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É positivo acordo para indenizar vítimas da tragédia de Mariana

Por Editorial / O GLOBO

 

Próximo de completar nove anos, o maior desastre ecológico da História brasileira enfim é objeto de um acordo razoável. A mineradora Vale e a anglo-australiana BHP Billiton, sócias na Samarco, fecharam na semana passada um entendimento segundo o qual desembolsarão R$ 132 bilhões, além dos R$ 38 bilhões já desembolsados, para compensar os danos provocados pela ruptura da Barragem do Fundão, em Mariana (MG).

 

O desastre, em 5 de novembro de 2015, liberou 43,7 milhões de m³ de lama, volume comparável ao do Pão de Açúcar. O rio de lama contaminada por rejeitos de mineração matou 19 pessoas, atingiu a Bacia do Rio Doce e, depois de percorrer 670 quilômetros, chegou ao mar no Espírito Santo. A população ribeirinha foi atingida, incluindo comunidades de pescadores, que tiveram de parar de trabalhar. Ao todo foram afetados 49 municípios — 38 mineiros e 11 capixabas.

 

Levando em conta as características inéditas do desastre, sua dimensão e a abrangência do entendimento a que se chegou na Justiça, foi positivo o desfecho das negociações que envolveram, além de Vale e BHP, os governos federal, de Minas e Espírito Santo, Ministérios Públicos, Defensorias Públicas e diversas organizações e entidades civis ligadas ao meio ambiente. Como toda reparação, o resultado não trará de volta tudo o que foi perdido. Mas é um desfecho à altura de capítulo tão doloroso.

 

Por meio da Fundação Renova, criada em 2016 como parte de um termo de ajuste de conduta firmado com União, governos estaduais e organismos ambientais, Vale e BHP já destinaram R$ 38 bilhões a 415 mil pessoas, incluindo comunidades indígenas e quilombolas. A estimativa é que, agora, com a extinção da fundação, 300 mil famílias sejam beneficiadas por mais R$ 32 bilhões, transferidos diretamente pela Samarco num prazo de dois anos.

 

A indenização por pessoa é estimada em R$ 35 mil, ante média de R$ 18 mil em casos semelhantes. Para pescadores e agricultores prejudicados, serão destinados R$ 95 mil. Os R$ 100 bilhões restantes serão repassados durante 20 anos ao BNDES, com o objetivo de financiar a recuperação ambiental e projetos apresentados por comunidades locais. Estão previstos recursos para aumentar o custeio da rede do SUS na Bacia do Rio Doce.

 

Com o acordo, ficam extintas no Brasil 181 ações civis públicas, incluindo as por danos morais e danos coletivos. Mas persiste uma ação de reparação impetrada em Londres contra a BHP pelo escritório Pogust Goodhead, em nome de 620 mil atingidos pelo rompimento da barragem. O escritório é especializado em processos relacionados ao direito ambiental e direitos humanos movidos contra grandes conglomerados, e o caso é considerado um dos maiores na Justiça britânica.

 

O julgamento começou na semana passada. O acordo fechado no Brasil, com aval de tantas instâncias públicas e a adesão de tantos afetados, será um trunfo da BHP. Como não será possível às vítimas receber duas indenizações — e a brasileira está assegurada —, o processo britânico tende a se esvaziar.

Norma do CNJ torna mais difícil ‘esconder’ dinheiro após ordem judicial de bloqueio

Por Lavínia Kaucz (Broadcast) / O ESTADÃO DE SP

 

BRASÍLIA - Uma nova norma do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) estabelece que corretoras e distribuidoras de valores mobiliários que não cumprirem ordens judiciais de bloqueio de ativos de clientes poderão ser responsabilizadas pela dívida. A portaria regulamenta o Sistema de Busca de Ativos do Poder Judiciário (Sisbajud), uma ferramenta utilizada por juízes para consultar saldos e bloquear contas de pessoas e empresas devedoras na Justiça.

