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Corrida de Haddad: Governo tem de aprovar uma medida a cada 3 dias para passar pauta econômica

Por Adriana Fernandes e Bianca Lima / O ESTADÃO DE SP

 

BRASÍLIA - A menos de quatro semanas do início do recesso de fim de ano do Congresso, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, corre contra o tempo para conseguir a aprovação de pelo menos oito itens da pauta econômica até o dia 22 de dezembro - ou seja, uma proposta a cada três dias.

 

Na contabilidade do apertado calendário dos próximos 25 dias da Câmara e do Senado, a tendência das lideranças é concentrar a maior parte das decisões para os últimos dias antes do recesso parlamentar, nas chamadas votações do “fim do mundo”.

 

É como os técnicos da área econômica costumam chamar esse período de votações decisivas na reta final do ano, quando muitos “jabutis” acabam sendo aprovados. O custo para o governo conseguir os votos fica sempre mais caro quanto menos tempo se tem para aprovar as propostas.

 

A tarefa da equipe econômica não será só aprovar a agenda econômica, mas também barrar a inclusão de medidas de última hora que retirem receitas ou aumentem despesas, como tem acontecido nos últimos anos. Boa parte dos jabutis só é conhecida no início do ano seguinte.

 

Em nome da pauta econômica, Lula já entregou o comando da Caixa, e o Congresso quer quase R$ 10 bilhões a mais de emendas parlamentares, subindo o valor para um total de R$ 46 bilhões, além de blindá-las dos bloqueios com um cronograma para empenho.

 

O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) quer que o governo dê o comando da Funasa para os Republicanos e não para o PSD. Essa negociação pode entrar na barganha política.

 

Para acalmar os partidos sobre a Funasa, o líder do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (sem partido-AP) apresentou uma emenda à Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) prorrogando os contratos até dezembro de 2024. Era um pedido dos partidos para os contratos que vencem agora em dezembro, e os prefeitos estão pressionando para não perder.

A agenda econômica

Na lista dos oito itens da pauta econômica com impacto nas contas do governo (veja a lista abaixo), estão a votação dos vetos que o presidente fez dos projetos do novo arcabouço fiscal, das mudanças no Carf e da desoneração da folha de pagamentos.

 

A votação desses três vetos têm impacto decisivo nas contas do governo em 2024. No caso da desoneração da folha, o custo adicional pode chegar a R$ 20 bilhões.

 

Empresários dos setores beneficiados pela prorrogação da desoneração até 2027, aprovada pelos parlamentares, já tinham iniciado uma movimentação no Congresso, na semana passada, pelo adiamento da sessão de votação dos vetos diante do risco de o presidente Lula confirmar o novo veto, o que de fato aconteceu.

 

Os projetos de taxação dos fundos exclusivos (dos super-ricos) e offshore (no exterior) e das apostas esportivas estão com votação adiantada no Senado e têm o apoio do presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Ele apresentou projeto e conseguiu apoio de Lula e Haddad para repactuação da dívida de R$ 160 bilhões do seu próprio Estado, Minas Gerais. No mesmo dia que Pacheco apresentou a sua proposta, que inclui a federalização da Cemig, a pauta começou a andar.

 

Fora do País por 11 dias, em viagem oficial, o ministro Haddad segue em contato permanente com sua equipe. Os dois pontos mais sensíveis no momento são as negociações da Medida Provisória (MP) da subvenção e a aprovação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2024, com uma emenda ao texto apresentada por Randolfe para reduzir o limite do contingenciamento (bloqueio preventivo de despesas) para um patamar em torno de R$ 23 bilhões.

 

negociação da MP, que altera a sistemática de aproveitamento de créditos de impostos federais com base em incentivos concedidos pelos Estados a grandes empresas via ICMS, está avançando com Lira. No Ministério da Fazenda, há otimismo de que a MP será aprovada depois que o presidente da Câmara assumiu o papel de “relator informal”.

 

O relator escolhido é o deputado Luiz Fernando Faria (PSD-MG), do mesmo partido e Estado do presidente do Senado.

 

Um integrante da equipe econômica disse ao Estadão, na condição de anonimato, que os “quase dez itens” serão aprovados até final do ano e que as negociações avançaram muito desde a semana passada.

O governo já dá como certo que o relator da proposta, deputado Danilo Forte (União-CE), acatará a emenda do senador Randolfe, abrindo espaço para um bloqueio menor. Forte, no entanto, está irritado com notícias de que aceitou a emenda em troca de uma regulamentação favorável para as empresas de energia eólica no seu Estado, o Ceará.

 

O bloqueio menor de despesas - a projeção anterior era de R$ 53 bilhões - foi uma garantia dada por Haddad a Lula para a manutenção da meta de zerar o déficit das contas públicas no ano que vem.

Em nota, o relator nega que tenha firmado esse acordo. “Aquele que inferir que minha luta pela Energia Limpa e pelo Nordeste possa me levar a comprometer o regramento fiscal e orçamentário do País na LDO está redondamente enganado”, disse ele. Interlocutores do relator afirmam que ele ainda não tomou a decisão.

 

Com o atraso na LDO, as discussões do projeto de Orçamento de 2024, a chamada LOA (Lei Orçamentária Anual), vão sendo postergadas. O prazo para apresentação de emendas foi estendido até 1º de dezembro e os prefeitos fazem fila nos gabinetes para terem seus pedidos abraçados pelos deputados e senadores.

 

A aprovação final da reforma tributária, mesmo com a possível supressão de trechos em que não houve acordo entre Câmara e Senado, também está na pauta.

 

O deputado José Guimarães (PT-CE), líder do governo na Câmara, lista as três grandes prioridades na Casa. Primeiro, votar a MP 1185, depois a reforma tributária e o combo LDO-LOA. “Essencial para o País é a votação da 1185. Se nós votarmos ela, eu me dou por satisfeito, com sentimento de dever cumprido”, afirma.

