Justiça decreta prisão de ex-diretor da Petrobras Renato Duque para cumprir pena de 39 anos
Catarina Scortecci / FOLHA DE SP
A Justiça determinou que o ex-diretor da Petrobras Renato Duque, condenado no âmbito da Operação Lava Jato, volte para a prisão. A decisão foi assinada no último dia 12 pela juíza substituta Carolina Moura Lebbos, da 12ª Vara Federal de Curitiba.
De acordo com a magistrada, ele ainda deve cumprir uma pena privativa de liberdade de 39 anos, 2 meses e 20 dias, em regime fechado. A pena se refere a quatro condenações que já transitaram em julgado, ou seja, quando não há mais possibilidade de recurso, e envolve crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
O tempo já considera descontos a título de detração e remição, referentes ao período em que ficou preso preventivamente. Ele teve duas passagens pela prisão: entre novembro e dezembro de 2014; e de março de 2015 até março de 2020. Depois, usou tornozeleira eletrônica até abril de 2023.
Duque foi um dos mais longevos presos da operação. Ao longo do período de prisão, ele se propôs a colaborar com a Justiça, confessou ter cometido crime e aceitou abrir mão de R$ 100 milhões em contas no exterior. Também fez acusações contra o hoje presidente Lula (PT).
A juíza determinou a expedição de mandado de prisão com prazo de validade até 14 de outubro de 2037 e pediu que a Polícia Federal adote as providências para que Duque seja encaminhado ao sistema prisional estadual.
A Folha entrou em contato nesta quinta-feira (18) com a PF no Paraná, que informou não ter a confirmação da prisão ainda.
Em nota, o advogado Marcelo Lebre, responsável pela defesa de Duque, disse apenas que irá se manifestar "tão logo tenha acesso à íntegra da decisão" da 12ª Vara Federal de Curitiba, "oportunidade em que serão apontados os diversos pecadilhos ocorridos nos diversos autos de ação penal da famigerada Operação Lava Jato".
No processo, a defesa havia pedido a suspensão da execução da pena até que fossem resolvidas questões apuradas no âmbito da Operação Spoofing, perante o TRF-1 (Tribunal Regional Federal da 1ª Região), e que poderiam "redundar na anulação de condenações proferidas" pela 13ª Vara Federal de Curitiba, responsável pela Lava Jato no Paraná.
A Spoofing é a investigação que tratou do hackeamento de autoridades, o que incluiu as mensagens trocadas entre autoridades da Lava Jato e que mostraram proximidade entre o Ministério Público e o então juiz Sergio Moro.
A juíza de Curitiba, porém, negou o pedido da defesa. "A suposição de que futuro julgamento de outra causa poderá ter consequências diretas sobre o executado não possui, por si só, o condão de suspender, neste momento, a execução de sentenças condenatórias transitadas em julgado", escreveu ela.
Canindé: MPE denuncia vereador, PM e empresário por compra de votos que movimentou quase R$ 500 mil
O Ministério Público Eleitoral (MPE) ofereceu denúncia, na última sexta-feira (12), contra o vereador Antônio Maciel Abreu, mais conhecido como Giovane Lira,do município de Canindé. Além dele, também foram denunciados um cabo da Polícia Militar e um empresário. Eles são acusados de compra de votos nas eleições de 2020 para a Câmara Municipal de Canindé. O MPE não divulgou o nome dos suspeitos, mas o Diário do Nordeste teve acesso à decisão judicial que tornou o grupo réu.
Na representação, o promotor eleitoral Jairo Pequeno Neto aponta que a conduta ilícita movimentou quase R$ 500 mil. O esquema foi identificado a partir de uma outra investigação criminal conduzida pelo Ministério Público no ano passado. "Essa denúncia é fruto de provas colhidas na operação São Francisco, feita em 2023. À época, colhemos elementos que indicaram essa compra de votos nas eleições de 2020", explicou o promotor.
Conforme as provas obtidas, o agente policial atuava como agiota, sendo fonte recorrente de financiamento da campanha do vereador denunciado.
Em troca, o policial cobrava vantagens e esperava benefícios concretos na forma de empregos e contratos na Prefeitura de Canindé. Já o empresário, segundo o MPE, agia como intermediário para obter recursos para a compra de votos e garantir que os acordos eleitorais fossem honrados.
Conforme relatado na denúncia, a compra de votos era planejada e demandava organização e estratégia com antecedência, evidenciando articulado cenário de compra de votos e financiamento ilícito.
