Com recuo de Toffoli, Segunda Turma do STF limita decisão que anulou processos de Marcelo Odebrecht
Por Rayssa Motta / O ESTADÃO DE SP
A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta sexta-feira, 6, limitar o alcance da decisão do ministro Dias Toffoli que anulou todos os processos e investigações envolvendo o empresário Marcelo Odebrecht na Operação Lava Jato.
Ficou definido que a decisão não tem efeito imediato sobre investigações e ações abertas a partir do trabalho da força-tarefa da Lava Jato. Isso inclui procedimentos instaurados com base no acordo de delação do empresário. Uma das instituições interessadas no resultado do julgamento é o Ministério Público de São Paulo (MP-SP).
O posicionamento intermediário funciona como uma espécie de “redução de danos”, e neste primeiro momento esvazia a decisão individual de Dias Toffoli, mas os procedimentos derivados de investigações da Operação Lava Jato, incluindo processos que tramitam fora da 13.ª Vara de Curitiba, ainda podem ser anulados. Os casos precisam ser avaliados pelo juiz responsável.
A solução foi costurada após um entrave no plenário virtual. O julgamento estava empatado e o ministro Kassio Nunes Marques, que definiria o placar, apresentou o posicionamento intermediário. Em seguida, Dias Toffoli recuou e aderiu ao voto do colega.
Ao enviar o complemento de voto, Toffoli argumentou que mudou de posicionamento “em razão da dinâmica do julgamento no plenário virtual”. Segundo o ministro, fica mantida a “declaração de nulidade dos atos praticados em desfavor” do empresário, em procedimentos vinculados à Lava Jato, mas o STF não vai mais “determinar o imediato trancamento das persecuções penais instauradas contra ele, devendo essas análises de trancamento serem direcionadas aos respectivos juízos e instâncias competentes.”
Réu confesso, Marcelo Odebrecht fechou acordo de colaboração com a força-tarefa de Curitiba e admitiu propinas a centenas de agentes públicos e políticos de diferentes partidos. Ele era presidente da construtora que leva o sobrenome da família quando a Lava Jato estourou em 2014 e prendeu os principais executivos do grupo. A defesa agora alega que o empresário foi forçado a assinar a delação.
Veja abaixo como votou cada ministro
Dias Toffoli
Toffoli mandou trancar os processos sob a justificativa de que houve “conluio” entre o então juiz federal Sérgio Moro e a força-tarefa de Curitiba. Ele estendeu ao empresário uma decisão que havia beneficiado o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Ao votar, o ministro defendeu a manutenção da própria decisão alegando que não há “razões aptas a modificar o entendimento anteriormente adotado”. Para evitar uma derrota, reajustou o voto e aderiu ao posicionamento intermediário.
Gilmar Mendes
Em seu voto, Gilmar Mendes alegou que a Lava Jato usou “métodos ilegais e abusivos para esvaziar o direito de defesa” do empresário. O decano afirma ainda que Sérgio Moro e Deltan Dallagnol, ex-procurador que coordenou a força-tarefa, “ajustaram estratégias contra ele, semeando os alicerces de sua futura condenação”.
“A investigação, prisão e condenação do agravado decorreram de estratégia concebida, organizada e executada pela força-tarefa da Lava Jato e pelo ex-juiz federal Sérgio Moro para inviabilizar o exercício do contraditório e da ampla defesa pelos seus advogados”, escreveu.
Edson Fachin
O ministro Edson Fachin foi o primeiro a abrir divergência ao voto de Toffoli. Ele considera que as situações de Lula e Marcelo Odebrecht são diferentes e, por isso, a decisão que beneficiou o presidente não poderia ter sido estendida ao empresário.
“Não se pode, a pretexto de pedidos de extensão, examinar pedidos amplos e genéricos sobre as mais variadas investigações decorrentes da operação Lava Jato, (...) sob pena de violação ao juiz natural e as regras de competência, transformando-se este Supremo Tribunal Federal em juízo universal de conhecimento, quando a Constituição Federal não o incumbiu dessa função”, argumentou o ministro.
Embora tenha anulado os processos e investigações envolvendo o empresário, Toffoli manteve a validade de seu acordo de colaboração. Mas, para Fachin, na prática a decisão “esvazia e inviabiliza o prosseguimento de investigações fundadas no próprio acordo ou em outros celebrados por executivos do grupo empresarial Odebrecht”.
“Torna-se nítida, desse modo, a necessidade de se avaliar, com a devida precaução e, caso a caso, no juízo competente, o alcance concreto e específico dos procedimentos criminais atingidos por eventual nulidade suscitada pela defesa, levando-se em consideração a existência de elementos autônomos, como aqueles advindos de acordo de colaboração premiada”, defendeu o ministro.
André Mendonça
Ao acompanhar a divergência aberta por Fachin, o ministro André Mendonça argumentou que, mesmo se ficar comprovado que houve irregularidade nas investigações, não há justificativa para o “trancamento geral de todo e qualquer procedimento”. “Até mesmo porque já consignada a higidez do acordo homologado no Supremo Tribunal Federal.”
Kassio Nunes Marques
O voto do ministro Kassio Nunes Marques foi um meio-termo entre os dois posicionamentos. Ele considerou que os diálogos da Operação Spoofing são suficientes para anular os processos contra o empresário, mas apenas aqueles “vinculados” à Lava Jato, “sem a determinação de trancamento das persecuções penais contra ele instauradas relativamente à aludida operação”.
“Reconhecida a validade do acordo de colaboração premiada, não vejo como afastar a sua aptidão para produzir efeitos perante juízo criminal competente e imparcial. Assim, embora reconhecida a nulidade dos atos processuais praticados pelo Juízo da 13ª Vara Federal de Curitiba, o acordo de colaboração premiada continua a ostentar eficácia, em consequência de sua validade.”
Moraes ordena bloqueio de contas da Starlink, de Musk; multas ao X passam de R$ 20 mi
O ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), decidiu bloquear as contas da empresa Starlink, de Elon Musk, no Brasil. A medida seria uma forma de cobrar multas aplicadas contra a rede social X (antigo Twitter) por descumprir decisão judicial.
