Fachin acerta ao pregar Supremo longe da política
Por Editorial / O GLOBO
Na cerimônia de posse como novo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Edson Fachin deu o tom que pretende imprimir a sua gestão. “Assumo não um Poder, mas um dever: respeitar a Constituição e apreender limites. Buscaremos cultivar a virtude do discernimento”, afirmou. “Ao Direito, o que é do Direito. À política, o que é da política.” A tônica de seu discurso foi a institucionalidade e o chamado ao diálogo republicano entre os Poderes, sem que o Judiciário fique submetido a populismos. Sua discrição já ficara nítida quando ele recusou qualquer badalação e festa de celebração. É sem dúvida positivo que tente desviar do Supremo os holofotes que, nem sempre com razão, se voltam para a Corte e seus ministros. Mas será preciso agir com determinação quando necessário. O STF não pode se esquivar de enfrentar questões espinhosas que volta e meia acabam por desaguar lá.
Desde a Constituição de 1988, sindicatos, partidos políticos ou ocupantes de altos cargos públicos podem acionar o STF por motivos variados. Na maioria dos países, os processos precisam começar em instâncias inferiores e trilhar longo caminho até o topo, e a maioria das Cortes Supremas costuma exercer apenas controle de constitucionalidade. O arranjo brasileiro é distinto. O Supremo é constantemente chamado a decidir sobre questões as mais diversas, além de funcionar como tribunal penal para as autoridades com prerrogativa de foro. Como presidente do STF, o poder de Fachin está na definição do ritmo daquilo que será votado.
Ele deve exercê-lo com equilíbrio e sensatez. De um lado, como pregou, precisa evitar que o Supremo assuma competências estranhas a seus deveres constitucionais, trilhando o caminho arriscado do ativismo judicial. De outro, é preciso não ser omisso diante das tarefas que se impõem. A mais imediata será a conclusão dos julgamentos relativos à tentativa de golpe de Estado, num momento em que o Judiciário brasileiro é alvo de sanções descabidas dos Estados Unidos. Alas do Congresso têm também lançado desafios constantes ao Supremo. É um quadro que exige temperança e, ao mesmo tempo, firmeza. Foi o que prometeu.
Nos últimos dez anos, Fachin construiu uma reputação de magistrado sério e discreto, em especial pelo papel que assumiu em casos de destaque, como a Operação Lava-Jato ou a ADPF das Favelas. “Fachin é uma pessoa de grande integridade pessoal, preparo técnico e idealismo. O país tem muita sorte de tê-lo na presidência”, afirmou o agora ex-presidente do Supremo Luís Roberto Barroso. “Ele fala por meio dos autos, é um homem muito institucional e que a vida inteira pregou, inclusive em seus votos, uma preocupação muito grande com a proteção do indivíduo”, diz o jurista Álvaro Jorge, da FGV Direito Rio.
Não há como esquecer o protagonismo do STF na defesa da democracia brasileira, antes e depois do 8 de Janeiro. Em 2022, ano das últimas eleições presidenciais, Fachin ocupou a presidência do Tribunal Superior Eleitoral por seis meses e teve papel importante no combate à desinformação sobre as urnas eletrônicas. O tom de sua gestão dependerá em grande parte das circunstâncias. Em qualquer situação, sua missão deverá ser aquela com que se comprometeu e que se espera de todo presidente do Supremo: a defesa da Constituição.