ESQUEMA
Para o esquema, os denunciados organizavam reuniões com os eleitores e prometiam ou entregavam as vantagens ilícitas em troca de votos, como transporte de eleitores, fornecimento de kits de motocicletas e pagamento de combustível, de impostos e de documentação de veículos.
Os três homens foram denunciados pelo crime de compra de votos tipificado no art. 299 do Código Eleitoral. Além disso, o vereador foi denunciado pelo crime tipificado no artigo 350 da mesma lei, por omitir a declaração da quantia de quase R$ 500 mil movimentada durante a campanha.
O Diário do Nordeste contactou a Câmara Municipal de Canindé, que disse não ter sido notificada da decisão. A reportagem não conseguiu localizar o vereador.
Fachin prorroga até 11 de setembro prazo para acordo entre governo e Congresso sobre desoneração
Por Lavínia Kaucz (Broadcast) / o estadão de sp
O ministro Edson Fachin, vice-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), prorrogou até 11 de setembro o prazo para o Congresso e o governo federal chegarem a um acordo sobre a desoneração da folha de pagamento de 17 setores. O prazo venceria no próximo dia 19, mas o Ministério da Fazenda e os senadores ainda não chegaram a um consenso sobre as fontes de compensação para financiar o benefício.
Fachin atendeu a um pedido conjunto das advocacias da União e do Senado. Para ele, as partes comprovaram “o esforço efetivo” do Executivo e Legislativo. “Cabe à jurisdição constitucional fomentar tais espaços e a construção política de tais soluções”, afirmou o ministro, que atua no plantão judiciário na primeira metade do recesso da Corte. Ele ainda destacou a relevância do tema pelo “impacto social e econômico dos dispositivos questionados, pois as medidas fiscais afetam setores que mais empregos geram”.
Na petição ao ministro Cristiano Zanin, relator do tema na Corte, a alegação é de que o projeto de lei que fixava as fontes de financiamento tinha previsão de ser levado à votação no último dia 10, “mas não foram concluídas as negociações com o Ministério da Fazenda a respeito das medidas de compensação”. Além disso, o pedido afirma que, com a chegada do recesso parlamentar, os trabalhos no Legislativo serão reduzidos.
“Desse modo, e não obstante o inegável progresso das negociações, a complexidade político-institucional do tema – que envolve minuciosa avaliação das medidas sugeridas pelo Congresso Nacional para a desoneração da folha de pagamento – aconselha a concessão de prazo adicional para a conclusão das tratativas”, afirma a petição.
Em abril, Zanin atendeu a um pedido do governo federal e suspendeu a desoneração. O argumento da AGU, acolhido pelo ministro, era que o Congresso não apresentou os impactos fiscais da medida. Em maio, Zanin congelou os efeitos da liminar por 60 dias e manteve a desoneração até as partes chegarem a um acordo sobre as fontes de compensação da política.
Como Zanin está de recesso, o pedido deve ser analisado por um dos plantonistas da Corte. O vice-presidente Edson Fachin atua no plantão até esta terça, e o presidente Luís Roberto Barroso volta nesta quarta.
Emenda vetada pelo STF sobrevive e chega a 30% dos municípios em ano eleitoral
As transferências de dinheiro público com baixa transparência e sem critério técnico realizadas por meio das chamadas emendas de relator somaram R$ 1,9 bilhão em 2024 e devem ter impacto direto nas eleições em quase 1.700 cidades do país, 30% do total de municípios brasileiros.
Essa forma de direcionamento de recursos federais por deputados e senadores ganhou relevância no governo anterior, de Jair Bolsonaro (PL), foi proibida no fim de 2022 pelo STF (Supremo Tribunal Federal) e continua no governo Lula (PT).
Depois do banimento pelo STF, as emendas de relator foram retiradas dos orçamentos seguintes da União, mas ainda têm aplicação na prática por meio de um mecanismo chamado "restos a pagar".
Trata-se de valores que já haviam sido reservados pelo Executivo antes da decisão do Supremo e que entram como uma espécie de pendência para os anos seguintes.
Em geral, os restos a pagar das emendas de relator são de convênios e obras públicas pagas em parcelas. A liberação dos recursos depende do avanço das obras.
O governo Lula herdou R$ 16,3 bilhões, no Orçamento de 2023, em restos a pagar das emendas de relator.
Em valores absolutos, a cidade do Rio de Janeiro foi a mais beneficiada pelos pagamentos desse tipo de emenda em 2024. Ao todo, a capital fluminense recebeu R$ 68,6 milhões até o dia 9 de julho.
