Brasil chega a 1.003 mortos por dengue; 7 em 10 se concentram em SP
Patrícia Pasquini / FOLHA DE SP
O Brasil registrou 1.003 mortes por dengue, segundo dados do Painel de Arboviroses do Ministério da Saúde, válidos até a 20ª semana epidemiológica (17 de maio) de 2025. O número é menor que o observado no mesmo período do ano passado (5.442), mas superou 2023, quando o país totalizou 867 óbitos até a mesma data.
Em 2024, a doença causou uma violenta epidemia no Brasil, que encerrou o ano com 6.264 mortes —alta de 431,3% quando comparado aos 1.179 óbitos ocorridos de janeiro a dezembro de 2023.
Nos três anos, São Paulo é o estado com os maiores números. Em 2025, sete em cada dez mortes por dengue ocorreram no estado paulista, situação já noticiada pela reportagem no mês de abril. Paraná (85) e Minas Gerais (70) também têm dados expressivos.
Para Júlio Croda, infectologista da Fiocruz e consultor da SBI (Sociedade Brasileira de Infectologia), o cenário de óbitos por dengue demonstra problemas na assistência.
"Nunca tivemos sucesso no controle vetorial, porque depende de medidas coletivas e individuais, de cada um limpar a sua casa e não deixar a água parada. O óbito depende da assistência que a pessoa com suspeita de dengue tem. Quantas vezes ela vai à Unidade Básica de Saúde? Quantas vezes não recebe o diagnóstico adequado, hidratação adequada? Todo óbito por dengue é prevenível, porque o tratamento da é a hidratação, que previne a morte. Superar mil óbitos por dengue mostra a ineficiência em atender adequadamente o paciente", afirma o Croda.
Em relação ao número de casos de dengue confirmados, 2024 registrou mais de 5,9 milhões. Destes, 5,1 milhões foram contabilizados até a 20ª semana epidemiológica. Em 2023, foi 1,4 milhão —pouco mais de um milhão na comparação com o mesmo período. Neste ano, o Brasil alcançou quase 987 mil casos. Se considerar os prováveis (soma dos confirmados e em investigação), passa de 1,3 milhão.
Na opinião do especialista, 2025 terminará com quase dois milhões de casos da doença.
"O ano passado foi fora da curva. Até hoje as pessoas estão querendo entender porque foi tão diferente. Se pegarmos o contexto epidemiológico dos últimos dois anos, todo ano que superou um milhão de casos teve bastante circulação de dengue. Neste ano, vamos chegar perto de dois milhões de casos e estabelecer um novo patamar de circulação do vírus da dengue no Brasil, muito provavelmente pelo aumento das temperaturas globais que ocorreram nos últimos anos", explica.
O problema em 2025, segundo Júlio Croda, é o fato de a epidemia se concentrar em São Paulo, o que também pode ser explicado pelo aumento da quantidade de vetores e a predominância da dengue tipo 3. Até o momento, esse subtipo circula em quase todo o estado paulista —exceções são as regiões de Registro e Presidente Prudente.
"Neste ano está circulando bastante dengue também, mas é mais problemático porque em 2024 se concentrou na região centro-sul. Neste ano, tem uma concentração muito clara no estado de São Paulo. É uma epidemia, em números gerais, menor que a de 2024, mas em São Paulo é bastante importante", comenta o infectologista.
O tipo 3 reapareceu no país em 2023 —na época, a Fiocruz afirmou que o país não registrava epidemias da doença provocadas por essa cepa há mais de 15 anos—, e circulou também em 2024.
O vírus da dengue possui quatro sorotipos. Quando um indivíduo é infectado por um deles adquire imunidade contra aquele vírus, mas ainda fica suscetível aos demais.
Em nota, a SES (Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo) disse que monitora a situação da dengue e outras arboviroses no estado. De acordo com a pasta, em 2025, foram investidos R$ 3 milhões em equipamentos, incluindo 490 nebulizadores portáteis, 42 de nebulização ambiental e 318 pulverizadores, disponíveis para os municípios.
Em janeiro, o governo estadual criou o COE de combate ao Aedes aegypti e antecipou R$ 228 milhões do IGM SUS Paulista (Incentivo à Gestão Municipal) para os 645 municípios. Também foi apresentado o Plano de Contingência das Arboviroses Urbanas 2025/2026, com ações de combate à dengue, chikungunya e Zika, e em fevereiro, foi decretado estado de emergência para facilitar o acesso aos recursos federais e estaduais.
A SES criou a força-tarefa para apoiar os municípios que lideram o ranking estadual de incidência de dengue neste ano, com registro de mais de mil casos por 100 mil habitantes.
A secretaria tem oferecido capacitação online para profissionais de saúde para reduzir a incidência e mortalidade das doenças e coordenar a resposta estadual de forma integrada entre todos os níveis de atenção à saúde.
"Do ponto de vista da gestão, seja federal, estadual, municipal, falta melhor treinamento dos seus profissionais de saúde e melhor organização dos serviços para atender os casos de dengue. Chegar a mil óbitos é inadmissível no Brasil. Não temos lições aprendidas a partir do cenário catastrófico que vivemos em 2024. Então, se repete os mesmos erros", finaliza Croda.
O Ministério da Saúde diz que a queda de casos e óbitos em 2025 é resultado de ações conjuntas da pasta, em parcerias com os estados e municípios, voltadas a prevenção, controle vetorial e preparação da rede de assistência, além da mobilização da população.
"Em maio deste ano, o Ministério da Saúde ampliou as ações prioritárias de enfrentamento à dengue para municípios com alta transmissão da doença ou número de casos em ascensão, fortalecendo o apoio aos estados e municípios para reduzir casos graves e óbitos. As equipes da Força Nacional do SUS estão preparadas para atender às cidades e apoiar na organização da assistência, com capacidade para instalar até 150 centros de hidratação", afirmou em nota.
"Foram feitas missões, por exemplo, em São José do Rio Preto/SP (com mais de 3,6 mil atendimentos), Marília/SP, Viamão/RS, Porto Alegre/RS, Alvorada/RS, Santarém/PA, Macapá/AP, Santana/AP, Porto Velho/RO, Rio Branco/AC, Cuiabá/MT, entre outros", diz.
Apoio do governo Lula após enchentes do Rio Grande do Sul fica dezenas de bilhões abaixo do anunciado
Em fevereiro, a Secretaria para Apoio à Reconstrução do Rio Grande do Sul chegou a apresentar um balanço na Câmara dos Deputados em que "o total das medidas de apoio ao Rio Grande do Sul" somavam R$ 141,5 bilhões, maior valor já anunciado.
