Governo Lula negocia pacote bilionário com municípios durante a Marcha dos Prefeitos
Por Daniel Weterman / O ESTADÃO
BRASÍLIA - O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) negociou um pacote com impacto estimado - entre ações efetivas e promessas - de cerca de R$ 900 bilhões para municípios durante a Marcha dos Prefeitos, em Brasília, nesta semana. As medidas beneficiam as prefeituras em ano eleitoral e também servem como um aceno ao Congresso Nacional - mas, por outro lado, incluem ações que diminuem o controle sobre o dinheiro público.
O pacote do governo inclui desoneração da folha salarial das prefeituras em 2024, renegociação das dívidas previdenciárias dos municípios, extensão da reforma da Previdência para as cidades, pagamento de emendas parlamentares e um novo modelo de repasse de verbas para obras de até R$ 1,5 milhão, mais rápido e com menos controle (leia mais abaixo).
O impacto de R$ 900 bilhões, um cálculo feito pela Confederação Nacional dos Municípios (CNM), ao qual o Estadão teve acesso, soma os repasses diretos, o alívio nas contas e também o potencial da economia para os municípios em medidas que ainda dependem de aprovação. Ou seja, reúne transferências efetivas e promessas para o futuro, que podem nunca ser efetivadas.
O presidente Lula usou seu próprio discurso na marcha para anunciar as medidas, entre elas a manutenção da desoneração da folha salarial dos municípios em 2024, na terça-feira, 1º. As propostas estavam no radar do governo federal anteriormente e algumas já estavam em execução, mas o governo aproveitou a marcha para criar um clima positivo com os gestores municipais. “Não tem país rico com cidade pobre”, disse o presidente durante o anúncio.
A desoneração da folha faz com que os municípios paguem um alíquota menor, de 8% em vez de 20%, sobre os salários dos servidores, e havia sido vetada pelo chefe do Executivo federal. A economia é de R$ 12 bilhões para os cofres municipais, de acordo com a CNM. Para os próximos anos, porém, o governo propõe uma reoneração gradual, cujos detalhes ainda serão negociados em projeto no Congresso.
Lula também anunciou novos prazos e condições para o pagamento dos precatórios (dívidas judiciais dos municípios), que terão limite de acordo com a arrecadação das prefeituras e com o estoque dos débitos. Segundo a instituição que representa os prefeitos, a medida permite que um volume de R$ 196 bilhões em precatórios passe por novas condições de pagamento. Não é um perdão das dívidas, mas uma forma de pagamento mais benéfica para os municípios.
Outra promessa foi renegociar a dívida dos municípios com os regimes de previdência, mexendo no parcelamento e nos juros cobrados. O impacto com a redução de multas e juros com o Regime Geral de Previdência Social (RGPS) é de R$ 86,2 bilhões, de acordo com a confederação. As dívidas com o Regime Geral e com os regimes próprios municipais que poderão ter parcelamento especial somam R$ 312 bilhões.
O governo federal também sinalizou apoio à ampliação da reforma da Previdência, aprovada em 2019 pelo Congresso, para os municípios. A proposta aprovada em 2019 mudou as regras de aposentadorias para trabalhadores em geral e servidores públicos federais, mas não mexeu com os benefícios dos funcionários estaduais e municipais.
Prefeitos avaliam que aprovar reformas por conta própria geram um desgaste maior nas cidades, e por isso querem uma extensão da reforma para os municípios. A aprovação depende de uma nova votação no Congresso Nacional, que a CNM defende, que atacaria as cidades com regimes próprios de Previdência. O texto chegou a ser aprovado pelo Senado em uma PEC paralela, mas está parado. De acordo com a instituição, a medida reduziria em R$ 308,5 bilhões o déficit previdenciário das prefeituras – que totaliza hoje R$ 1,1 trilhão.
Outra promessa de apoio é para a aprovação do projeto que permite que a União, os Estados e municípios vendam para o setor privado as contas que têm a receber (a chamada securitização). Com isso, por exemplo, um município que está cobrando uma empresa por um imposto não pago há anos poderá vender esse crédito no mercado. Quem comprar paga um valor para a prefeitura e passa a ter o direito de cobrar quem está devendo. Para os três níveis de governo, o impacto é de R$ 180 bilhões, mas ainda não há estimativa de quanto será repassado aos municípios, nem quais serão contemplados.
Haddad diz que governo simpatiza com medidas para ‘contornar constrangimento’ com municípios
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que o governo “simpatiza” com essas medidas, após o atrito gerado pela decisão do ministro Cristiano Zanin, do Supremo Tribunal Federal (STF), de suspender a desoneração da folha salarial para empresas e municípios a pedido do governo.
“Nós vamos buscar uma alternativa junto ao Congresso para contornar esse constrangimento, que é momentâneo, porque o que nós vamos fazer é muito mais do que está aprovado até aqui”, afirmou Haddad em entrevista ao canal institucional da CNM.
O governo também anunciou o pagamento de R$ 6 bilhões em emendas de bancada até esta sexta-feira, 24, e um repasse do Ministério da Saúde de R$ 4,3 bilhões para equipes de saúde em todos os municípios do Brasil. Fora esse anúncio, o governo pagou R$ 1,2 bilhão em emendas na segunda-feira, 20, valor recorde para um único dia no ano.
Governo vai repassar dinheiro antes do início de obras e sem análise de projetos
O governo Lula adotou um novo modelo de envio de dinheiro a Estados e municípios para realização de obras e compras de equipamentos, também anunciado durante a Marcha dos Prefeitos. O formato envolve o pagamento de recursos em parcela única, de uma só vez, antes do início das obras e sem análise prévia dos projetos apresentados pelas prefeituras e governos estaduais. Hoje, o repasse é gradual e depende do andamento do projeto.