Considerando a população da cidade de 6,2 milhões de residentes, segundo dados do Censo Demográfico de 2022, o recurso equivale a cerca de R$ 11,05 para cada carioca.
A maior parte da verba destinada ao Rio em 2024 foi aplicada em obras na avenida Brasil. O dinheiro para o serviço foi empenhado (reservado no orçamento) em 2020.
A cidade que mais angariou recursos herdados de Bolsonaro, por habitante, foi Cutias, no Amapá. O montante transferido ao município corresponde a R$ 1.576,97 para cada gameleirense. Segundo o Censo, a cidade tem 4.461 habitantes e o valor total recebido de emendas foi de R$ 7 milhões.
Segundo dados do portal orçamentário Siga Brasil, o principal enquadramento oficial usado para justificar as transferências de valores foi apoio à política nacional de desenvolvimento urbano voltado à implantação e qualificação viária, que inclui as obras de pavimentação nos redutos eleitorais dos congressistas, com R$ 554 milhões.
A segunda maior ação governamental que recebeu emendas de relator foi apoio a projetos de desenvolvimento sustentável local integrado à assistência comunitária, que foi responsável por abarcar R$ 462 milhões. Na terceira posição ficou apoio à política nacional de desenvolvimento de infraestrutura urbana com R$ 271 milhões.
As emendas pagas por Lula em 2024 abarcam os três anos de emendas de relator. Do total pago, R$ 680 milhões se referem a emendas apresentadas em 2020, R$ 1 bilhão de emendas de 2021 e R$ 275 milhões de emendas de 2022.
A maior parte do R$ 1,9 bilhão pago pela atual gestão neste ano eleitoral, a um total de 1.697 cidades, foi direcionada para órgãos públicos municipais, que totalizaram o recebimento de R$ 1,6 bilhão.
Na segunda posição estão órgãos públicos estaduais e o Distrito Federal (R$ 143 milhões), seguido de empresas do setor privado com R$ 96 milhões, entidades sem fins lucrativos (R$ 25 milhões) e empresas do setor público (R$ 21 milhões).
Os recursos saíram do orçamento de 25 órgãos do governo, dentre ministérios, fundos e empresas públicas.
A pasta que mais pagou essas emendas foi o Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional, que desembolsou R$ 1,2 bilhão.
Na segunda posição está o Ministério da Agricultura e Pecuária, com R$ 167 milhões, seguido da Codevasf (Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba), com R$ 137 milhões. O Ministério da Defesa está na quarta posição com R$ 104 milhões.
Em junho, o ministro do Supremo Flávio Dino determinou a realização de uma audiência para discutir o possível descumprimento da decisão da corte que declarou a inconstitucionalidade das emendas de relator.
Dino afirmou à época que não havia ocorrido "a comprovação cabal nos autos do pleno cumprimento dessa ordem judicial".
"Friso que todas as práticas viabilizadoras do 'orçamento secreto' devem ser definitivamente afastadas, à vista do claro comando deste Supremo Tribunal declarando a inconstitucionalidade do atípico instituto", ressaltou.
O magistrado marcou a audiência para o dia 1º de agosto.
O repasse de emendas bilionárias com baixa transparência tornou-se um símbolo das negociações entre Congresso Nacional e Planalto durante a gestão Bolsonaro.
As emendas em geral são uma forma pela qual deputados e senadores conseguem enviar dinheiro para obras e projetos em suas bases eleitorais e, com isso, ampliar seu capital político. Como mostrou a Folha, a prioridade do Congresso é atender redutos eleitorais, e não as localidades de maior demanda no país.
Depois que o STF proibiu as emendas de relator, o Congresso contornou o veto e encaixou as verbas em emendas de bancada e comissão, que também não apontam o verdadeiro padrinho político da verba.
Durante a campanha de 2022, Lula chamou as emendas de relator de o "maior esquema de corrupção da atualidade", "orçamento secreto" e "bolsolão".
As negociações por verba, porém, seguem com baixa transparência e sob influência no Congresso dos mesmos atores que atuavam na gestão Bolsonaro. No caso da Câmara, o próprio presidente, Arthur Lira (PP-AL), é um dos responsáveis pela partilha de verbas de comissão.
GOVERNO E CONGRESSO DIZEM QUE CUMPREM DECISÃO DO STF
Em nota enviada pela Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da República, o governo Lula afirmou que "o pagamento de restos a pagar para as emendas de relator tem seguido estrita e rigorosamente o que determinou o Supremo Tribunal Federal".