Além do governo, o PT também usou a apresentação para divulgar em seu site: "Governo Lula investe 140 bilhões na reconstrução do Rio Grande do Sul".
A reportagem analisou os números e identificou valores inflados em ao menos R$ 37 bilhões por medidas que nunca saíram do papel, além de valores possivelmente contabilizados de forma duplicada e divulgados sem detalhamento que permitisse que fossem checados.
Um exemplo dessas inconsistências foi a inclusão de R$ 7,2 bilhões previstos para importação de até 1 milhão de toneladas de arroz para evitar a disparada de preço no Brasil após quebra de safra gaúcha. Jamais houve a importação do cereal, pois a medida foi cancelada ainda em 2024.
Números do Tesouro Nacional analisados pela reportagem e especialistas indicam que recursos próprios novos do governo Lula investidos somam R$ 61,4 bilhões, entre eles:
- gastos com ações de resgate, benefícios sociais e obras;
- empréstimos via BNDES;
- perda de receita futura, com o perdão por três anos de juros da dívida do Rio Grande do Sul com a União.
Além disso, a União lançou mão de medidas como a antecipação do Bolsa Família e outros benefícios que já seriam pagos em 2024 e o adiamento da cobrança de impostos.
Essas ações não geram novas despesas, mas também foram contabilizadas pelo governo federal como recursos "destinados" ou "investidos" no Estado após as enchentes —assim como a liberação emergencial de R$ 3,5 bilhões do FGTS, um recurso que não é da União, mas uma poupança compulsória dos trabalhadores.
Entre economistas, há críticas aos números inflados, mas também elogios à resposta rápida e ao grande leque de ações de apoio a vários setores impactados —como auxílio direto a famílias desabrigadas, crédito barato a empresas e produtores rurais em dificuldade, além de repasses a prefeituras e ao governo estadual para reconstrução.
Para os autores de um artigo do Centro de Pesquisa em Macroeconomia das Desigualdades da Universidade de São Paulo (Made-USP) sobre as ações federais, o governo fez bem em conciliar recursos novos com antecipação de benefícios, adiamento de impostos e linhas de créditos especiais.
"É um jogo interessante, que tem baixo impacto orçamentário, ao mesmo tempo que você consegue disponibilizar recursos de uma maneira muito rápida para quem precisa", defendeu o economista Lucca Rodrigues.
Já Gabriel de Barros, ex-diretor da Instituição Fiscal Independente, órgão do Senado, diz que o Tribunal de Contas da União precisa investigar as inconsistências nos números divulgados.
"Esse dinheiro não é do governo, é da população", diz Barros, atual economista-chefe da ARX Investimentos.
"O governo tem obrigação de divulgar os números de forma transparente e clara para a sociedade fiscalizar se o gasto está sendo eficiente. Outro ponto importante é que mais transparência dificulta desvios de dinheiro."
Além das inconsistências nos valores anunciados, parte do que de fato foi liberado ainda não foi usado nas obras de reconstrução e prevenção a novas enchentes, que são complexas e esbarram no ritmo mais lento da burocracia pública.
A demora na entrega de novas moradias, escolas, pontes e diques tem gerado disputa política entre prefeituras, o governo estadual, comandado por Eduardo Leite (PSD), e a administração Lula (leia reportagem aqui).
"Se viesse uma cheia agora, um ano depois, não teria nada pronto a ponto de evitar inundação", constatou à reportagem o engenheiro ambiental Fernando Fan, professor do Instituto de Pesquisas Hidráulicas (IPH) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Outro tema que gerou polêmica foi a produção de um documentário do governo gaúcho sobre o aniversário de um ano da tragédia climática, com participação de Leite. O deputado federal Paulo Pimenta (PT-RS), ex-ministro de apoio à Reconstrução, acionou o Ministério Público Federal para investigar uso de dinheiro público para promoção pessoal do governador, que acaba de trocar o PSDB pelo PSD e se colocou como pré-candidato a presidente em 2026.
Já Pimenta, cotado para disputar o governo gaúcho ou uma vaga no Senado em 2026 pelo PT, também acusa o governo estadual de ter usado dinheiro da reconstrução no filme, o que a gestão Leite nega.
A BBC News Brasil também analisou os valores investidos em resposta às enchentes pelo governo do Rio Grande do Sul. A reportagem não encontrou sinais de números inflados ou incorretos, mas parte dos valores anunciados não está divulgada de forma clara e detalhada.
Um portal oficial diz que já foram investidos R$ 7,3 bilhões em ações de reconstrução e prevenção, mas o governo não soube informar à reportagem quanto desses valores de fato já foram gastos. O portal permite clicar em cada uma das medidas para obter mais detalhes, mas parte delas aparece como "em andamento".
O QUE DIZ O GOVERNO LULA SOBRE VALORES INFLADOS
Após questionamento da BBC News Brasil em abril, o secretário para Apoio à Reconstrução, Emanuel Hassen (PT), reconheceu que os números apresentados por ele na Câmara dos Deputados não representavam de fato o que o governo destinou ao Rio Grande do Sul.
O político gaúcho assumiu a secretaria após o deputado federal e ex-ministro Paulo Pimenta (PT-RS) deixar seu comando, em setembro.
Hassen alegou que, no momento da apresentação, em fevereiro, contabilizou todas as medidas que haviam sido anunciadas e que, agora, estava sendo feito um balanço do que de fato saiu do papel.
"Estamos passando uma peneira. Naquele momento, o dado somado era aquele. E agora a gente está, no final do processo, fechando o ano das enchentes, vamos dizer assim, aperfeiçoando a utilização dos números", disse, em abril.
"Então, obviamente, se alguém tem culpa naquela oportunidade, não é o PT, que pegou os números que o governo apresentou."
Os números anunciados por Hassen também parecem ter contabilizado duas vezes R$ 6,5 bilhões previstos para obras contra cheias na região metropolitana de Porto Alegre —o secretário negou essa duplicação, mas não apresentou os valores utilizados para que a reportagem pudesse checar a informação.
Já a Casa Civil, principal responsável por contabilizar as medidas, não comentou as questões levantadas pela reportagem sobre valores inflados, mas alterou os números divulgados em meados de abril. Depois disso, o governo unificou o anúncio de valores destinados ao Estado em R$ 111,7 bilhões —número que continua gerando controvérsias.