Conforme o Estadão revelou, a proposta foi aprovada pelo Congresso para acelerar o envio de verbas a redutos eleitorais, mas foi vetada pelo presidente Lula e contrariou a Controladoria-Geral da União (CGU). De acordo com a CGU e com especialistas em contas públicas, o modelo diminui o controle sobre o dinheiro público e aumenta o risco de desvios.
No dia 9 de maio, o Congresso derrubou o veto à proposta que permitia o início das obras sem análise de projetos, com apoio do próprio governo. Outro item, que prevê a parcela única, deve ser analisado na próxima semana e também ser aprovado. A medida é apoiada pelo presidente da Caixa, banco controlado pelo PP, partido do presidente da Câmara, Arthur Lira, e impacta diretamente as emendas parlamentares que passam pela instituição.
Durante a marcha, o governo publicou um decreto e duas portarias que permitem o funcionamento do novo modelo. Os municípios precisarão cumprir uma série de exigências para aumentar o acompanhamento das obras e a fiscalização do dinheiro, como assegurar a qualidade técnica dos projetos, registrar todo o andamento da obra na internet, em plataforma do governo federal, e ainda colocar uma placa no local com o QR Code do aplicativo para que o cidadão tenha informações sobre a execução e possa mandar elogios, reclamações e denúncias.
A essência do modelo, porém, foi mantida conforme o interesse dos prefeitos e dos parlamentares: dinheiro na conta de uma só vez e sem análise prévia dos projetos (etapa que só será feita depois que a obra estiver pronta). O modelo vale para contratos assinados pela União com Estados e municípios com valor de até R$ 1,5 milhão, que representam 90% do total e tem potencial de mexer com R$ 5 bilhões por ano. “Vocês percebem que a ideia aqui é facilitar a vida das prefeituras pequenas em fazer acordo de até R$ 1,5 milhão”, disse Lula.
Governo desbloqueia R$ 2,9 bi, mas piora projeção de déficit no ano
O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) reverteu o bloqueio de R$ 2,9 bilhões do Orçamento, mas elevou a projeção de déficit das contas públicas neste ano de R$ 9,3 bilhões para R$ 14,5 bilhões –equivalente a 0,1% do PIB (Produto Interno Bruto).
Apesar da piora, o resultado projetado segue dentro do intervalo de tolerância previsto no novo arcabouço fiscal para o cumprimento da meta fiscal de déficit zero. Pela regra, há uma margem de tolerância de 0,25% do PIB para menos ou para mais. Na prática, o governo poderá chegar ao final do ano com um déficit de até R$ 28,8 bilhões sem estourar a meta.
A nova projeção de déficit foi encaminhada ao Congresso nesta quarta-feira (22), no segundo relatório bimestral de avaliação de receitas e despesas do Orçamento deste ano.
O governo também não precisou fazer um contingenciamento das despesas para cumprir a meta fiscal de déficit zero, como antecipou a Folha na terça-feira (21).
O relatório trouxe a reversão do bloqueio de R$ 2,9 bilhões que tinha sido feito preventivamente no primeiro relatório, em março, para não estourar o teto de gastos do novo arcabouço fiscal. O desbloqueio orçamentário ajuda a diminuir a pressão sobre as pastas que tinham sido mais afetadas pelo corte feito em março pelos ministros Fernando Haddad (Fazenda) e Simone Tebet (Panejamento).
Na época, os ministérios das Cidades e dos Transportes foram os principais alvos do bloqueio de R$ 2,9 bilhões em verbas no Orçamento. Apesar do aumento da previsão de despesas obrigatórias, a liberação do bloqueio foi possível porque o governo conseguiu abrir uma espaço fiscal permanente de R$ 15,8 bilhões em novas despesas.
O artigo 14 da lei que criou o novo arcabouço fiscal permitia essa ampliação caso a avaliação das receitas fosse favorável no relatório de avaliação do Orçamento do segundo bimestre, o que de fato aconteceu.
A ampliação do espaço de despesas amorteceu o aumento dos gastos obrigatórios.
Os números do governo mostram uma perspectiva mais otimista do que a do mercado financeiro, que espera um déficit de 0,70% do PIB para este ano diante da previsões diferentes da alta da arrecadação até o final do ano.
De acordo com o relatório, a projeção de despesas aumentou em R$ 24,4 bilhões –R$ 20 bilhões em gastos obrigatórios. Desse total, R$ 13 bilhões são destinados ao enfrentamento da calamidade pública no Rio Grande Sul –despesas que são deduzidas do cálculo da meta fiscal.
O governo contabilizou um aumento de R$ 3,5 bilhões nas estimativas de despesas com o pagamento de benefícios previdenciários, que subiu de R$ 914,2 bilhões para R$ 917,8 bilhões em 2024. O impacto dos gastos com a Previdência seria maior se não fosse o impacto das medidas de revisão desses benefícios, que incluem combate a fraudes.
As despesas com subsídios e Proagro (seguro agrícola) seguem com forte alta e têm sido um fator de piora das previsões. O novo relatório mostrou uma alta de R$ 3,8 bilhões em relação a março, com a estimativa de receitas subindo de R$ 20,4 bilhões para R$ 24,2 bilhões.
Já a previsão de receitas com impostos cobrados pela Receita Federal caiu R$ 16,4 bilhões. Esse movimento foi compensado pelo aumento de R$ 14,3 bilhões de receitas com dividendos. Entre elas, os dividendos extraordinários pagos pela Petrobras, cujo pagamento tinha sido inicialmente suspenso pelo Conselho de Administração da companhia.
A arrecadação com recursos de exploração mineral também ajudou o governo com uma alta de R$ 8,5 bilhões nas estimativas. O governo também contabilizou uma alta de R$ 9,7 bilhões com receita para a previdência.
O secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Dario Durigan, afirmou que as medidas aprovadas para recomposição fiscal estão gerando os efeitos esperados pela equipe econômica. "A gente está, de fato, vendo concretamente nos quatro primeiros meses do ano o que defendeu em 2023", disse.
ENTENDA A DIFERENÇA ENTRE BLOQUEIO E CONTINGENCIAMENTO
O novo arcabouço fiscal determina que o governo observe duas regras: um limite de gastos e uma meta de resultado primário (verificada a partir da diferença entre receitas e despesas, descontado o serviço da dívida pública).Ao longo do ano, conforme mudam as projeções para atividade econômica, inflação ou das próprias necessidades dos ministérios para honrar despesas obrigatórias, o governo pode fazer ajustes para garantir o cumprimento das duas regras.
Se o cenário é de aumento das despesas obrigatórias, é necessário fazer um bloqueio. Se as estimativas apontam uma perda de arrecadação, o instrumento adequado é o contingenciamento. Na prática, porém, o efeito acaba sendo o mesmo: o congelamento de recursos disponibilizados aos ministérios.
Como funciona o bloqueio?
O governo segue um limite de despesas, distribuído entre gastos obrigatórios (benefícios previdenciários, salários do funcionalismo, pisos de Saúde e Educação) e discricionários (investimentos e custeio de atividades administrativas).Quando a projeção de uma despesa obrigatória sobe, o governo precisa fazer um bloqueio nas discricionárias para garantir que haverá espaço suficiente dentro do Orçamento para honrar todas as obrigações.
Como funciona o contingenciamento?
O governo segue uma meta fiscal, que mostra se há compromisso de arrecadar mais do que gastar (superávit) ou previsão de que as despesas superem as receitas (déficit). Neste ano, o governo estipulou uma meta zero, que pressupõe equilíbrio entre receitas e despesas. Como a despesa não pode subir para além do limite, o principal risco ao cumprimento da meta vem das flutuações na arrecadação. Se as projeções indicam uma receita menos pujante, o governo pode repor o valor com outras medidas, desde que tecnicamente fundamentadas, ou efetuar um contingenciamento sobre as despesas.
Pode haver situação de bloqueio e contingenciamento juntos?
Sim. Não é este o cenário atual, mas é possível que, numa situação hipotética de piora da arrecadação e alta nas despesas obrigatórias, o governo precise aplicar tanto o bloqueio quanto o contingenciamento. Neste caso, o impacto sobre as despesas discricionárias seria a soma dos dois valores.
Quanto foi bloqueado no primeiro relatório de março?
Foram bloqueados R$ 2, 9 bilhões. Não houve necessidade de contingenciamento porque os dados oficiais indicaram um déficit de R$ 9,3 bilhões no ano, o equivalente a -0,1% do PIB. Embora pior do que o superávit de R$ 9,1 bilhões aprovado no Orçamento, o resultado estava dentro do intervalo de tolerância da meta defendida pelo ministro Fernando Haddad (Fazenda).
PT escala crise com ministro da Educação e quer levar à Executiva polêmica sobre Zema
Por Eduardo Gayer / O ESTADÃO DE SP
Lideranças do PT de Minas Gerais estão revoltadas com o ministro da Educação, Camilo Santana (PT), e pretendem levar o desentendimento à Executiva Nacional do partido. A crise foi deflagrada após o ministro confirmar — em vídeo nas redes sociais ao lado do governador Romeu Zema (Novo-MG) —uma parceria entre os governos federal e estadual para a construção de hospitais universitários em seis municípios mineiros, durante audiência sem nenhum deputado petista.
À Coluna do Estadão, o MEC afirmou que Santana recebe governadores de todos os Estados e espectros políticos, em agendas públicas, para tratar de temas de interesse do País, por orientação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Também esclareceu que a parceria para os hospitais está em fase de discussão, para posterior anúncio oficial.
O foco da crise é a parceria em Divinópolis. Pelo acordo, o hospital local será doado à Universidade Federal de São João Del-Rey (UFSJ), e administrado pelo MEC como um hospital-escola. Zema levou à reunião no MEC o prefeito de Divinópolis, Gleidson Azevedo (Novo), irmão gêmeo do senador Cleitinho (Republicanos). Os dois são ferrenhos opositores do presidente Lula e apoiadores do governador mineiro, que avalia disputar o Palácio do Planalto em 2026.
A tesoureira nacional do PT, Gleide Andrade, que é de Minas e integrante da Executiva, lembrou que a UFSJ foi fundada por Lula em 2008. O campus local Centro-Oeste Dona Lindu leva o nome da mãe do presidente.
“O anúncio deveria ter sido feito pelo presidente Lula, e não pelo governador [Zema], que foi o responsável pelo abandono da obra neste tempo todo”, declarou Gleide à Coluna do Estadão. Ela disse não ter entendido porque o ministro, ex-governador do Ceará pelo PT, agiu desta forma.
De acordo com relatos, outros dois petistas muito irritados com Camilo Santana são o líder do PT na Câmara, Odair Cunha (MG), e o deputado federal Rogério Correia (MG), pré-candidato a prefeito de Belo Horizonte. Procurados, não comentaram.
Aliados do ministro da Educação no Congresso, por sua vez, tentam amenizar a crise. “A gente senta e conversa, isso não pode ser motivo para crise”, afirmou o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE).
Na avaliação dos petistas mineiros, o ministro da Educação deu munição política para o prefeito de Divinópolis pré-candidato à reeleição. Ao postar o vídeo com Santana nas redes sociais, Azevedo afirmou que a parceria entre os governos federal e estadual foi concretizada a seu pedido.
Na terça-feira, 21, a federação PT-PCdoB-PV em Minas Gerais divulgou uma nota de repúdio a Camilo Santana e se diz “indignada com a forma escolhida para conduzir o anúncio”. “Sem citar parlamentares e lideranças históricas que trabalharam arduamente para que a parceria fosse viabilizada”, diz o documento.
