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Usucapião de herança: como se tornar dono de imóvel sem pagar por ele

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Do alto do prédio na rua Lourenço Castanho, na Vila Nova Conceição, zona sul de São Paulo, a enfermeira Edinéia Bispo da Cruz, de 57 anos, acompanha a movimentação de ciclistas, pedestres e corredores no Parque Ibirapuera. Além da vista privilegiada num dos metros quadrados mais caros da capital paulista, a enfermeira vive num apartamento com dois quartos, suíte e varanda. Pelo imóvel, Edinéia diz que não desembolsou nada: foi conquistado pelo que o judiciário chama de usucapião de herança.

 

A modalidade é um jeito de se tornar dono de uma propriedade que já tem herdeiros. Isso acontece quando alguém cuida do imóvel, mora nele e age como dono por ao menos 10 ou 15 anos — período conhecido como usucapião ordinária e extraordinária, respectivamente —, sem que os sucessores reclamem a posse. Se essa pessoa cumprir os requisitos da lei, ela pode pedir na Justiça para ser reconhecida como a nova proprietária do imóvel, mesmo que ele tenha pertencido a um parente morto e fosse destinado a outros herdeiros.

 

No caso de Ednéia, ela conta que foi cuidadora de uma idosa por mais de 20 anos, ofício que anteriormente foi responsabilidade da sua mãe. Instalada na casa para prestar cuidados contínuos, a enfermeira afirma que durante todo esse tempo a empregadora nunca pediu que ela deixasse o lar, e passou a cuidar do imóvel como se fosse dela, fazendo reparos e pagando as contas.

 

Com a morte da mulher na pandemia de covid-19, Ednéia entrou com pedido de usucapião na Justiça. “Só que no meu caso foi muito mais complicado porque era um imóvel de herança, com filhos vivos, e eu precisei provar que habitava o espaço também como proprietária sem nenhuma reclamação dos herdeiros”, lembra a enfermeira. Para a escritura levar seu nome, a enfermeira montou o que chama de “megaoperação”: contou com ajuda dos porteiros, vizinhos e até comerciantes.

 

Provas, erros comuns e empecilhos

Embora não haja pagamento pelo imóvel, não há como ter a propriedade por usucapião de herança se quem entrou com o pedido não tem como comprovar vínculo com o imóvel, explicam os especialistas ouvidos pelo E-Investidor.

 

“Primeiro deve ser analisado o caso concreto para traçar a estratégia a ser seguida, já que existem diversas modalidades de usucapião, com requisitos diversos. De toda forma, podemos dizer que é cabível a utilização do instituto desde que seja comprovado o exercício da posse exclusiva do imóvel, com ânimo de dono e de maneira mansa, pacífica, contínua e duradoura”, diz a advogada especialista em direito das famílias e sucessões, Gabrielly Ramos Macedo.

 

Para isso, o interessado precisa reunir uma série de documentos como contas de luz e água, Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU) e fotografias. Além disso, é possível usar depoimentos de testemunhas para provar os requisitos. “O tabelião examina os documentos apresentados pelo requerente e, se necessário, pode realizar diligências no local do imóvel para entrevistar vizinhos e coletar depoimentos”, explica o 1º vice-presidente do Colégio Notarial do Brasil, da Seção São Paulo (CNB/SP), Daniel Paes de Almeida.

 

“Ele verifica a ausência de oposição à posse e a continuidade do uso do imóvel pelo período exigido. A ata notarial é um instrumento público que certifica a situação da posse, servindo como prova no processo de usucapião”, ressalta.

 

Além do problema com documentação, Almeida aponta que há ainda dificuldade em comprovar a posse mansa e pacífica com a documentação adequada. Problemas em notificar todos os interessados, especialmente herdeiros e terceiros, confusão sobre os prazos exigidos para diferentes tipos de usucapião, e oposição de terceiros que contestam a posse também dificultam a conclusão do processo.

 

O advogado e professor universitário, Fabrício Camargo, explica que não é necessário que todos os herdeiros concordem com a usucapião de um imóvel herdado. Segundo ele, o processo, em regra, é individual e depende do herdeiro, autor da ação que está pleiteando a posse. “É importante que o herdeiro que busca a usucapião cumpra os requisitos legais, como o tempo de posse e a boa-fé”, diz.

 

Caso contrário, conforme ele, outros herdeiros podem contestar a aquisição da propriedade. “As [situações] mais comuns são de que o usucapiente não possui legitimidade para propor ação, não possui posse mansa e pacífica, não possui boa-fé. Pode-se contestar também a data da morte, que afeta o início do prazo para a usucapião,” completa o professor.

 

Tanto Macedo quanto Camargo afirmam que a ação de usucapião pode ser rejeitada se não houver comprovação adequada de posse exclusiva pelo período exigido por lei. Em relação a bens de herança, há divergência entre os tribunais sobre a possibilidade de transmissão da propriedade para um herdeiro através da usucapião.

 

Isso porque, segundo eles, de acordo com o princípio da Saisine (art. 1.784 do Código Civil), a herança é transmitida imediatamente aos herdeiros legítimos e testamentários após a morte do autor da herança.