Em resposta à BBC News Brasil, a pasta disse que o conjunto de ações do governo federal é "sem precedentes" e "evitou uma recessão no Estado, o fechamento de empresas e a perda de empregos, os quais agravariam as consequências da calamidade".
"Os investimentos foram tão efetivos que o PIB do Rio Grande do Sul cresceu 4,9% em 2024. Mais que o PIB nacional, que cresceu 3,4%", argumentou ainda a Casa Civil, citando estatísticas do Departamento de Economia e Estatística (DEE), um órgão gaúcho, e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
O crescimento gaúcho, porém, foi puxado por forte alta da agropecuária, que cresceu 35% em 2024, devido principalmente à recuperação da colheita de soja realizada até abril (antes das enchentes), após dois anos de estiagem. Já a indústria caiu 0,4%, enquanto o setor de serviços subiu 3,5%, informou também o DEE.
A Casa Civil disse ainda que os valores têm sido divulgados com "total transparência".
"Além dos diversos eventos de balanço das ações realizados no Estado, portais oficiais do Governo Federal criaram painéis específicos para o acompanhamento [dos gastos no Rio Grande do Sul], além do acompanhamento próximo do Tribunal de Contas da União, Controladoria Geral da União e Ministério Público Federal", continuou a pasta.
Uma delas é olhar quanto foi de fato mobilizado em recursos novos pela União (61,4 bilhões). A outra forma é ver o impacto das medidas na ponta, ou seja, quanto de fato chegou aos beneficiários finais: famílias, empresas, agricultores, prefeituras e governo estadual.
Esse montante, agora contabilizado em R$ 111,7 bilhões, é o dado que o governo mais usa para divulgar sua atuação - e o que mais gera questionamentos.
Mas, para entender como esses valores acabaram inflados, primeiro é preciso analisar os recursos novos mobilizados pelo governo.
Esses R$ 61,4 bilhões incluem gastos primários (R$ 29,4 bilhões), empréstimos com recursos da União (R$ 20 bilhões do Fundo Social, alimentado por royalties do petróleo e gerido pelo BNDES) e o perdão dos juros da dívida (estimado em ao menos R$ 12 bilhões).
Os gastos primários, compilados pelo Tesouro Nacional no Painel de Monitoramento da Execução Orçamentária e Financeira com Auxílio e Reconstrução do Rio Grande do Sul, foram autorizados pelo Congresso e puderam ser excluídos do arcabouço fiscal, regra que limita as despesas anuais do governo.
O valor foi usado, por exemplo, em ações da Defesa Civil (R$ 1,4 bilhão) e no pagamento do Auxílio Reconstrução, uma parcela única de R$ 5,1 mil. A medida beneficiou mais de 420 mil famílias afetadas, somando R$ 2,15 bilhões.
Os gastos novos também incluíram o depósito, em dezembro, de R$ 6,5 bilhões em um fundo na Caixa Econômica Federal, dinheiro reservado para obras contra cheia na região metropolitana que ainda não foi usado - motivo de atrito entre o governo Lula e a gestão Leite.
Além disso, ainda nas despesas primárias, o governo depositou R$ 6 bilhões em fundos garantidores de crédito, geridos por Banco do Brasil e BNDES - com objetivo de estimular linhas de crédito barato, conhecidas pelas siglas Pronampe, PEAC e Pronamp/Pronaf.
Essa garantia do governo permitiu a bancos públicos e privados reduzir seu risco e, assim, oferecer empréstimos com juros baixos aos atingidos pelas inundações. O dinheiro emprestado, porém, era dos próprios bancos, que recebem compensação dos fundos garantidores somente em caso de inadimplência.
Foi justamente a comunicação do impacto dessa última medida que mais gerou distorções nos valores anunciados.
*Despesas extras autorizadas pelo Congresso para Auxílio Reconstrução, obras, adiantamento de precatórios e subsídios para linhas de crédito, entre outras ações.
**Recursos da União depositados no Fundo Social do BNDES e liberados para empréstimos.***Perdão dos juros que seriam aplicados na dívida do Rio Grande do Sul com a União por três anos
O governo Lula modificou a composição dos valores anunciados como "destinados" ao Rio Grande do Sul, retirando as informações incorretas e incluindo outras iniciativas, sendo a principal delas a suspensão da dívida estadual com a União por três anos - medida que antes era tratada separadamente.
A nova divulgação, porém, reduziu a transparência dos dados.
Antes, o portal Brasil Participativo detalhava cada medida contabilizada no que seriam os R$ 94,5 bilhões em recursos novos destinados ao Estado. Foi isso que permitiu à reportagem identificar os valores inflados.
Depois da mudança, esses recursos novos caíram para R$ 66,7 bilhões, mas o portal passou a listar as medidas que compõem esse montante sem informar seus valores separadamente.
Já a soma das outras ações (adiamento de impostos e antecipação de benefícios) subiu de R$ 17,5 bilhões para R$ 21,9 bilhões. Esses valores já não eram detalhados antes e continuaram sem detalhamento.
Além dessas duas alterações, o portal passou a incluir, no total de valores destinados, as estimativas de impacto da suspensão da dívida estadual por três anos. Com isso, a soma dos novos "valores destinados" passou a ser de R$ 111,7 bilhões.
O novo valor é cerca de R$ 23 bilhões menor do que o total das ações divulgadas antes das alterações (R$ 135 bilhões), considerando a soma do que era informado até meados de abril no portal Brasil Participativo como recursos novos, antecipações de benefícios, adiamento de impostos e, separadamente, o impacto da suspensão da dívida.
'SER TRANSPARENTE NÃO SIGNIFICA VOMITAR O DADO NA INTERNET'
Dentro do portal Brasil Participativo, há ainda outra página que detalha a liberação dos recursos anunciados por município.
Essa página também sofreu alterações após os questionamentos iniciais da BBC News Brasil.
No entanto, ela também não detalha o que compõe a nova cifra de R$ 111,7 bilhões de "valores destinados ao Rio Grande do Sul".
A nova versão dessa página informa que, desse total que teria sido destinado ao Estado em resposta às enchentes, R$ 89,7 bilhões já foram "pagos ou concedidos" - o que inclui ações variadas, como empréstimos já liberados, saque emergencial do FGTS, postergação de tributos, a suspensão da dívida gaúcha com a União e dinheiro liberado para obras, mas ainda não executado.
Os valores "pagos ou concedidos" são informados em detalhes, o que permite checar as informações.