Dinheiro acabou e Ministério do Planejamento desapareceu no governo Dilma III comandado por Lula
Por Carlos Andreazza / O ESTADÃO DE SP
O Ministério do Planejamento entrou na clandestinidade. O aparelho está por cair; seus técnicos conspirando contra as indexações-vinculações que agravam a subordinação do Brasil ao império do gastar o que não pode. Flertam os conjurados com a ideia perigosa de fazer escolhas. Ameaçam difundir que grana não dá em árvore.
E, então, sussurram o óbvio, os traidores da pátria: as contas não fecham. O dinheiro escasseia. Não está mais tão barato arrancá-lo; nada fácil fabricá-lo. Avançado já o segundo ano de governo... O mundo real se impõe.
A ministra Tebet tem paradeiro desconhecido depois de haver atentado contra a frente ampla. Expôs a saturação do fiscalismo haddadeano – aquele exercido via crescimento eterno da arrecadação. E tentou plantar a bomba da reforma estrutural na engenharia das despesas. Não haveria outro jeito, de acordo com essa inimiga da nação. É procurada.
Ainda assim, os resistentes subversivos ousam segredar que 24 veio sem PEC da Transição. Poucos se lembram do troço. Conveniente esquecê-lo. Uma injustiça, pois o projeto inicial do governo de reconstrução previa que se reproduzisse a graça. Seria a PEC da Transição Permanente.
Não que seu esbanjamento solo, em 23, tenha sido ineficaz. Fez Fernando Haddad um ministro da Fazenda crível, senhor da estabilidade fiscal. Com R$ 150 bilhões extras para iniciar os trabalhos, qualquer um vende futuro de metas superavitárias. Com cara de pau, até se comemora contas poucamente deficitárias. “Gestão no caminho certo”.
Triunfo do oximoro, também sua melhor expressão: Haddad ao mesmo tempo responsável fiscalmente e ministro da Fazenda deste Dilma III.
A conta nunca fechou. E o dinheiro acabou. Relativize-se o “ministro da Fazenda crível”. Crer pode ser bom negócio. A temporada do Haddad Meta Zero fez bons preços. Para que se avalie o tamanho do “me engana que eu gosto”: produziu o arcabouço fiscal e houve quem empenhasse a credibilidade em identificar no bicho, natimorto ao primeiro olhar, compromisso com o controle das despesas.
O arcabouço fiscal, senhoras e senhores! Aquele cujo presunto finalmente se avista e que intoxica todo e qualquer marco de credibilidade. A própria Constituição – a bíblia – do império gastador dos bilhões que não há. Crer será bom negócio quando a expiração da fé for previsível. O governo é previsível.
E ora temos a Lei de Responsabilidade Fiscal em xeque, segundo ótima reportagem de Daniel Weterman. “Em xeque” pressuporia a existência desafiada do organismo. Isso é coisa do passado. A resistência – uma década de perecimento – foi vencida. Letra morta, a LRF. Morreu em nome de novo voo de galinha. Enterrada como indigente.
Governo digital federal chega a 156 milhões, mas municípios ainda patinam e convivem até com internet discada
Luany Galdeano / FOLHA DE SP
O Brasil avança na digitalização de serviços públicos, com a promessa de desburocratizar o setor e facilitar a garantia de direitos. Mas as evoluções esbarram nas desigualdades e em lacunas de conectividade em vários pontos do país, que exigem a continuidade de serviços analógicos e, a longo prazo, podem afetar os avanços.
Plataformas como o gov.br e o Fala.BR, de acesso à informação, colocaram o Brasil em segundo lugar no último índice de maturidade em governo digital do Banco Mundial, lançado em 2022, à frente de países como Alemanha e Estados Unidos.
Apesar do destaque, a inovação é maior em âmbito federal do que em entes subnacionais, segundo Rogério Mascarenhas, secretário de Governo Digital do Ministério da Gestão.
Agora o desafio é levar ferramentas e letramento digitais a estados e municípios para que possam dar conta da transformação tecnológica. O apoio do governo federal a outros entes é previsto na Lei do Governo Digital, aprovada em 2021.
Esta é a primeira reportagem da série Governo Digital, de Vida Pública, uma parceria entre a Folha e o Instituto República.org, que vai mostrar o presente e o futuro de avanços e entraves tecnológicos na gestão pública do Brasil.
A iniciativa vai abarcar mudanças em curso no documento básico de identificação dos brasileiros, a aplicação de novas ferramentas digitais em saúde, previdência, ambiente e outros setores, além de debater os direitos de privacidade do cidadão.
"Temos números relevantes: são 156 milhões de pessoas na base do gov.br. Mas somos 203 [milhões de habitantes]", afirma o secretário Rogério Mascarenhas.
"Nossa preocupação é sempre ter um canal alternativo. Não podemos matar o analógico, porque se não vamos estar trabalhando para um aumento da exclusão."
Enquanto 76% dos órgãos federais oferecem o serviço mais procurado pelo cidadão inteiramente online, o número cai para 45% nos estaduais. Nas prefeituras, apenas 32% oferecem a possibilidade de agendar consultas e outros serviços por site, 3% ainda usam internet discada e 26% utilizam modem 3G ou 4G.
Segundo a lei do governo digital, a prestação de serviços por meio eletrônico deve ser feita com tecnologias de amplo acesso a toda a população, independentemente da renda, e sem afetar o direito ao atendimento presencial.
O gov.br, que já reúne 4.200 serviços, vai incluir também funções de outros entes subnacionais. A plataforma visa trazer vantagens para o cidadão e para gestões públicas, centralizando o atendimento virtual e permitindo que estados e municípios tenham acesso facilitado a serviços federais, como a prova de vida.