 

Confira os documentos exigidos para o processo de usucapião extrajudicial

 

  • Requerimento de usucapião: assinado pelo requerente ou por seu advogado;
  • Planta e memorial descritivo do imóvel: elaborados por profissional habilitado e com a Anotação de Responsabilidade Técnica;
  • Certidões negativas dos distribuidores cíveis: para comprovar a inexistência de ações possessórias sobre o imóvel;
  • Comprovantes de posse: documentos que demonstrem a posse mansa, pacífica e contínua do imóvel pelo prazo legalmente exigido;
  • Ata notarial: lavrada pelo tabelião de notas, atestando a posse do imóvel;
  • Certidão de ônus reais e ações reais e pessoais reipersecutórias: emitidas pelo cartório de registro de imóveis;
  • Documento de identificação e CPF dos requerentes;
  • Justo título ou quaisquer documentos que comprovem a origem da posse.

Fonte: 2º Tabelião de Notas da Comarca de Ribeirão Preto

 

Estratégias, tempo e posse

Especialistas dizem que a orientação para as ações de usucapião é basicamente a mesma para todos os tipos de casos. Segundo eles, é fundamental conversar com o interessado e explicar todo o procedimento a ser seguido. A pessoa precisa entender a estratégia que o advogado deve traçar, inclusive para a coleta da documentação necessária para comprovação.

 

Além disso, o interessado deve estar ciente das fases do processo para que esteja preparado para participar da audiência de instrução, indicar testemunhas e ser ouvido. “A melhor estratégia é buscar a verdade. Se a pessoa tem a posse mansa e pacífica, ela, provavelmente, poderá ser provada. Perceba que a ideia de posse mansa e pacífica se relaciona a fatos, não a documentos”, pontua a advogada especialista em direito das famílias e sucessões, Gabrielly Ramos Macedo.

Não é possível estabelecer a duração do processo de usucapião porque isso depende da complexidade de cada caso e da estrutura do tribunal onde está sendo processado. Geralmente, trata-se de um processo judicial que demanda uma extensa produção de provas, o que significa que não é um processo rápido. “Geralmente leva de um a três anos, dependendo da complexidade do caso e do volume de processos na vara competente”, explica o CEO da Guarda Digital, Sidney Pedrotti.

 

Se o processo de usucapião for bem sucedido, o herdeiro obtém a propriedade do bem e recebe um documento que confirma sua posse exclusiva. Isso significa que a propriedade não precisa mais ser dividida com os outros herdeiros. “O antigo proprietário não terá mais direitos sobre o bem usucapido. Todos os deveres e responsabilidades inerentes à propriedade passam para o novo proprietário”, ressalta Camargo.

 

Veja o passo a passo para registrar um imóvel usucapido

  • Reunião da documentação: coleta de todos os documentos necessários;
  • Lavratura da ata notarial: realizada pelo tabelião de notas, certificando a posse do imóvel;
  • Protocolização do pedido: no cartório de registro de imóveis competente;
  • Análise e notificações: o oficial de registro de imóveis analisa o pedido e notifica os interessados;
  • Decisão do registrador: o oficial decide pela procedência ou improcedência do pedido;
  • Registro da usucapião: se o pedido for procedente, o imóvel é registrado em nome do possuidor.

Fonte: 2º Tabelião de Notas da Comarca de Ribeirão Preto

Fux desabafa como se o STF fosse obrigado a decidir sobre o que não lhe cabe

Por Carlos Andreazza / O ESTADÃO DE SP

 

Luiz Fux resolveu desabafar sobre o “protagonismo deletério” do Supremo. Foi na sessão em que o tribunal legislou pela descriminalização do porte de maconha para uso pessoal. Aquela jornada em que se usou a balança da Justiça – de alta precisão – para pesar gramas de droga, expostos juízes da corte constitucional, em busca da batida perfeita, ao debate-definição sobre qual seria a gramatura justa.

 

“Não se podem desconsiderar as críticas de que o Judiciário estaria se ocupando de atribuições próprias dos canais de legítima expressão da vontade popular, reservada apenas aos Poderes integrados por mandatários eleitos” – disse o ministro que suspendeu individualmente a implementação de lei, a que instituíra o juiz de garantias, aprovada pelo Parlamento.

 

“Nós não somos juízes eleitos.” São os não eleitos cuja confiança nas próprias luzes lhes autoriza a identificar (forjar) urgências e preencher lacunas sobre as quais a democracia representativa se acovardaria.

 

“O Brasil não tem governo de juízes”, declarou o juiz que esteve longamente sentado sobre liminar que garantia o pagamento de auxílio-moradia a magistrados.

 

“Nós assistimos, cotidianamente, ao Poder Judiciário sendo instado a decidir questões para as quais não dispõe de capacidade institucional”. Diante de arguição sobre constitucionalidade de lei, em vez de responder e ponto, expande-se o tribunal para criar critérios-procedimentos. Porque, tão sabedores os seus, não podem admitir que a acusada omissão do Parlamento seja uma posição.

 

“Essa disfuncionalidade desconhece que o STF não detém o monopólio das respostas e nem é o legítimo oráculo para todos os dilemas morais, políticos e econômicos da nação.” Nesse momento, lamentei não haver o diretor de imagens da TV Justiça nos mostrado o ministro Barroso.

 

Fux lastima que o Supremo arque com o “preço social” de decidir sobre o que não lhe cabe. Haveria espécie de armadilha contra o tribunal, manipulando-lhe a natureza contramajoritária. Como se o STF fosse obrigado a entrar na arapuca, compulsória a prática proativa. Como se não houvesse o voto de Fachin (pela descriminalização), exemplar da expressão comedida que se espera da corte constitucional.

 

“Nós não temos de fazer pesquisa de opinião pública”. Correto. “Nós temos que aferir o sentimento constitucional do povo”. Ele adora esse conceito. O sentir jurídico – dos intérpretes da massa – pela construção da cidadania. Né? Melhor fazer pesquisa de opinião.