 

O sistema funciona como uma ponte entre o Judiciário e as instituições financeiras, a quem cabe executar os bloqueios e entregar os dados requisitados pelos juízes. Embora o Sisbajud esteja em uso desde 2020, as regras vigentes até agora eram as mesmas que regiam o sistema anterior, o BacenJud. A nova regra do CNJ foi publicada no último dia 14 de outubro e já está em vigor.

 

A norma determina que as corretoras são responsáveis solidárias pela dívida - ou seja, podem ser cobradas se não efetuarem o bloqueio “imediato e integral” dos valores depositados em seus sistemas. Na avaliação da procuradora Renata de Paula, que representou a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) na edição da portaria, a lei já permite que os bancos sejam responsabilizados em caso de descumprimento de ordens judiciais. De acordo com ela, a previsão específica para corretoras na portaria do CNJ “ocorreu porque eram as instituições que mais precisam de ajustes no procedimento”.

 

“Nos termos do artigo 927 do Código Civil, quem causar dano é obrigado a repará-lo. Ou seja, apesar da previsão expressa para corretoras e distribuidoras, as outras instituições autorizadas pelo Banco Central também podem ser chamadas a responder por prejuízos causados por descumprimento das regras do Sisbajud”, disse a procuradora ao Estadão/Broadcast.

 

Em relação aos bancos, também está prevista a criação de um portal que vai dar publicidade às instituições que descumprirem as ordens judiciais - uma espécie de ranking de bancos inadimplentes. A página deve ser publicada no site do CNJ no ano que vem e vai informar, mensalmente, o rol das instituições e o porcentual de solicitações não respondidas. “Espero que a publicação da inadimplência sirva de incentivo para instituições financeiras se adequarem. Existe a questão de reputação, de ser uma instituição que não cumpre as ordens”, avalia Renata.

 

De acordo com a procuradora, um dos objetivos da regulação é dar mais celeridade aos processos de execução fiscal, entre outras cobranças judiciais. Hoje, as execuções fiscais representam o maior fator de congestionamento do Judiciário - aproximadamente 34% do total de casos pendentes na Justiça - e são pouco eficientes - em torno de 2% do crédito tributário é recuperado.

 

A regulamentação também visa a agilizar o combate a crimes financeiros, como lavagem de dinheiro. “Em processos criminais, a descapitalização é essencial e é preciso um sistema efetivo, moderno, que converse de uma forma ágil com as instituições financeiras”, afirma Renata.

 

Outra novidade é a impossibilidade de transferência dos saldos para “operações compromissadas”. Até então, era comum que os atingidos esvaziassem a conta-corrente, levando os valores para Certificados de Depósito Bancário (CDB) e Recibos de Depósitos Bancários (RDB), por exemplo, para fugir do bloqueio. “Sempre que a ordem batia, vinha negativo. Mas a esperança é que agora não aconteça mais”, diz Renata. A partir da nova norma, esses valores devem ser bloqueados de forma imediata, “independentemente da natureza do negócio jurídico firmado entre a instituição e o atingido”.

 

Nova forma de responsabilidade solidária

Para o advogado Renato Vieira, presidente do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCrim), há dúvidas quanto à “possibilidade legal de se instituir uma nova forma de responsabilidade solidária por força de resolução”. Para ele, a responsabilização das corretoras deveria ser prevista em lei, e não em um ato infralegal.

 

Vieira também avalia que essa responsabilização delega uma atribuição do poder público para as instituições privadas. “Há uma tendência de privatização de uma atividade pública de controle”, disse.

 

Por outro lado, o advogado vê como positivo o “propósito uniformizador” da resolução do CNJ. “Agora temos abrangência muito maior e mais uniforme, abrange bancos, casas de custódia, letras de câmbio, instituições financeiras em liquidação judicial, é mais padronizado”, afirmou.

 

Em nota, a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) disse que o Sisbajud “é um importante e fundamental mecanismo para conferir efetividade às decisões judiciais, pois permite o rápido bloqueio de valores e investimentos”. De acordo com a entidade, no primeiro semestre de 2024 foram R$ 40,8 bilhões, “o que demonstra o total compromisso do setor bancário em dar cumprimento às ordens judiciais”.