Para que isso ocorra, as gestões devem aderir à rede gov.br, que integra funções dos diferentes entes federativos. Todos os estados e o Distrito Federal já estão conectados à rede. Entre os municípios, 1.000 dos 5.565 fizeram a adesão, de acordo com a Secretaria de Governo Digital.
Essa integração já gerou uma economia de R$ 4 bilhões desde 2020, segundo cálculos do Ministério da Gestão, por reduzir a burocracia, o deslocamento até os órgãos públicos, entre outros.
O Brasil dará mais um passo na digitalização com o lançamento da Estratégia Nacional de Governo Digital, feita em conjunto com os estados e prevista para ser publicada como decreto em junho.
O documento vai trazer orientações para melhorar a oferta de serviços e objetivos a serem cumpridos, de acordo com o secretário Rogério Mascarenhas.
Ele afirma que, nesse processo, o governo federal vai apoiar estados e municípios com as adaptações necessárias para cada realidade. A criação de estruturas "figitais" —que reúnem o físico e o digital— está entre planos para ampliar o acesso aos serviços virtuais.
Com essa estrutura, o cidadão que não tem internet pode ir a um órgão público para conseguir a ajuda de um servidor e preencher um formulário on-line, por exemplo. Projetos-piloto dessa modalidade já estão em andamento em algumas cidades, como Niterói (RJ), Teresina (PI) e Lages (SC).
"Temos uma realidade desafiadora e precisamos melhorar muito a infraestrutura, mas, se olharmos para números de uso do gov.br, vemos que há apelo na população por acessar serviços digitais", diz Mascarenhas.
Governo e Congresso ‘brincam’ com fundos garantidores e criam Orçamento paralelo, diz Marcos Mendes
Por Bianca Lima / O ESTADÃO DE SP
BRASÍLIA - O pesquisador do Insper Marcos Mendes chama a atenção para uma prática fiscal que, segundo ele, vem ganhando força desde a pandemia: o uso de fundos garantidores para financiar políticas públicas fora do Orçamento, sem que esse dinheiro retorne aos cofres públicos.
Trata-se, de acordo com Mendes, de uma espécie de “Orçamento paralelo”, uma vez que o impacto fiscal desse gasto é sentido apenas uma vez, quando o governo faz o aporte no fundo. Depois, esse dinheiro acaba tendo outros tipos de utilização, e seu uso é prorrogado de forma indefinida.
O termo é refutado pelo Tesouro Nacional, que afirma que o raciocínio “está equivocado” e que “todos os aportes nesses fundos ocorreram e ocorrem como despesa primária na sua integralidade, não sendo cabível qualquer consideração quanto à não execução orçamentária desses valores”.
Mendes pondera, porém, que os aportes impactam o resultado primário apenas na transferência inicial, quando o dinheiro sai do Tesouro. “Depois, o resultado primário negativo fica para trás, e governo e Congresso ficam ‘brincando’ com esse dinheiro aqui fora”, afirma o pesquisador. Tudo se passa, destaca ele, como se a realocação dos recursos não tivesse custo fiscal.
“Não é correto dizer que não tem custo porque se trata de fundo privado que está fora do Orçamento. Esse dinheiro veio do Tesouro e deveria voltar para o Tesouro”, afirma Mendes. “Estabeleceu-se essa prática, de se criar fundos fora do Orçamento, para poder ficar manejando verbas sem as amarras fiscais”, destaca.
Atualmente, há dez fundos desse tipo (veja tabela abaixo), os quais têm natureza privada, mas são administrados pelos bancos públicos. No total, eles somam R$ 77 bilhões em participação da União, segundo os dados mais recentes, compilados pelo governo na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2025.
As finalidades são as mais diversas: garantir empréstimos mais baratos a micro e pequenas empresas; dar suporte a programas de renegociação de dívidas de pessoas físicas e jurídicas; e, indiretamente, até ajudar a financiar bolsas a estudantes de baixa renda do ensino médio, por meio do programa Pé-de-Meia.
Isso porque a política educacional é financiada por meio de um fundo privado administrado pela Caixa Econômica Federal, que, por lei, pode receber recursos não utilizados em determinados fundos garantidores.
Um mecanismo orçamentário visto como perigoso por Mendes. “É um programa social que deveria estar dentro do Orçamento, como qualquer outra despesa social, e não ser operado por fora, com recursos apartados em um fundo.”
Questionado pela reportagem, o Tesouro Nacional afirmou que os fundos garantidores “servem para garantir uma operação de crédito, e todos continuam servindo para tal propósito”. Não houve resposta, porém, em relação à sistemática do Pé-de-Meia. “Não há sentido, portanto, em criar controvérsias em relação ao uso de tais recursos dentro das regras vigentes”, diz a nota da secretaria do Ministério da Fazenda.
Outros usos, porém, vêm sendo frequentemente cogitados a esses fundos dentro do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), como, por exemplo, socorrer empresas aéreas ou garantir gastos de pequenas e médias empresas com o cartão de crédito fornecido pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
A iniciativa mais recente está ligada à retomada dos pequenos negócios afetados pela tragédia climática no Rio Grande do Sul, por meio de financiamentos mais acessíveis.
“O mecanismo de fundo garantidor para alavancar operações de crédito em momento de calamidade se revelou bem-sucedido na pandemia. Portanto, faz sentido repeti-lo agora (no caso do RS)”, avalia Mendes. Mas alerta: “Há, contudo, o risco de se repetir o passado e se mudar a legislação para deixar o dinheiro no fundo, para financiar operações futuras, sem qualquer relação com a catástrofe”.
A Medida Provisória editada pelo governo federal com foco no enfrentamento da catástrofe gaúcha previu R$ 4,5 bilhões em aportes no FGO Pronampe, administrado pelo Banco do Brasil, e outros R$ 500 milhões direcionados ao FGI-PEAC, operado pelo BNDES.