 

“Quanto mais as nossas decisões se aproximam do sentimento constitucional do povo, mais efetividade terão as nossas decisões”, falou o juiz, leitor do povo, que nem sequer a própria cadeira afasta.

Foto do autor

Opinião por Carlos Andreazza

Andreazza foi colunista do jornal O Globo e âncora da Rádio CBN Rio, além de ter colaborado com a Rádio BandNews e com o Grupo Jovem Pan. Formado em jornalismo pela PUC-Rio, escreve às segundas e sextas.

CNJ fará mutirão para reavaliar casos de presos por porte de maconha

Mariana Brasil / FOLHA DE SP

 

CNJ (Conselho Nacional de Justiça) fará um mutirão nos presídios para reavaliar os casos de pessoas detidas por portar maconha após o STF (Supremo Tribunal Federal) fixar a quantidade de até 40 gramas ou seis plantas fêmeas para diferenciar usuário de traficante.

Os números são relativos e devem servir de critério pelas autoridades policiais, que também devem levar em conta outros fatores para decidir se alguém é traficante, mesmo que esteja portando menos de 40 gramas. A definição do STF vale até que o Congresso decida esse limite.

Ao fim do julgamento, o Supremo determinou que o CNJ adote medidas para cumprir a decisão, além de promover mutirões carcerários com a Defensoria Pública para apurar e corrigir prisões que tenham sido decretadas fora dos parâmetros da decisão.

O CNJ informou que aguarda a notificação oficial da decisão do STF para definir os parâmetros para cumprimento da decisão em todo país.

A organização de mutirões carcerários é uma das atribuições conferidas ao Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativa, órgão vinculado à presidência do CNJ.

A determinação partiu do presidente do STF, Luís Roberto Barroso, que falou sobre as prisões fruto de discriminações de classe e raça.

"Nós temos enfrentado o tráfico de maneira errada. A política criminal em matéria de drogas no Brasil é a prisão de meninos de periferia primários e de bons antecedentes com pequenas quantidades de drogas. Ele é preso, mesmo que ele seja um pequeno traficante, entra no sistema penitenciário onde ele imediatamente se filia a uma facção criminosa, que para ele é uma questão de sobrevivência. Esta vaga que ele ocupa custa dinheiro. Ele fica preso um, dois anos e sai pior do que entrou", disse Barroso ao fim da sessão a jornalistas.

De acordo com dados do Banco Nacional de Demandas Repetitivas e Precedentes Obrigatórios do CNJ, há 6.343 processos sobrestados que aguardavam essa definição em todo o país.

Como mostrou a Folha, um estudo do Insper apontou que para a polícia de São Paulo, a diferença entre um traficante e um usuário de drogas pode estar na cor da pele. Ainda mais quando o acusado é flagrado com pequenas quantidades de maconha. Em razão disso, 31 mil pessoas pardas e pretas foram enquadradas como traficantes em situações similares àquelas em que brancos foram tratados como usuários.

 

CNJ prepara mutirão para rever decisões e libertar presos por portar 40g de maconha ou menos

Por Guilherme Naldis / O ESTADÃO DE SP

 

Após a descriminalização do porte de maconha em pequenas quantidades pelo Supremo Tribunal Federal (STF), o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) está preparando um mutirão para desencarcerar detentos presos por carregar as quantidades da droga hoje permitida.

 

Atualmente, o conselho está levantando todos os casos de encarceramento por essa razão enquanto o STF não define os parâmetros para cumprimento da decisão. Atualmente, há 6.343 processos que aguardavam a decisão do Supremo para decretar a pena definitiva dos réus.

 

A organização do mutirão carcerário foi determinada pela Corte no mesmo julgamento que reconheceu na última terça-feira, 25, que o porte de maconha para consumo próprio não é crime. O STF definiu que pessoas flagradas com até 40 gramas de maconha ou seis plantas fêmeas de cannabis devem ser tratadas como usuárias e não traficantes.

 

Se uma pessoa for abordada portando mais do que a quantidade fixada, ela poderá responder a um processo como traficante, com pena prevista de cinco a 15 anos de prisão. A decisão só passa ter efeitos práticos quando o julgamento for encerrado e o acórdão, publicado.

 

Conforme estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), publicado em maio do ano passado, 33% dos casos de condenação por tráfico de maconha estão abaixo do limite definido, de 40 gramas. Em relação à quantidade de processos em que houve apreensão de maconha, 37% seriam impactados. O Ipea estima que 42 mil pessoas não estariam presas se o critério para apreensão fosse 25g.(agora a Lei vai retroagir?)

‘Decidir sobre maconha sem regulação e deixar a população nas mãos do narcotráfico?’, questiona Fux

por Fausto Macedo e Pepita Ortega / o estadão de sp

 

O ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal, cobrou nesta quarta-feira, 26, que os “poderes com expertise” regulem o porte de maconha para uso pessoal. Um dia depois de a Corte, dividida, decidir que não é crime portar a droga - em quantidade ainda não definida - para consumo, Fux ponderou ao Estadão: “Decidir a questão da maconha sem regulação e deixar a população nas mãos do narcotráfico? Quem pode produzir? Quem pode distribuir? Quem pode vender?”

 

Ao Estadão, o ministro ressaltou que votou, no julgamento desta terça, 25, “com deferência ao legislativo e aos órgãos técnicos, como a Agência Nacional de Vigilância Sanitária”. No plenário, o ministro afirmou que o Brasil não tem “governo de juízes”.