A justificativa de Moraes para bloquear as contas de outra empresa é a falta de representação legal do X no Brasil. O grupo de Musk decidiu abandonar o país após o ministro do Supremo determinar a derrubada de contas e aplicar multas diárias de mais de R$ 1 milhão por descumprimento.
A decisão de Moraes, sob sigilo, alega que as duas empresas fazem parte do mesmo grupo econômico por possuírem Musk como dono. As informações foram reveladas pelo G1 e confirmadas pela Folha.
O bloqueio das contas foi decidido por Moraes no último dia 18 —um dia após Musk decidir fechar o escritório do X no Brasil. Pelas contas de funcionários da rede social ouvidos pela Folha, as multas já superam R$ 20 milhões.
Isso porque Alexandre de Moraes fixou multa diária de R$ 1,4 milhão caso o X não derrubasse as contas do senador Marcos do Val (Podemos-ES) e outras seis pessoas. A decisão é do dia 13 de agosto, e a rede de Musk ainda não a cumpriu.
Em sua conta oficial, Elon Musk comentou a decisão de Moraes. Ele disse que o ministro é um "criminoso da pior espécie, disfarçado de juiz" e disse que a esquerda tem apoiado "ditaduras em todo o mundo".
"O tirano @alexandre é o ditador do Brasil", escreveu Musk.
Nesta quarta-feira (28), Moraes também intimou o empresário, via mensagem publicada na rede, a indicar em 24 horas um novo representante da empresa no Brasil. Ele estabeleceu a pena de suspensão das atividades da rede social, caso a medida não seja cumprida.
A intimação de Moraes foi postada pelo perfil do Supremo no próprio X, na qual as contas do empresário na rede e do Global Government Affairs foram marcadas. A publicação foi feita às 20h07 de quarta —e o prazo para a resposta termina na noite desta quinta.
No dia 17, a rede social X acusou o ministro de ameaçar de prisão seus funcionários e, diante disso, anunciou o fechamento do escritório no Brasil.
A empresa afirmou na postagem que encerraria suas operações no país em decorrência da ação do ministro, mas que a rede social continuaria disponível para os brasileiros.
Em sua conta, Musk disse que a "decisão de fechar o escritório X no Brasil foi difícil". "Se tivéssemos concordado com as exigências de censura secreta (ilegal) e entrega de informações privadas de @alexandre, não haveria como explicar nossas ações sem ficarmos envergonhados."
"Não há dúvidas de que Moraes precisa sair. Ter um 'justiceiro' que viola a lei repetidamente e flagrantemente não é justiça nenhuma", afirmou em outra postagem.
Isso aconteceu depois que a rede social publicou o que seria decisão sigilosa de Moraes na qual ele determina a intimação dos advogados regularmente constituídos pelo X no Brasil para que tomem as providências necessárias e bloqueiem contas de usuários da rede.
A Starlink enviou um comunicado aos clientes nesta quarta para comunicar sobre o bloqueio de suas contas e possíveis impactos no serviço. Ela diz que a decisão de Moraes é inconstitucional e que, se necessário, proverá internet gratuita aos usuários.
"A Starlink está comprometida em defender seus direitos protegidos pela Constituição e continuará fornecendo o serviço para você —gratuitamente, se necessário— enquanto lidamos com essa questão por meios legais", diz o texto, enviado por email.
A empresa afirma que recebeu a ordem de Moraes no início desta semana e que, desde então, tem congeladas suas finanças, o que "impede que a Starlink realize transações financeiras no Brasil".
"Esta ordem é baseada em uma determinação infundada de que a Starlink deve ser responsável pelas multas aplicadas —inconstitucionalmente— contra o X, uma empresa não filiada à Starlink", diz.
A Starlink é um projeto de desenvolvimento de satélites da empresa SpaceX. Ela opera satélites de baixa órbita que fornecem internet de alta velocidade e baixa latência. No Brasil, o serviço é utilizado especialmente em regiões remotas e de difícil acesso à rede, como na Amazônia.
Em áreas rurais e alto mar, a Starlink é a única provedora de internet. O custo ainda é baixo e a instalação, facilitada.
A Starlink tem uma constelação de mais de 5,5 mil satélites em baixa órbita (550 km de altitude). Com os equipamentos mais próximos da Terra, o sinal enviado por eles é mais rápido que os satélites comuns.
Empresas concorrentes criticam o domínio do grupo de Musk no mercado de baixa órbita. São dois os principais motivos: a capacidade de reunir informações relevantes de clientes dos seus serviços e a ocupação de parcela relevante da órbita mais disputada no momento, com previsão de envio de mais 40 mil satélites nos próximos anos.
No Brasil, os clientes da Starlink tiveram salto de 23,8 mil a 155 mil no último ano. Os estados que mais utilizam antenas da empresa de Musk são Amazonas (18.778 acessos), São Paulo (18.526) e Minas Gerais (17.641).
No recorte por município, regiões da Amazônia têm destaque. Das dez cidades com mais antenas da Starlink, seis são de estados amazônicos (Roraima, Amazonas e Pará).
A profusão de antenas da Starlink pelo país trouxe benefícios às Forças Armadas, a escolas na Amazônia e a comunidades indígenas. A Marinha conectou seus navios e fragatas, com acesso à internet em alto mar, e lideranças indígenas conseguem trocar informações em tempo real com defensores públicos.
Em contraponto, garimpeiros ilegais passaram a utilizar as antenas do grupo de Elon Musk para auxílio nas atividades criminosas. Passou a ser rotina nas ações do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais) o recolhimento de aparelhos da Starlink durante desmonte de acampamentos do garimpo ilegal na Amazônia.
Intimação de Moraes a Elon Musk via X é atípica e ilegal, avaliam juristas
Por Gabriel de Sousa / O ESTADÃO DE SP
BRASÍLIA - Juristas ouvidos pelo Estadão consideram que a intimação emitida pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes ao X (antigo Twitter) e ao bilionário Elon Musk, por meio da própria plataforma, é atípica e ilegal. Em postagem direcionada ao dono da plataforma, Moraes ordenou que ele informe, em até 24 horas, quem será o novo representante da plataforma no Brasil. Caso isso não seja feito, há o risco da rede social ser suspensa no País.