 

Procurada, a Associação Nacional das Corretoras de Valores (Ancord) disse que ainda está consultando os associados para formalizar um parecer sobre a regulamentação.

Cobrar imposto de renda de herança antecipada é indevido, decide STF

Escrito por ,/ DIARIONORDESTE

 

A cobrança do Imposto de Renda (IR) na antecipação da herança é indevida. Foi o que entendeu por unanimidade a 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) ao julgar um recurso da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) que queria a incidência do tributo sobre essas doações de bens e direitos, em valor de mercado, feitas por um contribuinte a seus filhos.

 

Ao votar contra a União, o relator do caso, ministro Flávio Dino, destacou que as regras constitucionais visam impedir que um mesmo fato gerador seja tributado mais de uma vez. No caso em questão, a incidência do IR acabaria por acarretar indevida bitributação, pois já há a cobrança do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), de competência estadual.

 

Acréscimo patrimonial do doador 

A decisão se deu a partir de um recurso apresentado contra decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), que negou a incidência do IR no caso. Segundo a PGFN, o imposto deveria ser cobrado em relação ao acréscimo patrimonial do doador ocorrido entre a aquisição dos bens e o valor atribuído a eles no momento da transferência.

 

Em voto apresentado em sessão virtual, Flávio Dino observou que a decisão do TRF-4 é compatível com a jurisprudência do STF pacificada no sentido de que o fato gerador do IR é o acréscimo patrimonial efetivo. Na antecipação legítima da herança, o patrimônio do doador é reduzido e, não, ampliado. Portanto, não se justifica a cobrança do IR.

Com informações da Secretaria de Comunicação Social do STF.

Bolsonaristas buscam STF para entender gravidade de investigação contra Gustavo Gayer

Por  / O GLOBO

 

Interlocutores do PL e de Jair Bolsonaro buscaram alguns ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) para tentar saber qual é a magnitude da investigação que mira um dos principais aliados do ex-presidente, o deputado federal Gustavo Gayer (PL-GO).

 

A nota do PL e os discursos de seus integrantes buscam usar a operação para atacar o STF e, mais uma vez, tentar colar a pecha de autoritarismo na corte. Nos bastidores, porém, parte dos aliados admite que o material da Polícia Federal que veio à tona é consistente e pode causar estragos.

 

Os endereços do parlamentar foram alvos de buscas nesta sexta-feira, em uma operação da PF que investiga um grupo suspeito de desviar recursos públicos da cota de deputado e falsificar documentos. A investigação aponta que Gayer mantém uma escola de inglês e uma loja de roupa com recursos da Câmara. Mensagens interceptadas pela PF mostram que um empresário próximo ao deputado diz ter alertado Gayer sobre irregularidades no uso de verbas parlamentares. A operação foi autorizada pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).

Aliados de Bolsonaro estão preocupados que a imagem do ex-presidente seja chamuscada com a operação contra Gayer.

 

A proximidade de ambos ficou evidente na campanha eleitoral, com o capitão abraçando a candidatura de Fred Rodrigues (PL) em Goiânia, a pedido do deputado federal. O próprio Bolsonaro disse, em diversas ocasiões, que ele e Gayer decidiram juntos que o parlamentar não concorreria ao comando do Executivo da capital goiana, devido ao papel de confronto que exerce na Câmara.

 

Os planos do ex-presidente, inclusive, são de acompanhar o segundo turno em Goiânia ao lado de Gayer e Fred Rodrigues. O deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), no entanto, decidiu dobrar a aposta depois da ação policial e passou a usá-la para pedir votos ao candidato do seu partido.