 

“Os juízes não são eleitos e, portanto, não exprimem a vontade e o sentimento constitucional do povo”, declarou nesta quarta.

 

Fuz entende que não cabe ao STF decidir sobre questões como a do porte de maconha. “Essa tarefa é do Congresso, razão pela qual não é o STF que deve dar a palavra final nas questões em que há dissenso moral e científico. Cabe ao Legislativo, que é a instância hegemônica num Estado Democrático”, ponderou.

 

Ele demonstra preocupação com os “malefícios da cannabis” e defende um posicionamento da Anvisa sobre o tema. “Há uma sólida corrente na ciência que aponta o uso da canabis com alto teor de THC como causa de depressão, esquizofrenia e síndrome amotivacional. Urge que os poderes com expertise regulem o tema”, conclamou o ministro.

 

O argumento de Fux vai na linha do voto que ele proferiu nesta terça, 25, quando o STF formou maioria para descriminalizar o porte de maconha para uso pessoal. Oito ministros defenderam que o porte da droga para consumo próprio não é crime, com nuances entre os posicionamentos.

Desses oito magistrados, seis - Gilmar Mendes, Luís Roberto Barroso, Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Rosa Weber (já aposentada) e Cármen Lúcia - consideraram que parte da Lei de Drogas é inconstitucional e precisa ficar claro que o porte de maconha por usuários não é crime.

 

Fux acompanhou Dias Toffoli e entendeu que a Lei de Drogas já não tratou do tema como crime.

 

Kassio Nunes Marques, Cristiano Zanin e André Mendonça votaram no sentido de que a Lei de Drogas é constitucional e prevê o porte de maconha para uso pessoal como crime punido com penas alternativas à prisão.

 

Fux dedidou todo um capítulo de seu voto para tratar da “necessidade de autocontenção e de respeito às capacidades institucionais”. Segundo o ministro é necessário que os tribunais “atentem à sua natureza de órgãos não submetidos ao escrutínio das urnas”.

 

O ministro avaliou que a discussão sobre a constitucionalidade da Lei de Drogas e o porte para uso próprio envolve “amplo dissenso moral no seio da sociedade”. “A ausência de amplo consenso sobre o tema exige da Corte postura minimalista”, anotou.

 

Segundo Fux, a Lei de Drogas tem natureza de “norma em branco” e cabe à Anvisa especificar “quais são as drogas cujo comércio e consumo deve ser submetido a um controle especial”.

 

“Considero,por essas razões, inadequado que o Judiciário, adotando postura não deferente aos órgãos técnico-científicos detentores dos saberes sobre o tema,tome para si a tarefa de fixar quais são as substâncias e as quantidades que os indivíduos devem ser autorizados a adquirirou plantar,para consumo próprio.

 

O dissenso científico sobre a matériaorienta a Corte a adotar postura minimalista, de não intervenção diretae de respeito às autoridades públicas competentes”, ressaltou.

Descriminalização da maconha: STF define 40 gramas para diferenciar usuário de traficante

Por Rayssa Motta / o estadão de sp

 

Supremo Tribunal Federal (STF) definiu nesta quarta-feira, 26, que pessoas flagradas com até 40 gramas de maconha ou seis plantas fêmeas de cannabis devem ser tratadas como usuárias e não traficantes. O critério deve prevalecer até o Congresso Nacional estabelecer uma quantidade em lei, conforme ressalvaram os próprios ministros.

 

A decisão só passa ter efeitos práticos quando o acórdão ou a ata de julgamento forem publicados.

 

O critério não é absoluto, mas referencial. Outros elementos podem ser usados para analisar cada caso, como a forma de acondicionamento da droga e as circunstâncias da apreensão. Se uma pessoa estiver com uma balança de precisão, por exemplo, ela pode ser denunciada como traficante, mesmo que tenha consigo uma quantidade de droga abaixo do limite.

 

Esse é apenas um parâmetro para tentar garantir um tratamento mais igualitário nas abordagens policiais e nos processos judiciais.

 

Estudos citados no plenário mostram que negros são condenados como traficantes com quantidades menores do que brancos. O grau de escolaridade também gera distorções nas condenações – a tolerância é maior com os mais escolarizados.

 

As propostas apresentadas foram de 10 a 60 gramas. Os ministros chegaram a um consenso, nos bastidores, para aprovar a quantidade intermediária, de 40 gramas. O resultado foi anunciado nesta tarde.

 

Ontem, os ministros já haviam definido, por maioria, que o porte de maconha para uso pessoal não é crime. Isso não significa que o consumo foi legalizado. A mudança é que o uso de maconha deixa de ser um delito penal e passa a ser considerado um ato ilícito sujeito a sanções administrativas, como medidas educativas e advertência.

 

Lei de Drogas, aprovada em 2006, não pune o porte com pena de prisão. Com isso, os ministros decidiram que os usuários não devem responder na esfera criminal. Uma das mudanças práticas é o fim dos antecedentes criminais para quem consome a droga e antes era fichado.

 

Com a decisão do STF, os usuários não poderão mais ser presos em flagrante. A droga deve ser apreendida e a pessoa notificada para comparecer no fórum.

 

Como ainda não há regras claras sobre como a mudança vai funcionar na prática, o que depende de regulamentação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), órgão que administra o Poder Judiciário, os ministros deixaram estabelecido, como regra de transição, que os usuários de maconha ainda poderão ser conduzidos às delegacias e processados em juizados especiais criminais até que os protocolos sejam definidos.

