases que causam o efeito estufa realizada pelos que emitem. O relator ainda disse que se a Amazônia fosse próspera na exploração de seus recursos naturais seria um risco econômico às nações mais ricas.
— Países estrangeiros, dentre quais grandes emissores de gás carbônico, financiam ONGs no Brasil para difundir uma visão "santuarista", de intocabilidade da Amazônia.
Os senadores Dr. Hiran (PP-RR) e Jaime Bagattoli (PL-RO) apontaram o espaço produtivo disponível nos estados da Região Norte. Bagattoli afirmou que o município de São Félix do Xingu, no Pará, é composto em grande parte por unidades de conservação.
— Será que é justo o estado, com a cidade e o produtor rural, terem só 11% [das terras] para poder desfrutar? — indagou Bagattoli.
Como resposta, o relatório sugere dois projetos de lei que regulamentam atividades econômicas em terras indígenas e o Fundo Amazônia, que capta doações para ações de prevenção e combate ao desmatamento na floresta.
Transparência
O relator indagou a moralidade na alternância das mesmas pessoas entre cargos públicos, funções de direção nas ONGs e cadeiras acadêmicas. Segundo Bittar, “quando estão no governo, elas angariam recursos que serão destinados às ONGs para as quais, posteriormente, atuarão”.
Para o senador, a CPI deve apresentar projeto de lei que estabeleça quarentena de dois anos para que um agente público possa ocupar a direção ou vaga no conselho consultivo dessas entidades. A proposta ainda prevê regras de transparência e responsabilização na prestação de contas das ONGs.
Caso seja aprovado, a CPI também apresentará projeto de resolução do Senado para criar uma Comissão Permanente da Amazônia, na Casa. Na avaliação do relator, o novo órgão será a “consequência mais prática da continuidade do trabalho” do colegiado.
PECs
O relator afirmou que integrantes do colegiado buscarão apresentar uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para que a criação de novas unidades de conservação somente possa ser feita por lei.
Além disso, o relatório sugere que a Constituição seja alterada para que o Procurador-Geral da República (PGR) possua legitimidade para processar e julgar ações relacionadas a obras de grande interesse público ou nacional. O Supremo Tribunal Federal (STF) teria a competência de julgar essas ações. Como as duas sugestões não obtiveram no mínimo 1/3 de assinaturas da Casa, não serão propostas oficiais da CPI.
Violência
Os parlamentares criticaram episódios de violência atribuídos a ações de funcionários das ONGs. A deputada Silvia Waiãpi (PL-AP) e a senadora Damares Alves (Republicanos-DF) relataram casos em que foram vítimas de ameaça de agressão.
— Como ministra, eu tentei ir na área ianomâmi [na Amazônia]. Sabe qual foi o recado que eu recebi? “A senhora não entra, porque as ONGs vão fomentar os índios para lhe machucar, para lhe agredir”. Fui recomendada pelo serviço de segurança a não entrar — disse Damares.
Segundo Bittar, o colegiado recebeu denúncias de que as ONGs perseguem os moradores de comunidades da Amazônia que as contestam.
— Foram relatados casos de deslegitimação do discurso que lhe fossem contrário e ataques a membros das comunidades por meio de nota de repúdio e outras declarações, supostamente emitidas em nome de todo o grupo.
Trabalhos
Instalada em junho, a CPI das ONGs realizou 30 reuniões, nas quais ouviu 28 depoimentos. Entre as pessoas recebidas, estiveram a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva; os presidentes do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama), Rodrigo Agostinho, e do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), Mauro Oliveira Pires; os ex-ministros Ricardo Salles e Aldo Rebelo; e vários representantes de comunidades indígenas e de organizações não-governamentais.
A CPI também realizou cinco diligências externas, viajando aos estados do Acre (duas vezes), do Amazonas, do Mato Grosso e do Pará. Nessas visitas, a comissão apurou denúncias de comunidades locais sobre abuso de poder de autoridades ambientais e de forças de segurança. Também expediu 72 pedidos de informações a diversos órgãos e autoridades. Uma das principais preocupações da CPI com esses ofícios foi saber sobre o financiamento a ONGs com dinheiro público e com recursos vindos do exterior. Os trabalhos do colegiado atenderam a requerimento de Plínio Valério para investigar as atividades de ONGs financiadas com dinheiro público na região da Amazônia entre os anos de 2002 e 2023.