Todo mundo fala: ‘não sei como a Polícia Federal não pega’, disse servidora do TJ-MS sobre esquema

Por Rayssa MottaPepita Ortega e Fausto Macedo / O ESTADÃO DE SP

 

Conversas obtidas pela Polícia Federal (PF) mostram que o suposto esquema de venda de decisões judiciais no Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, investigado na Operação Último Ratio, era conhecido por atores do Poder Judiciário.

 

A servidora Natacha Neves de Jonas Bastos, assessora do gabinete do desembargador Júlio Roberto Siqueira Cardoso, aposentado em junho, afirma em uma conversa: “Todo mundo fala: ‘ai não sei como que o CNJ não pega, a Polícia Federal não pega’”.

 

A Polícia Federal apreendeu quase R$ 3 milhões em dinheiro vivo nesta quinta-feira, 24, na casa do desembargador.

 

A mensagem foi enviada à juíza Kelly Gaspar Duarte Neves, da Vara Criminal de Aquidauana, ex-diretora da Associação dos Magistrados de Mato Grosso do Sul, após a Operação Tiradentes, deflagrada em fevereiro, quando a PF fez buscas em endereços ligados ao desembargador Divoncir Schreiner Maran, suspeito de receber propina para soltar um traficante no plantão judicial.

 

A servidora tenta obter informações sobre outras investigações que poderiam estar em curso: “Vocês devem saber mais porque eu acho que tem juízes que participam das coisas no CNJ e tal, porque lá em cima o povo não fica sabendo.”

 

Segundo Natacha, “todo mundo lá em cima fala negócio de Sideni, de rolo disso, daquilo, do povo... até do Marcão e tal.” Os desembargadores Sideni Soncini Pimentel e Marcos José de Brito Rodrigues, mencionados na conversa, foram afastados na Operação Última Ratio.

 

A juíza Kelly Gaspar Duarte Neves compartilha informações sobre as investigações envolvendo os desembargadores: “Segundo a gente sabe teria entrado dinheiro lá na conta, mas como desde a morte da primeira esposa dele, do Divoncir, ele criou aquela empresa, então tudo vai pra empresa, eles não movimentam nada pessoa física, mas do escritório, essas coisas.”

 

A magistrada afirma ainda que a Receita Federal quebrou sigilos bancários na investigação. “Então diz que prova tem né, mas o pessoal fala que um dos filhos dele, não sei se é Vando, alguma coisa assim, diz que esse é muito sério, tal, sei lá.”

 

Por fim, a juíza conta sobre suspeitas envolvendo o desembargador Sideni Soncini Pimentel, agora afastado do tribunal. “Do Sideni também tem e... só que sempre pelos filhos, sabe? Sempre pelos filhos. Mas a investigação lá tá há um tempão já no... no CNJ. A gente sabe porque eu fui da Amasul, então a gente meio que é que segura, sabe?”

 

Para a Polícia Federal, as mensagens “apontam que a prática de crimes por desembargadores é de notório conhecimento interno no Judiciário”.

A Polícia Federal acredita que o uso de familiares para negociar a venda de decisões e os pagamentos era praxe no esquema. As suspeitas envolvem sobretudo os filhos dos desembargadores, em sua maioria advogados, que segundo a PF usariam os escritórios para receber os pagamentos sem chamar a atenção dos órgãos de investigação.

 

“As conversas travadas entre a analista judiciária Natacha e a magistrada Kelly corroboram a hipótese criminal levantada no presente inquérito policial, no sentido de que a negociação de decisões judiciais ocorra por intermédio dos filhos dos desembargadores, os quais são, em sua maioria, advogados e sócios de escritórios de advocacia e utilizariam de suas pessoas jurídicas na intenção de burlar os mecanismos de rastreamento do fluxo de dinheiro”, afirma a PF na representação que levou à Operação Última Ratio.

 

Em nota, o Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul informou que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinou “medidas direcionadas exclusivamente a alguns desembargadores, magistrado e servidores” e que elas foram “regularmente cumpridas, sem prejuízo a quaisquer dos serviços judiciais prestados à população e que não afetam de modo algum os demais membros e componentes da Justiça sul-mato-grossense”.

