Prefeitura de São Paulo propõe comprar 5 mil apartamentos prontos
05 de março de 2022 | 05h00
Pela primeira vez, a Prefeitura de São Paulo vai abrir concorrência pública para a compra de até 5 mil apartamentos novos ou reformados, com até dez anos de construção, para compor o programa habitacional do Município. Os imóveis serão usados para atender famílias cadastradas na fila da moradia de forma definitiva ou por meio de locação social e vão compor uma ação ampliada que prevê a aquisição de 45 mil unidades da iniciativa privada até o final de 2024 em um investimento estimado de R$ 8 bilhões.
Segundo o prefeito Ricardo Nunes (MDB), a consulta pública anterior à publicação do edital seria lançada neste sábado, 5, nos moldes do programa Pode Entrar, aprovado pela Câmara Municipal ano passado. “Ele muda toda política pública habitacional e cria um novo marco legal que nos dará condições de avançar no atendimento às famílias”, disse Nunes ao Estadão.
Transformado em lei pelos vereadores, o programa permite, por exemplo, que a Prefeitura compre imóveis de forma pulverizada pela cidade, em prédios populares já ocupados sob duas condições básicas: que o valor máximo esteja de acordo com o edital e que a oferta contemple pelo menos cinco unidades na mesma torre.
De acordo com o programa, passam a ser permitidas também compras de empreendimentos inteiros já em construção ou em fase de licenciamento. Segundo o Estadão apurou, os apartamentos devem ter entre 32 e 70 metros quadrados, com dois quartos e um banheiro. Já os beneficiados deverão ter renda bruta familiar de até seis salários mínimos.
O secretário municipal de Habitação, João Farias, informou que os valores estabelecidos para a compra são de R$ 200 mil, no caso de apartamentos prontos, e de R$ 180 mil, para unidades em fase de construção ou licenciamento. Ao participar do programa, as famílias passam a arcar com os custos do financiamento – feito direto com a Cohab de forma subsidiada e dividido em 30 anos – e com taxas relativas a IPTU e condomínio, por exemplo.
O Município diz que aceitará propostas de imóveis localizados em toda a cidade, mas que dará prioridade aos territórios abastecidos com opções de transporte público, próximos, portanto, a estações de trem e metrô e corredores de ônibus. A intenção, segundo a gestão Nunes, é reduzir os deslocamentos urbanos, ampliando o acesso da população beneficiada aos equipamentos públicos e ao mercado de trabalho.
A consulta pública tem o prazo de 30 dias. Depois, as propostas serão reavaliadas para a publicação definitiva dos editais. “É importante destacar que essa consulta pública vai permitir que a Prefeitura faça a maior aquisição de unidades habitacionais da história de São Paulo. Para se ter uma ideia, nossa meta é chegar a 49 mil até o final da gestão, em 2024, mas apenas esses editais já preveem 45 mil”, afirmou o secretário Farias.
O déficit habitacional da capital paulista passa de 400 mil moradias, levando-se em conta a fila registrada da Cohab, o total de imóveis identificados em áreas de risco (173 mil) e o número de moradores de rua (31 mil).
Para o coordenador do Laboratório Arq.futuro de Cidades do Insper, Tomas Alvim, é importante que a Prefeitura desenvolva modelos alternativos de oferta de moradia, principalmente perto das áreas infraestruturadas. “A iniciativa parece ótima, mas isso, claro, não atende a demanda existente. Continuamos precisando de um programa consistente que torne a moradia a porta de entrada de acesso à cidade e aos serviços públicos, como sempre diz Carmem Silva (ativista e coordenadora do Movimento dos Sem-Teto do Centro, o MSTC). Novas soluções devem fazer parte dessa política habitacional”, afirma.
Outros planos para habitação em SP
A Prefeitura quer uma nova fórmula para calcular o valor da indenização a ser paga a moradores de áreas de risco listados em planos de remoção. A ideia é pagar um bônus de até R$ 30 mil para a desocupação de imóveis com mais de cinco anos classificados de risco muito alto. São mais de 11 mil nesta situação na capital, segundo cálculos do Município.
O prefeito Ricardo Nunes também encomendou à Secretaria Municipal de Habitação um novo programa de moradias populares que contemple parte da população em situação de rua com unidades privativas e ocupação rotativa, ou seja, sem a entrega da posse definitiva. De acordo com o projeto, os apartamentos poderão ter a partir de 12 metros quadrados – com cozinha, sala e banheiro – e uso estimado de um ano.