 

Ficou convencionado que o CNJ deve criar as regras para a tramitação desses casos nos tribunais em articulação com o Ministério da Saúde, o Ministério da Justiça, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e o Conselho Nacional do Ministério Público.

 

Uma das sugestões do STF é que os usuários sejam encaminhados pelo Judiciário a unidades especializadas no sistema de saúde, como os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS). Prevaleceu a posição de que a dependência é um problema de saúde pública.

 

A expectativa dos ministros é que a decisão amplie o acesso dos dependentes ao tratamento adequado e ajude a reduzir o encarceramento.

 

“Penso que a política de drogas que se deva praticar é a de monitoramento dos carregamentos e do dinheiro, de persecução grandes traficantes e do policiamento tão intenso quanto possível de fronteiras e não a política de prender em flagrante meninos pobres de periferia com pequenas quantidades de drogas”, defendeu o ministro Luís Roberto Barroso, presidente do STF, ao concluir o julgamento.

 

A pena para os usuários permanece a mesma prevista na legislação – advertência sobre os efeitos das drogas e participação em programas ou cursos educativos. Apenas a obrigação de prestar serviços comunitários foi considerada incompatível com a natureza administrativa do ilícito e derrubada.

 

A tese fixada foi a seguinte: “Não comete infração penal quem adquirir, guardar, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, a substância cannabis sativa, sem prejuízo do reconhecimento da ilicitude extrapenal da conduta.”

 

Os ministros também definiram que os recursos contingenciados do Fundo Nacional Antidrogas devem ser liberados e que parte deles deve ser usada em campanhas educativas sobre os malefícios das drogas, nos moldes do que já é feito em relação ao cigarro.

STF decide por 8 a 3 descriminalizar porte de maconha para uso pessoal

Por — Brasília / o globo

 

Por oito votos a três, o Supremo Tribunal Federal (STF) descriminalizou o porte de maconha para consumo pessoal. Na prática, a decisão da Corte significa que o uso da substância deixará de ser crime, o chamado ilícito penal, e passará a configurar um ilícito administrativo. Os ministros ainda não definiram qual é a quantidade que será determinada para que se diferencie traficante de usuário – a proclamação final será feita nesta quarta-feira.

 

A maioria de seis ministros foi atingida com o voto de Dias Toffoli, que fez um esclarecimento do voto que já havia proferido na última quinta-feira. Na sequência, os ministros Luiz Fux e Cármen Lúcia aderiram à corrente majoritária.

 

Toffoli, que já havia proferido o seu posicionamento na semana passada, disse que seu voto é claro no sentido de entender que "nenhum usuário de droga deve ser criminalizado". O caso começou a ser analisado pelo Supremo em 2011, e ficou paralisado por oito anos.

 

O julgamento avalia a constitucionalidade do artigo 28 da Lei de Drogas, de 2006, que considera crime "adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar".

 

Com o voto de Toffoli, até o momento, seis ministros (Toffoli, Gilmar, Barroso, Moraes, Rosa e Fachin) já votaram para considerar que não é crime o porte de drogas para consumo individual. Quatro ministros (Fux, Nunes Marques, André Mendonça e Cristiano Zanin) se manifestaram em sentido oposto, entendendo que a lei é constitucional e, portanto, o porte deve ser compreendido como um crime.

 

– O meu voto é claríssimo no sentido de que nenhum usuário de nenhuma droga pode ser criminalizado. Esse foi o objetivo da lei de 2006, descriminalizar todos os usuários de drogas. A lei anterior tratava como crime o uso de drogas, tratava como criminosos os usuários de drogas – disse Toffoli ao fazer o esclarecimento em seu voto.

Para Toffoli, a questão da fixação de quantidades como critério para descriminalização e sustentou que a medida não é suficiente para resolver a questão.

 

– Fixar a quantidade não resolve o problema. Vamos imaginar um rapaz pego, morador de um lugar muito pobre, com dois mil reais no bolso e cinco gramas de maconha. Ele vai ser preso do mesmo jeito, como traficante – pontuou.

 

Após a explicação feita por Toffoli, o presidente do STF, Luís Roberto Barroso, proclamou a maioria de votos atingida no julgamento. O presidente ainda lembrou que o consumo de drogas em lugares públicos continua sendo um ato ilícito, e que a Corte não estava legalizando a maconha.

 

Ao se juntar aos magistrados que votaram contra a descriminalização, o ministro Luiz Fux falou em uma "dificuldade de superar o dissenso científico". Por isso, declarou o artigo 28 da Lei de Drogas constitucional.

 

– Peço vênia ao colegiado por essa visão realista de que, sem regulação, sem atuação do Legislativo, a alteração do uso da maconha vai trazer muito mais problema do que solução – pontuou.

 

Quantidade de drogas

Além disso, todos os nove ministros que votaram até o momento consideram que deve haver uma quantidade da droga que faça a pessoa ser presumida como usuária, e não traficante.

 

Para sete deles, cabe à Corte definir esta quantidade. Dois outros magistrados entendem que compete a outras instituições, como o Congresso Nacional ou a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), a definição desta quantidade.

 

Até agora, os ministros Gilmar Mendes, Luís Roberto Barroso, Alexandre de Moraes e Rosa Weber, hoje aposentada, votaram para que o critério que faça alguém ser presumido como usuário seja de 60 gramas ou seis plantas fêmeas. Já os ministros Cristiano Zanin e Nunes Marques, entendem que esta quantidade seja fixada em 25 gramas.