 

Ele está confiante de que a LDO será votada nesta semana com a “emenda Randolfe”. Segundo ele, o que falta é a definição dos valores das emendas de bancada e de comissão. “Vamos acordar o conteúdo e o valor das emendas, de qual modalidade, se é dos ministérios ou se é de comissão e vamos aprovar a emenda do Randolfe, porque é essencial”, destaca

 

Economista-chefe da Warren Rena, Felipe Salto avalia que Haddad terá sucesso com os projetos de aumento de arrecadação, porque o ministro está conseguindo negociar aqueles mais difíceis para criar algumas flexibilizações.

 

“Na MP da Subvenção, ele está conseguindo resolver o passado com o parcelamento. É bom, porque pode viabilizar uma correção que é importante”, diz Salto. Ele ressalta que, hoje, o Estado escolhe dar o benefício e a União paga a conta sem ter escolhido. Na sua avaliação, é natural que haja esse acúmulo de projetos no fim do ano e os temas fiscais acabem ficando para última hora, aos “45 minutos do segundo tempo”.

 

“O problema é que tem a LDO e o Orçamento também”, diz o economista, que vê com preocupação as tentativas de renegociação de dívidas dos Estados com a União. “Esse é um tema que me preocupa. Alguns Estados não cumprem o prometido, que é fazer o ajuste fiscal“, diz. No caso de Minas, ele questiona quanto vale a Cemig em relação ao tamanho da dívida de Minas Gerais, que “é de três dígitos”.

 

Para o deputado Mauro Benevides (PDT-CE), que chegou a ser cotado para ser o relator da MP 1185, a cobrança da retroatividade dos passivos será difícil de passar. “Retroatividade não está passível de aceitar”, admite. Mas o pedetista não vê problemas de prazos para aprovar a pauta. “Eu aprendi no parlamento que, quando se faz acordo na reunião de líderes ao meio-dia, às 18h a matéria está aprovada”, ressalta.

 

Veja a lista da pauta mais urgente da agenda econômica:

  • Fundos dos super-ricos (Senado)
  • Apostas esportivas (Senado)
  • Reforma tributária (Câmara)
  • Subvenção (Câmara)
  • Juros sobre Capital Próprio (JCP) (Câmara)
  • LDO (Congresso)
  • LOA (Congresso)
  • Vetos do arcabouço, Carf e desoneração da folha (Congresso)

Escolha de Flávio Dino para Supremo Tribunal Federal abre crise no PT

Por Vera Rosa / O ESTADÃO DE SP

 

A escolha do ministro da Justiça, Flávio Dino, para o Supremo Tribunal Federal (STF) abalou a cúpula do PT, que não esconde a contrariedade com a decisão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Dirigentes petistas queriam emplacar na Corte o advogado-geral da União, Jorge Messias, que é próximo do partido, especialmente do líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA).

 

Dino é visto como um adversário político não apenas por bolsonaristas como também pela ala majoritária do PT desde os tempos em que era governador do Maranhão. Nos bastidores, integrantes do comando petista observam que, mesmo no Supremo, nada impede que Dino deixe a Corte para disputar a Presidência da República na eleição de 2030. O ministro é filiado ao PSB, sigla que também abriga o vice, Geraldo Alckmin. A portas fechadas, Dino sempre disse que uma hipótese dessas seria uma “loucura”.

 

Na avaliação de senadores e deputados do PT ouvidos pelo Estadão, sob reserva, o sentimento no partido é o de que Lula ignorou o seu próprio partido ao tomar a decisão não apenas porque confia em Dino, mas também para contemplar os ministros do STF Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes. Os dois magistrados defenderam os nomes de Dino para o STF e do subprocurador Paulo Gonet para o comando da Procuradoria-Geral da República (PGR).

 

A indicação do secretário-executivo Ricardo Capelli como ministro interino da Justiça, até a escolha do sucessor, também é outro fator de insatisfação nas fileiras do PT. No diagnóstico da cúpula petista, Lula está dando três “trancos” no partido com suas decisões, um atrás do outro. O primeiro deles está na escolha de Dino para o STF. O segundo é deixar Capelli, considerado um desafeto da legenda, como interino no Ministério da Justiça.

 

O terceiro é que uma importante ala do PT já trabalhava para apaziguar o descontentamento provocado pela indicação de Paulo Gonet como procurador-geral da República, no lugar de Augusto Aras, na expectativa de que Lula “compensasse” o partido e indicasse Jorge Messias para a cadeira antes ocupada por Rosa Weber no STF. Não foi o que ocorreu.

 

Na semana passada, grupos de esquerda chegaram a enviar a Lula um manifesto contra a indicação de Gonet para a PGR, sob o argumento de que ele era “ultraconservador”, com passagens que colidiam com a defesa dos direitos humanos.

 

Apesar das críticas a Gonet, petistas com trânsito no Palácio do Planalto entraram em cena para defender o nome do subprocurador e dissipar o mal-estar. Esperavam que, com esse gesto, Lula atendesse aos apelos do partido para fazer de Messias o novo ministro do STF.

 

Mesmo contrariados, dirigentes do PT já haviam até mesmo se conformado com o fato de o presidente não escolher agora uma mulher negra para a vaga de Weber. Mas, quando achavam que Messias estava mais bem posicionado no jogo, foram surpreendidos com o anúncio de Dino.

Presidente recebeu garantias de Pacheco e Alcolumbre

Lula pretendia indicar somente Gonet agora, deixando a escolha do novo ministro do Supremo para a volta da viagem aos Emirados Árabes, para onde embarca nesta segunda-feira, 27, a fim de participar da 28.ª Conferência das Nações Unidas para Mudanças Climáticas. Mudou de ideia, porém, depois de o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e também o senador Davi Alcolumbre, que comanda a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), garantirem a ele que Dino não ficaria “na chuva” e teria o nome aprovado na Casa.

 

Tanto Dino como Gonet precisam passar por sabatinas na CCJ e no plenário do Senado para serem nomeados. O ministro da Justiça sofre resistências de aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro por ter atuado fortemente para enquadrar bolsonaristas que participaram dos atos golpistas de 8 de janeiro. Liderada pelo PL de Bolsonaro, a oposição já avisou que tentará barrar a ida de Dino, senador licenciado, para o Supremo.