 

“Os investigados terão certamente todo o direito de defesa e os fatos ainda estão sob investigação, não havendo, por enquanto, qualquer juízo de culpa definitivo. O Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul seguirá desenvolvendo seu papel de prestação jurisdicional célere e eficaz, convencido de que aos desembargadores, magistrado e servidores referidos, será garantido o devido processo legal”, diz a nota.

 

Veja quem são os desembargadores e seus filhos investigados:

  • Rodrigo Gonçalves Pimentel e Renata Gonçalves Pimentel, filhos do desembargador Sideni Soncini Pimentel;
  • Fabio Castro Leandro, filho do desembargador Paschoal Carmello Leandro;
  • Marcus Vinicius Machado Abreu da Silva e Ana Carolina Machado Abreu da Silva, filhos do desembargador Vladimir Abreu;
  • Camila Cavalcante Bastos, filha do desembargador Alexandre Aguiar Bastos;
  • Divoncir Schreiner Maran Júnior, Vanio Cesar Bonadiman Maran, Rafael Fernando Ghelen Maran e Maria Fernanda Ghelen Maran, filhos do desembargador Divoncir Schreiner;
  • Diogo Ferreira Rodrigues, filho do desembargador Marcos José de Brito Rodrigues.

O Estadão busca contato com as defesas.

O Supremo e o caminho para a condenação de Jair Bolsonaro

Por Marcelo Godoy / O ESTADÃO DE SP

 

Era 1792. A Convenção examinava se Luís XVI devia ser julgado, quando Maximilien Robespierre disse: “Os povos não julgam como as cortes judiciais; não proferem sentenças, eles lançam o raio; não condenam os reis, eles os mergulham de volta no nada”. O jacobino defendia a execução do rei sem julgamento, pois um tribunal poderia condená-lo ou absolvê-lo e, se Luís fosse absolvido, a revolução estaria condenada. A morte era uma questão de segurança pública. A assembleia rejeitou os apelos, e Luís XVI acabou na guilhotina.

 

Passado o segundo turno das eleições, o STF estará diante do desafio de mostrar ao País que uma eventual condenação de Jair Bolsonaro não se fará por uma medida de segurança, sob o argumento de que se pretende defender a democracia.

 

O Supremo não esqueceu o que houve em 8 de janeiro de 2023. A turba emporcalhou a mesa de Alexandre de Moraes. Queria fechar o Supremo e impor sua vontade ao País, até que seu líder – que a insuflou durante anos contra a ordem, a legalidade e os demais Poderes constituídos – voltasse de Miami. E não se diga que era um crime impossível, pois o que vale aqui é o dolo de quem tenta e não a habilidade para executar o delito.

 

O caminho para a condenação de Bolsonaro está traçado. O leitor atento do Blog do Fausto Macedo já deve tê-lo adivinhado. Em 27 de setembro, Moraes deu 60 dias para a PF concluir o inquérito sobre o golpe, que investiga Bolsonaro e seus ministros, o que deve ocorrer em novembro.

 

A decisão aconteceu no mesmo dia em que o ministro Nunes Marques interrompeu com um pedido de vista o julgamento do habeas corpus que deve reinstituir o foro privilegiado para ex-presidentes, ex-ministros e ex-parlamentares. Já há maioria entre os ministros para a volta do foro: seis a favor e dois contrários – Fachin e Mendonça. Faltam votar, além de Marques, Fux e Cármen Lúcia.

 

E assim a polêmica sobre quem deve julgar os casos de Bolsonaro – joias, vacinas, golpe – deve acabar. Eles ficarão no STF. Agora, a 1.ª Turma do STF indeferiu o pedido da defesa do ex-presidente para a devolução de seu passaporte. Alegou-se o risco de fuga. Para quem sugere se tratar de perseguição, é preciso lembrar: Lula ficou 580 dias preso e não fugiu. Bolsonaro foi dormir na embaixada da Hungria ao se sentir ameaçado.