 

Edson Fachin e André Mendonça consideram que a definição cabe ao Congresso, não ao STF. Mendonça, no entanto, sugeriu um critério provisório, de 10 gramas, até que os parlamentares decidam.

 

Toffoli votou ainda para fazer um "apelo" para que Executivo e Legislativo, em um prazo de 18 meses, façam a regulamentação de pontos da lei, incluindo o critério que diferencie usuário e traficante.

 

Alexandre de Moraes age como onipotente censurando e ‘descensurando’ quando quer

Por Carlos Andreazza / O ESTADÃO DE SP

 

Alexandre de Moraes censurou e descensurou. A liberdade do onipotente produz relaxamentos; o “juízo de cognição sumária” baixando já sem tentativa de envernizar a ordem com Direito.

 

Ordenou a censura porque pleito de Arthur Lira. Em 2019, na origem dos inquéritos xandônicos, censurara a Crusoé a pedido de Dias Toffoli. É ler as oito páginas da decisão e constatar a inexistência de outra fundamentação. Periculum in Lira.

 

Ordenou a descensura porque, entre os censurados, estava jornalão. Talvez tenha sabido só depois... “Ih! A Folha.” Ministro do Supremo flagrado mui à vontade para censurar distraidamente, copiando e colando trechos de censuras anteriores.

 

O objeto da censura ora (mais ou menos) descensurado é entrevista, de 2021, em que a ex-mulher de Lira o acusa de violências físicas e coação. Vídeo que Xandão tirou do ar, em 2024, para interromper – você já conhece o texto – a “propagação dos discursos com conteúdo de ódio, subversão da ordem e incentivo à quebra da normalidade institucional e democrática”.

 

Sua intenção – ao mandar apagar relato em que uma mulher denuncia agressões – era “interromper a lesão ou ameaça a direito”.

 

Lesionado o Direito quando juiz de corte constitucional, copiando e colando, determina supressão da palavra – ato extremo – sem argumento concernente ao caso concreto.

 

Está na decisão – você já conhece o texto: “Liberdade de expressão não é liberdade de agressão! Liberdade de expressão não é liberdade de destruição da democracia, das instituições e da dignidade e honra alheias! Liberdade de expressão não é liberdade de propagação de discursos mentirosos, agressivos, de ódio e preconceituosos!”

 

Moraes copiou e colou e, calculando os tempos da última terça, 18 de junho, não será improvável que tenha despachado enquanto votava para tornar réus os acusados – entre os quais um deputado federal – de mandar assassinar Marielle.

 

O brado “liberdade de expressão não é liberdade de agressão” numa imposição censória sobre entrevista de uma mulher que acusa parlamentar poderoso de a ter agredido.

 

O presidente da Câmara peticionou, pela extensão da censura, em processo de que não é parte: uma reclamação da Agência Pública contra o bloqueio – mantido por Xandão – à reportagem “Ex-mulher de Lira o acusa de violência sexual”. A reclamação, instrumento para assegurar a liberdade de expressão, servindo à ampliação do arreganho.

 

Esse caso tramita na Primeira Turma do STF. A censura, que já dura nove meses, foi endossada por Fux e Zanin. Formada a maioria. Cármen Lúcia – outrora a juíza do “cala a boca já morreu”, que, em 2022, votou para censurar um documentário – pediu vista em abril.

Foto do autor

Opinião por Carlos Andreazza

Andreazza foi colunista do jornal O Globo e âncora da Rádio CBN Rio, além de ter colaborado com a Rádio BandNews e com o Grupo Jovem Pan. Formado em jornalismo pela PUC-Rio, escreve às segundas e sextas.

Suspensão de perfis por Moraes vira caixa-preta com sigilo e exclusão de PF e PGR

Matheus Teixeira / FOLHA DE SP

 

As decisões do ministro Alexandre de Moraes que não envolvem pedidos da Polícia Federal ou pareceres da PGR (Procuradoria-Geral da República), além do sigilo imposto a inquéritos, têm impossibilitado o acompanhamento global de quantos perfis de redes sociais foram suspensos por ele —e por quais motivos.

A determinação de retirar do ar uma entrevista da Folha com a ex-mulher do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), se soma a outras decisões do integrante do STF (Supremo Tribunal Federal) de censurar perfis em redes sociais.

O ministro recuou da censura à Folha na última quarta-feira (19), um dia após determinar a retirada do vídeo do ar.

O relatório do Congresso dos EUA com decisões sigilosas do magistrado para suspender perfis de redes sociais também revelou casos que não partiam da PGR ou da PF nem passavam por esses órgãos.

Esse fato, atrelado ao sigilo de inquéritos, faz com que somente o ministro tenha condições de saber quantas contas já mandou suspender e por quais motivos.

Uma das investigações mais polêmicas, a de fake news, aberta por Dias Toffoli, tem todos os documentos físicos, não digitalizados, sendo que sua totalidade só pode ser acessada por Moraes.

A falta de transparência nas decisões tem sido um dos motivos das críticas recebidas pelo ministro.

Em alguns casos, ao longo de cinco anos de investigações comandadas por ele, nem PGR nem PF tiveram acesso ao conteúdo antes da ordem de providência enviada às plataformas, até mesmo em determinações envolvendo quebras de sigilo.

Como mostrou a Folha, o ministro também derrubou perfis e conteúdos apenas com base em relatório da Assessoria Especial de Enfrentamento à Desinformação, órgão do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), grupo que ele chefiou.