Fonte: Agência Senado
Campanha da Alece incentiva a doação de produtos eletroeletrônicos sem uso
A Assembleia Legislativa do Estado do Ceará, por meio da Célula de Sustentabilidade e Gestão Ambiental do Comitê de Responsabilidade Social, estendeu a campanha em que servidores e público podem doar produtos eletroeletrônicos sem serventia. Podem ser doados celulares, eletrodomésticos, computadores, câmeras fotográficas, impressoras, cabos, CDs e disquetes, dentre outros, que, por não possuírem mais vida útil, acabam se tornando resíduo eletrônico (REE).
Os resíduos eletrônicos (REE) são considerados perigosos por conterem em sua composição metais de difícil degradação e produtos químicos tóxicos, podendo causar graves problemas ambientais se descartados de maneira inadequada. Dessa forma, esses resíduos não devem ser colocados no lixo comum, sendo necessário o descarte adequado visando a reciclagem.
Visando o engajamento dos servidores do Parlamento na construção de um planeta mais sustentável, a Alece, fundamentada nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Agenda 2030 da ONU, especificamente o ODS 12 (Consumo Responsável), estende a campanha para arrecadar produtos eletroeletrônicos. Os materiais podem ser deixados na sala da Célula de Sustentabilidade e Gestão Ambiental, que fica situada no Anexo I, até o dia 8 de dezembro.
Os Resíduos Eletrônicos arrecadados ao longo da campanha serão destinados para a empresa Robótica Sustentável, que reutiliza esse material para a confecção de brinquedos, que posteriormente são destinados para a educação ambiental de crianças. Já o material excedente é destinado corretamente para a reciclagem.
SERVIÇO: Campanha de doação de Resíduos Eletrônicos (REE).
Local para doação: Sala da Célula de Sustentabilidade e Gestão Ambiental - Anexo 1
Data final da campanha: 08/12/2023
Alece disponibiliza ponto de arrecadação de brinquedos da campanha Natal do Ceará Sem Fome
Por Vandecy Dourado / ALECE
A Assembleia Legislativa do Estado do Ceará (Alece) recebe, até o dia 15 de dezembro, brinquedos para a campanha Natal do Ceará Sem Fome, encabeçada pela primeira-dama do Estado, Lia de Freitas. A Casa do Povo vai disponibilizar um ponto de arrecadação no prédio da Casa do Cidadão, localizado na av. Pontes Vieira, 2.300 (anexo III), no bairro Dionísio Torres, a partir desta quarta-feira (06/12).
Os brinquedos serão destinados a crianças de 0 a 12 anos em situação de extrema vulnerabilidade atendidas pelas cozinhas do programa Ceará Sem Fome, durante o período natalino. A iniciativa envolve servidores, colaboradores e parceiros e se estende a toda a sociedade. Os pontos de arrecadação estão espalhados em diversos locais na capital e no interior, onde a população poderá contribuir com a ação.
A primeira-dama do Ceará e presidente do Comitê Intersetorial de Governança, Lia de Freitas, destaca que, no dia da entrega dos itens, previsto para 20 de dezembro, haverá uma confraternização com uma ceia natalina para as crianças e suas famílias. "O Governo do Ceará vai fazer uma ceia especial em todas as 1.028 cozinhas, nos quase 170 municípios, onde realizará um momento de convivência com essas crianças e famílias, entregando um brinquedo com que você contribuiu", revela.
A expectativa é arrecadar 30 mil brinquedos nos próximos dez dias, estimado no número de crianças atendidas pelo programa de combate à insegurança alimentar no Ceará. Os artigos infantis devem ser preferencialmente unigêneros, indicados para crianças com idades entre 0 e 12 anos. “Desde já, agradecemos o empenho de todas as pessoas com a campanha. Esse é o diferencial do Ceará Sem Fome: a união do nosso povo por todo o povo cearense”, acentua Lia de Freitas.