"Conforme essa decisão, o prosseguimento da execução dos recursos que já haviam sido empenhados está sujeito à discricionariedade da pasta responsável, que pode dar prosseguimento nos casos em que as indicações estivessem de acordo com os critérios das políticas públicas. A responsabilidade pelo cumprimento dessas condições é de cada órgão executor de emendas parlamentares", completou a atual gestão.
Em nota, a assessoria de imprensa da Câmara dos Deputados afirmou que a casa legislativa cumpre a decisão do STF.
"Todas as informações em relação a essas emendas já estavam disponibilizadas na página da Comissão Mista de Orçamento do Congresso Nacional", segundo a assessoria.
A assessoria de imprensa do Senado afirmou que a casa já prestou informações ao STF quanto ao cumprimento da decisão da corte. Em petição ao tribunal, o Senado afirmou que foram "adotadas sucessivas medidas para ampliar a publicidade, a transparência e os mecanismos de controle institucional e social na indicação das emendas de relator-geral, em especial quanto à obrigatoriedade de identificação do parlamentar solicitante ou apoiador".
ENTENDA AS EMENDAS PARLAMENTARES E DE RELATOR
O que são emendas parlamentares?
A Constituição de 1988 autoriza o Legislativo a participar do processo orçamentário. Ela permite, dentro de limites que eles façam emendas na proposta orçamentária anual enviada pelo Executivo. Cada congressista tem direito a apresentar emendas individuais, dentro de certos limites. Bancadas estaduais e comissões permanentes do Congresso também têm direito a emendas
Quais são os tipos de emendas?
As emendas parlamentares se dividem atualmente em:
- Emendas individuais: Cada um dos 594 congressistas tem direito de apresentar até 25 emendas individuais. A execução das emendas era uma decisão política do governo, mas a partir de 2015 o Executivo passou a ser obrigado a executar as despesas previstas por elas
- Emendas de bancadas: É a verba proposta pelas bancadas estaduais. Em 2019, o Congresso ampliou o orçamento impositivo ao aprovar a emenda constitucional 100, tornando obrigatório o pagamento deste tipo de emenda
- Emendas de comissão: São valores propostos pelas comissões permanentes da Câmara dos Deputados e do Senado, e pelas comissões mistas, do Congresso
- Emendas de relator: Usada apenas como forma de corrigir pontuais correções no Orçamento pelo relator da proposta; tornou-se a principal moeda de troca nas negociações do governo de Jair Bolsonaro (PL) e do Legislativo
O que eram as emendas de relator?
Eram uma forma de corrigir eventuais imprecisões na proposta orçamentária anual, feita pelo relator. No governo Bolsonaro, foram usadas para destinar recursos federais a despesas de interesse de deputados e senadores. Suas regras foram alteradas para ampliar o campo de atuação do relator, autorizando o uso das suas emendas para financiar quase todo tipo de despesa.
Qual o problema?
Os recursos separados pelo relator no Orçamento eram distribuídos durante o ano de acordo com indicações dos parlamentares, sem transparência e sem critérios claros para divisão do dinheiro. Elas tinham sido usadas para favorecer deputados e senadores alinhados com o governo e a cúpula do Congresso.
Quando essas emendas foram criadas?
As emendas de relator vêm da Constituição de 1988, a assegurar a participação do Congresso no processo orçamentário. Seu alcance foi ampliado durante o governo Bolsonaro, por iniciativa dos parlamentares e do Executivo.
O que o Supremo decidiu sobre as emendas?
Em 2021, o STF determinou que o Congresso criasse um sistema para divulgação dos patrocinadores e dos beneficiários das emendas do relator. O sistema criado deu mais transparência às emendas, mas ainda oculta muitas informações.
No ano seguinte, a corte declarou a inconstitucionalidade do uso discricionário das emendas de relator. O placar foi de 6 votos a 5 pela derrubada do mecanismo. A decisão também ordenou que os recursos restantes fossem gastos sem vinculação com indicações formuladas pelo Congresso.
PF faz operação sobre 'Abin paralela' e prende agentes que trabalhavam para Ramagem
A Polícia Federal deflagrou nesta quinta-feira (11) a quarta fase da operação sobre a chamada "Abin paralela" e prendeu agentes que trabalhavam diretamente para Alexandre Ramagem, atual deputado federal, pré-candidato do PL à Prefeitura do Rio de Janeiro e ligado ao vereador Carlos Bolsonaro (PL), que também é investigado.
Policiais federais cumprem cinco mandados de prisão preventiva e sete mandados de busca e apreensão, expedidos pelo STF, em Brasília, Curitiba, Juiz de Fora, Salvador e São Paulo.