De acordo com Andre Marsiglia, advogado constitucionalista e especialista em liberdade de expressão, a intimação feita por Moraes é inválida. Segundo ele, o código processual obriga que Musk, um cidadão estrangeiro, receba a intimação por meio de uma carta rogatória, e não por meios eletrônicos.
“Essa intimação tem que ser feita, ainda que no estrangeiro, por meio de carta rogatória e os instrumentos processuais necessários para que eles recebam lá pessoalmente este pedido”, afirmou Marsiglia.
Segundo o especialista, caso Moraes suspenda as atividades do X devido à falta de resposta de Musk, a medida será ilegal. “A suspensão seria ilegal porque essa intimação, feita pelo Twitter, é nula. É como se o Twitter e o representante ilegal não tivessem recebido a intimação. Então seria ilegal qualquer medida decorrente de uma intimação nula”, disse.
O especialista diz ainda que o STF deveria permanecer tentando intimar Musk por meios formais. Apesar disso, Marsiglia acredita que a suspensão da rede social é possível de ser feito, tendo em vista o confronto entre Moraes e o bilionário. Caso o magistrado decida interromper a atuação da plataforma, um ofício será encaminhado para a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel).
Moraes mandou a secretaria do STF intimar o empresário por “meios eletrônicos”. Elon Musk encerrou o escritório no Brasil e não têm mais advogados constituídos no País. A conta institucional do STF no X enviou a intimação por meio da própria rede social, em resposta ao perfil oficial da plataforma. A conta pessoal de Musk também foi marcada na publicação.
Musk é investigado no inquérito nº4.957, que apura supostos crime de obstrução à Justiça, organização criminosa e incitação ao crime. Segundo o STF, em nota, a advogada constituída nos autos também foi intimada, em 18 de agosto.
Ao Estadão, especialistas em direito constitucional e processual afirmaram que intimações, como a feita por Moraes, é atípica. Eles também questionam a validade da notificação do STF e legalidade de uma possível suspensão das atividades da rede social.
STJ já apontou ser inválida citação por redes sociais
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) já se debruçou por algumas vezes sobre o tema, que é considerado controverso. Apesar de uma resolução de 2020 da Corte respaldar a utilização de aplicativos como WhatsApp em tribunais brasileiros, em agosto de 2023, a Terceira Turma da Corte negou provimento a um recurso de uma empresa credora que pretendia que a citação do devedor fosse feita por meio de mensagem eletrônica em suas redes sociais, em virtude da dificuldade de uma citação pessoal.
Os ministros entenderam que a citação por aplicativos de mensagens e por redes sociais não têm nenhuma base legal. Assim, seu uso poderia caracterizar “vício de forma”, o que, em tese, resulta em declaração de nulidade dos atos comunicados dessa forma.
Relatora do recurso, a ministra Nancy Andrighi reforçou, na ocasião, que o Código de Processo Civil já possui a hipótese de citação por edital quando o réu não é encontrado para ser citado pessoalmente.
“O STJ entende não ser possível, mas a última palavra cabe ao Supremo, que pode causar uma mudança de orientação jurisprudencial do STJ e dos demais Tribunais do país, causando uma gigante insegurança jurídica”, explica Thiago Pádua, especialista em direito constitucional.
Intimação por Twitter não assegura que investigado recebeu a ordem
Para Ludgero Liberato, especialista em direito processual, a intimação por rede social não dá garantias do recebimento por parte do destinatário da ordem.
“É preciso que haja certeza inequívoca de que a pessoa recebeu, e de que a pessoa que está do lado de lá é pessoa no qual você está tratando. A intimação do Twitter não assegura, de forma cabal, que o Elon Musk vai ter ciência disso”, afirmou.
Liberato analisa ainda que, caso Musk permaneça em silêncio e não haja uma comprovação de que ele está ciente da determinação do STF, a ação não poderá ser validada.
“Se ele se permanecer em silêncio ou se você tiver dúvidas, essa intimação não tem como ser tido como válida. Existe formalidades que devem ser feitas para enviar intimações para pessoas que moram fora do País”, completou o especialista.
Moraes intima Musk em tuíte para que X indique representante, sob pena de suspensão
José Marques / folha de sp
O ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), intimou nesta quarta-feira (28) o empresário Elon Musk, dono da rede social X (o antigo Twitter), a indicar em 24 horas um novo representante legal da empresa no Brasil, sob pena de suspensão das atividades da rede social.
A intimação foi feita em postagem na página oficial do Supremo do próprio X, na qual o perfil do empresário e do Global Government Affairs da rede social foram marcados.
Na decisão, Moraes determina a Musk "a indicação, em 24 horas, do nome e qualificação do novo representante legal da X Brasil, em território nacional, devidamente comprovados junto à Jucesp [Junta Comercial do Estado de São Paulo]".
Caso não apresente um representante legal, diz o ministro, a rede social será suspensa "até que as ordens judiciais sejam efetivamente cumpridas e as multas diárias quitadas".
No dia 17, a rede social X acusou Moraes de ameaçar de prisão seus funcionários e, diante disso, anunciou o fechamento do escritório no Brasil.
A empresa afirmou na postagem que encerraria suas operações no país em decorrência da ação do ministro, mas que a rede social continuaria disponível para os brasileiros.
Em sua conta, Musk disse que a "decisão de fechar o escritório X no Brasil foi difícil". "Se tivéssemos concordado com as exigências de censura secreta (ilegal) e entrega de informações privadas de @alexandre, não haveria como explicar nossas ações sem ficarmos envergonhados."
"Não há dúvidas de que Moraes precisa sair. Ter um 'justiceiro' que viola a lei repetidamente e flagrantemente não é justiça nenhuma", afirmou em outra postagem.
Isso aconteceu depois que a rede social publicou o que seria decisão sigilosa de Moraes na qual ele determina a intimação dos advogados regularmente constituídos pelo X no Brasil para que tomem as providências necessárias e bloqueiem contas de usuários da rede.