Confira aqui a lista completa com os locais e endereços dos pontos de arrecadação da campanha Natal do Ceará Sem Fome.
Edição: Clara Guimarães
Nova lei das PMs, que uniu bancada da bala e PT, é pior que decreto da ditadura
A recém-aprovada Lei Orgânica das Polícias Militares é resultado de uma articulação particular entre o bolsonarismo raiz e o governo petista, que patrocinou sua tramitação no Senado e se recusou a ampliar o debate junto à sociedade civil. Autores argumentam que a proposta é ainda mais autoritária que o decreto-lei sobre o tema editado pelo regime militar depois do AI-5 por concretizar o avanço de uma hipermilitarização que libera as polícias de controles indispensáveis em uma democracia.
A Lei Orgânica das Polícias Militares (LOPM), que aguarda sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), é tratada por seus defensores como uma atualização da legislação vigente para que as PMs se adequem ao regime democrático. O que está em curso, no entanto, é justamente o oposto. Seguramente, a proposta não está sendo debatida como deveria. Talvez não esteja mesmo sendo notada.
O projeto foi aprovado na Câmara em dezembro de 2022, com relatoria do deputado bolsonarista Capitão Augusto (PL-SP) e apoio da bancada da bala. Encaminhado ao Senado, ganhou prioridade em um acordo de bancadas e contou com atuação favorável do ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, indicado ao STF (Supremo Tribunal Federal). O senador Fabiano Contarato (PT-ES) se tornou relator do projeto, e o texto foi aprovado sem debate, por acordo de líderes
Entidades da sociedade civil tentaram fazer com que o tema fosse discutido no Senado, mas todos os esforços nesse sentido foram rechaçados pelo governo. Uma união sui generis entre o bolsonarismo raiz e o governo atual, portanto, fizeram a lei caminhar.
A nova lei orgânica guarda o espírito —e muitos trechos literais— de nada menos que o decreto-lei 667, de 1969, a norma editada para transformar a ação das polícias militares em polícias políticas logo depois do AI-5. Agora sob uma fachada democrática e sem nenhuma oposição, porque patrocinada por um governo que seria progressista, a lei mimetiza a organização policial do período mais pesado da repressão militar.
O projeto de lei aprovado no Congresso determina que as PMs responderão como força auxiliar do Exército e prescinde das secretarias estaduais de Segurança Pública, além de fazer desaparecer a autonomia das ouvidorias. Na prática, as PMs passam a ser muito mais autônomas politicamente.
Livres de controle, interno ou externo, as PMs poderão, por exemplo, "produzir, difundir, planejar, orientar, coordenar, supervisionar e executar ações de inteligência e contrainteligência" (artigo 5º, inciso XI), o que permitiria criar órgãos semelhantes ao Dops (Departamento de Ordem Política e Social) e marchar sobre as competências atuais das polícias civis e da Polícia Federal.
Os problemas da LOPM são muito mais numerosos. É sabido que, em 1969, o decreto-lei 667 foi editado para que as polícias atuassem como auxiliares diretos da função político-militar de guerra contra inimigos internos do regime. Se sancionada, a nova lei orgânica permitirá que as PMs façam o mesmo sob a justificativa de guerra ao crime —aos criminalizados, sejam eles quem forem.
Há coincidências assustadoras entre a LOPM e o decreto-lei 667. Os detalhes de redação são ardilosos: a norma da ditadura passou por uma espécie de harmonização facial para ganhar uma aparência mais jovem, uma "cara de democracia". A redação da nova lei finge eliminar dispositivos do decreto original, mas reproduz seus conteúdos à risca.
Além disso, o texto revoga farsescamente alguns trechos explicitamente polêmicos do decreto 667 para, em seguida, reinseri-los na LOPM com uma redação mais vaga e contemporânea. "Evitemos a resistência", devem ter pensado seus formuladores.