 

Nos últimos dias, no entanto, tanto Pacheco como Alcolumbre se aproximaram de Lula. Os dois asseguraram ao presidente que os nomes de Dino e Gonet serão aprovados em sabatinas no Senado antes do recesso parlamentar, que começa em 22 de dezembro.

 

Nessas articulações, até mesmo dirigentes do PT desconfiam que o líder do partido no Senado, Jaques Wagner (BA), se aliou a Pacheco e Alcolumbre e votou a favor da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que restringe poderes do Supremo para fazer um aceno na direção da dupla. Com o movimento, Wagner irritou o PT e o Supremo, mas pode ter sido um jogo combinado com Lula, que, depois, afagou os magistrados.

Facilitar o trabalho

O governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) insiste em ações retrógradas na área trabalhista. A última tentativa foi o decreto que limita o trabalho aos domingos e feriados, publicado em 14 de novembro e suspenso poucos dias depois devido à reação do Congresso.

A norma reverte a permissão ampla concedida em 2021, ao exigir previsão em convenção coletiva e aprovação municipal do trabalho dominical e em feriados para vários setores da economia, como farmácias, lojas e supermercados.

As exigências valeriam a partir de janeiro, mas o decreto suscitou movimentação no Parlamento e em associações do setores afetados. No dia 21, foi aprovada na Câmara a urgência para votação de um projeto de decreto legislativo para derrubar a portaria do governo.

Percebendo o alto risco de derrota, Luiz Marinho, ministro do Trabalho, suspendeu temporariamente a mudança e agora diz que instaurará uma comissão tripartite, com representantes de governo, sindicatos e associações patronais.

Tanto o ministro como dirigentes sindicais justificaram a portaria anacrônica como uma tentativa de fortalecer os sindicatos.

Trata-se, na prática, de dificultar a vida de trabalhadores e empresas, impondo o intermédio de dirigentes nas soluções. Eis a receita de sempre para manter a tutela das negociações trabalhistas em estruturas sindicais ossificadas.

Não procede o argumento de que os direitos trabalhistas são desrespeitados e precisam ser novamente revistos em convenções.

Nenhuma norma pode suplantar dispositivos da CLT que disciplinam a carga máxima de trabalho e o descanso semanal. Já há, ademais, acordos coletivos para a jornada aos domingos e feriados.

É quase unânime o entendimento de que o caminho mais sensato e que gera melhores resultados para a economia é ampliar a liberalização, sob as regras da CLT, mas governo e parceiros sindicais permanecem corporativistas.

O ministro deveria estar mais preocupado em implementar uma modernização que fortaleça a representação de classe a longo prazo. É do interesse dos trabalhadores a existência de sindicatos atuantes, que atraiam associados e contribuições voluntárias.

Em vez de reforçar estruturas monopolistas arcaicas, o melhor seria liberalizar o sistema e ampliar a concorrência entre as entidades, o que exigiria a revisão da unicidade constitucional. Não serão, por certo, os dirigentes atuais a iniciar tal debate essencial.

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Lula indica Flávio Dino para STF e vai enfrentar bolsonaristas no Congresso

Por Caio Spechoto e Vera Rosa / O ESTADÃO DE SP

 

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) indicou nesta segunda-feira, 27, o ministro da Justiça, Flávio Dino, para vaga no Supremo Tribunal Federal (STF), e o subprocurador-geral da República Paulo Gonet para o comando da Procuradoria-Geral da República (PGR). Os dois nomes serão analisados pelo Senado. Quando Dino foi incluído na lista dos prováveis indicados por Lula, senadores da oposição vieram a público protestar, avisando que fariam de tudo para tentar barrar a nomeação.

 

Dino e Gonet se reuniram com o presidente no Palácio do Alvorada antes de o petista embarcar para Riade, capital da Arábia Saudita, em uma viagem para participar da 28ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, a COP-28, em Dubai, nos Emirados Árabes. Depois, Lula seguirá para a Alemanha, retornando ao Brasil em 5 de dezembro.

 

As indicações foram encaminhadas para o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), de acordo com publicação da equipe de Lula no X (antigo Twitter).

 

Os dois nomes serão sabatinados pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), presidida por Davi Alcolumbre (União Brasil-AP). Após essa etapa, as indicações serão submetidas ao plenário da Casa.

Minutos após a confirmação da indicação para o Supremo, Flávio Dino agradeceu a Lula e afirmou que dialogará para ter o apoio dos senadores.

 

“O presidente Lula me honra imensamente com a indicação para ministro do STF. Agradeço mais essa prova de reconhecimento profissional e confiança na minha dedicação à nossa nação. Doravante irei dialogar em busca do honroso apoio dos colegas senadores e senadoras. Sou grato pelas orações e pelas manifestações de carinho e solidariedade”, disse Dino em seu perfil no X.

 

Lula se reuniu com ministros do STF antes das indicações

 

Lula promoveu um jantar no Alvorada, na quinta-feira, 23, com os ministros do STF Alexandre de MoraesGilmar Mendes Cristiano Zanin. Foi uma tentativa de distensionar o ambiente depois que o Senado aprovou uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para restringir poderes da Corte. A PEC contou com o apoio do líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), o que foi considerado pelos magistrados como uma “traição”.

 

Dino e o ministro Jorge Messias, da Advocacia-Geral da União (AGU), também estavam presentes ao jantar. Messias e o presidente do Tribunal de Contas da União (TCU)Bruno Dantasdisputavam a vaga do STF com o titular da Justiça. Sob reserva, ministros disseram que, após a saída de Dino e de Messias da reunião no Alvorada, Lula confirmou a eles suas escolhas.

 

O Estadão apurou que Alcolumbre garantiu a Lula a marcação das sabatinas no menor tempo possível, antes do recesso parlamentar, que começa em 22 de dezembro. Alcolumbre criou problemas para o presidente nos últimos tempos, mas, recentemente, se reaproximou do Palácio do Planalto.

 

Em entrevista nesta segunda, Rodrigo Pacheco afirmou que a análise dos nomes será entre os dias 12 e 15 de dezembro. “Vamos ter que fazer um esforço concentrado para fazer a apreciação de todas essas autoridades até o final do ano”, disse.