Enfrentamento ao déficit habitacional exige conjunto de ações
Coordenador do curso de negócios imobiliários da Fundação Getulio Vargas (FGV), Alberto Ajzental explica que a maior parte das famílias em déficit habitacional tem renda bruta entre um e três salários mínimos. “É onde o mercado não consegue atender, porque quem faz a construção não consegue fazer uma coisa tão barata, e quem recebe de um a três salários mínimos não tem renda para comprar”, destaca. Por isso, a intervenção do poder público se justifica.
Para ele, a melhor solução para o problema é o aluguel, não a compra, que exige comprometimento grande de parcela da renda familiar por muito tempo. “Se ela aluga e não pode pagar, não vai perder tanto do investimento, porque não perde o bem”, explica.
A compra de imóveis da iniciativa privada, aponta, evita ineficiência e desvios de recursos. “A Prefeitura não é uma construtora”, diz. “Faz uma concorrência e compra o que é bom”, sugere.
A pesquisadora do Laboratório Espaço Público e Direito à Cidade (LabCidade) da USP, Isadora Guerreiro, diz que a compra de imóveis prontos “responde mais rápido” à crise habitacional. Por outro lado, ao incentivar um nicho do mercado que englobe moradias nos parâmetros fixados pelo poder público, dá autonomia à iniciativa privada. “Deixar na mão da iniciativa privada para que construa onde bem entender é algo que vai contra todas as regras de planejamento da cidade”, avalia.
Nesse sentido, ela questiona a possibilidade de “pulverização” dos imóveis comprados. “Me parece uma contradição com o Plano Diretor, que definiu as áreas de prioridade (para a construção de habitação de interesse social)”, diz, citando os eixos de estruturação urbana, as Zonas Especiais de Interesse Social (Zeis) e o Parcelamento, Edificação ou Utilização Compulsórios (Peuc).
A pesquisadora destaca que o enfrentamento do déficit habitacional requer ações diversas, pois ele não é um número abstrato, mas sim composto de elementos internos, como precariedade e coabitação, que indicam necessidades distintas. Ela aponta que cerca de 70% do déficit habitacional da Região Metropolitana corresponde a pessoas que enfrentam ônus excessivo de aluguel, que se configura quando mais de 30% do rendimento familiar fica comprometido. / COLABOROU LEON FERRARI
Novo decreto permite eventos sociais, festivos e esportivos sem limitação de público no Ceará
O governador do Estado Camilo Santana (PT) e o secretário da Saúde Marcos Antônio Gadelha Maia anunciaram, nesta sexta-feira (4), a liberação de eventos sociais, festivos e esportivos no Estado sem limite de público, mantendo o uso de máscara e a apresentação do comprovante vacinal. A nova medida entra em vigor a partir de segunda-feira (7).
A decisão foi tomada durante a reunião semanal do Comitê Estadual de Enfrentamento à Pandemia, após análise de que os índices da Covid-19 continuam em queda no Ceará.
"As pessoas poderão realizar eventos sem limitação de público, contanto que sejam em espaços controlados, que exijam passaporte de vacinação das três doses, acima de 18 anos, e também a obrigatoriedade do uso da máscara. Isso é uma forma também de exigir que as pessoas se vacinem, tomem a 3ª dose, respeitando o que aconteceu nessa onda da ômicron", disse Camilo Santana.
O decreto atual, vigente até o próximo domingo (6), mantém a capacidade máxima de 250 pessoas em locais fechados e 500 nos abertos. Esse limite foi definido ainda em janeiro deste ano, com o avanço da variante ômicron.
Ainda conforme o governador, as demais atividades que já exigem a apresentação do passaporte, como bares e restaurantes, deverão exigir o passaporte com as três doses da vacina a partir de 21 de março.
Máscara N95
Outra mudança diz respeito ao fim da obrigatoriedade da máscara N95, com exceção para as atividades que exigem em seu protocolo a utilização deste modelo, como a área da saúde, por exemplo.
Atual decreto
O decreto atual é válido até domingo (6). Na ocasião do anúncio, o governador manteve as medidas que já vinham em vigor e revelou que os índices seguem em queda no Estado. DIARIONORDESTE
PIB cresce 4,6% em 2021 e supera perdas da pandemia
O Produto Interno Bruto (PIB) do país avançou 0,5% no quarto trimestre de 2021 e encerrou o ano com crescimento de 4,6%, totalizando R$ 8,7 trilhões. Esse avanço recuperou as perdas de 2020, quando a economia brasileira encolheu 3,9% devido à pandemia. O PIB per capita alcançou R$ 40.688 no ano passado, um avanço de 3,9% em relação ao ano anterior (-4,6%).