Por outro lado, a página não fornece detalhamento sobre os R$ 111,7 bilhões que teriam sido destinados.
A diferença entre os dois montantes (valores destinados e valores pagos ou concedidos) soma quase R$ 22 bilhões de recursos, sobre os quais não se tem informações claras.
A BBC News Brasil pediu à Casa Civil o detalhamento desses valores, mas não obteve acesso aos dados.
Para o economista Gabriel de Barros, ex-diretor da Instituição Fiscal Independente (órgão do Senado), as inconsistências nos números divulgados mostram problemas de transparência e governança.
"Ser transparente não significa vomitar o dado na internet. Tem que ter consistência nos dados que são apresentados, e não tem", criticou.
Outra crítica do economista é à forma como o governo soma valores de naturezas diversas, tratando recursos privados como verbas federais.
Há momentos, inclusive, em que canais oficiais e autoridades do governo se referem a esses valores como se fossem investimentos da União.
"Junto de todos os gaúchos, investimos R$ 112 bilhões na sua recuperação, incluindo a suspensão da dívida estadual de R$ 23 bilhões com a União", diz um vídeo compartilhado nas redes sociais do governo federal em 27 de abril.
Na ocasião, o Ministério da Fazenda reconheceu o erro e corrigiu conteúdos em seu site e nas redes sociais, enquanto a Casa Civil e a Secretaria de Comunicação da Presidência (Secom) mantiveram as informações no ar.
Um ano depois, a BBC News Brasil voltou a questionar a Casa Civil sobre o governo tratar como "investimentos federais" recursos que não são da União. A pasta não respondeu diretamente o questionamento e defendeu a importância das medidas.
"Uma das medidas mais importantes em um momento de calamidade é o dinheiro no bolso na hora da dificuldade. Por isso, é comum em calamidades a autorização do saque dos recursos do FGTS como uma injeção de recursos nas famílias e na economia", respondeu a Casa Civil.
"Além de permitir o saque do FGTS, o governo antecipou a restituição do Imposto de Renda, de benefícios da previdência social, de abono salarial, do Bolsa Família e pagou o auxílio reconstrução. Essas medidas, associadas a muitas outras, evitaram uma recessão no Estado", continuou a pasta.
- Dinheiro para obras (a maior parte ainda não executada), ações de resgate, benefícios sociais, entre outros
- Fundo social, alimentado com royalties do petróleo
- Em sua maioria, dinheiro emprestado a governos locais e empresas por bancos com garantia da União
- Fundo estadual para investimentos com recursos da suspensão da dívida com a União
- Antecipação de benefícios sociais, repasses aos governos locais e precatórios que já seriam pagos pela União
- Governos locais, empresas e população puderam adiar pagamentos
- Saque emergencial do FGTS pelo trabalhador
E AS AÇÕES DO GOVERNO EDUARDO LEITE?
A BBC News Brasil também analisou as ações divulgadas pelo governo do Rio Grande do Sul. A reportagem não encontrou sinais de números inflados ou incorretos, mas parte dos valores anunciados não está divulgada de forma clara e detalhada.
O governo gaúcho tem um portal em que são divulgados R$ 7,3 bilhões de recursos estaduais usados no Plano Rio Grande (Programa de Reconstrução, Adaptação e Resiliência Climática do Rio Grande do Sul).
Os valores também incluem, por exemplo, ações emergenciais, recursos para obras, construção de moradias temporárias e definitivas, além de garantias para uma linha de crédito do Banrisul, banco estatal gaúcho. Nesse caso, a gestão Leite inclui apenas o que de fato foi depositado em garantias, e não projeções de empréstimos.
O portal informa quais medidas estão incluídas nessa soma e seus respectivos valores. É possível também clicar em cada ação e abrir uma nova página com mais informações sobre cada uma delas.
No entanto, muitas das ações são descritas como "em andamento", sem informação sobre o que de fato foi liberado e gasto. Questionado pela BBC News Brasil, o governo gaúcho disse que não tinha os dados atualizados no momento.
Outro ponto nebuloso é quanto desses R$ 7,3 bilhões vem do Fundo do Plano Rio Grande (Funrigs), abastecido pelos recursos estaduais liberados pela suspensão do pagamento da dívida com a União por três anos. A estimativa inicial era que o fundo receberia R$ 11 bilhões ao longo desse período, mas a nova previsão está em R$ 14 bilhões.
O governo gaúcho disse à BBC News Brasil que parte dos R$ 7,3 bilhões está sendo pago com recursos do Funrigs, mas não soube informar quanto.
A reportagem também questionou a gestão Leite sobre as críticas a demora em usar os R$ 6,5 bilhões que o governo federal já depositou para obras contra cheias na região metropolitana.
O governo estadual respondeu que as obras são complexas e demandam estudos atualizados.
"Os eventos recentes mostraram que o volume de água e a frequência das cheias mudaram. Isso exige uma revisão técnica completa para garantir que as soluções realmente protejam as áreas mais vulneráveis", disse o governo Leite.
Isso envolve atualizar "informações sobre o terreno; a ocupação do solo para realocação de residências; e os modelos de comportamento da água em diferentes cenários de chuvas e ventos", modernizar equipamentos, como bombas submersíveis, e revisar "falhas ignoradas anteriormente".
Outro foco de questionamentos contra o governo Leite foi a realização de um filme sobre a tragédia climática com o título "Todos Nós por Todos Nós", frase que foi slogan da campanha de reeleição do governador em 2022.
Além da representação feita por Paulo Pimenta ao Ministério Público, o deputado estadual Matheus Gomes (PSOL-RS) moveu uma ação popular questionando os valores gastos e solicitando a suspensão da exibição do filme. Em decisão liminar, a Justiça determinou que o governo esclareça o orçamento da produção, mas negou a retirada do documentário do ar.
Segundo o juiz substituto Thiago Notari Bertoncello, da 7ª Vara da Fazenda Pública do Foro Central da Comarca de Porto Alegre, o documentário dá destaque ao governador, mas isso é inerente ao seu cargo e não configura promoção pessoal. A decisão foi confirmada em segunda instância.
Questionado pela reportagem, a gestão Leite não informou o valor gasto.
"Com imagens e entrevistas captadas pelo Departamento de Jornalismo da Secom [Secretaria de Comunicação], o documentário é um registro histórico da calamidade vivida pelo Rio Grande do Sul. Não foram empregados recursos da reconstrução no documentário. Toda a produção foi realizada pela equipe interna própria da secretaria", respondeu o governo em nota.