 

Está a se abrir o caminho às denúncias de Gonet, quando se tomará conhecimento das provas existentes ou não contra o ex-presidente. Chegará, então, o momento decisivo, aquele em que o País deve afirmar que precisa da Justiça das Cortes e não a dos jacobinos – como não quis a dos golpistas. É preciso que Bolsonaro seja julgado por uma sentença e não por um raio.

Foto do autor
Análise por Marcelo Godoy

Repórter especial do Estadão e escritor. É autor do livro A Casa da Vovó, prêmios Jabuti (2015) e Sérgio Buarque de Holanda, da Biblioteca Nacional (2015). É jornalista formado pela Casper Líbero.

STF forma maioria para proibir revista íntima em presídios

DIARIONORDESTE

Na ocasião, seis ministros votaram indicando que esse tipo de visita é vexatória e ilegal, pois viola a dignidade humana e que, por isso, as provas derivadas das medidas íntimas devem ser nulas. 

Outros quatro ministros votaram para admitir a busca pessoal como algo excepcional, desde que não vexatória, justificada e com o aval do visitante.

A revista íntima consiste em fazer com que os visitantes dos presos tirem toda a roupa ou parte dela e que tenha as cavidades inspecionadas, como ânus ou vagina.  

Retomada 

O julgamento começou em 2016 e, desde então, já foi suspenso diversas vezes.  Em 2021, a deliberação foi adiada novamente com um pedido de vista do ministro Nunes Marques. 

O recurso voltou à pauta em maio de 2023, quando chegou a cinco votos pela proibição da revista íntima vexatória.

O processo voltou a ser discutido hoje no plenário virtual, após a análise ter sido interrompida em maio deste ano, depois de um pedido de vista do ministro Cristiano Zanin. 

No voto proferido nesta sexta, Zanin acompanhou o relator, ministro Edson Fachin, para vedar as visitas vexatórias. Logo em seguida, a análise do caso foi suspensa mais uma vez. 

Caso analisado

O caso analisado é o de uma mulher absolvida da acusação de tráfico de drogas. Em 2011, foi flagrada na revista do presídio com 96,09 gramas de maconha enroladas em um preservativo e acondicionados na vagina, que seriam levadas ao irmão preso. A Corte julga um recurso para reverter a absolvição da mulher. 

O Ministério Público do Rio Grande do Sul recorreu alegando que a situação cria uma “imunidade criminal”, dando salvo-conduto para aqueles que pretendem entrar com drogas no sistema carcerário. 

Votos 

Gilmar Mendes apresentou uma divergência pontual, alegando que essa decisão só valha para o futuro. A ideia é dar prazo de 24 meses para os estados adquirirem aparelhos de scanner corporal, o que solucionaria os abusos.

Em paralelo a isso, os ministros Alexandre de Moraes, Nunes Marques, Dias Toffoli e André Mendonça entendem que a revista íntima não é, por si só, uma medida ilegal, pois auxilia no controle de segurança das unidades prisionais.

O ministro Luiz Fux ainda não registrou voto. 

As instituições de defesa dos direitos humanos contestam a prática da revista íntima. A Rede Justiça Criminal, que é composta por organizações como Conectas Direitos Humanos, ITTC (Instituto Terra, Trabalho e Cidadania) e IDDD (Instituto de Defesa do Direito de Defesa), solicita que a prática seja declarada inconstitucional.

Elaborado pela Rede em 2021, o relatório ‘Revista vexatória: uma prática constante’, considera o procedimento como “uma das principais violências perpetradas contra familiares de pessoas presas”.

Barroso apresenta regras para fornecimento de medicamentos fora do SUS e cita 'escolhas trágicas'

Constança Rezende / FOLHA DE SP

 

O presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), ministro Luís Roberto Barroso, apresentou junto com a ministra da Saúde, Nísia Trindade, nesta quinta-feira (17), a decisão que fixou as normas para o fornecimento de medicamentos não incluídos no SUS (Sistema Único de Saúde) em casos que vão parar na Justiça.