O modelo de comunicação de Moraes com as plataformas para dar as ordens judiciais foi exposto no material divulgado pela comissão do Congresso dos Estados Unidos comandada pelo deputado republicano Jim Jordan, ligado ao ex-presidente Donald Trump —ídolo do bolsonarismo.

O documento elenca decisões de Moraes em inquéritos em andamento no STF e decisões relacionadas à atuação do ministro no TSE.

No caso da corte eleitoral, as 22 decisões reveladas são fundamentadas e detalham os motivos da suspensão das contas ou de postagens. Nelas, alguns pedidos partem da assessoria do próprio ministro.

As notificações às plataformas via STF, no entanto, não são acompanhadas das respectivas decisões fundamentadas.

Essas decisões, apontam os documentos, são relacionadas a casos como o inquérito das fake news, 8 de janeiro e milícias digitais —todos relatados por Moraes.

O ministro, nesses casos, apenas cita no documento que uma decisão foi tomada, mas é mantida em sigilo, e determina que a ordem de derrubada também seja mantida em sigilo.

Em nota, o STF afirmou que todas as decisões tomadas "são fundamentadas, como prevê a Constituição, e as partes, as pessoas afetadas, têm acesso à fundamentação". Sobre o que foi revelado pela comissão do Congresso americano, a corte informou que não se tratam de decisões, mas de "ofícios enviados às plataformas para cumprimento da decisão".

"Fazendo uma comparação, para compreensão de todos, é como se tivessem divulgado o mandado de prisão (e não a decisão que fundamentou a prisão) ou o ofício para cumprimento do bloqueio de uma conta (e não a decisão que fundamentou o bloqueio)."

A ausência das decisões tem sido criticada nos bastidores pelas plataformas. Do lado de Moraes, o entendimento é que como as plataformas são apenas o meio de divulgação, não precisam ter acesso aos documentos que fundamentam a decisão.

Advogados que representam essas empresas de tecnologia afirmam, sob reserva, que as decisões nesse sentido se acumularam durante as eleições de 2022 e logo após o pleito. Depois, o ritmo diminuiu, mas ordens judiciais desta natureza seguem ocorrendo.

Profissionais que atuam nos casos afirmam que o STF é o único tribunal do país a dar ordens do tipo sem estar acompanhada de uma fundamentação.

Pessoas com conhecimento dos processos afirmam que na minoria dos casos houve decisão posterior para autorizar a retomada de perfis. A maioria, portanto, segue fora do ar.

O relatório traz decisões relacionadas ao X (ex-Twitter), mas que também determinam a derrubada de links de outras plataformas —como TikTok, YouTube, Instagram e Telegram.

O relatório indica que foram ao menos 77 decisões tomadas no âmbito do STF pela derrubada de perfis em 2022 –em alguns casos, as contas dizem respeito à mesma pessoa, mas em diferentes plataformas.

No ano seguinte, foram suspensas das redes sociais 136 contas por ordem de Moraes nas apurações em curso no Supremo. Do total, 107 perfis foram derrubados entre janeiro e março, o que demonstra que a atuação do ministro se intensificou logo após os ataques golpistas de 8 de janeiro.

O debate sobre a atuação do magistrado em relação às plataformas voltou à tona após o dono do X, Elon Musk, fazer ataques a Moraes e ameaçar publicar tudo o que é exigido pelo ministro e "como essas solicitações violam a legislação brasileira".

O ministro iniciou sua atuação no combate às ofensivas contra o tribunal quando foi designado pelo então presidente da corte, Dias Toffoli, para ser relator do inquérito das fake news, que nasceu para apurar ataques aos membros do STF.

A instauração do caso foi criticada porque se baseou em um artigo do regimento interno do Supremo que permite abertura de inquérito caso ocorra "infração à lei penal na sede ou dependência do tribunal".

Toffoli fez uma interpretação ampliativa do texto para afirmar que ataques às contas de emails dos ministros e ameaças em meios digitais validam a decisão, uma vez que um membro do STF seria ministro em "qualquer hora e em qualquer lugar".

Nessas situações, o regimento prevê que o presidente escolha o relator, em vez de haver sorteio entre todos, como acontece geralmente.

Inicialmente, a decisão foi muito criticada, inclusive por ministros da corte. Com o passar do tempo, no entanto, os ataques ao STF durante o governo de Jair Bolsonaro (PL) se avolumaram e o apoio ao inquérito cresceu, levando à sua validação pelo plenário.

Depois, outras investigações foram abertas, também sob relatoria de Moraes, por terem conexão com a primeira.

Além disso, o magistrado se tornou integrante do TSE e assumiu a presidência da corte nas eleições de 2022. Ele mantém um discurso sobre a necessidade de o Judiciário atuar para impedir a circulação de fake news que atentem contra a democracia.

Toffoli abre nova divergência sobre porte de maconha, e julgamento continua na terça (25)

Constança Rezende / FOLHA DE SP

 

O ministro Dias Toffoli, do STF (Supremo Tribunal Federal), abriu um terceiro entendimento no julgamento sobre descriminalizar o porte de maconha para uso pessoal, que se arrasta desde 2015 e foi interrompido diversas vezes.

Em sessão nesta quinta (20), avaliou que a legislação que trata do assunto é constitucional e já não criminaliza o usuário, ou seja, não tem natureza penal, mas administrativa.

Com isso, o placar segue 5 a 3 pela descriminalização, além do voto divergente de Toffoli, e o tema volta a ser julgado na próxima terça (25).