"A Justiça, inclusive, já reconheceu a legitimidade do documentário ao negar pedido de liminar para suspensão da divulgação do filme. [...] Fica evidente, portanto, que os questionamentos têm intenção clara de ofuscar a liderança do Estado no processo da reconstrução", continuou o Palácio Piratini.
Gráficos feitos por Caroline Souza, Equipe de Jornalismo Visual da BBC Brasil
Este texto foi publicado originalmente aqui.

Voz isolada: crítica de Marina à flexibilização do licenciamento ambiental não tem sinais de apoio no governo
Por Ana Flávia Pilar, Renata Agostini, Lauriberto Pompeu, Lucas Altino e Luis Felipe Azevedo— Rio, São Paulo e Brasília / o globo
Após a aprovação no Senado do projeto que muda normas de licenciamento ambiental na quarta-feira, a ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, atribuiu ontem o resultado a dificuldades na articulação política do governo e pediu uma mobilização popular para reverter a aprovação na Câmara dos Deputados. Mas o ministro dos Transportes, Renan Filho, defendeu o debate, em mais um sinal de apoio do governo depois de dois terços dos 54 votos a favor da flexibilização (houve 13 contrários) virem da sua base.
— O governo tem uma série de dificuldades em relação a uma base segura. Não é a primeira vez que a gente sofre algumas dessas derrotas, inclusive em agendas igualmente estratégicas, mas vamos continuar dialogando com o Congresso — afirmou a ministra, em uma cerimônia em comemoração ao Dia Internacional da Biodiversidade, no Jardim Botânico, no Rio.
Marina afirmou que o projeto representa uma “demolição” do sistema de licenciamento ambiental no Brasil e reforçou que ele é um risco a acordos internacionais, inclusive comerciais, que o país negocia — em um ano que Belém irá sediar a COP30, conferência internacional do clima.
A ministra sinalizou que irá pedir que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vete trechos do projeto, caso seja aprovado na Câmara, acrescentando que a mobilização popular poderia reverter as mudanças. A ministra lembrou a votação de uma Medida Provisória de 1995, do então presidente Fernando Henrique Cardoso, que reduziria de 80% para 50% a Reserva Legal na Amazônia. Marina, na época deputada federal, disse que a medida foi abandonada após a reação popular.
— Se a gente tiver uma grande mobilização da sociedade, com certeza deputados e senadores se sentirão mais confortáveis (a rejeitar a proposta) — afirmou.
Grandes obras
Enquanto Marina atacava a aprovação no Rio, em São Paulo, Renan Filho, afirmou, em um leilão de infraestrutura, que a falta de autorização para grandes obras nos últimos anos justificou o debate sobre a mudança no licenciamento. O texto votado pelos senadores pode acelerar empreendimentos como a exploração de petróleo na Margem Equatorial, tema em que Lula cobrou publicamente o Ibama pela demora em autorizar pesquisas das Petrobras na faixa do Atlântico entre o Pará e o Amapá.
— Talvez esse tempo sem definição tenha levado o Congresso Nacional a fazer uma leitura. Está muito difícil ou não? — afirmou o ministro, cujo pai, Renan Calheiros (MDB-AL), votou a favor do projeto. — Independente do que cada um de nós acha, a gente tem que compreender que o Congresso tem legitimidade para discutir esses temas. Se eventualmente ele flexibiliza um pouco e ali adiante ele entende que precisa elevar novamente o sarrafo, é o papel do parlamento brasileiro, e todos têm que entender as regras do jogo.
O ministro procurou dissociar a aprovação no Senado de uma visão contrária à preservação pelo governo Lula.
— Não é aqui que o sujeito ganhou a eleição com a motosserra na mão. Não é aqui que a gente disputou a eleição dependendo da passagem da boiada. Ao contrário — afirmou Renan, referindo-se ao símbolo da campanha do presidente da Argentina, Javier Milei, e a uma analogia usada pelo ex-ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles, do governo Bolsonaro, sobre afrouxamento de regras ambientais.
Entre as mudanças mais criticadas por ambientalistas, pela ministra e por sua equipe, estão a substituição do licenciamento em três etapas por uma só. O projeto também permite que comunidades tradicionais, como indígenas ou quilombolas, que sejam afetadas por empreendimentos, sejam ouvidas no processo apenas no caso de estarem em territórios já homologados. Além disso, a proposta isenta atividades de licenciamento ao prever que empreendimentos de pequeno e médio porte e potencial poluidor poderão ter uma Licença por Adesão e Compromisso, automática e autodeclaratória.
Ao blog de Renata Agostini, Marina disse que teve reuniões recentes com a Casa Civil e com a Secretaria de Relações Institucionais para alertar dos riscos do projeto para a agenda de Lula, no ano em que o Brasil sediará a conferência ambiental COP30, em Belém. Segundo a ministra, até terça-feira, parecia que havia “algum tipo de mediação”, mas o relato é que os parlamentares “voltaram atrás”.
— Mesmo que a gente perca, nós temos que perder ganhando, que é defendendo o que é correto para o licenciamento ambiental. O licenciamento pode ganhar agilidade? Pode, mas sem perda de qualidade — afirmou.
Embora o PT tivesse orientado contra o projeto, o fato de o governo não ter trabalhado para obstruir as sessões em que a proposta avançou e no corpo a corpo com senadores foi visto como um aceno à pauta no Congresso. Outro sinal foi uma emenda do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), que autoriza licenciamentos especiais para obras consideradas estratégicas pelo Conselho de Governo do presidente.
Ministra Marina Silva durante cerimônia em comemoração ao Dia Internacional da Biodiversidade, no Jardim Botânico, no Rio — Foto: Reprodução/MMA
Governador Elmano de Freitas anuncia contratação de cerca de 13 mil cirurgias eletivas
“13.500 cirurgias eletivas a mais, das já realizadas na nossa rede pública estadual, para que também possam ser feitas em hospitais privados, públicos e filantrópicos”, disse o chefe do Executivo estadual.
São quatro especialidades no edital: cardiologia (adulto e pediátrica), ortopedia, endometriose e oftalmologia. Antes, o credenciamento de cirurgias extras era apenas de instituições privadas.
Segundo Elmano, só neste ano, já forma mais de 44 mil cirurgias eletivas realizadas pelo Estado. Só em seu governo, segundo ele, já são mais de 324 mil.