A Folha apurou que entre os quatro alvos já presos estão um policial federal e um militar cedidos para a Abin e que atuavam com Ramagem. Os outros são influenciadores digitais que trabalhavam para o chamado "gabinete do ódio".
Pela manhã, a PF prendeu Mateus de Carvalho Spósito, Richards Pozzer, Marcelo Araújo Bormevet e Giancarlo Gomes Rodrigues.
Bormevet é policial federal, foi segurança de Jair Bolsonaro (PL) na campanha de 2018 e depois nomeado por Ramagem para comandar o CIN (Centro de Inteligência Nacional), estrutura criada pelo atual deputado na Abin. Já o militar Giancarlo Rodrigues era subordinado a Bormevet na Abin.
O vereador Carlos Bolsonaro é um dos investigados da Operação Última Milha, alvo de apuração por envolvimento no uso do software espião FirstMile pela Abin (Agência Brasileira de Inteligência) no governo Bolsonaro.
A PF investiga se policiais lotados no CIN utilizaram o software de geolocalização e se produziram relatórios sobre ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) e políticos adversários do ex-presidente.
O objetivo seria desarticular a Abin paralela, organização criminosa voltada ao monitoramento ilegal de autoridades públicas e à produção de notícias falsas, utilizando-se de sistemas da agência.
Nesta fase, as investigações apontam que membros dos três Poderes e jornalistas foram alvos de ações do grupo, incluindo a criação de perfis falsos e a divulgação de informações sabidamente falsas.
Segundo a PF, a Abin Paralela também acessou ilegalmente computadores, aparelhos de telefonia e infraestrutura de telecomunicações para monitorar pessoas e agentes públicos.
Os investigados podem responder pelos crimes de organização criminosa, tentativa de abolição do Estado democrático de Direito, interceptação clandestina de comunicações e invasão de dispositivo informático alheio.
O CIN foi criado por um decreto de Bolsonaro, assinado em julho de 2020, que criou novas estruturas dentro do organograma da Abin, à época chefiada por Ramagem.
Durante as investigações, Ramagem negou irregularidades e afirmou, por meio de sua assessoria, que o "departamento de operações, composto exclusivamente de servidores de carreira da Abin, era o único responsável pela gestão, senhas e execução do sistema".
A justificativa para criação do CIN foi planejar e executar "atividades de inteligência" destinadas "ao enfrentamento de ameaças à segurança e à estabilidade do Estado" e assessorar órgãos competentes sobre "atividades e políticas de segurança pública e à identificação de ameaças decorrentes de atividades criminosa".
Servidores da agência e policiais federais próximos de Ramagem e da família Bolsonaro foram colocados em cargos de chefia na nova estrutura, o que fez com que o CIN fosse apelidado de Abin paralela.
O centro foi desmontado pela reestruturação promovida pela atual direção da Abin, já no governo Lula (PT), após a operação da PF que mirou o software espião.
O FirstMile foi utilizado pela Abin entre 2019 e 2021. Ele foi adquirido e ficava "hospedado" em computadores da Diretoria de Operações de Inteligência, mas depoimentos de servidores e documentos de apurações internas da Abin mostram o uso por solicitação de pessoas ligadas ao CIN.
O software de monitoramento foi produzido pela empresa israelense Cognyte —antiga Suntech/Grupo Verint. O FirstMile foi adquirido pela Abin ainda no governo de Michel Temer (MDB) por R$ 5,7 milhões.
Em decisão de janeiro deste ano sobre um servidor que foi alvo de busca pela PF, o ministro Alexandre de Moraes, que autorizou a operação, afirmou que ele era "o responsável pela fiscalização contratual do sistema FirstMile e, mesmo transferido de setor, continuou a realizar consultas pelo Centro de Inteligência Nacional."
"O servidor, ainda, tinha plena ciência da característica intrusiva da ferramenta que questionou, na condição de fiscal do contrato, o fato de a empresa fornecedora ter perdido a eficácia em relação a operadora Tim", dizia a decisão.
A volta da Uber ao Supremo Tribunal Federal
Mariana Cotta / FOLHA DE SP
A Uber regressou ao Supremo Tribunal Federal (STF) para pleitear a suspensão de processos em outras instâncias do Judiciário que discutem a existência de vínculo empregatício entre motoristas e entregadores com as plataformas de transporte.
O pleito foi feito pelos advogados que representam a empresa no final de junho, em um recurso extraordinário que está sob a relatoria do ministro Edson Fachin. A Uber pleiteia que Fachin suspenda os demais processos envolvendo análise de vínculo de trabalho com aplicativos enquanto se aguarda o desfecho do caso principal na corte.