Na decisão judicial publicada pela empresa, Moraes narra a tentativa do oficial de Justiça de comunicação com a rede social, para que cumprisse outra determinação, de bloqueio de contas de usuários, do dia 7 deste mês. Aplicou então multa de R$ 50 mil e intimou quem acreditava ser o administrador da empresa no Brasil, Diego de Lima Gualda.
Posteriormente, narra, tomou conhecimento de que Gualda não era mais o representante da empresa no Brasil. O oficial de Justiça teria entrado em contato com uma profissional de relações públicas da empresa, que pediu a formalização da demanda por email.
O encerramento das operações do X no Brasil dificultou ainda mais o cumprimento de decisões judiciais, uma vez que não haverá representantes no país para serem notificados.
Por essa falta de representante legal, Moraes decidiu intimar pela própria plataforma, em publicação feita pelo perfil do STF no X.
A situação pode se assemelhar a casos recentes de outras plataformas, como o Telegram, que vinha escapando de ordens e pedidos de autoridades brasileiras, inclusive do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e do STF, que faziam tentativas de contato sobre demandas envolvendo publicações na rede social, no período eleitoral.
O dono da rede social é investigado em um inquérito que apura suspeitas de obstrução de Justiça, organização criminosa e incitação ao crime. Essa investigação é um desdobramento do chamado inquérito das milícias digitais.
À época da inclusão de Musk em inquérito, em abril, Moraes disse que a medida se justificava pela "dolosa instrumentalização criminosa" da rede, em conexão com os fatos investigados nos inquéritos das fake news e dos atos antidemocráticos.
Ele tinha determinado ainda que a provedora da rede X devia se abster de realizar qualquer reativação de página cujo bloqueio foi determinado pelo STF, sob pena de multa diária de R$ 100 mil por perfil e responsabilidade por desobediência à ordem judicial dos responsáveis legais pela empresa no Brasil.
Naquele período, Musk vinha fazendo uma série de posts relacionados ao Brasil. Ele disse que estava "levantando restrições" impostas por decisão judicial de sua rede e defendeu que Moraes deveria renunciar ou sofrer impeachment.
Alexandre de Moraes ataca de novo
Por Notas & Informações / O ESTADÃO DE SP
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes parece não ter ficado satisfeito em instrumentalizar o poder de polícia do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para aumentar ainda mais o seu capital político-institucional, chamemos assim, como uma espécie de plenipotenciário guarda-costas do Estado Democrático de Direito no Brasil.
Após o jornal Folha de S.Paulo ter publicado o teor de conversas envolvendo Moraes e assessores que sugerem aquela instrumentalização, o ministro não só determinou ex officio a abertura de um inquérito para apurar o vazamento do conteúdo ao matutino, como ainda se pôs a presidir a investigação – sigilosa, por óbvio, como é de seu feitio.
Diante de mais essa mixórdia de papéis promovida por Moraes ao arrepio do devido processo legal, a defesa de um dos envolvidos nas conversas, Eduardo Tagliaferro, pediu ao presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, que Moraes fosse impedido de seguir como relator do inquérito, haja vista o seu “nítido interesse na causa”. Barroso indeferiu o pedido do ex-servidor do TSE sustentando que, nas mensagens, não havia indícios de parcialidade de Moraes capazes de comprometer a sua permanência à frente do caso.
No dia 25 passado, Moraes determinou que a Secretaria Judiciária do STF procedesse à reautuação do inquérito sobre o vazamento, agora como uma simples petição – uma “PET”, no jargão técnico da Corte. Na prática, trata-se de algo próximo a um rebaixamento, pois um inquérito, a rigor, deixou de existir do ponto de vista formal. O busílis é que, no mesmo despacho, o ministro determinou que a tal “PET” fosse “distribuída por prevenção ao Inquérito 4.781″, o chamado inquérito das fake news, que, ora vejam, é relatado pelo próprio Moraes.
Não se pode condenar quem veja nessa manobra uma forma de Moraes responder às críticas que tem recebido por sua atuação opaca à frente dos inquéritos mais sensíveis sob sua relatoria no STF. Consta que a enorme concentração de poder pelo ministro na condução dos infindáveis inquéritos das fake news, das milícias digitais e dos atos antidemocráticos tem incomodado cada vez mais alguns de seus pares na Corte, ainda que, publicamente, tanto o STF como a Procuradoria-Geral da República (PGR) sejam enfáticos na defesa de Moraes.
Todo esse apoio incondicional, no entanto, começa a ficar constrangedor, para dizer o mínimo, diante de evidências cada vez mais consistentes de que Moraes parece crer que vale tudo em nome de uma suposta defesa do Estado Democrático de Direito, até mesmo atropelar os ritos processuais mais comezinhos. A produção de provas contra suspeitos de atentar contra a democracia fora do processo regular, como sugerem as conversas entre Moraes e seu principal auxiliar no STF, o juiz instrutor Airton Vieira, e entre este e Tagliaferro, estaria coberta por esse manto de sacralidade democrática na defesa do País contra o golpismo bolsonarista.
É disso que Moraes tem se valido para contestar até mesmo seus críticos de boa-fé, que jamais devem ser confundidos com os verdadeiros inimigos da democracia que detrataram a mais alta instância do Poder Judiciário com o claro objetivo de minar sua legitimidade como guardiã da Constituição “cidadã”.
Exposto o seu peculiar método de intercâmbio de informações entre o STF e o TSE, Moraes se apressou em associar o vazamento a uma suposta ação insidiosa de “organização criminosa” que, em sua visão, teria como objetivo desestabilizar as instituições, fechar o STF e restaurar a ditadura no País. Nada menos.
Concretamente, é forçoso dizer, se há algo em curso no País que pode, de fato, desestabilizar as instituições e, no limite, ameaçar o Estado Democrático de Direito é a atitude monocrática do ministro Alexandre de Moraes e a sua aparente incapacidade de reconhecer erros na condução de inquéritos sigilosos que há muitíssimo tempo já deveriam ter sido encerrados.
Tamanha concentração de poder em uma autoridade ou instituição é diametralmente oposta ao ideal republicano fundamental. Ao agir como se pairasse acima do bem e do mal por força exclusiva de suas eventuais virtudes morais ou boas intenções, Moraes avilta o próprio Estado Democrático de Direito que ele jura defender.