Ambos têm o objetivo de garantir empréstimos direcionados a micro, pequenos e médios empresários. No caso de inadimplência, os fundos são acionados e honram parte das perdas, reduzindo o risco das instituições financeiras, que passam a emprestar com juros mais baixos.
O texto, que agora será analisado pelo Congresso Nacional, prevê que os valores não utilizados até 31 de dezembro de 2024 sejam devolvidos à União. Esse mesmo tipo de trava, porém, existia na pandemia, mas não foi respeitada.
Inicialmente, o FGO Pronampe deveria oferecer garantias às operações emergenciais contratadas até o final de 2021, mas lei aprovada pelo Congresso e depois sancionada pelo então presidente Jair Bolsonaro tornou o Pronampe permanente e adiou para 2025 a devolução desses recursos ao Tesouro.
O Congresso, porém, já discute a possibilidade de se retirar a obrigatoriedade de retorno dos valores do FGO aos cofres públicos, fazendo com eles sejam usados para garantir o programa por tempo indefinido. O projeto é de autoria do senador Esperidião Amin (PP-SC) e está em debate na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado.
Dentre as experiências problemáticas ligadas a esse tipo de mecanismo, a mais emblemática é a do Fundo Garantidor da Construção Naval (FGCN), que tinha o objetivo de garantir os empréstimos concedidos à Sete Brasil, empresa que gerenciava a construção de navios sondas para a Petrobras.
Em um único mês de 2016, os bancos chegaram a sacar R$ 4 bilhões do FGCN diante da inadimplência da empresa, que foi citada na Operação Lava Jato e entrou em recuperação judicial.
O governo gastará no Sul um dinheiro que não tem
A situação tende a piorar, pois os gastos obrigatórios crescem mais rápido que o PIB e a arrecadação. Diante do colapso do Rio Grande do Sul, muita gente aproveitou para defender a política de gastos públicos. Disseram: “Estão vendo? O governo precisa gastar. Se não fizer isso, quem atenderá a população?”.
Fraco argumento.
Óbvio que o governo precisa gastar. Ou terá passado pela cabeça de alguém lançar uma megaprivatização de atendimento a tragédias ambientais? Também não, claro. Isso mostra que o tema é bem mais complexo.
Comecemos, então, por outro lado. Imaginemos que o governo federal estivesse com suas contas equilibradas, até gastando menos do que arrecada. Teria, portanto, caixa forrado e espaço para tomar empréstimo — e gastar uma grana pesada na reconstrução do Rio Grande e no socorro às famílias.
Não é essa a realidade. O governo já vinha aumentando suas despesas, em nível muito acima da arrecadação. Tem déficits acumulados, dívida em alta. Pior ainda: o governo gasta 90% de seu orçamento com despesas obrigatórias: pensões e aposentadorias, salários do pessoal, programas como seguro-desemprego, benefício a idosos, Bolsa Família, educação e saúde. Sobram míseros 10% para todo o resto: investimentos, subsídios e créditos favorecidos a determinados setores, os diversos PACs.
O dinheiro já é insuficiente para isso, e a situação tende a piorar, pois os gastos obrigatórios crescem mais rápido que o PIB e a arrecadação. Falando francamente: não tem dinheiro disponível para gastar com o atendimento à tragédia no Sul. E, entretanto, tem de gastar.
Como? Desistindo de todos os demais investimentos e programas, o que o governo Lula não pretende fazer, ou tomando mais dinheiro emprestado. Endividar-se significa gastar mais com juros e pressionar, para cima, a taxa de juros de mercado.
Pior ainda: o governo estadual e as prefeituras também terão de gastar mais. Podem? Antes da tragédia, o governo gaúcho já estava em recuperação fiscal. Traduzindo: não pagou suas dívidas, a União assumiu, e o estado passou a pagar prestações mensais mais camaradas. O governo federal já suspendeu o pagamento dessas parcelas, pelos próximos três anos. Isso deixa R$ 28 bilhões nos cofres do estado e tira esses mesmos recursos da receita da União. Mais déficit federal. E estadual, mais à frente.
Logo, assim como Brasília, também o Rio Grande entra nessa história já sem dinheiro em caixa e endividado. O mesmo vale para a maior parte das prefeituras, que só têm uma saída: arrancar dinheiro de Brasília e pegar umas sobras do que vai para o estado.
Em muitos programas de assistência, o governo federal oferece crédito a cidadãos e empresas, em vez de simplesmente dar dinheiro. Os juros são subsidiados, mas quem recebe os empréstimos terá de devolver em algum momento. Logo, o setor privado tem de se virar. Acionistas precisarão alocar capital e fazer ajustes. O PIB gaúcho fatalmente encolherá.
Eis por que é uma grande bobagem dizer que o governo tem de gastar. A questão é: que dinheiro, onde e como gastar?
Dizemos isso, embora óbvio, porque já se vê por aí um pessoal sugerindo que as contas públicas estourarão por causa das despesas com a recuperação do Sul. Não. Já estavam arrombadas. Pretendem tirar da contabilidade o gasto com a recuperação, de modo que, legalmente, o Orçamento estará dentro das metas. Mas, dentro ou fora dos livros contábeis, o gasto feito gera déficit e dívida reais. E juros.
Eis por que a ministra do Planejamento, Simone Tebet, teve a ousadia de pensar em ajuste fiscal. Só pensar, estudar como equilibrar as contas nos próximos anos. Já sofre ataques só por isso. Ataques ideológicos — falar de ajuste numa hora desta? — porque os números da ministra dizem o seguinte: nessa toada, em 2028, todo o Orçamento do governo será destinado às despesas obrigatórias. Não sobrará nada para investimentos. Muito menos para a prevenção e cuidados com as tragédias ambientais.