Antigos vilões e experiências fracassadas ressurgem na cena política sob Lula 3.0

Por Malu Gaspar / O GLOBO

 

Você também tem a sensação de que a política nacional parece uma grande sessão da tarde em que os vilões do passado reaparecem, tentando se repaginar como mocinhos? E não só os personagens, mas também os enredos se repetem? Não é só sensação.

 

Uma das principais notícias da semana é a tentativa do governo Lula de tutelar a Petrobras para que controle os preços dos combustíveis de forma a não deixar a inflação subir demais, além de investir em plataformas e navios construídos no Brasil, apostando na volta da cota de conteúdo nacional que contribua para a geração de empregos.

 

Quem já viu esse filme sabe o final. Jean Paul Prates pode até resistir por um tempo, mas terá de ceder quando Lula acionar o trator do Palácio do Planalto. Não é difícil prever o final da história, assim como não é difícil saber como termina o enredo batido da ressurreição da indústria naval.

 

Já houve diversas tentativas de financiar a construção de navios em grande escala no Brasil com financiamento público. Mas, sem mão de obra qualificada, tecnologia de ponta e metas de produtividade, os estaleiros nacionais não conseguem competir num mercado global. Cedo ou tarde, acabam sucumbindo e quebrando.

 

Lava-jato: relembre alguns dos mais relevantes alvos da operação

O doleiro Alberto Youssef: "marco zero" das investigações, a partir de um inquérito do ex-delegado da Polícia Federal Gerson Machado, de 2008, sobre lavagem de dinheiro — Foto: Jorge William / Agência O Globo - 27/10/2015

Paulo Roberto Costa, ex-diretor de abastecimento da Petrobras. Ligações com Youssef deu origem à investigação sobre a estatal  — Foto: Jorge William / Agência O Globo - 25/08/2015

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O ex-senador Delcídio do Amaral. Foi preso pela Polícia Federal em novembro de 2015, por tentar obstruir as investigações tentado impedir a delação premiada de Nestor Cerveró, ex-executivo da Petrobras  — Foto: Ailton de Freitas / Agência O Globo

Iniciada em março de 2014, conjunto de investigações contra a corrupção já levou à prisão desde empresários a políticos, incluindo dois ex-presidentes da República

Claro que sempre haverá quem atribua a responsabilidade pelo fracasso a fatores externos. Para amantes do conteúdo nacional como Lula, a última onda de quebradeira foi culpa da Lava-Jato, que investigou e prendeu dirigentes de estaleiros por corrupção — e não da corrupção em si, vejam que curioso.

 

Mas quem conhece o setor sabe que teriam sucumbido de qualquer maneira, porque a equação financeira não fechava nem com muito subsídio.

O presidente da Petrobras acompanhou a história, por isso tenta empurrar a discussão com a barriga, argumentando que a empresa precisa investir em transição energética para garantir um futuro longevo aos negócios.

 

Em tese ele está do lado certo, mas não dá para entender como a busca da sustentabilidade casa com a insistência de Prates em driblar as regras de governança para trazer de volta à cúpula da Petrobras figuras que já foram investigadas e até afastadas sob suspeita de corrupção e desvio de recursos.

Não é só na petroleira que figuras defenestradas no passado vêm emergindo em busca de protagonismo. Ontem mesmo, em São Paulo, o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto fez uma reentrada pública na cena política, abrindo um seminário da Central Única dos Trabalhadores (CUT) sobre fundos de pensão numa sessão que tinha como tema “A Previc e o novo governo”.

 

A Previc é a autarquia que regula e fiscaliza a aplicação de mais de R$ 1 trilhão depositados em fundos de aposentadoria privada de milhões de trabalhadores. Sentados à mesa com Vaccari estava o diretor de normas da Previc.

 

Na sessão seguinte, diretores dos maiores fundos de pensão do país — do Banco do Brasil, a Previ, e da Caixa Econômica Federal, a Funcef — discutiram “problemas e soluções” para o setor.

 

Para quem não se lembra, Vaccari foi o todo-poderoso tesoureiro do PT entre 2010 e 2015, período que compreendeu as duas campanhas de Dilma Rousseff. Foi condenado em sete processos na Lava-Jato, um dos quais lhe rendeu uma sentença de 15 anos de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro.

Ficou na cadeia por quatro anos, até sair em 2019 por um indulto natalino da Justiça do Paraná. Em 2017, se tornou réu na Justiça Federal por fraudes que provocaram prejuízos de R$ 402 milhões justamente na Funcef, representada no seminário da CUT.

 

O processo até hoje não terminou. Mas os aposentados desses fundos sofrem desconto de parte do benefício todo mês para cobrir o rombo. Pois Vaccari não apenas abriu o evento da CUT em posição privilegiada, como também aproveitou o microfone para se defender das acusações da Justiça sem que ninguém parecesse se espantar.

O bonde da volta dos que não foram é grande. Seriam necessários mais parágrafos para listar as figurinhas carimbadas da política e da economia ressurgindo, brandindo candidamente a pergunta em tom por vezes até indignado: mas então quem já foi condenado pelos tribunais da Justiça ou da mídia não tem o direito de refazer a vida e seguir em frente?

 

Claro que sim, desde que estejam dispostos a mudar de conduta. Pelo que se viu até agora, todos se comportam como se estivessem de volta à cena do crime, buscando concluir o que faziam quando foram interrompidos.

Só que não estamos falando de ficção, mas de realidade crua. Fazer tudo sempre igual não costuma levar a resultados diferentes. Está aí uma reprise que não vale a pena ver de novo.

Atualização as 10h31: Ao contrário do que dizia a versão original, os presidentes dos fundos nao conpareceram ao seminário, e sim seus diretores. O texto foi corrigido

 

 

Sob Lula, estatais federais voltam a ter déficit

FOLHA DE SP

Depois de anos de ajustes e superávits, o conjunto das empresas estatais federais voltará ao vermelho neste primeiro ano do terceiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), segundo a projeção oficial.