SOBRE O PROGRAMA
O Programa Estadual de Redução de Filas foi lançado em 10 de abril de 2023, tendo continuidade em 2024, em todo o Ceará, tendo planos de financiamento estadual e federal. A iniciativa foi criada para reduzir o tempo de espera dos pacientes por cirurgias eletivas, que são consideradas procedimentos programados, de não urgência.
As especialidades contempladas são: oftalmologia, ortopedia, otorrinolaringologia, cirurgia geral, gastroenterologia, ginecologia, urologia, nefrologia, neurologia e vascular. Segundo o Governo do Estado, clínicas, hospitais-polo, hospitais municipais e outros equipamentos de saúde se inscreveram por meio de chamamento público.
As unidades da rede estadual com perfil cirúrgico, seguem realizando procedimentos eletivos em paralelo à execução do Programa. Para entrar na fila das cirurgias eletivas, o paciente faz uma consulta com o médico especialista e é orientado sobre a necessidade de passar por uma cirurgia eletiva.
Em seguida, ele é encaminhado para um cirurgião, que irá avaliar a urgência do procedimento e o encaminhamento para a unidade e equipe que realizarão a cirurgia.
BALANÇO
Em dezembro do ano passado, a Secretaria da Saúde do Ceará (Sesa) divulgou os dados relacionados ao programa. De janeiro de 2024 até aquele período, a iniciativa chegou à marca dos 150.468 procedimentos em menos de um ano. Os números são de janeiro de 2024 até esta quarta-feira (11).
Durante todo o ano de 2023, foram 123.449 cirurgias eletivas realizadas, representando um aumento de 36% no número de procedimentos realizados. A iniciativa está presente em todas as cinco regiões de Saúde do Estado – Fortaleza, Norte, Litoral Leste, Sertão Central e Cariri.
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Governador Elmano sanciona lei que recria Hospital da Polícia Militar do Ceará
O governador Elmano de Freitas (PT), sancionou, nesta quarta-feira (21), a lei que cria o Hospital e Maternidade da Polícia Militar do Ceará José Martiniano de Alencar (HPM), e transfere a administração da Secretaria da Saúde (Sesa) para a Polícia Militar.
Segundo o decreto, que entrou em vigor na publicação do Diário Oficial, a unidade hospitalar prestará assistência à saúde dos militares estaduais como também de seus dependentes, com ampliação da estrutura e do atendimento especializado.
O HPM deverá prestar atendimento de média complexidade em saúde, adequado às necessidades de militares estaduais e seus dependentes, além de desenvolver fluxos específicos para atender às necessidades de saúde de militares estaduais e seus dependentes.
Segundo o decreto, a unidade poderá articular ações em conjunto com órgãos da rede de saúde pública estadual quando necessário, além de prestar serviços dentro do Sistema único de Saúde (SUS), em forma de convênio, por exemplo.
- Ficará a cargo da Polícia Militar redistribuir os cargos e aderir equipamentos para a unidade hospitalar.
Terá também que promover a capacitação e o treinamento de profissionais, além de buscar a sustentabilidade financeira por meio de parcerias para a ampliação e a manutenção do serviço hospitalar.
Fica a cargo da Sesa a constituição de uma comissão específica que irá monitorar os serviços prestados para o SUS, e num primeiro momento, os funcionários da antiga unidade de saúde serão cedidos para administrar o HPM.
Quem poderá ser atendido?
O HPM prestará serviços de saúde a todos os militares estaduais e a seus dependentes, como o cônjuge ou o(a) companheiro(a), o ex-cônjuge ou o(a) ex-companheiro(a), desde que receba pensão alimentícia.
Além destes, filhos menores de 21 anos que ainda residam com um dos responsáveis, ou menor de 24 anos que esteja devidamente matriculado numa universidade, como também filho em condição de invalidez, devidamente comprovada.[
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Fila do INSS chega a recorde de 2,7 milhões e gera custo de bilhões às contas públicas
A fila de espera por benefícios do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) disparou no início de 2025, bateu novos recordes e deve impactar as contas públicas no ano.
Em abril havia 2,678 milhões de requerimentos para pagamento de aposentadorias, pensões, licença maternidade e benefícios por incapacidade e assistenciais. No mesmo mês de 2024, esse estoque era de 1,4 milhão, ou seja, houve um aumento de 91%.
O maior patamar foi registrado em março deste ano, quando foram 2,707 milhões de pedidos.
A maior parte da fila se refere a benefícios por incapacidade (48%), seguidos pelos assistenciais (24%) e aposentadorias (17%).
A XP Investimentos estima um impacto de R$ 6 bilhões apenas com o pagamento dos valores em atraso para 1,3 milhão dos pedidos que estão na fila. O custo em 12 meses seria em torno de R$ 27 bilhões para o mesmo número de beneficiários. Como apenas uma parcela dos pedidos é aprovada (outros caem em restrição ou são negados), o custo anual deve ficar em R$ 14 bilhões.
Em seu relatório de acompanhamento fiscal de abril, a IFI (Instituição Fiscal Independente) diz que o aumento da fila pode ser explicado, ao menos parcialmente, pela greve dos médicos peritos de agosto do ano passado e abril deste ano. Para a instituição, o fim da greve dos peritos do INSS pode acelerar o ritmo de concessão de benefícios.
Em abril, por exemplo, a análise de pedidos (1,072 milhão) superou a entrada de novos requerimentos (1,062 milhões), o que se refletiu na redução da fila em relação ao mês anterior.
O órgão, que é ligado ao Senado, projeta uma despesa previdenciária R$ 16 bilhões acima do R$ 1,015 trilhão previsto no Orçamento de 2025. O número da instituição considera o ritmo de crescimento dos benefícios emitidos até dezembro de 2024 –último dado disponível na data de divulgação do documento.
O advogado Valdir Moysés Simão, que foi presidente do INSS em duas ocasiões e também ministro do Planejamento, afirma que parte da explicação pelo aumento da fila é uma mudança de estratégia do próprio INSS que impactou a solicitação do auxílio-doença.
Houve uma tentativa de tornar a avaliação médica mais tecnológica e menos dependente da atuação dos peritos, por meio do Atestmed, sistema online que dispensa a perícia presencial. Mas, diante de um aumento significativo nos pedidos e nas concessões de benefício, houve a decisão de retomar o exame para alguns tipos de auxílio-doença.
"O INSS concedeu muitos benefícios sem necessariamente observar se o segurado tinha de fato direito, e nos últimos meses houve um esforço da entidade para fazer uma revisão disso. A grande fila que temos hoje é em relação ao afastamento por doença", afirma Simão.