Esses são os números. O resto é palavrório e uma feia tentativa de assumir protagonismo político em meio à tragédia.
Se Lula acertar no Sul, sobe nas pesquisas; se errar, cai. É do jogo
Por Eliane Cantanhêde / O ESTADÃO DE SP
O pior já passou? Não, não passou. A previsão é de tempos ainda muito difíceis e dolorosos no Rio Grande do Sul, com chuvas e enchentes ao sul do Estado e aumento do risco de doenças por toda parte onde a água começa a secar e a lama fica, com uma profusão de bactérias, sujeira e dor. O foco, neste momento, está na saúde e na ajuda emergencial para famílias, municípios, Estado e produtores, sem descuidar da reconstrução.
Em Pelotas e Rio Grande, cidades banhadas pela Lagoa dos Patos, atenção total para a piora da situação, com mais água escoando para o oceano e os níveis da lagoa subindo e ameaçando com inundações, deslizamentos e a destruição de casas, comércios, empresas. Logo, a vida de pessoas.
Em todo o Estado, alerta para as doenças ligadas à água, como leptospirose, hepatite A e diarreias, e o frio potencializa as síndromes respiratórias, especialmente em circunstâncias adversas, com crianças, idosos e suas famílias amontoados em abrigos e que deixaram cobertores e agasalhos para trás, em suas casas alagadas, muitas perdidas para sempre. Como centenas de pessoas poderão usar máscaras, dia e noite, num ambiente assim? O razoável é que só os que apresentarem sintomas passem a usar.
O secretário de Atenção Especializada do Ministério da Saúde, sanitarista Adriano Massuda, que se reuniu nesta semana com os secretários de Saúde Arita Bergmann, do Estado, e Fernando Ritter, de Porto Alegre, registra que foram garantidos 1,2 milhão de doses de vacinas, o abastecimento de oxigênio, que poderia faltar em dois dias, e cem kits para desastres desse tipo.
Cada kit é suficiente para atender 1.500 pessoas durante 30 dias e contém 40 itens, como analgésicos, anti-inflamatórios, antibióticos e material de primeiros socorros e a isso se somam as parcerias com Estados, municípios, indústrias farmacêuticas e de material de saúde, planos de saúde, clínicas e entidades. “Uma operação de guerra”, resume Massuda.
O governo federal também anuncia R$ 30 milhões para assistência de alta complexidade, já que pacientes de câncer e renais, por exemplo, ficaram de repente sem hospitais e desorientados. E há, como alerta o secretário, a grave questão das doenças mentais, a ansiedade, o medo, o desespero. A intenção é também aumentar o número de leitos na capital e nas cidades atingidas, criar pelo menos mais um hospital de campanha e monitorar o número de profissionais de saúde que a emergência exige.
Essa guerra, que não é só da saúde, mas de todo o governo federal e do País inteiro, joga luzes nos erros do passado e nos riscos do futuro: se o Brasil, os demais Países e a humanidade inteira não tiverem o diagnóstico correto e não agirem adequadamente para enfrentar para as mudanças climáticas, a vida na Terra estará ameaçada. O alarme já é estridente: enchentes nunca antes vistas, secas aterrorizantes, incêndios e devastação por todo o planeta.
Do ponto de vista político, é preciso criticar quando algo vai mal, por exemplo, na política externa e na ingerência política na Petrobras, mas é também preciso reconhecer quando as ações vão na direção certa. O presidente Lula tem comandado a guerra, tomado decisões, liberado verbas emergenciais, cobrado os ministros, acompanhado de perto ações e marcado presença na área da tragédia, que é o que se espera de governantes e líderes. A grande dúvida é de onde vem tanto dinheiro, e num momento em que o grande nó da política econômica é a questão fiscal.
E Lula arranhou seu desempenho ao nomear como o homem de Brasília na crise o gaúcho Paulo Pimenta, ministro, deputado federal mais votado do PT na história do Estado e candidato natural ao governo em 2026. Pior: anunciar Pimenta, rindo, alegre, como se fosse um palanque. Mas é um erro de forma, que não afeta o conteúdo. A verdade é que o governo tem feito tudo o que é possível. Se terá efeitos na popularidade de Lula, na avaliação do governo e em futuras eleições... Bem, isso é da natureza política. Aliás, da própria natureza humana.
Ceará tem o 5º maior aumento na alfabetização em 12 anos, mas segue com 14% da população analfabeta
O Ceará conseguiu reduzir, entre 2010 e 2022, a proporção de pessoas com 15 anos ou mais que são analfabetas e, logo, aumentou a taxa de alfabetização, tendo a 5º maior ampliação desse índice no país, entre os 26 estados e o Distrito Federal. Os dados constam no Censo Demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2022 e foram divulgados nesta sexta-feira (17). Em 2010, 18,8% da população cearense com 15 anos ou mais (critério usado nos censos do IBGE desde 1950) era analfabeta, ou seja, não sabia ler e escrever ao menos um bilhete simples. Em 2022, essa proporção, que evidencia um problema histórico, recuou 4,7 pontos percentuais e, no cenário mais recente, 14,1% da população segue analfabeta.
O Censo Demográfico 2022 é uma pesquisa feita pelo IBGE em todas as residências brasileiras, e além de dados sobre as características da população e as formas de moradia, também investiga aspectos como educação. Nesse quesito, a pesquisa que ocorreu em 2022 (com atraso, pois deveria ter sido aplicada em 2020) investigou o estado educacional da população indicando de forma censitária qual a proporção de pessoas alfabetizadas e não alfabetizadas em cada cidade brasileira.