PF rebate Nunes, cita vídeo e justifica pedido para seguir investigação sobre máfia das creches
A Polícia Federal listou à Justiça uma série de suspeitas a apurar sobre eventual participação do prefeito Ricardo Nunes (MDB) na máfia das creches, incluindo um vídeo em que uma investigada no caso cita que ele recebeu repasses desviados de unidades de ensino.
Conforme a Folha revelou, PF decidiu no mês passado dar continuidade a um inquérito sobre o caso, que tem como um dos objetivos apurar suspeitas de lavagem de dinheiro pelo atual prefeito quando ele ainda era vereador da cidade. A PF aguarda autorização da Justiça para prosseguir na apuração.
A defesa de Nunes, por sua vez, entrou com pedido de arquivamento. Os advogados do prefeito afirmam que a PF decidiu dar continuidade ao inquérito justamente no período eleitoral, após cinco anos de investigações, e que repete agora o que o Ministério Público de São Paulo já havia feito antes, tendo concluído pela inexistência de irregularidades sobre os mesmos fatos.
No despacho em que a PF insiste na continuidade da apuração, ela afirma que pode ser necessária a quebra de sigilo bancário e fiscal "das principais pessoas físicas e jurídicas envolvidas, a fim de rastrear o recebimento e o destino dos recursos recebidos", incluindo cartões de crédito.
O documento não menciona detalhes de quais pessoas seriam alvo para não alertar eventuais investigados.
A corporação rebate as afirmações da defesa de Nunes e, além de pontos não elucidados, cita o vídeo revelado pela Folha no mês passado em sua justificativa para continuidade do caso.
Nunes sempre afirmou que repasses a ele e a uma empresa de sua família eram referentes a pagamentos de serviços de dedetização. Rosângela Crepaldi, em vídeo, contradiz essa versão.
"Foi repasse", disse. "[Nunes] nunca prestou nenhum serviço", completa, em trecho de vídeo obtido pela reportagem. Segundo nota do advogado dela, William Albuquerque de Sousa Faria, ela "produziu o referido vídeo por razões de segurança, sem a intenção de torná-lo público".
De acordo com a manifestação da PF, "após a elaboração do relatório conclusivo, soube-se pela mídia que Rosângela Crepaldi dos Santos, que ficou em silêncio em sede policial, teria gravado um vídeo em que afirma que empresas de Ricardo Nunes teriam recebido dinheiro das creches sem terem prestado quaisquer serviços".
Conforme a Folha revelou em 2021, Nunes e uma empresa de sua família, a Nikkey Serviços S/S Ltda, receberam em 2018 valores de uma firma chamada Francisca Jacqueline Oliveira Braz, tida pela polícia como suspeita de ser uma grande "noteira" (fornecedora de notas) da máfia das creches.
Segundo documento da Justiça Federal obtido pela reportagem, foram dois cheques no valor de R$ 5.795,08 cada um para Nunes em fevereiro daquele ano, revelados após quebra de sigilo bancário.
Ainda de acordo com o documento, a suposta empresa "noteira" enviou outros R$ 20 mil à Nikkey, companhia de controle de pragas em nome da mulher do prefeito, Regina, e de uma filha dele de relacionamento anterior, Mayara.
"Por si só, esse fato merece uma apuração mais aprofundada ou, se a defesa preferir outro nome,
continuidade das investigações", afirma o despacho.
A PF enumera uma série de perguntas sobre relações de Nunes com a entidade Acria (Associação Amiga da Criança e do Adolescente), que gere creches conveniadas da prefeitura na zona sul de São Paulo com a qual Nunes tem proximidade. A então presidente da entidade, Elaine Targino, também seria funcionária da empresa Nikkey, segundo a PF.
Entre os pontos questionados estão por que Nunes recebeu o dinheiro na própria conta e por que manteve uma empresa no nome de familiares.
Em sabatina realizada pela GloboNews nesta terça-feira (28), o prefeito de São Paulo e candidato à reeleição voltou a negar qualquer envolvimento no esquema, afirmando que já prestou esclarecimentos sobre o caso e que foi considerado inocente.
A jornalista Daniela Lima pontuou que Ricardo Nunes não apresentou documentos suficientes para comprovar a narrativa de que o dinheiro era relativo aos serviços prestados pela empresa de sua família. O prefeito respondeu que isso era "um engano", afirmando que apresentou todos os documentos ao Ministério Público.
Um funcionário da empresa citado teria afirmado que os recebimentos se davam por meio de boletos, desconhecendo pagamentos por cheques, transferências e notas fiscais.
Além disso, a polícia diz querer entender por que empresas chamadas noteiras devolveram valores à Acria em dinheiro que ultrapassaram R$ 1,5 milhão e para onde foi esse dinheiro.
A PF classifica como agressiva a petição da defesa de Nunes e defende a investigação feita até agora, citando 116 indiciamentos. Segundo o documento, as investigações também ocorreram sob o mais rigoroso sigilo, o que incluiu quando Nunes prestou depoimento por meio de vídeo-chamada.
A petição da defesa diz não haver indiciamento de Nunes e que as justificativas trazidas para o pedido de desmembramento da PF não apresentam novidades, além de haver excesso de prazo. Também afirma que a manutenção do inquérito proporciona uso eleitoral contra Nunes.
A coordenação jurídica da campanha de Nunes afirmou nesta terça (27) que "o delegado da Polícia Federal pede à Justiça agora, depois de 5 anos e a um mês da eleição, o que o Ministério Público de São Paulo já fez em 2021". "E, aliás, determinou o arquivamento do inquérito civil público sobre os mesmos fatos, externando a inexistência de qualquer irregularidade ou ilicitude por parte de Ricardo Nunes e sua família", acrescenta.
Antes disso, a defesa também havia enviado um pedido de exclusão do vídeo citado na reportagem da Folha. A ação do prefeito inicialmente trazia para exclusão links de reportagens da Folha, que revelou o caso, e outros veículos de comunicação, como Metrópoles, Carta Capital e Poder 360.