A compreensão de que o indivíduo se converte em empreendedor, trabalhando por sua conta e risco e sem direitos trabalhistas —estes apontados como causadores de desemprego— foi flexibilizada, sob uma perspectiva autodenominada de liberal. E o tema chegou além-mar.
Meses após promulgarmos a nossa reforma trabalhista, a França promulgou a sua, para desregulamentar o mercado de trabalho. Ultrapassado o fordismo, em que o sistema de trabalho se tornou metódico e especializado, chegamos à fase da uberização, em que o trabalhador se converteu em empreendedor, com o direito de se associar a algum aplicativo e dirigir seu veículo por 10 ou 16 horas, sem férias ou outras garantias.
A normatização legal cede espaço a negociações entre as partes, já que a ideia de Estado tem se tornado demodê. São os novos tempos.
Como o mercado de trabalho tem se tornado cada vez mais global, a flexibilização de um impõe a flexibilização dos demais. Já que as empresas concorrem entre si sem limites territoriais, a ausência de normas trabalhistas impõe concorrência desequilibrada a quem ainda as possui.
A própria Organização Internacional do Trabalho já reconhece, no preâmbulo de sua constituição, esse fenômeno: "A falha de qualquer nação em adotar um sistema de trabalho verdadeiramente humano dificulta os esforços de outras nações que desejam melhorar o destino dos trabalhadores em seus próprios países".
Se o século 20, com suas crises e guerras, foi alcunhado de a "era dos extremos" por Eric Hobsbawm, caminhamos para definir o século 21 como a "era sem extremos", em que o terceiro mundo passou a ser modelo para o primeiro, igualando-o em nossa miséria.
Em 2022, o jornal The Guardian publicou que um ex-funcionário da Uber revelou ter participado de um sistema de lobby voltado à erosão de direitos trabalhistas e manipulação da opinião pública em diversos países. A investigação, levada a cabo pelo jornal britânico conjuntamente ao Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ), analisou mais de 124 mil documentos, culminando com as declarações de Mark MacGann, que admitiu que "a abordagem da empresa nesses lugares era essencialmente quebrar a lei, mostrar o quão incrível era o serviço da Uber e depois mudar a lei. Meu trabalho era construir relações com o mais alto nível do governo e negociar".
Diversos países foram objeto desse lobby. Há documentos apontando a relação com funcionários do governo Barack Obama, com o Partido Conservador do Reino Unido, com a Comissão Europeia, além de um diálogo com o então ministro e atual presidente francês, Emmanuel Macron.
Coincidência ou não, à época da atuação de MacGann diversas reformas trabalhistas eclodiram mundo afora.
A lei 13.429/2017, conhecida por Lei da Terceirização, ao lado de atualizações normativas importantes, inaugurou, em terra brasilis, essa nova compreensão, em que o indivíduo se converte em empreendedor, estando por sua conta e risco.
TENDÊNCIAS / DEBATES
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.
STF tem de preservar a reforma da Previdência
O Supremo Tribunal Federal está perto de invalidar dispositivos importantes da reforma da Previdência Social aprovada em 2019. Interrompido por pedido de vista do ministro Gilmar Mendes, o julgamento deve ser retomado em breve, com riscos graves para os sistemas de seguridade que cobrem os servidores públicos.
O custo potencial de 15 ações em análise na corte (duas ainda não levadas a julgamento) chega a R$ 497,9 bilhões. Tema particularmente sensível é a contribuição progressiva do funcionalismo, cuja eliminação traria perdas de R$ 300 bilhões em dez anos —no cálculo de Paulo Tafner, citado em reportagem do jornal Valor Econômico.
Em relação a esse caso, o placar no STF está empatado em 5 a 5, e a conclusão depende do voto do ministro Gilmar Mendes.
A controvérsia diz respeito ao dispositivo da reforma que instituiu alíquotas crescentes, de 7,5%, para remunerações de um salário mínimo, até 22%, para vencimentos acima de R$ 52 mil.
A norma, cujo princípio é correto e segue a lógica progressiva do Imposto de Renda, é ainda mais relevante no regime deficitário dos servidores —cujos benefícios, sobretudo os mais elevados, não guardam historicamente consistência com as contribuições.
Caso a cobrança seja derrubada, volta a valer a contribuição linear de 11%, que é insuficiente para custear as aposentadorias em qualquer análise atuarial séria.