Se manifestaram a favor da descriminalização o presidente da corte, Luís Roberto Barroso, Alexandre de Moraes, Edson FachinRosa Weber (já aposentada) e Gilmar Mendes.

Votaram contra os ministros Cristiano ZaninAndré Mendonça e Kassio Nunes Marques.

Faltam os votos de Luiz Fux e Cármen LúciaFlávio Dino não vota, porque é o sucessor de Rosa Weber, que já votou antes de se aposentar.

Todos os nove ministros que já votaram, no entanto, concordaram em estabelecer uma quantidade da droga para que uma pessoa seja classificada como usuária.

A quantia, porém, ainda não foi decidida. Sete ministros avaliam que isso deve ser definido pelo Supremo e, dois, pelo Congresso.

No início do julgamento, Barroso e Mendonça se exaltaram quando o presidente da corte relatava ter recebido uma uma ligação do presidente da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), dom Jaime Spengler, em que manifestou preocupação a respeito do caso.

Barroso disse que explicou ao religioso que o julgamento não tratava de legalização das drogas, mas sim se o tema deveria ser tratado como um ato de natureza penal ou administrativa.

"A única diferença é se deve tratar o porte com uma pena de prestação de serviços à comunidade. O usuário pode precisar de tratamento, não de uma pena de natureza penal. Continua a ser um ato ilícito, apenas passa a ser um ato de natureza administrativa, não penal", afirmou.


ENTENDA AS DIFERENÇAS

  • DespenalizarConduta não deixa de ser crime, mas deixa de haver previsão de pena de prisão quando ela ocorre.
  • Descriminalizar: Conduta não se torna legal, mas deixa de ser tratada como crime e pode ser objeto ou não de sanção administrativa.
  • Legalizar: Conduta deixa de ser ilícito e e passa a ser regulada por lei.

Mendonça pediu a palavra e disse que não se tratava de desinformação e que partilhava com o bispo a mesma preocupação. Ele afirmou que portar drogas é crime e transformar em ato administrativo é "passar a vontade do legislador" e que "nenhum país fez isso".

O ministro Alexandre de Moraes também entrou na discussão e afirmou que há uma tentativa de "deturpação dos votos e da discussão no STF no sentido de jogar a sociedade contra o Poder Judiciário".

O processo começou a ser julgado em 2015 e foi paralisado em diversas ocasiões, por pedidos de vista (mais tempo para análise) de ministros.

O relator do processo é Gilmar Mendes, que defendeu inicialmente que a medida fosse estendida para todas as drogas e argumentou que a criminalização compromete medidas de prevenção e redução de danos, além de gerar punição desproporcional.

No ano passado, no entanto, ele ajustou seu voto e o restringiu à maconha, já que era a tendência a ser formada pela maioria dos seus colegas.

QUANTIDADE PARA DIFERENCIAR USUÁRIO DE TRAFICANTE

Existem diferenças, porém, a respeito do limite que pode configurar uso pessoal. Quatro ministros (Gilmar, Moraes, Barroso e Rosa) fixam a quantidade de 60 gramas ou seis plantas fêmeas para diferenciar usuário e traficante.

Já Fachin afirmou que cabe ao Congresso deve definir a quantia que diferencia usuário e traficante.

Em agosto passado, o primeiro a divergir sobre a questão da descriminalização foi Zanin. Para ele, a conduta não deve ser descriminalizada, mas o usuário que estiver com até 25 gramas de maconha não poderá ser preso. Kassio votou da mesma forma.

Já André Mendonça, em seu voto, fixou a quantia provisória de 10 gramas para diferenciar usuário e traficante e propôs 180 dias para o Congresso regulamentar o tema.

Em março, quando o Supremo voltou a julgar o tema, o Congresso Nacional reagiu. O Senado, presidido por Rodrigo Pacheco (PSD-MG), aprovou uma PEC (proposta de emenda à Constituição) para incluir a criminalização de porte e posse de drogas na Constituição.

O texto foi validado em abril pelos senadores, por ampla maioria, e no último dia 12 a CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Câmara dos Deputados aprovou a proposta.

Ao anunciar que apoiaria a PEC, Pacheco disse que uma eventual decisão do STF pela não descriminalização seria bem vista pelo Congresso. "Não concordamos, obviamente, com a desconstituição daquilo que o Congresso Nacional decidiu que deve ser crime", afirmou, à época.

Como mostrou a Folha, uma ala do Supremo entende que, independentemente da posição do Congresso, há espaço para uma decisão que diferencie usuário e traficante em relação à maconha.

O QUE O STF ESTÁ DISCUTINDO?

A ação no STF pede que seja declarado inconstitucional o artigo 28 da lei 11.343/2006, a Lei de Drogas, que considera crime adquirir, guardar e transportar entorpecentes para consumo pessoal e prevê penas como prestação de serviços à comunidade. Já a pena prevista para tráfico de drogas varia de 5 a 20 anos de prisão.

A lei, no entanto, não definiu qual quantidade de droga caracterizaria o uso individual, abrindo brechas para que usuários sejam enquadrados como traficantes. Assim, o debate no STF pode definir critérios para distinguir usuários de traficantes.

O julgamento havia sido suspenso pela última vez em março deste ano, após pedido de vista do ministro Dias Toffoli. Naquela sessão, o presidente Barroso disse que definir parâmetros objetivos é necessário para que polícia, Ministério Público e Judiciário possam diferenciar usuários de traficantes, evitando, assim, discriminação contra pessoas flagradas com maconha simplesmente em função de renda ou escolaridade, por exemplo.

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