Posteriormente, porém, a defesa de Nunes recuou e mandou à Justiça um pedido de retificação do material no qual afirma não solicitar a retirada do ar de material jornalístico e sim dos que faziam uso político e eleitoral dele nas redes sociais
Nunes nega qualquer irregularidade e diz nunca ter sofrido qualquer acusação no inquérito no qual Rosângela foi investigada. Também afirma que causa perplexidade o vídeo ser divulgado a dois meses das eleições e que as declarações serão analisadas pela defesa do prefeito para que ela responda por denunciação caluniosa.
Ministra do TSE nega recurso do PDT e autoriza desfiliação de deputados aliados de Cid Gomes
Escrito por
A ministra Isabel Gallotti, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), negou o recurso apresentado pelo diretório do PDT Ceará e pela Executiva nacional da sigla contra a desfiliação de um grupo de deputados cearenses da legenda. Os parlamentares são aliados do senador Cid Gomes (PSB), que deixou os quadros pedetista e se filiou ao PSB em fevereiro deste ano.
A magistrada reconheceu, em decisão publicada nesta segunda-feira (26), que houve grave discriminação pessoal contra os deputados estaduais e suplentes por parte do diretório nacional do PDT e validou a desfiliação sem perda do mandato.
Na prática, a decisão beneficia os seguintes deputados:
- Tin Gomes;
- Antônio Granja;
- Bruno Pedrosa;
- Guilherme Bismarck;
- Guilherme Landim;
- Helaine Coelho (suplente);
- Salmito Filho;
- Jeová Mota;
- Lia Gomes;
- Marcos Sobreira;
- Oriel Nunes;
- Osmar Baquit;
- Romeu Aldigueri;
- Sérgio Aguiar.
“Entendo que a criação de obstáculos para expedir carta de anuência a margem do estatuto e a inativação indevida do órgão estadual configuram grave discriminação pessoal apta a justificar a desfiliação dos recorridos do PDT”, escreveu a ministra na decisão.
Gallotti considerou que a manobra do diretório nacional de inativar o diretório do PDT Ceará foi arbitrária e justifica a ruptura do vínculo partidário por parte dos deputados e suplentes. Ela também considerou irregular a tentativa da Executiva nacional de avocar a competência exclusiva para autorizar a desfiliação partidária.
A decisão da ministra confirma o veredicto do Pleno do Tribunal Regional Eleitoral do Ceará (TRE-CE), em abril deste ano, que validou a decisão de parte da bancada pedetista de deixar o partido sem a perda de mandato.
Racha do PDT
A decisão judicial desta segunda-feira ressoa o racha interno enfrentado pelo PDT desde as eleições de 2022. À época, a legenda se dividiu entre aqueles que queriam apoiar a candidatura de Roberto Cláudio (PDT) ao Governo do Ceará e os que preferiam a candidatura à reeleição de Izolda Cela (então no PDT, mas atualmente no PSB).
Com a escolha de Roberto Cláudio, a queda de braço entre as duas alas continuou intensa até o início deste ano, quando o grupo que apoiava Izolda decidiu se filiar ao PSB.
Nesse meio tempo, Cid Gomes chegou a comandar o diretório do PDT Ceará e concedeu cartas de anuência aos deputados insatisfeitos. Os documentos foram revogados pela Executiva nacional da sigla, contudo, as decisões judiciais têm reconhecido a “grave discriminação” contra os parlamentares e autorizado a saída deles.
Os presidentes do PDT Ceará, Flávio Torres, e do PDT Nacional, André Figueiredo, foram procurados pela reportagem, mas não houve retorno.
Plataforma X ignora decisão judicial sobre perfis de Marçal e expõe desafios na fiscalização de campanhas nas redes
Por Matheus de Souza, Hyndara Freitas e Bernardo Mello— São Paulo e Rio/ O GLOBO
A suspensão de perfis em redes sociais do ex-coach Pablo Marçal (PRTB), candidato à prefeitura de São Paulo, expôs brechas na legislação e dificuldades para fiscalização de campanha irregular, fatores que voltam a preocupar a Justiça Eleitoral e especialistas nas eleições deste ano. Além das suspeitas de desembolso de recursos não declarados para remunerar influenciadores, o caso de Marçal envolve a criação de contas reservas que o mantêm ativo nas redes — no X, o antigo Twitter, a decisão judicial de suspender seu perfil oficial sequer foi cumprida.
Há também dúvidas sobre os critérios das plataformas para limitar ou não a distribuição de conteúdo político, já que parte desse controle depende de uma autodeclaração que não é seguida por todos os candidatos.
A dificuldade de garantir que as campanhas nas redes sociais sigam determinadas balizas legais repete uma tônica das eleições de 2018 e de 2022. No primeiro caso, houve episódios de disparo massivo de mensagens, com desinformação e ataques a rivais, o que levou o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) a estabelecer regras para coibir o financiamento a esta prática. Já na última eleição, a Corte ordenou a remoção de conteúdos com uma fala do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) sobre imigrantes venezuelanas, e outros que associavam o atual presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a uma facção criminosa; ainda assim, ambos os materiais se replicaram rapidamente nas redes.
Em 2024, um novo desafio é a limitação imposta pela Meta, responsável por Facebook e Instagram, à distribuição de conteúdo classificado como “político”. No início do ano, a empresa parou de recomendar esse tipo de conteúdo a usuários, que, em tese, passariam a só ter acesso a postagens políticas de perfis que já sigam.
Na prática, porém, o primeiro “sarrafo” para decidir quem atende ou não os critérios é uma autodeclaração. Em São Paulo, por exemplo, dos candidatos à prefeitura que têm pontuado nas pesquisas eleitorais, apenas Tabata Amaral (PSB) e Guilherme Boulos (PSOL) se identificam como “políticos”. No Rio, nenhum dos candidatos a prefeito segue esta classificação.
— Um possível manual de boas práticas seria que as plataformas cadastrassem todos os políticos, mas o que ocorre no Brasil hoje é uma combinação de autodeclaração com moderação de conteúdo — explica Fabro Steibel, diretor-executivo do Instituto de Tecnologia e Sociedade (ITS).