Vejamos algumas "novidades" da LOPM:
a) a atuação da PM como "força auxiliar e reserva do Exército", que constava no artigo 1º do decreto-lei 667, foi revogada, mas retornou fielmente no artigo 2º da nova lei;
b) a manutenção da Inspetoria Geral das Polícias Militares, comandada por general de brigada da ativa que constava no artigo 2º da norma da ditadura voltou à LOPM em seu artigo 28;
c) a estruturação interna das PMs (órgãos de direção, de execução e de apoio), que constava no artigo 5º do decreto-lei de 1969, retornou à LOPM em seu artigo 7º;
d) a organização da hierarquia das PMs, de coronel a soldado, que constava no artigo 8º, revogado, voltou à nova lei em seu artigo 12; uma hierarquia idêntica à do Exército foi, dessa forma, reproduzida na estrutura das PMs.
Há também pontos que não foram nem disfarçados nesse procedimento estético. No artigo 3º do decreto-lei 667, constava que as PMs serviriam para a manutenção da ordem pública e segurança interna. Na LOPM, a palavra manutenção é substituída por preservação, enquanto segurança interna é substituída por segurança pública (artigo 2º), além do policiamento ostensivo.
Ora, não existe compatibilidade entre o papel de polícia em uma democracia e em um regime militar. Essa incompatibilidade, no entanto, não será sequer notada pelo público. A militarização política da polícia repete, agora como farsa, a tragédia da ditadura.
Outros pontos da LOPM merecem destaque: o artigo 2º define as PMs como instituições militares permanentes, organizadas com base na hierarquia e disciplina militares. O adjetivo militar é enfatizado.
No que se refere às diretrizes da organização (artigo 4º), se preveem cooperação e compartilhamento recíproco de experiências entre os órgãos da segurança pública (inciso IX), instituição de bases de dados online e unificadas por estado da federação (inciso XII) e compartilhamento de seus bancos de dados e demais sistemas de informação (inciso XVII).
Se desejáveis do ponto de vista técnico, essas diretrizes desafiam o federalismo e criam um problema enorme. Quem coordenará e controlará a decisão dessas polícias? Não há menção ao Ministério da Justiça. As polícias controlam a si mesmas ou o Exército as controla.
Em relação à competência das PMs (artigo 5º), se nota uma enorme expansão do militarismo policial sobre as competências de outros órgãos e áreas do Estado. Por exemplo, sobre o ensino e a pesquisa: "Recrutar, selecionar, formar seus membros militares e desenvolver as atividades de ensino, extensão e pesquisa [...] por meio do seu sistema de ensino militar" (inciso XIV).
O atual sistema de ensino das PMs e das Forças Armadas está fora do alcance da LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional). A LOPM prevê que "o Poder Executivo federal editará decreto com a definição de parâmetros mínimos para [...] os cursos de formação, habilitação e aperfeiçoamento", que conterão "as disciplinas de direitos humanos e polícia comunitária" (artigo 34).
Não se menciona quem editará o decreto ou quem realizará o acompanhamento e a avaliação do que for implantado. Serão as próprias PMs por meio do "seu" sistema de ensino?
A LOPM reforça o caráter exclusivista e excludente do ensino das polícias: as competências do MEC ficam para o resto do mundo educacional e de pesquisa, enquanto as PMs têm autonomia para ensinar e pesquisar o que quiserem. Liberdade acadêmica para as polícias, talvez nenhuma para os pesquisadores das universidades, chamados de pseudo-especialistas.
Em relação à segurança de trânsito, a nova lei inclui entre as atribuições das PMs "exercer, por meio de delegação ou convênio, outras atribuições para prevenir e reprimir atos relacionados com a segurança pública" (artigo 5º, inciso VI). O que isso significa? Interdição de vias? Autorização para a realização de eventos em vias públicas? A redação é vaga, permitindo que arbitrariedades políticas encontrem amparo legal.
No que diz respeito à fiscalização ambiental, a LOPM inclui as competências de "exercer, por meio de delegação ou convênio, outras atribuições na prevenção e na repressão de atividades lesivas ao meio ambiente" (artigo 5º, inciso VIII) e de aplicar sanções (inciso VII). As PMs poderão julgar recursos ambientais além de lavrar autos de infração ambiental? Poderão conduzir o licenciamento ambiental? Quem controlará essas atividades?