Segundo o IBGE, é considerada alfabetizada a pessoa que “sabe ler e escrever pelo menos um bilhete simples ou uma lista de compras, no idioma que conhece, independentemente do fato de estar ou não frequentando escola e já ter concluído períodos letivos”. A informação foi captada no item “Sabe ler e escrever?”, do questionário básico do Censo Demográfico aplicado nas residências.
Mas, apesar da melhora no cenário, o Ceará ainda é o 5º do país com a maior proporção de pessoas analfabetas. E a taxa de analfabetismo no Estado é o dobro da média nacional, visto que no Brasil, em 2022, 7% do contingente populacional não sabia ler nem escrever, enquanto 93% foram considerados alfabetizados.
No Brasil, o Nordeste ainda concentra os maiores índices de analfabetismo e os 9 estados constam na lista com as 10 unidades da federação com as menores taxas de alfabetização. No caso de Alagoas, o estado foi a Unidade da Federação que mais aumentou o percentual de pessoas de 15 anos ou mais alfabetizadas, com uma expansão de 6,7 pontos percentuais, ainda assim isso não foi suficiente para retirá-la da última posição na taxa de pessoas alfabetizadas.
SITUAÇÃO DOS ESTADOS
Entre as unidades da federação, em 2022, segundo dados do IBGE, as maiores taxas de alfabetização foram registradas em Santa Catarina, com 97,3%, e no Distrito Federal, com 97,2%. Já Alagoas, com 82,3%, e o Piauí, com 82,8% tiveram as menores taxas.
No Censo de 2010 a diferença entre a maior e a menor taxa de alfabetização, isto é, entre o Distrito Federal e Alagoas era de 20,9 pontos percentuais, mas em 2022, esse diferencial caiu para 15 pontos percentuais entre Santa Catarina e Alagoas.
Vale ressaltar que o Brasil adota no Censo, desde 1950, o referencial da declaração sobre saber ler e escrever, logo, é registrada como analfabeto quem tenha declarado não saber. Esse parâmetro que considera a população com 15 anos ou mais tem conexão com o entendimento da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) e, em geral, é usado para efeito de comparações internacionais.
CIDADES CEARENSES ENTRE AS MENOS ALFABETIZADAS
Para avaliar as taxas de alfabetização nas distintas cidades brasileiras, o IBGE recortou os dados a partir do porte das cidades. Elas foram divididas da seguinte forma:
- Com até 10 mil habitantes;
- Com mais de 10 mil até 50 mil habitantes;
- Com mais de 50 mil habitantes até 100 mil habitantes;
- Com mais de 100 mil habitantes até 500 mil habitantes;
- Com mais de 500 mil habitantes;
No caso dos municípios com mais de 50 mil habitantes e menos de 100 mil, três cidades do Ceará tiveram altas taxas de analfabetismo, são elas:
- Granja: com 53.344 habitantes, 29% da população era analfabeta;
- Icó: com 62.642 habitantes, 25,9% da população era analfabeta;
- Boa Viagem: 50.411 habitantes, 24,3% população era analfabeta;
No caso das cidades maiores, com mais de 500 mil habitantes, capitais como Maceió, Teresina e Natal estão entre os cinco municípios com maiores taxas de analfabetismo no Brasil.
DIFERENÇAS DE GÊNERO E RAÇA
Quando considerado o recorte de cor ou raça, os dados do Censo 2022 indicam que a taxa de analfabetismo segue menor entre a população de cor ou raça branca do que as taxas das populações preta, parda e indígena.
No Brasil, 4,3% da população branca é analfabeta, enquanto 10,1% da população preta; 8,8% dos pardos, 16,1% dos indígenas estão na mesma condição.
No comparativo entre os censos, as diferenças entre esses grupos caiu em pontos percentuais, mas as taxas de pretos e pardos analfabetos ainda são mais do que o dobro da registrada para os brancos.
Outro recorte, por gênero, indica que no Brasil, 93,5% das mulheres em 2022 sabiam ler e escrever, enquanto o número de homens era 92,5%. Segundo o IBGE, essa vantagem das mulheres foi verificada em praticamente todos os grupos etários analisados, com exceção entre pessoas de 65 anos ou mais de idade, onde 79,9% dos homens e 79,6% das mulheres são alfabetizados.
Após Lula determinar mudanças, Petrobras demite 20 nomes ligados a Prates; cortes devem seguir
Por Renata Agostini / FOLHA DE SP
Após o presidente Lula determinar mudanças na Petrobras e demitir Jean Paul Prates do comando da petroleira, os cortes na empresa seguem em ritmo acelerado. Em dois dias, 20 executivos já foram afastados da empresa.
A lista inclui diretores, assessores e consultores ligados a Prates. Entre eles estão, por exemplo, o diretor de Transformação Digital e Inovação, Carlos Augusto Barreto, e o advogado-geral da Petrobras, Marcelo Mello.
A “limpa” envolveu um mapeamento de cargos até no exterior. Um dos cortes alcançou o contrato com uma consultora, que reside no Canadá e trabalhava em sistema “híbrido”, vindo ocasionalmente ao Brasil.
As mudanças devem prosseguir nas próximas semanas. A expectativa é que haja trocas significativas na diretoria da Petrobras. Como mostrou a coluna, as diretorias de engenharia e governança estão na mira desde que a demissão de Prates foi confirmada.
A mudança entrou no radar do governo ainda que o movimento para trocar o atual diretor de governança não seja dos mais simples, já que requer o apoio de minoritários. Já há, inclusive, um nome cotado para o cargo, o do auditor da Controladoria-geral da União (CGU), Edson Leonardo Dalescio Sá Teles.
A Petrobras afirmou, por meio de nota, que foram destituídos profissionais “cujos contatos de trabalho estavam diretamente vinculados ao mandato do ex-presidente Jean Paul Prates” e disse que se trata de um “procedimento padrão”.
Prates foi demitido por Lula na terça-feira. O presidente indicou Magda Chambriard para o cargo.