De acordo com o boletim bimestral de avaliação orçamentária divulgado nesta quarta-feira (22), as estatais deverão fechar o ano com déficit primário (receitas menos despesas, excluindo juros) de R$ 4,5 bilhões.

A cifra se refere a um grupo de 22 empresas que dispõem de receitas próprias e não dependem do Tesouro Nacional, mas cujo desempenho é considerado na apuração do resultado fiscal do governo federal.

Entre elas estão nomes conhecidos como Correios, Ceagesp, Infraero, Dataprev e Serpro —as três últimas têm previsão de superávit, bem como outras oito estatais da lista. Não são considerados os números da Petrobras nem dos bancos públicos.

Se confirmada a estimativa, o déficit, equivalente a 0,04% do PIB, será o maior desde 2009, no segundo governo Lula. Essa comparação, porém, deve levar em conta que o grupo passou por diversas alterações no período, devido a privatizações, liquidações e criações de empresas.

É evidente, porém, o contraste com os resultados dos últimos anos. Após o impeachment da petista Dilma Rousseff, em 2016, as estatais passaram por um processo de enxugamento de despesas e restrições a indicações políticas.

O superávit voltou em 2018 e se manteve até o ano passado, exceção feita ao ano atípico de 2020, quando houve o impacto da pandemia de Covid-19 sobre a atividade econômica e as contas públicas. No ano passado, o saldo positivo foi de R$ 4,75 bilhões.

Já se imaginava que haveria déficit neste 2023. A cifra projetada, no entanto, supera os R$ 3 bilhões previstos na LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias). Quando isso acontece, o Tesouro Nacional precisa compensar a diferença em seu resultado primário.

A principal responsável pela volta ao vermelho, conforme os cálculos oficiais, é a Emgepron, gerenciadora de projetos da Marinha, com déficit esperado de R$ 3,695 bilhões.

Em setembro, o governo chegou a projetar um rombo maior para o conjunto das empresas, de R$ 5,6 bilhões, como noticiou o jornal Valor Econômico. A previsão gerou críticas à gestão das estatais.

A ministra Esther Dweck (Gestão e Inovação) respondeu que o resultado será coberto com recursos dos caixas das próprias empresas, obtidos com saldos de anos anteriores. Não haverá, portanto, necessidade de algum socorro direto por parte do Tesouro

Em resposta a um editorial da Folha, a Emgepron afirmou em nota que "a projeção do resultado primário aparentemente `negativo´" diz respeito a investimentos, que serão cobertos com recursos próprios e "não representam um `rombo´ ou má administração de recursos".

Também em nota, a Ceagesp apontou que teve superávit de janeiro a setembro e espera fechar o ano com resultado positivo.

 

Fracasso da concessão da BR-381 é evidência de um País falido que não consegue concluir suas obras

Por Fabiano Lana / O ESTADÃO DE SP

 

Muitos brasileiros gastam fortunas em busca de aventura em diversos locais do mundo. Outros, mais radicais, arriscam suas vidas em escaladas no monte Everest, no Himalaia, ou nas ondas gigantes de Nazaré, em Portugal. Mas se o objetivo é se expor perigosamente, não precisam sair do Brasil. Basta enfrentar algumas de nossas rodovias. Contam com crateras nas pistas, não têm acostamentos, a ultrapassagem é impossível e exigem perícia de corredor de Fórmula 1.

 

As invasões de comunidades prejudicam expansões e animais domésticos podem atravessar a qualquer momento o asfalto. Existem quebra-molas inesperados e desvios impensáveis. Há também a visão de carros destruídos ou caminhões tombados nas laterais.

 

Um dos maiores exemplos é a BR-381, em Minas Gerais, que nesta semana teve seu leilão de concessão à iniciativa do trecho entre Belo Horizonte e Governador Valadares, de 306 km, fracassado por falta de propostas. A novela da duplicação das pistas dessa BR já dura décadas.

 

A BR-381, uma das muitas vias do Brasil que recebe a alcunha de “rodovia da morte”, liga São Paulo, nosso principal polo industrial, ao Vale do Aço, onde estão as maiores reservas de minério de ferro do mundo e algumas das principais usinas siderúrgicas do Brasil. Une regiões populosas. Pela importância econômica, relevância logística e utilidade social, devia ser uma das melhores do país. Em Minas, principalmente no trecho de cerca de 200 km entre Belo Horizonte e Ipatinga, o que se vê são evidências de um país falido que não consegue concluir suas obras mais importantes.

 

O pior trecho é a saída de Belo Horizonte. O trânsito já costuma engarrafar ainda dentro da capital mineira, na ponte que atravessa o rio das Velhas. No calor, os moradores das comunidades em torno estão prontos para vender garrafas de água logo que os veículos começam a parar. No frio, vendem cabos e carregadores de celular. É a luta pela vida de um lugar pobre.

A região é extremamente montanhosa e acidentada. É rotina algum motorista imprudente perder a paciência com a via estreita, executar uma ultrapassagem indevida e encontrar a morte numa batida frontal, incluindo a família. Ônibus que caíram nos abismos matando boa parte de seus passageiros não são histórias incomuns.

 

A política sempre tenta se aproveitar da rodovia, que é a obra mais esperada pela população de Minas. “Vou transformar a estrada da morte em estrada da vida”, disse o então candidato Lula, em setembro de 2022, em plena campana presidencial. A promessa de Bolsonaro ocorreu em julho de 2021. “Sai, a duplicação sai. Conversei com o Tarcísio (de Freitas, então ministro) há pouco e ele me botou a par. Depende de o TCU liberar e eu acho que o TCU vai liberar. Liberando, imediatamente nós partimos para as licitações”, disse.

 

Dilma Rousseff, em campanha para a reeleição em 2014, chegou a assinar a ordem de serviço para a duplicação das pistas. Em Minas, criticou seus antecessores pela demora na obra. “Aqueles que criticam o atraso da BR-381, por que não respondem o porquê não fizeram a rodovia antes?! Eles estiveram à frente do Governo Federal por oito anos e nada fizeram. Podem até me criticar, mas deveriam responder essa pergunta antes”, disse a presidente. No poder, o presidente Michel Temer entrou em conflito com a bancada de Minas quando seu governo tentou retirar parte dos recursos para as obras. O presidente Lula, que incluiu a obra no PAC, em 2009 também prometeu que faria a obra. Treze anos depois, culpou o “golpe” contra a Dilma pela paralisia.