Nas entrelinhas, a ideia é que ninguém controle, mesmo porque não são previstas transparência e prestação de contas à sociedade.
Em relação à realização de eventos e atividades em locais públicos, a lei prevê que caberá às PMs emitir manifestação técnica sobre a realização de atos (artigo 5º, inciso XVI). As corporações poderão proibir a realização de manifestações ou protestos em vias públicas? Poderão proibir a realização de determinadas manifestações culturais? Infelizmente, parece que sim. Temos presenciado a criminalização do funk e do hip hop, por exemplo, há anos. Com a sanção da lei, haverá amparo legal para isso.
A falta de transparência das polícias ganha legalidade na nova lei, que autoriza a subordinação direta das ouvidorias aos comandantes-gerais das PMs (art. 10, parágrafo 8º). Norberto Bobbio definiu a democracia como o governo do poder público em público, em que a transparência é a regra. Esse dispositivo da LOPM é o oposto disso e cria um risco grave para a democracia.
O artigo 7º, por sua vez, estabelece a subordinação direta das PMs aos governadores. Abre-se a possibilidade de não haver mais uma Secretaria de Segurança Pública e, com isso, a eliminação de mais uma instância de controle e o agravamento da relação com as polícias civis.
Em relação ao efetivo das corporações, a LOPM restringe a participação de mulheres ao estabelecer cota de 20% de vagas em concurso públicos e não faz menção à comunidade LGBTQIA+. Ao reforçar que as PMs são integradas por membros militares (artigo 11), a lei exacerba mais uma vez o militarismo.
Estamos diante de um hipermilitarismo que combate os esforços civis para democratizar a segurança pública, reforçando a rota que nos trouxe à tragédia atual da segurança pública brasileira.
Depois de estudar seu conteúdo, fica nítido que a LOPM vai além do decreto-lei do regime militar. A hipermilitarização das corporações tem intenções políticas bastante evidentes: a autonomização das PMs de qualquer controle civil ou democrático, deixando aberta a possibilidade de sua utilização política nos estados e na União. Como uma lei aprovada em tempos de democracia pode ser ainda mais autoritária que uma norma editada no auge repressivo da ditadura?
Se a lei não é boa para a sociedade, tampouco é boa para os policiais. Pesquisas sobre a incidência de suicídio entre policiais revelam que seu adoecimento psíquico pode ser decorrente mais de fatores organizacionais que de fatores operacionais. Por exemplo, protocolos baseados em uma cultura autoritária e concentração da tomada de decisão, típica de uma estrutura militarizada, com menor reconhecimento e valorização do policial.
O treinamento de policiais voltado não para servir a população, mas para combatê-la, abre espaço para que superiores tomem decisões arbitrárias ao avaliar seus subordinados, determinem escalas de trabalho excessivas e imponham relações interpessoais abusivas. A hipermilitarização, impulsionada pela LOPM, se insere em uma realidade laboral precária e pode se tornar um fator preditivo de suicídio entre policiais, fenômeno que vem se agravando.
Apesar disso, a lei foi aprovada nas duas casas do Congresso por votação simbólica, em acordo de líderes. Na Câmara, o Partido Novo foi o único que votou contra o projeto, possivelmente só para marcar sua oposição ao governo.
Testemunhamos esforços de entidades da sociedade civil junto ao governo Lula, alertando para os riscos presentes no projeto e pedindo mais diálogo e transparência no processo legislativo. O Executivo se recusou a promover esse debate.
Como explicar que parlamentares ditos progressistas e o atual governo federal, igualmente dito progressista, tenham apoiado incondicionalmente esse projeto, que evidentemente tem todos os traços da extrema direita? Uma barganha para a aprovação de outras pautas, consideradas mais relevantes para o governo, parece ser a resposta.
A LOPM é antidemocrática e autonomiza e politiza as PMs, enquanto finge fazer o oposto, e exacerba a hipermilitarização, reduzindo sensivelmente a transparência e o efetivo controle da sociedade e, sobretudo, dos governos eleitos sobre os grupos armados estatais.