O custo dos rombos em sistemas privilegiados ante o regime geral do setor privado (RGPS) não pode ser repassado à coletividade. Não há nada juridicamente errado com a cobrança progressiva nem se sustenta a premissa de confisco para quem recebe vultosos montantes, não acessíveis no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS)
Outro ponto em julgamento é a possibilidade de cobrança de contribuição sobre aposentadorias acima de um salário mínimo no caso de déficit atuarial. Antes da reforma, havia imunidade tributária para aposentadorias até o teto do RGPS, hoje em R$ 7.786 mensais.
Sobre este tema o STF já tem maioria de 6 a 4 pela inconstitucionalidade, embora os magistrados ainda possam alterar o voto.
Deveriam fazê-lo, pois o argumento de isonomia com os trabalhadores privados não deveria ser invocado apenas em partes. Considerando cada sistema em sua integralidade, não há duvida de que o do funcionalismo é mais favorável.
Além das considerações de equidade, os três níveis de governo têm as finanças combalidas, e ampliar o deficit previdenciário traria empecilhos óbvios para a prestação de serviços públicos essenciais. Que o STF, sem prejuízos para a legalidade, preserve a coletividade.
Secretário de Educação de Waguinho é preso em operação contra desvio de verba da merenda escolar em Belford Roxo
Por O Globo — Rio de Janeiro / O GLOBO
O atual secretário de Educação de Belford Roxo Denis de Souza Macedo foi preso na manhã desta terça-feira, em sua casa, no município de Nova Iguaçu. Ele é alvo da operação Fames, da Polícia Federal e do Ministério Público Federal, que combate o desvio de recursos destinados ao Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) no município da Baixada Fluminense. O valor desviado foi de ao menos R$ 6,1 milhões. Além do mandado de prisão contra o secretário, outros 21 mandados de busca e apreensão foram expedidos pela 7ª Vara Federal da Subseção Judiciária do Rio de Janeiro, cumpridos na capital e em cidades da Baixada. Foram apreendidos 300 mil euros (cerca de R$ 1,8 milhão), em espécie, na residência de um dos alvos, em um condomínio de luxo, na Barra da Tijuca.
Cem agentes da PF estão na operação. As fraudes eram realizadas, de acordo com a PF, a partir de sucessivos pagamentos superfaturados, baseados em documentação falsa, destinados a empresas que foram contratadas para fornecer merenda escolar. A investigação revelou ainda que as empresas pagavam vantagens indevidas aos agentes públicos da cidade.
Os investigados poderão responder por uso de documento falso, peculato, corrupção passiva e ativa, além de fraude à licitação e lavagem de dinheiro.
O nome da operação Fames faz alusão à deusa da fome na mitologia romana.
Nunes aponta revelia de Boulos e pede condenação em R$ 50 mil no caso ‘rouba e faz esquema’
ISTOÉ ; ESTADÃO
A defesa do atual prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), pediu reconhecimento de revelia do deputado federal Guilherme Boulos (PSOL) em ação por danos morais movida pelo emedebista depois de o parlamentar acusá-lo de roubar e fazer esquemas na Prefeitura de São Paulo. A revelia ocorre quando o réu é citado, mas não se manifesta na ação para se defender dentro do prazo. Em nota, a assessoria do deputado federal disse Nunes tenta censurá-lo para a população paulistana não saber “a verdade sobre os fortes indícios de corrupção” da atual gestão.
O advogado Amilcar Ribeiro afirma em documento juntado ao processo na última quinta-feira, 4, que Boulos foi citado em sua casa, “onde vem sendo reiteradamente citado em processos promovidos pelo próprio autor”.
O aviso de recebimento positivo é do dia 11 de maio. Ribeiro segue ao afirmar que “o prazo de resposta se esgotou. Houve certificação. O réu foi revel e não incidem as exceções ao efeito da revelia”, citou o defensor. Por decisão anterior, o deputado federal Boulos recebeu 15 dias para se manifestar a partir da citação.
Nunes processou Boulos por uma declaração dada ao podcast Inteligência Ltda no dia 8 de abril deste ano. Na ocasião, o deputado federal respondia sobre a tramitação no Congresso Nacional do projeto que proíbe as “saidinhas” de presos em regime semiaberto.
“Então, assim, é lógico que quem cometeu crime, ainda mais um crime violento: roubou, matou, estuprou, tem que ir para cadeia, como diz a lei. Aliás, isso não é cumprido com muita gente, a começar por algumas pessoas, como o prefeito de São Paulo, que tem roubos claros e está aí, segue governando”, citou Boulos, segundo trecho da petição inicial protocolada pelos advogados de Nunes.