 

Hoje, quem passa pelas pistas da BR-381 pode perceber que idas e vindas no andar de cima da administração pública tem consequências danosas. A estrada alterna trechos duplicados, trechos arruinados, trechos desgastados, túneis prontos e túneis paralisados. É confusa, perigosa. É uma mostra evidente de que vivemos sob administradores públicos displicentes e inconstantes.

O trecho mais perigoso da BR, os 116 km entre Belo Horizonte e a cidade de João Monlevade (onde há uma unidade da siderúrgica Arcelor Mittal), foi concluído em 1960. Dez anos depois, a estrada chegou a Governador Valadares, totalizando seus 306 km. Mas o desenvolvimento do Brasil logo deixou as vias obsoletas devido à magnitude do tráfego, que inclui enormes carretas a levar equipamentos para siderúrgicas, como a Usiminas, em Ipatinga, e a principal unidade da Arcelor (antiga Acesita), em Timóteo.

 

Em 2006, no primeiro mandato do presidente Lula, foi aprovado o estudo de viabilidade técnica e econômica de duplicação do trecho Governador Valadares a Belo Horizonte. Solução tida como definitiva. A pretensão era executar as obras, divididas em dois túneis e nove lotes, no segundo mandato de Dilma Rousseff. Uma empresa espanhola, a Isolux, venceu seis lotes. Nenhuma outra empreiteira se interessou pelo trecho mais movimentado, a partir de Belo Horizonte até o município de Caeté, de 31 km, por apresentarem valores acima do orçamento sigiloso do DNER (hoje DNIT).

 

Em 2015, a Isolux abandonou as obras alegando problemas de custos e construção. A solução do atual governo é que as obras sejam tocadas pela iniciativa privada por meio do pagamento de pedágio. Mas, devido à especificidade da região, o valor das tarifas pode ser até quatro vezes maior que o do trecho paulista da rodovia.

 

O Painel da Confederação Nacional de Transportes de Consultas de Dinâmicas de Acidentes Rodoviários já registrou que morrem anualmente em média 260 pessoas por ano no trecho mineiro da BR-381, que inclui a rota para São Paulo. Proporcionalmente, a maioria dos acidentes ocorrem nos 100 sinuosos quilômetros entre Belo Horizonte e João Monlevade, onde a estrada foi construída seguindo uma antiga rota de burros que contornava as montanhas. É uma pista que não perdoa erro dos motoristas, muito menos imprudência.

 

As mortes da BR-381 são uma característica trágica dessa obra especifica. Mas a estrada é apenas uma integrante da longa lista de empreendimentos públicos brasileiros que não ficam prontos nunca. Podemos citar desde a megalomaníaca Transamazônica, da década de 70, à ferrovia Transnordestina, prevista para ser concluída em 2010 e longe do final. As obras da ferrovia Norte-Sul se estenderam por quase quarenta anos. Também prevista para ficar pronta em 2010, a transposição ainda atende um número de brasileiros aquém do previsto. A refinaria Abreu e Lima, fora o escândalo de corrupção, funciona parcialmente. As refinarias previstas para a Maranhão e Ceará foram abandonadas após as obras de terraplanagem.

 

Após consumir cerca de R$ 40 bilhões, o Comperj, que produziria produtos petroquímicos, foi deixada de lado e governo busca um novo escopo para reduzir os prejuízos. Devido à concepção inviável do projeto, a empresa que cuidava da concessão da BR-040, que liga o Juiz de Fora a Brasília, abandonou o negócio. Um novo modelo foi anunciado. O metrô de Belo Horizonte não ganha estações novas desde 2002.

 

É possível contar a história do Brasil apenas por meio de uma BR como a 381. Dos caminhos do tráfico do ouro até os dias de hoje. Ciclos de pujança econômica se alternam com momentos de decadência. Milhões construíram suas vidas ao longo de suas pistas. Mas há um padrão: o setor público sempre fica aquém do mínimo que deveria oferecer à população que tenta usufruir seus serviços. Nesse caso, inclusive, permitindo que brasileiros coloquem suas vidas em risco pela inoperância alheia.

TCU estima em R$ 34 bilhões os pagamentos irregulares no Bolsa Família este ano e determina medidas ao governo

Por    — Brasília / FOLHA DE SP

 

O Tribunal de Contas da União determinou nesta quarta-feira que o governo Lula adote uma série de medidas para diminuir as fraudes de cadastro no programa Bolsa Família. Uma auditoria técnica feita pelo Tribunal estimou que a concessão de benefícios irregulares pode ter chegado a R$ 14 bilhões de janeiro a maio deste ano, com potencial para subir a R$ 34 bilhões em 2023.

 

Segundo auditoria, a análise do programa encontrou uma série de inconsistências no CadÚnico, como divergência de renda em 40% das famílias cadastradas, e inconsistências de composição familiar em 33% das famílias beneficiárias.

 

- Estima-se que 22% das famílias que receberam benefícios de forma irregularmente, o que representa pagamentos de R$ 14 bilhões, somente de janeiro a maio de 2023, com potencial prejuízo de R$ 34 bilhões em 2023 - afirmou o ministro Walton Alencar Rodrigues, durante apreciação do relatório nesta quarta-feira.

 

Entre as medidas determinadas pelo Tribunal estão a melhora na coleta de informações e maior transparência no CadÚnico.

 

- Por essas razões proponho determinações e recomendações ao Ministério para otimizar a coleta de dados, a gestão, a transparência e o controle social do CadÚnico, aprimorando a execução do programa público - disse Rodrigues, que foi seguido por todos os ministros.

 

Segundo Rodrigues, o TCU também encontrou falhas na supervisão de apoio técnico prestados pelo Ministério e pelos estados aos municípios, o que contribuiu para inclusão de dados equivocados no sistema e a ocorrência de pagamentos irregulares.