Além disso, amplia os limites da atuação das PMs, que poderão se sobrepor às competências de outros órgãos do Estado, em um evidente avanço da militarização estatal, inclusive em atividades de educação e pesquisa. A nova lei aponta para o avanço da precarização da investigação policial, já que as PMs poderão avançar sobre as prerrogativas das polícias civis e federal.
Se sancionada por Lula, como indica que será, a LOPM semeará a criação de um Estado policial e militarizado que terá amparo legal para esgarçar ainda mais a nossa já combalida democracia.
Primeira Turma do STF nega por unanimidade vínculo de emprego entre motorista e app
Constança Rezende / FOLHA DE SP
A Primeira Turma do STF (Supremo Tribunal Federal) negou por unanimidade, nesta terça-feira (5), o reconhecimento de vínculo de emprego de um motorista de aplicativo de transportes.
O colegiado atendeu ao pedido feito pela empresa Cabify e cassou decisão do TRT-3 (Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região), de Minas Gerais.
O tribunal havia determinado o reconhecimento do vínculo, em processo movido por um motorista que atuou na empresa.
No recurso levado ao Supremo, chamado de reclamação, a empresa alegou que a decisão anterior ignorava o entendimento da Corte sobre a validade da terceirização.
A defesa do aplicativo defendeu que julgamento anterior "fixou tese no sentido de admitir outras formas de contratações civis, diversas da relação de emprego".
Os ministros Cristiano Zanin, Luiz Fux e Cármen Lúcia seguiram o voto do relator do caso, o ministro Alexandre de Moraes.
Cabe recurso na própria Turma. Se algum ministro pedir para que o caso seja levado ao plenário, o tema pode ser analisado por todos os integrantes do STF.
O relator afirmou, durante o seu voto, que os motoristas do aplicativo têm liberdade para aceitar a corrida que desejarem e fazer o seu horário de trabalho.
"Ele [motorista] tem liberdade de ter outros vínculos, atua em outras coisas, não se prende pelo vínculo da exclusividade", disse, acrescentando que esta é "uma nova forma que possibilitou o aumento de emprego e de renda".
Moraes também citou que, durante a pandemia, vários engenheiros e advogados procuraram os aplicativos para complementar sua renda e que, nesta situação, poderiam ser chamados de microempreendedores.
"Apesar de ter ficado conhecido como comunistas nos últimos anos, na verdade defendo a livre concorrência e o direito de propriedade", disse.
Zanin afirmou que precedentes do STF já consagraram a liberdade econômica a de organização de atividades produtivas e consideraram lícitas outras formas de pactuação das forças de trabalho.
"Não vejo nesse caso uma relação típica de trabalho da CLT, mas outra forma de contratação que, eventualmente, pode merecer outra legislação que discipline a relação", afirmou.
Já Cármen Lúcia relatou preocupação com os trabalhadores chamados de "uberizados", que lidam com a falta de regulamentação específica e direitos sociais, o que, segundo ela, não significa adotar o modelo da legislação trabalhista.
Moraes já havia cassado a decisão do TRT-3 em maio, agora confirmada pelo colegiado. Contra esta nova decisão, em tese, cabe outro tipo de recurso, chamado de embargos de declaração.
O pedido de vínculo de emprego havia sido negado na 31ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte em abril de 2022. Em junho do mesmo ano, a 11ª Turma do TRT-3 determinou, por maioria de votos, o reconhecimento da relação.
A Cabify não atua mais no Brasil desde meados de 2021, quando, durante a pandemia, anunciou a decisão de encerrar o serviço no país.
Os ministros também decidiram levar outro processo sobre o tema, desta vez de motorista que atende ao aplicativo Rappi, para o plenário da corte.
O objetivo é firmar um entendimento sobre o tema e evitar que mais ações do tipo cheguem ao Supremo. Neste caso, a Justiça do Trabalho também reconheceu o vínculo e Moraes suspendeu o processo.
Durante o julgamento os ministros também disseram que há uma insistência de magistrados do trabalho em descumprir decisões do STF sobre o tema. Eles decidiram requisitar ao CNJ (Conselho Nacional de Justiça) um levantamento sobre estes casos.