Ele diz que o aumento das filas implica prejuízo na casa dos bilhões para o sistema. Quando a consulta demora mais de 60 dias para ser agendada, o segurado pode receber o benefício mesmo se já tiver superado a incapacidade, e o INSS acaba pagando por um período em que o trabalhador poderia estar ativo.
Carlos Vinicius Lopes, dirigente do Sindisprev-Rio (Sindicato dos Trabalhadores em Saúde, Trabalho, Previdência e Assistência Social no Estado do Rio de Janeiro), afirma que o problema central é a falta de servidores, mas também diz que há questões de infraestrutura: "Os sistemas da Dataprev não estão atendendo a demanda".
Ele citou também duas greves que aconteceram no ano passado. Uma delas foi dos servidores administrativos, que durou cerca de 80 dias e teve adesão de 20% da categoria. Houve ainda a paralisação dos peritos médicos, que durou mais de 230 dias. "A greve deles foi diferenciada, porque a maioria trabalhou, mas fazia menos perícias do que o necessário. Essa, sim, teve impacto na fila".
Nesta semana, o INSS publicou portaria que define que o instituto e o Ministério da Previdência Social vão pagar até R$ 17,1 mil para os servidores do órgão destravarem a fila de pedidos de aposentadoria, pensão e outros benefícios, e realizarem revisão do BCP (Benefício de Prestação Continuada).
Segundo o documento, é possível receber R$ 68 extra por cada tarefa, chegando aos R$ 17 mil.
Para receber os valores, as regras são as mesmas do programa anterior para destravar filas: primeiro, é preciso cumprir a meta de trabalho mensal do servidor, e só depois dá para participar do programa, com a possibilidade de ganhar valores a mais. Quem não cumpre a primeira etapa, majorada pelo INSS, não recebe.
Polícia Civil deflagra operação na Secretaria da Educação do Ceará e servidora é afastada
[ATUALIZAÇÃO às 15h53]
Anteriormente, a Polícia Civil tinha informado que as possíveis fraudes eram em processos licitatórios. A Polícia atualizou a nota agora se referindo a 'contratos'.
Durante a ofensiva foram cumpridos mandados de busca e apreensão em empresas e residências. Não há informações sobre quem é a servidora e como ela atuava dentro do suposto esquema. A reportagem apurou que pelo menos duas empresas são investigadas.
Por nota, a Polícia Civil disse que o Estado é vítima e que "o caso segue em segredo de Justiça. O Governo do Estado do Ceará reforça o absoluto rigor no combate a qualquer tipo de desvio de conduta que se identifique em seus processos".
A reportagem também procurou a Secretaria. A Pasta informou em nota "que adotará todas as providências cabíveis no âmbito administrativo, com o objetivo de colaborar para a elucidação dos fatos. A Seduc reitera, ainda, seu compromisso com a transparência, a legalidade e a integridade na gestão pública".
OPERAÇÃO EM 2024
Em 2024, duas servidoras do setor financeiro da Coordenadoria Regional de Desenvolvimento da Educação (Crede 1) da Secretaria da Educação do Ceará (Seduc) foram alvo de uma operação por suposto crime de fraude em licitação, lavagem de dinheiro e organização criminosa.
A regional onde elas são lotadas fica em Maracanaú, na Grande Fortaleza. Em nota, a Seduc informou que iniciou procedimentos administrativos para apurar as situações dentro da legalidade. "A pasta coloca-se à disposição das autoridades competentes para fornecer todas as informações necessárias".
Na mesma ação, foram presos dois homens, 50 e 38 anos, pelos mesmos crimes. As diligências descobriram que o homem de 50 tinha uma empresa sem funcionários registrados e que não estava instalada no local informado nos contratos. Isso se deu devido a uma dispensa de licitação e carta convite. Os nomes dos investigados não foram divulgados pela Polícia.
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Com Lula sob vaias, governo aposta em ‘pacote INSS’ de Motta para estancar sangria da popularidade
Por Iander Porcella e Roseann Kennedy / O ESTADÃO DE SP
Lideranças governistas no Congresso apostam todas as fichas no “pacote do INSS” anunciado pelo presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), para tentar estancar a sangria na popularidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O petista, que pretende concorrer à reeleição em 2026, vem sofrendo um desgaste atrás do outro desde o início do ano, e nesta terça-feira, 20, foi alvo novamente de vaias em evento com prefeitos.
Sondagens internas do Planalto mostram que, após escândalo do roubo dos aposentados e pensionistas, a avaliação negativa do governo voltou a piorar. Agora, a base aguarda, com certo grau de tensão, as pesquisas públicas.
Enquanto isso, pressiona pela rápida aprovação de projetos de lei, apresentados nas últimas semanas, para vedar descontos automáticos de sindicatos e associações na folha de pagamento de aposentados e pensionistas. Embora a medida seja inócua em relação ao que já foi debitado, a ideia é passar a imagem de que as ilegalidades não voltarão a ocorrer.
Motta decidiu bancar a análise das propostas, que se tornaram o principal assunto da reunião do Colégio de Líderes da Casa nesta terça-feira, 20. O governo apela à base para encerrar o assunto o mais rapidamente possível para que o Congresso foque em pautas positivas para o Planalto, como a ampliação da faixa de isenção do Imposto de Renda e a PEC da Segurança Pública. A votação dos projetos também serviria como mais um argumento para tentar evitar a CPMI do INSS.
Como mostrou a Coluna do Estadão, embora ainda tente convencer o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), a enterrar a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito do INSS, o governo vê que a instalação será inevitável e escala aliados “bons de briga” para fazer a defesa de Lula e jogar a culpa na gestão Bolsonaro. Mas, se tiverem mesmo de enfrentar a CPMI, os petistas preferem que seja depois da aprovação de projetos e da devolução do dinheiro dos aposentados.
Aposta do Planalto para segurar CPI do INSS, Alcolumbre ganha aval de Lula e indica novo chefe da Codevasf
Por Jeniffer Gularte— Brasília / O GLOBO
O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), indicou o novo presidente da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf) enquanto o Planalto tenta segurar no Congresso a abertura da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) para investigação dos descontos indevidos nas aposentadorias do INSS. Marcelo Moreira deixará o cargo até julho e será substituído pelo atual gerente-executivo de Estratégia e Finanças da empresa, Lucas Felipe de Oliveira. A troca do comando da companhia foi revelada pelo UOL e confirmada pelo GLOBO.