Os advogados do prefeito afirmaram na inicial que ficou claro para todos que Boulos “declarou para milhões de pessoas que Ricardo Nunes rouba na Prefeitura de São Paulo. E a circunstância agravou a ofensa. O réu estava tratando de criminosos que mereciam cadeia e, neste contexto, disse que o autor comete crime como prefeito”. A ação está na 19ª Vara Cível de São Paulo.
COM A PALAVRA, A DEFESA DE GUILHERME BOULOS
A defesa do deputado se manifestará no processo. O prefeito Ricardo Nunes não quer que a população conheça a verdade sobre os fortes indícios de corrupção em sua gestão na cidade de São Paulo e entrou com a ação inicial na Justiça para tentar censurar o deputado. Dentre inúmeros casos, a gestão Nunes gastou mais de R$ 4 bilhões em obras sem licitação com suspeita de superfaturamento e tem contratos de mais de R$ 40 milhões, também sem licitação, com o padrinho da filha do próprio prefeito.
i / ISTOÉ
Cautela na PGR deve deixar denúncia de Bolsonaro para depois das eleições
Por Rafael Moraes Moura / COLUNA DA MALU GASPAR
A cúpula da Procuradoria-Geral da República (PGR) trabalha com uma data-chave para a análise do relatório da Polícia Federal sobre o inquérito das joias e decidir se e quando apresenta denúncia contra os investigados no Supremo. Se uma eventual acusação for aceita pela Corte, Bolsonaro entra no banco dos réus.
De acordo com interlocutores do procurador-geral da República, Paulo Gonet, ouvidos reservadamente pela equipe da coluna, a cúpula da PGR tem uma espécie de prazo informal para decidir se denuncia Jair Bolsonaro, o ex-ajudante de ordens e tenente-coronel Mauro Cid e mais 10 pessoas no inquérito das joias sauditas: 16 de agosto, data do início da propaganda eleitoral.
De acordo com interlocutores do procurador-geral da República, Paulo Gonet, ouvidos reservadamente pela equipe da coluna, a cúpula da PGR tem uma espécie de prazo informal para decidir se denuncia Jair Bolsonaro, o ex-ajudante de ordens e tenente-coronel Mauro Cid e mais 10 pessoas no inquérito das joias sauditas: 16 de agosto, data do início da propaganda eleitoral.
Gonet quer evitar ser acusado de agir politicamente ou que haja um uso político das investigações na campanha, mesmo sabendo que o caso inevitavelmente surgirá nos debates eleitorais por todo o País.
Dessa forma, dizem auxiliares de Gonet, se não denunciar Bolsonaro, Mauro Cid e companhia até 16 de agosto, só o fará depois do período eleitoral, após o resultado do segundo turno – cenário considerado mais provável hoje. Nas palavras de um aliado do PGR, sem “açodamentos”.
Bolsonaro, Mauro Cid e outras 10 pessoas foram indiciadas por crimes como peculato (apropriação de bem público), lavagem de dinheiro e associação criminosa envolvendo um esquema de apropriação irregular de pelo menos quatro kits de joias recebidos por Bolsonaro enquanto ainda era chefe de Estado.
Só os delitos atribuídos a Bolsonaro pela PF possuem penas que podem chegar a 32 anos.
Dentro da cúpula do PL, partido de Bolsonaro, já é dado como certo que a PGR vai denunciar o ex-presidente da República pelos mesmos crimes.
Gonet assumiu o cargo por indicação de Lula, com o lobby nos bastidores dos ministros Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes – Moraes é considerado inimigo público número 1 pela militância bolsonarista e relator das principais investigações que vêm fechando o cerco contra o ex-presidente e seus aliados.
O regimento interno do Supremo Tribunal Federal (STF) prevê que a PGR tem um prazo de 15 dias a partir do recebimento do relatório final da PF, para decidir se denuncia, pede o arquivamento ou se solicita a coleta de mais provas na investigação. Mas essa contagem do prazo só será feita a partir de agosto, com o fim do recesso e o retorno das atividades do STF.
Dentro do STF e na própria PGR, no entanto, se avalia que esse prazo é “impróprio”, ou seja, não obrigatório, porque o Ministério Público Federal é o titular da ação penal. Isso significa que Gonet vai poder usar o tempo que for necessário para formar sua convicção sobre o caso.
Existem antecedentes. Em outubro de 2018, por exemplo, a PF indiciou o então presidente Michel Temer por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso que ficou conhecido como inquérito dos portos, envolvendo supostas irregularidades na edição de um decreto do setor portuário. O emedebista só foi denunciado pela PGR dois meses depois, no apagar das luzes do seu mandato.