A deturpação das emendas parlamentares
Por Notas & Informações / O ESTADÃO DE SP
Desde o fim do orçamento secreto, o Legislativo se movimenta para encontrar formas de reconquistar o poder que tinha no governo Bolsonaro. Com as emendas de relator, esquema revelado pelo Estadão, para obter apoio a seus projetos, o Executivo cedeu o controle e a distribuição de parte do Orçamento à cúpula do Legislativo.
O maior problema do orçamento secreto era a completa opacidade sobre a autoria das indicações, que nunca foram uma escolha do relator. Foi por isso – por violar os princípios constitucionais da transparência, impessoalidade, moralidade e publicidade – que o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu a inconstitucionalidade das emendas do tipo RP-9. O STF, portanto, acertou em derrubar o orçamento secreto e em não declarar que as demais emendas eram inconstitucionais.
Como já dissemos neste espaço, as emendas parlamentares são parte do jogo democrático e um dos vários instrumentos de construção de governabilidade. Se alinhadas a políticas públicas nas mais diversas áreas, elas privilegiam os parlamentares que integram a base e podem ser um ganha-ganha para o Executivo e o Legislativo. Cerrar fileiras com a oposição costumava ser uma decisão de alto custo e que exigia muita convicção.
Em 2015, isso começou a mudar. Foi quando o Congresso tornou impositivas as emendas individuais e garantiu uma verba para cada deputado e senador, independentemente de seu posicionamento. Desde então, os vários tipos de emendas ocupam espaço cada vez maior no Orçamento. Em 2014, elas totalizaram R$ 8,7 bilhões; neste ano, chegaram a R$ 35,8 bilhões. O Congresso não quer abrir mão delas, o Executivo não tem tido conforto para aprovar seus projetos e a sociedade não tem visto o resultado das políticas públicas.
Ainda assim, os parlamentares não desistiram de criar alternativas para resgatar o orçamento secreto. O relator da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), Danilo Forte (União-CE), tentou criar a emenda de liderança, que ficaria sob o comando dos líderes partidários, mas recuou.
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), prefere ampliar as emendas de comissão, tornar seu pagamento obrigatório e criar um calendário para sua execução. Uma reportagem do Estadão mostrou que o parlamentar defende ampliar o espaço que cabe às emendas das Mesas Diretoras da Câmara e do Senado. Como na Câmara a Mesa é presidida pelo próprio Lira, isso pode fazer delas um retrofit do orçamento secreto.
O avanço das emendas teve outro efeito colateral e reduziu a autoridade que os líderes partidários tinham sobre suas bancadas. Parlamentares se sentem livres para ignorar as orientações de suas lideranças. Não seria um problema se as eleições legislativas não adotassem o sistema proporcional, no qual o mandato não pertence ao político, mas pertence ao partido.
Eventualmente, a emenda de liderança poderia ser um modelo de transição para recolocar algumas coisas em seu devido lugar. Se bem utilizada, ela poderia resgatar o papel dos partidos, reorganizar as bancadas, facilitar negociações para a formação de uma base para o governo e favorecer a atuação de uma oposição responsável e programática.
Para que isso funcionasse, tal emenda teria de ser discricionária e premiar apenas quem efetivamente votasse de acordo com a orientação de seu líder partidário – seja a favor ou contra o governo. Aos partidos, certamente não é positivo lidar com parlamentares insubordinados.
Em paralelo, seria mais do que desejável que se reduzisse o espaço de outros tipos de emenda, mas dentro de uma lógica bastante realista. O Congresso não aceitará retomar os patamares anteriores a 2015, e o Executivo terá de aceitar essa realidade.
É inegável, portanto, que as emendas parlamentares têm sido desvirtuadas no tamanho e na forma, o que sinaliza um certo esgotamento. É preciso questionar a quem interessa o modelo atual de distribuição desses recursos. Pode parecer que essa barganha sem limites e sem contrapartidas favorece todos os deputados e senadores. Mas quem tem ganhado, de fato, são as presidências da Câmara e do Senado.