A mudança vinha sendo costurada desde março e o martelo foi batido agora. Indicado ao cargo pelo ex-líder do União Brasil na Câmara, Elmar Nascimento (União-BA), o atual presidente deixará o posto para trabalhar na iniciativa privada.
A troca aumenta a influência de Davi Alcolumbre em cargos estratégicos dentro do governo e tira espaço ocupado por uma indicação chancelada pela bancada do União Brasil na Câmara. O gesto para o presidente do Senado ocorre ao mesmo tempo em que o governo trabalha para tentar adiar o começo da CPMI do INSS mas também admite a probabilidade cada vez maior de o Congresso instalar o colegiado para investigar o escândalo dos descontos ilegais no INSS. Frente a esse cenário, o Planalto também já avalia estratégias para disputar cargos e ter voz ativa na comissão, que será instalada por Davi Alcolumbre.
No início do governo Lula, PT e União Brasil travaram uma disputa por diretorias da Codevasf, estatal que se tornou uma das preferidas do Centrão. Petistas viam que as políticas empreendidas pela Codevasf poderiam gerar dividendos eleitorais a adversários da legenda, principalmente no Nordeste. Por isso, defendem uma revisão na atuação em obras de pavimentação e outras áreas para as quais há órgãos específicos para tratar. O União Brasil, no entanto, venceu a queda de braço e manteve Marcelo Moreira, Elmar Nascimento (BA), no comando da companhia.
A Codevasf foi criada em 1974 para apoiar o desenvolvimento das regiões pobres do Vale do Rio São Francisco. Com o passar dos anos, a companhia foi ampliando sua área de atuação e passou a abarcar regiões que estão a milhares de quilômetros do Velho Chico, com frequência para abrigar aliados de quem está no poder.
Em 2020, por meio de um projeto de Davi Alcolumbre, Codevasf foi ampliada e passou a atuar em 2.681 municípios, localizados no Distrito Federal e em 15 estados: Alagoas, Amapá, Bahia, Ceará, Goiás, Maranhão, Minas Gerais, Mato Grosso, Pará, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte, Sergipe e Tocantins. Assim, a área de atuação da companhia passou a alcançar o equivalente a 36,59% do território nacional.
Desde 2020 até a decisão do Supremo Tribunal Federal que acabou com o orçamento secreto em agosto de 2024, a Codevasf teve seu orçamento irrigado por verbas proveniente das chamadas emendas de relator, na qual parlamentares enviavam verbas do governo a seus domicílios eleitorais sem que sejam identificados. O mecanismo atendia barganhas do governo com o Congresso e tornou a estatal uma das mais cobiçadas pelo Centrão pelo seu grande raio de influência pelo país. Mesmo após o fim do orçamento secreto, a companhia manteve sua relevância política.
Lula e Alcolumbre em viagem ao Vietnã: senador demonstra prestígio ao indicar apadrinhados e se tornar presença constante em visitas oficiais — Foto: Ricardo Stuckert/Presidência da República
Lula é vaiado ao participar de encontro de prefeitos em Brasília
Por Sérgio Roxo — Brasília / O GLOBO
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi vaiado três vezes ao participar da Marcha dos Prefeitos, realizada em um centro de convenções de Brasília, na manhã desta terça-feira. Ao subir ao palco, recebeu a primeira vaia. Em seguida, quando foi chamado a discursar, Lula recebeu uma nova vaia. Nas duas vezes, alguns dos presentes aplaudiram o presidente, enquanto os demais vaiavam.
Ao terminar de falar, com o fim da cerimônia de abertura da Marcha, Lula recebeu uma nova vaia de parte da plateia. No seu discurso, o presidente destacou que, em seu governo, os prefeitos não sofrem discriminação por causa da preferência partidária.
— A prova disso é o PAC Seleções, que vai ser feito para construção de casas. Vocês vão ter direito a casa independentemente do partido, se vocês gostam ou não do presidente. Isso não está em jogo. O que está em jogo é a necessidade dos moradores de cada cidade que precisam de casa — disse Lula, sendo aplaudido pela plateia.
Ao discursar, o presidente da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), Paulo Ziulkoski, se queixou das despesas crescentes a cargo dos municípios e também criticou a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de exigir transparência para a liberação de emendas.
— Abra o olho. Vamos votar pautas estruturantes — disse Paulo Ziulkoski, ex-prefeito de Mariana Pimentel (RS), se dirigindo a Lula, e se referindo às dificuldades que a paralisação dos pagamentos de emendas pode gerar.
Na sua vez de falar, Lula ironizou o presidente do CNM ao dizer que ele voltou a ter um discurso duro de cobrança. O presidente sugeriu de forma indireta que Ziulkoski, durante a gestão de Jair Bolsonaro (PL), teria uma outra postura.
— Quero cumprimentar Paulo Ziulkoski que hoje voltou a ser velho Paulo Ziulkoski com um discuso mais inflamado, com um discuros mais contudente, como sempre deveria ser um representante dos prefeitos em todas as marchas.
Logo na abertura de sua fala, Lula fez elogios ao ministro da Casa Civil, Rui Costa, que vinha sendo apontado com suspeito de ter vazado a intervenção feita pela primeira-dama Janja da Silva em jantar com o presidente da China, Xi Jinping, na semana passada, para falar sobre o TikTok.
— O Rui é tratado como se fosse um cara que não deixa as coisas acontecerem. Quando, na verdade, todos vocês, prefeitos, devem ter um secretário que tem o mesmo papel que o chefe da Casa Civil. É fazer com que as coisas funcionem corretamente e que todos os secretários se dirijam a ele para que as coisas possam dar certo. Quero aproveitar, na frente dos prefeitos, agradecer o papel importante e relevante do Rui Costa. O governador mais bem-sucedido da Bahia joga no meu governo.
Ao fim da cerimônia de abertura da Marcha, o ministro das Cidades, Jader Filho, anunciou que o governo abrirá as inscrições para que os municípios recebam 130 mil novas unidades da Faixa 1 (destinada a familias com rendas de até R$ 2.850) do programa Minha Casa, Minha Vida.
A marcha tem o objetivo de levar para o governo federal e para o Congresso as demandas dos municípios do país. Além de prefeitos, secretários e vereadores também estão na capital federal. A estimativa é de que o evento reúna um total de 12 mil pessoas.
Lula durante evento com prefeitos em Brasília — Foto: Reprodução