O tribunal definiu, como regra geral, que o juiz só pode determinar excepcionalmente o fornecimento de medicamento registrado na Anvisa que não constar das listas do SUS, independentemente do custo.

Pela norma, o autor da ação judicial deve comprovar, entre outros requisitos, que não tem recursos para comprar o medicamento, que ele não pode ser substituído por outro da lista do SUS, que sua eficácia está baseada em evidências e seu uso é imprescindível para o tratamento.

Se todos esses requisitos forem cumpridos, caberá ao Judiciário, no caso de deferimento judicial do medicamento, oficiar aos órgãos competentes para avaliarem a possibilidade de sua incorporação no âmbito do SUS.

Barroso declarou que o momento é "muito especial" e que o acordo poderá produzir um "impacto relevante sobre um tema desafiador que cria muitos embaraços à saúde no país".

"O tema representa profunda transformação na forma de atuação de todos os atores envolvidos na prestação de ações e serviços de saúde pelo Estado. O que aqui se conseguiu fazer foi uma importantíssima definição de competências, o que é papel da União, do estado, e do município", declarou.

O ministro também afirmou que a judicialização excessiva de questões da Saúde "passou a ser um dos maiores problemas do Poder Judiciário brasileiro" e que "estamos no âmbito das escolhas trágicas".

"Se tivéssemos uma vara de condão, ou se dinheiro nascesse em árvores, daríamos todos os benefícios possíveis a todas as pessoas e as tornaríamos imortais. Infelizmente, isso não é possível e precisamos fazer essas escolhas, fazer alocações racionais e produzir o que é justo em matéria de medicina", disse.

O ministro disse que o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) monitora a crescente litigiosidade dos temas da saúde pública e privada "com números impressionantes" e que, em algum momento, "teremos um encontro marcado com questões afetas à saúde suplementar".

"Em 2020, registravam-se cerca de 21 mil novas ações judiciais relacionadas à saúde por mês. Já em abril de 2024, esse número triplicou, praticamente, e temos 61 mil novos processos por mês, um aumento de quase 300% em menos de quatro anos. No total anual, o número de processos passou de 347 mil em 2020 para 600 mil atualmente", apontou.

Nísia disse que a cerimônia representava "um marco para o Brasil e para a saúde pública, assegurado em primeiro lugar pela Corte Constitucional", e que a judicialização da saúde "deve ser a exceção, não a regra".

A tese, proposta em um voto conjunto dos ministros Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso, foi levada ao plenário virtual na corte, em julgamento encerrado em 20 de setembro. Ela se baseia em três premissas: a escassez de recursos e de eficiência das políticas públicas, a igualdade de acesso à saúde e o respeito à expertise técnica e à medicina baseada em evidências.

Segundo os ministros, os recursos públicos são limitados e a judicialização excessiva pode comprometer todo o sistema de saúde e que a concessão de medicamentos por decisão judicial beneficia indivíduos, mas produz efeitos que prejudicam a maioria da população que depende do SUS. Por isso, seria necessário estabelecer políticas e parâmetros aplicáveis a todas as pessoas.

De acordo com o voto, a concessão deve estar apoiada em avaliações técnicas à luz da medicina baseada em evidências, e os órgãos técnicos têm conhecimentos especializados para tomar decisões sobre a eficácia, a segurança e a relação custo-efetividade de um medicamento.

Os inquéritos do STF e a salvação da democracia

Por William Waack / O ESTADÃO DE SP

 

 

“Alguém tem de ter o direito de cometer o último erro”, disse o presidente do STF ao New York Times. “Não acho que erramos, mas a última palavra é do Supremo”.

 

Nunca houve dúvidas sobre a última palavra caber ao Supremo — como acontece no Estado de Direito. A questão levantada pelo jornal americano, ecoando o fortíssimo debate brasileiro, é se o Supremo errou. A Suprema Corte brasileira “está salvando ou ameaçando a democracia?”, pergunta a manchete do NYT.