 

Além disso, houve descumprimento do índice mínimo de 20% de visitas domiciliares previsto para certificar a veracidade dos dados.

- Capacitação insuficiente dos agentes do CadÚnico com falta de padronização, erros no preenchimento dos formulários, não requisição de documentos e a ausência de explanação prévia para o recebimento do Bolsa Família - completou o ministro.

 

 

 

 

TCU determina que governo corrija irregularidades do Bolsa Família

Constança Rezende / FOLHA DE SP

 

TCU (Tribunal de Contas da União) determinou, nesta quarta-feira (22), que o Ministério do Desenvolvimento Social corrija os problemas encontrados pelo órgão no Bolsa Família.

Conforme a Folha antecipou, a unidade técnica do tribunal identificou 4,75 milhões de beneficiários irregulares no Bolsa Família até meados deste ano, o que equivale a mais de um quinto do público do programa.

De acordo com o tribunal, as irregularidades poderiam gerar um prejuízo de R$ 34 bilhões aos cofres públicos neste ano caso nada fosse feito.

As informações estão em um relatório obtido pela Folha que foi aprovado por unanimidade pelos ministros na sessão desta quarta.

O ministro Walton Alencar leu em plenário as conclusões do documento e destacou a capacitação insuficiente dos agentes do CadÚnico (Cadastro Único). Dentre as falhas apontadas estão falta de padronização, erros no preenchimento dos formulários, não-requisição de documentos e ausência de explicação prévia das regras exigidas para ter direito ao Bolsa Família.

Por estas razões, proponho determinações e recomendações ao ministério para otimizar a coleta de dados, a gestão, a transparência e o controle social do Cadastro Único, aprimorando a execução do programa público", disse.

A auditoria fiscalizou R$ 285 bilhões de recursos do Bolsa Família entre janeiro de 2019 e junho de 2023.

Também foi constatado, por meio de cruzamento de dados do CadÚnico com informações de estados e municípios, a existência de 29,8 mil CPFs inválidos e 283 mil registros com indício de óbito.

Desde o início do ano, a União tem fechado o cerco contra possíveis fraudes no benefício. O principal motivo foi o crescimento do total de famílias de uma só pessoa que passaram a receber o benefício assistencial a partir de julho de 2022, ano em que o então presidente Jair Bolsonaro (PL) tentou a reeleição.

Em abril, houve bloqueio de 1,2 milhão de benefícios por cadastro desatualizado. Dados mais recentes, de outubro, apontam desligamento de 297,4 mil famílias do Bolsa Família por não atenderem às regras.

Os técnicos do TCU apontam como problemas no Bolsa Família a autodeclaração sem os devidos controles, além de falhas de supervisão e monitoramento de dados por parte do Ministério do Desenvolvimento Social.

O órgão propôs, entre as medidas para sanar os problemas, que sejam estabelecidos sistemas de supervisão e monitoramento das gestões estadual e municipal nas atividades do Cadastro Único.

Além disso, que a pasta crie uma sistemática de avaliação periódica dos dados. Os técnicos também sugerem que o governo elabore estratégias mais eficientes de comunicação, capacitação e de apoio aos agentes do cadastro na esfera municipal.

No final de outubro, o governo federal criou um órgão específico para fiscalizar e combater fraudes no programa.

Conforme mostrou a Folha, no entanto, o desconhecimento nos municípios sobre as regras do programa Bolsa Família e o apagão de investimentos na rede de assistência nos últimos anos desafiam o atual governo na tarefa de revisar e atualizar o Cadastro Único de programas sociais.

O desafio do governo é identificar, com precisão, quem tem direito ao benefício e quem está burlando o cadastro, corrigir os problemas e incluir quem precisa e ainda está fora do alcance dos programas.

Tudo isso em um contexto de reestruturação da rede Suas (Sistema Único de Assistência Social), que foi sucateada. Os repasses caíram de R$ 2,4 bilhões em 2019 para R$ 905,7 milhões em 2022. No Nordeste, três municípios dividiram um único assistente social.

Procurado, o Ministério do Desenvolvimento Social afirma que, ao assumir em janeiro de 2023, a nova gestão se deparou com "graves distorções na base de dados" dos programas sociais e que, durante a transição de governo, contou inclusive com o auxílio de relatórios do próprio TCU para o enfrentamento dos problemas.

De acordo com a pasta, desde janeiro foram iniciados trabalhos para retomada das ações de qualificação cadastral, com reflexos já observados a partir de março. Famílias que falham em prestarem as informações devidas não são incorporadas ao programa.

"Também têm sido intensificadas as ações de busca ativa e identificação de famílias em situação de vulnerabilidade, para que estas passem a estar identificadas e sigam incluídas nas estratégias federais de combate à fome e à pobreza", afirma o ministério em texto enviado.

"Tais medidas visam assegurar que sejam atendidas as famílias que de fato necessitam e que a transferência de renda proporcionada pelo Programa Bolsa Família seja o pontapé inicial que elas necessitam para alcançar outros direitos e novos patamares na sua autonomia e desenvolvimento", diz a pasta.

Déficit de 2023 piora, vai a R$ 177,4 bi e se afasta de meta de Haddad para primeiro ano de governo

Idiana Tomazelli / FOLHA DE SP

 

O governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) prevê encerrar o primeiro ano de mandato com um rombo de R$ 177,4 bilhões nas contas, uma piora em relação à estimativa anterior e ainda mais longe da meta traçada pelo ministro Fernando Haddad (Fazenda), de entregar um déficit de até 1% do PIB (Produto Interno Bruto) em 2023.

Em setembro, o governo esperava um déficit de R$ 141,4 bilhões nas contas do governo central (que inclui Tesouro Nacional, INSS e Banco Central), o equivalente a 1,3% do PIB. A nova projeção significa um rombo de 1,7% do PIB, segundo dados divulgados nesta quarta-feira (22).

Como mostrou a Folha, para a aferição oficial do cumprimento da meta, o resultado fiscal ainda vai ter uma piora adicional de R$ 26 bilhões, referentes ao resgate de valores "abandonados" nas contas do Fundo PIS/Pasep. Na prática, o rombo oficial chegaria a R$ 203,4 bilhões (1,9% do PIB).

A LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) autoriza um rombo de até R$ 213,6 bilhões, o que corresponde a 2% do PIB. Portanto, os números não indicam um descumprimento formal da regra.

Em seu discurso de posse, porém, Haddad disse que não iria aceitar um resultado "que não seja melhor do que os absurdos R$ 220 bilhões de déficit previstos no Orçamento".

A partir daí, a Fazenda traçou a meta informal de 1% do PIB —que em março chegou a virar 0,5%, um objetivo ainda mais ambicioso, mas que logo foi abandonado.

Em entrevista coletiva para comentar os números, o secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, defendeu o governo, atribuiu o afastamento da meta informação de 1% a fatores extraordinários ou esqueletos do passado e disse que a equipe econômica segue comprometida com a trajetória de melhora das contas públicas.

Ceron conta com um empoçamento de recursos entre R$ 30 bilhões e R$ 35 bilhões neste ano, o que reduziria o déficit efetivo para uma faixa entre R$ 142 bilhões a R$ 147 bilhões, na visão do Tesouro Nacional.

O empoçamento ocorre quando os ministérios têm autorização para gastar, mas não conseguem por causa de obstáculos burocráticos, como ausência de licenças. Se o recurso fica parado, isso acaba contribuindo para amenizar o rombo nas finanças da União.

Essa variável, no entanto, só é observada após a execução do Orçamento. Por isso, o Executivo não pode contabilizá-la desde já nas estimativas oficiais.

"Nada muda em relação a 2024 [cuja meta é déficit zero]. Estamos tomando todas as medidas para recompor as receitas", afirmou Ceron. "Estamos muito vigilantes no processo de consolidação fiscal. Hoje tivemos avanço importante com [aprovação da taxação de] offshores. Todas as medidas necessárias para recuperar o quadro fiscal serão tomadas, e aquelas que não performarem serão repostas."

Os dados do Relatório de Avaliação de Receitas e Despesas do 5º bimestre, divulgado nesta quarta, mostram que a piora fiscal em 2023 é explicada por uma conjugação de frustração de receitas e aumento de despesas.

Do lado das despesas, o governo inclusive precisou fazer um bloqueio extra para evitar o estouro do limite de gastos válido para este ano. Até setembro, R$ 3,8 bilhões já estavam travados. Agora, o valor subiu a R$ 5 bilhões —um acréscimo de R$ 1,1 bilhão, segundo o Executivo.

Segundo o governo, houve aumento na previsão de gastos com benefícios previdenciários, além de um incremento de R$ 4,3 bilhões para atender o mínimo da Saúde neste ano.

Houve ampliação também nas despesas com autorização legal para serem feitas fora dos limite deste ano. A principal delas é um repasse bilionário para estados e municípios, calculado em R$ 16,3 bilhões.

Os valores são uma compensação pelas perdas dos governos regionais após o Congresso, apoiado pelo governo Jair Bolsonaro (PL), limitar as alíquotas de ICMS sobre combustíveis, energia, transporte e telecomunicações.

Em meio à penúria das prefeituras e à demanda por um socorro federal, o governo Lula aceitou antecipar a parcela que seria paga em 2024 —o que tira pressão da meta fiscal do ano que vem, mas consome a folga que existia na meta em 2023.

O governo também observou uma frustração em suas expectativas de arrecadação. O Executivo reduziu sua previsão em R$ 22,2 bilhões, dos quais R$ 12,6 bilhões vêm da exclusão dos depósitos judiciais da Caixa (sob a justificativa de que transferência pode não ocorrer ainda em 2023).

Outros R$ 9 bilhões foram deduzidos da projeção de receitas com tributos, diante da perspectiva de uma inflação menor.

Ceron argumentou ainda que, descontados fatores extraordinários, o "déficit fiscal estrutural seria zero" em 2023. A conta do secretário parte dos R$ 142 bilhões a R$ 147 bilhões que ele acredita ser o déficit efetivo no ano e desconta os R$ 16 bilhões adicionais da compensação do ICMS.

Segundo ele, os R$ 130 bilhões restantes equivalem ao montante das perdas do governo com "dois grandes problemas fiscais" que estão drenando a arrecadação federal: o aumento das compensações de PIS/Cofins (que diminuem o tributo a ser pago pelas empresas) e a redução da base de cálculo de IRPJ e CSLL atrelada aos incentivos fiscais do ICMS.

O secretário afirma que a primeira, ligada ao julgamento do STF (Supremo Tribunal Federal) que decidiu pela retirada do ICMS da base de PIS/Cofins, gerou uma perda de cerca de R$ 80 bilhões neste ano. Já a segunda reduziu a arrecadação em quase R$ 50 bilhões em 2023.

O abatimento dos créditos de PIS/Cofins ainda deve ter um efeito entre R$ 80 bilhões e R$ 90 bilhões em 2024, mas tende a acabar em 2025. Já a questão da subvenção é alvo de uma tentativa do Executivo de reduzir as brechas e recuperar parte da arrecadação.

Ceron ainda falou sobre a discrepância entre os números do déficit primário entre Tesouro e Banco Central. A diferença se deve a uma divergência com o Banco Central, órgão responsável pelo cálculo oficial das estatísticas de contas públicas.

O Tesouro segue a redação de uma emenda constitucional para considerar o valor como receita primária. O BC diz que o resgate das contas não representa esforço fiscal e, seguindo metodologia alinhada a padrões internacionais, desconta o valor do primário.

"Felizmente esse [entendimento do BC] não tem consequência prática nenhuma, mas se fosse um cenário de meta fiscal apertada, poderia ter consequências", observou o secretário.

Ele disse que a LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal) prevê a regulamentação da metodologia de apuração do resultado primário, o que nunca ocorreu. "Deveríamos tentar suprir essa lacuna estrutural para ter uma hamonização de entendimentos", afirmou.

Segundo ele, Tesouro e BC discutem uma proposta para tentar pactuar uma forma única de estimar o desempenho das contas públicas e evitar futuras divergências.

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