Para especialistas, as regras podem causar desequilíbrio ao não restringir todos os perfis de políticos. A Meta diz que, além da autodeclaração, busca identificar contas que publiquem conteúdos relacionados à política, com postagens que envolvam leis, eleições ou tópicos sociais. Não explica, porém, quando usuários que fazem essas postagens passam a ser alvo de restrições. A empresa recomenda, inclusive, que contas que estejam sofrendo com a perda de alcance podem “parar de publicar esse tipo de conteúdo por um período”, para que voltem a ser recomendados.
No caso do TikTok, a Bytedance, empresa chinesa que é dona da plataforma, proíbe publicidade política e classifica determinados perfis dentro desta categoria, mas essa listagem não é pública.
Para Fernando Ferreira, pesquisador do Laboratório de Estudos de Internet e Redes Sociais (NetLab), a falta de transparência dificulta entender como as decisões são tomadas.
— A falta de métodos oficiais de coleta e aquisição de dados gera opacidade sobre o impacto real dessas restrições.
Outro ponto que gera dor de cabeça neste ano são dribles a decisões judiciais. Após o PSB obter, na última sexta-feira, uma liminar que suspendeu perfis de Pablo Marçal por suspeita de se beneficiar de uma rede de pagamentos irregulares a terceiros para geração de conteúdo, o candidato do PRTB criou contas alternativas que rapidamente chegaram ao patamar de milhões de seguidores. O diretor executivo do ITS, Fabro Steibel, pondera que Marçal não descumpriu a decisão judicial, que apenas bloqueou seus perfis oficiais. Mas lembra que já houve casos de restrições mais amplas, como a do blogueiro bolsonarista Allan dos Santos, proibido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) de criar novos perfis, que são corriqueiramente burladas.
A lógica da campanha nas redes também reduz a eficácia de eventuais direitos de resposta, na avaliação do especialista. Em São Paulo, a campanha de Boulos chegou a obter três direitos de resposta — depois suspensos — após o candidato do PRTB sugerir, sem quaisquer provas, o uso de drogas ilícitas; Marçal, porém, retomou sistematicamente o tema em novas postagens.
— O direito de resposta, que é uma forma de garantir a igualdade de armas, já tinha falhas na TV e funciona mal na internet. É preciso que a legislação se adapte aos algoritmos e que responsabilize a desinformação profissionalizada — diz Steibel.
Campeonato de cortes
Outra controvérsia, também envolvendo a campanha de Marçal, é sobre destinação de recursos para que terceiros produzam vídeos curtos, os chamados “cortes”, em benefício do candidato. De acordo com resolução do TSE, os candidatos só podem impulsionar conteúdo nos seus perfis oficiais, que precisam ser informados às plataformas, e não podem pagar a influenciadores para fazê-lo.
Em junho, reportagem do GLOBO mostrou que Marçal prometia prêmios a apoiadores, já na pré-campanha, que fizessem vídeos com alto número de visualizações. Na ação em que pediu a suspensão de perfis de Marçal, o PSB apontou indícios de que a prática “continuou mesmo após o início do processo eleitoral”, e alegou que ela pode configurar “caixa dois” e abuso de poder econômico.
Até a noite de segunda-feira, Facebook, Instagram e Tik Tok haviam atendido a determinação judicial de suspender os perfis oficiais de Marçal. Já seu perfil no X, que vive um embate com o Judiciário brasileiro, seguia ativo.
Especialistas apontam que há dificuldade de fiscalização nos casos em que a origem do pagamento é dissimulada. O monitoramento comumente feito pelas plataformas é do impulsionamento de publicações políticas em perfis não autorizados quando este é pago diretamente pela campanha do candidato.
Marçal vem alegando que não fez pagamentos a apoiadores. Na segunda-feira, os administradores do canal “Cortes do Marçal”, no aplicativo de conversas Discord, usado para promover os “campeonatos de cortes” com imagens do candidato do PRTB, passaram a pedir a produção de conteúdo com o influenciador fitness Renato Cariani. Ele é próximo a Marçal e apoia sua candidatura.
O administrador do canal, Jefferson Zantut, alega que a nova competição não tem relação com Marçal, e promete até R$ 50 mil em prêmios. Para especialistas, será preciso averiguar posteriormente se o conteúdo de Cariani teve o intuito de beneficiar Marçal.
As zonas cinzentas nas plataformas
- Classificações de políticos: neste ano, a Meta deixou de recomendar aos usuários conteúdo considerado “político”. Para especialistas, a falta de uma classificação padronizada para os candidatos e o uso de critérios pouco claros para a moderação de conteúdo trazem risco de desequilíbrio na campanha.
- Criação de contas alternativas: decisões judiciais como a que suspendeu os perfis oficiais de Pablo Marçal não necessariamente impedem que candidatos criem novos perfis e sigam postando. Também já houve casos de decisões mais amplas, que proibiam novas contas, que acabam sendo burladas.
- Remuneração de seguidores: o envio de recursos não declarados para que terceiros produzam e impulsionem conteúdo nas redes é proibido pela Justiça Eleitoral, mas especialistas afirmam que há dificuldades na fiscalização quando este pagamento não é feito diretamente pela conta do candidato.
- Descumprimento de decisões judiciais: além da criação indiscriminada de novos perfis, outra dor de cabeça na campanha deste ano para quem se sente ofendido por postagens de adversários é o cumprimento de direitos de resposta, já que a lógica das redes sociais é porosa à replicação do conteúdo que gerou a sanção.
Juiz valida tese de Flávio Bolsonaro e aponta 'grupo criminoso' na Receita
Italo Nogueira / FOLHA DE SP
Uma decisão da Justiça Federal no Rio de Janeiro apontou a existência de um "grupo criminoso" para realizar acessos irregulares a dados fiscais composto por servidores da Receita Federal, tese defendida pela defesa do senador Flávio Bolsonaro (PL) no caso da "rachadinha".
O juiz José Arthur Diniz Borges, da 8ª Vara Federal, afirmou em sentença haver comprovação sobre a existência de "acessos privilegiados ao sistema da Receita".
O magistrado responsável pela decisão já teve encontro com o Jair Bolsonaro no Palácio do Planalto, em 2021, foi condecorado pelo ex-presidente em 2022 e absolveu Silvinei Vasques, ex-chefe da PRF (Polícia Rodoviária Federal), em ação de improbidade administrativa no ano passado.