 

Em público, os integrantes da Corte não têm dúvidas de qual seria a resposta e se dedicam à autocelebração. Em privado, admitem que “algumas coisas” foram longe demais. Leia-se: decisões monocráticas de Dias Toffoli, anulando a Lava Jato e suas consequências, e os inquéritos tocados por Alexandre de Moraes.

 

No momento, os ministros têm pouco temor do que possa vir das pautas anti-STF discutidas no Legislativo, pois elas são função da luta política imediata. Ocorre que essa luta vai ser fortemente pautada pelo que acontecerá com os inquéritos que envolvem Jair Bolsonaro.

 

Chegou a hora de se encaminhar para o final desses inquéritos, admitem ministros, o que equivaleria a restringir os poderes excepcionais dos quais faz extensivo uso o ministro Alexandre de Moraes. Significa entregá-los ao procurador-geral da República, o que já deveria ter acontecido há muito tempo — não fosse a desconfiança de alguns dos ministros do STF de que pudessem ser engavetados.

 

O ex-presidente enfrenta quatro grandes investigações: falsificação de cartão de vacina, a posse de presentes que recebeu enquanto chefe de Estado, a “Abin paralela” e, o mais grave de todos, a “tentativa de golpe de Estado” que culminou no 8 de janeiro. Haverá denúncias? E, se houver, em quais inquéritos?

 

O mundo dos operadores do direito em Brasília (esse fluido mix de advogados, ministros das cortes superiores e Ministério Público) considera frágil a base jurídica para denunciar Bolsonaro pelos presentes, pelo cartão de vacina e pela Abin. As opiniões se dividem — e proliferam as dúvidas — sobre o “golpe”.

 

Tomado isoladamente, diz um dos atores relevantes, o 8 de janeiro não poderia ser visto como “golpe de Estado”. Mas o “conjunto da obra” é bem mais complicado — a depender do que a Polícia Federal encontrou dentro dos inquéritos-monstros conduzidos por Moraes. Por enquanto é tudo sigiloso, até mesmo para quem teria de fazer a denúncia. O que só aumenta o peso da questão formulada acima. O problema com essa questão — se o STF está salvando ou ameaçando a democracia — não é a resposta. É ela ter sido feita.

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Opinião por William Waack

Jornalista e apresentador do programa WW, da CNN

O gesto de Lula que irritou os ministros do STJ na campanha por seu favorito

Por  / O GLOBO

 

Um gesto feito por Lula em meio às suas articulações para tentar nomear Rogério Favreto para o Superior Tribunal de Justiça (STJ) irritou integrantes da corte.

 

Durante um jantar realizado no mês passado para ministros do STJ, na Granja do Torto, foi determinado que todos deixassem os celulares longe da mesa. Os aparelhos foram desligados e ficaram em envelopes lacrados. O ato foi alvo de queixas de integrantes do tribunal para membros do governo após o encontro. Magistrados afirmaram que foram surpreendido com o veto do aparelho e que o gesto passou uma mensagem de “desconfiança”.

 

Integrantes do governo e do próprio Judiciário avaliam que Lula errou ao entrar pessoalmente na articulação pela nomeação de Favreto, que acabou fora da lista tríplice votada pelos ministros do STJ. O usual é que o presidente da República escale seus auxiliares para fazer essa articulação junto aos magistrados e não entre em campo diretamente.

 

A avaliação de membros do governo é que a certeza dada por Lula a membros do tribunal sobre a nomeação de Favreto, caso entrasse na lista, foi essencial para que ele fosse excluído.

 

Quando Lula esteve preso no âmbito da Lava-Jato, em 2018, Favreto, como integrante do Tribunal Regional Federal da 4a Região (TRE-4), chegou a determinar sua soltura durante um plantão, mesmo não sendo o relator do caso.

 

Os três desembargadores mais votados na lista do STF foram Carlos Augusto Pires Brandão e Daniele Maranhão Costa, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), e Marisa Ferreira dos Santos, do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3).

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