Em nota, a Receita Federal afirmou que a decisão trata "de evento idêntico a outros que já foram objeto de apuração interna e se mostraram improcedentes".
"De todo modo, a Corregedoria abrirá procedimento para apuração das questões levantadas", diz a nota.
A sentença proferida por Borges não tem relação direta com o senador, filho do ex-presidente, mas vai ao encontro de sua tese defensiva. As vítimas do suposto grupo criminoso, de acordo com a decisão, seriam dois auditores que foram acusados de enriquecimento ilícito a partir de processo administrativa conduzido pela Corregedoria do órgão.
O processo apontou que denúncias anônimas enviadas ao Escritório da Corregedoria da 7ª Região Fiscal, no Rio de Janeiro, foram precedidas de acessos irregulares a dados fiscais dos servidores.
"Os fatos revelados demonstram a prática contumaz de montagem de cartas anônimas, a partir de acessos imotivados a dados sigilosos de servidores da Receita Federal, as quais eram utilizadas como base para instauração de processo administrativo", afirmou o magistrado em sentença.
Um dos autores dos acessos considerados irregulares é o auditor Christiano Paes Leme Botelho, ex-chefe do escritório da Corregedoria da Receita no Rio de Janeiro. Ele foi citado pelas advogadas de Flávio Bolsonaro ao utilizar a tese defensiva sobre acessos ilegais no caso da "rachadinha".
A tese defensiva de Flávio foi tema da reunião entre as advogadas do senador no Palácio do Planalto com o ex-presidente, o general Augusto Heleno (então chefe do Gabinete de Segurança Institucional) e o deputado Alexandre Ramagem, ex-chefe da Abin (Agência Brasileira de Inteligência).
A reunião de agosto de 2020 foi gravada por Ramagem. O arquivo foi apreendido e objeto de análise na investigação da suposta "Abin paralela", conduzida pela no STF (Supremo Tribunal Federal). A suspeita é de que Bolsonaro mobilizou a estrutura da Receita e do Serpro para auxiliar a defesa do filho.
Na reunião, as advogadas afirmam ter indícios de que Flávio foi vítima da prática relatada por auditores fiscais alvos de processos administrativos baseados em denúncias anônimas.
Logo após a reunião, a Receita solicitou uma devassa em seus sistemas para tentar identificar acessos a dados fiscais do ex-presidente, de seus três filhos políticos, de suas duas ex-mulheres, da ex-primeira-dama Michelle e de Fabrício Queiroz, pivô da investigação.
A defesa do senador afirma que nunca teve acesso aos dados dessa devassa —tecnicamente chamada de apuração especial.
A Receita também mobilizou por quatro meses uma equipe de cinco servidores para apurar a acusação de origem ilegal da investigação contra Flávio. A investigação do Fisco concluiu pela improcedência das teses do filho do ex-presidente.
A comissão de servidores foi presidida por Diogo Esteves Rezende, que segundo documentos do processo integrava o Escritório de Corregedoria da 7ª Região Fiscal, exatamente o órgão chefiado por Botelho, acusado por Flávio de cometer ilegalidades.
Até então, decisões judiciais vinham validando os atos da Receita. O Grupo Nacional de Pareceristas da Receita elaborou um parecer afirmando que o Fisco abriu a investigação a pedido do senador com base em "ilações desprovidas de fundamento jurídico e sem nenhuma evidência ou prova objetiva".
A sentença de Borges, porém, corrobora a tese. Ela afirma que "restou comprovado que os réus foram vítimas de um grupo criminoso que utiliza acessos privilegiados ao sistema da Receita Federal para instaurar processos disciplinares astuciosos com o fito de eliminar servidores desafetos".
"Os auditores fiscais nominados na apuração especial, a incluir o Superintendente da Receita Federal na 7ª Região Fiscal e o chefe do Escritório de Corregedoria da 7ª Região Fiscal, utilizaram suas senhas funcionais privilegiadas para acessar as bases de dados sigilosas relativas aos réus e realizar intensas pesquisas dias antes da protocolização da carta anônima que deu origem ao processo administrativo", afirmou o magistrado.
Incêndio criminoso em área de mata pode render pena de até oito anos
Paulo Eduardo Dias / FOLHA DE SP
Os incêndios como o visto no interior de São Paulo, em especial na região de Ribeirão Preto, na última semana podem ser punidos com prisão, de acordo com a legislação brasileira.
A pena pode variar conforme o tipo da área queimada e o entendimento tanto do delegado (primeira autoridade a analisar o caso), quanto do Ministério Público, que pode modificar a tipificação penal relatada pela Polícia Civil.
Dos quatro presos no interior de São Paulo desde a semana passada por envolvimento em supostas queimadas propositais, um deles foi indiciado pela Polícia Civil no artigo 250 do Código Penal, que se refere a causar incêndio, expondo a perigo a vida, a integridade física ou o patrimônio de alguém.
A pena é de três a seis de prisão, além de multa. No entanto, a sentença pode aumentar em um terço se ocorrido em lavoura, pastagem, mata ou floresta.
O homem detido e indiciado pelo crime teve a prisão em flagrante convertida em preventiva, ou seja, sem prazo, decretada pela Justiça nesta segunda-feira (26).
"Entende-se que causar o incêndio em lavoura é mais grave. Um dos motivos é que atinge a produção de alimentos e outra questão é que tende a ser mais difícil de controlar, por isso o legislador entendeu ser mais grave", explicou o advogado criminalista André Lozano.
"Ele pode pegar de quatro a oito anos, por causa do aumento de pena em decorrência do incêndio ser feito em lavoura. É possível prisão preventiva, já que a pena máxima ultrapassa quatro anos", acrescentou o advogado.
Além do artigo 250, o crime de incêndio está previsto em outras legislações. Como o artigo 41 da Lei de Crimes Ambientais, que prevê pena de até quatro anos para quem provocar incêndio em mata ou floresta.
Quatro anos de prisão também é a pena máxima para quem causar poluição de qualquer natureza em níveis que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora, prevista no artigo 54 da Lei de Crimes Ambientais, segundo Lozano.