O PIB, soma dos bens e serviços finais produzidos no país, está 0,5% acima do quarto trimestre de 2019, período pré-pandemia de covid-19, mas continua 2,8% abaixo do ponto mais alto da atividade econômica na série histórica, alcançado no primeiro trimestre de 2014.
Os dados são do Sistema de Contas Nacionais Trimestrais, divulgado hoje (4) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Setores
Segundo o levantamento, o crescimento da economia foi puxado pelas altas nos serviços (4,7%) e na indústria (4,5%), que juntos representam 90% do PIB do país. Por outro lado, a agropecuária recuou 0,2% no ano passado.
De acordo com a coordenadora de Contas Nacionais do IBGE, Rebeca Palis, todas as atividades que compõem os serviços cresceram em 2021, com destaque para transporte, armazenagem e correio (11,4%). Segundo ela, o transporte de passageiros também subiu bastante, principalmente no fim do ano, com o retorno das pessoas às viagens.
“A atividade de informação e comunicação (12,3%) também avançou, puxada por internet e desenvolvimento de sistemas. Essa atividade já vinha crescendo antes, mas com o isolamento social e todas as mudanças provocadas pela pandemia, esse processo se intensificou, fazendo a atividade crescer ainda mais”, disse, em nota, Rebeca Palis.
Outras atividades de serviços (7,6%) também tiveram alta no período. “São atividades relacionadas aos serviços presenciais, parte da economia que foi a mais afetada pela pandemia, mas que voltou a se recuperar, impulsionada pela própria demanda das famílias por esse tipo de serviço”, acrescentou a pesquisadora.
Cresceram ainda comércio (5,5%), atividades imobiliárias (2,2%), administração, defesa, saúde e educação públicas e seguridade sociais (1,5%) e atividades financeiras, de seguros e serviços relacionados (0,7%).
Segundo o IBGE, na indústria, o destaque positivo foi o desempenho da construção que, após cair 6,3% em 2020, subiu 9,7% em 2021.
“As indústrias de transformação (4,5%), com maior peso no setor, também cresceram, influenciadas principalmente pela alta nas atividades de fabricação de máquinas e equipamentos; metalurgia; fabricação de outros equipamentos de transporte; fabricação de produtos minerais não metálicos; e indústria automotiva. As indústrias extrativas avançaram 3% devido à alta na extração de minério de ferro”, informou o IBGE.
A única atividade que não cresceu foi a de eletricidade, gás, água, esgoto, gestão de resíduos, que teve variação negativa de 0,1%, que indica estabilidade. “A crise hídrica afetou negativamente o desempenho da atividade em 2021”, explicou Rebeca Palis.
Os investimentos (Formação Bruta de Capital Fixo) avançaram 17,2%, favorecidos pela construção, que no ano anterior teve uma queda, e pela produção interna de bens de capital. A taxa de investimento subiu de 16,6% para 19,2% em um ano.
A balança de bens e serviços registrou alta de 12,4% nas importações e de 5,8% nas exportações. Em 2020, tinham recuado 9,8% e 1,8%, respectivamente. “Como a economia aqueceu, o país importou mais do que exportou, o que gerou esse déficit na balança de bens e serviços. Isso puxou o PIB um pouco para baixo, contribuindo negativamente para o desempenho da economia”, disse Rebeca Palis.
Entre os produtos da pauta de exportações, os destaques foram extração de petróleo e gás natural; metalurgia; veículos automotores; e produtos de metal. No caso dos serviços, as viagens subiram mais. Entre as importações, os destaques positivos foram produtos químicos; máquinas e aparelhos elétricos; indústria automotiva e produtos de metal.
Agropecuária
A agropecuária, que havia crescido em 2020, recuou 0,2% em 2021, em decorrência da estiagem prolongada e de geadas.
“Apesar do crescimento anual da produção de soja (11,0%), culturas importantes da lavoura registraram queda na estimativa de produção e perda de produtividade em 2021, como a cana-de-açúcar (-10,1%), o milho (-15,0%) e o café (-21,1%). O baixo desempenho da pecuária é explicado, principalmente, pela queda nas estimativas de produção dos bovinos e de leite”, afirmou a pesquisadora.
Demanda interna
Segundo a pesquisa, ao contrário do que ocorreu em 2020, todos os componentes da demanda avançaram em 2021, contribuindo positivamente para o crescimento do PIB. O consumo das famílias avançou 3,6% e o do governo subiu 2%. No ano anterior, esses componentes haviam recuado 5,4% e 4,5%, respectivamente.
“Houve recuperação da ocupação em 2021, mas a inflação alta afetou muito a capacidade de consumo das famílias. Os juros começaram a subir. Tivemos também os programas assistenciais do governo. Ou seja, fatores positivos e negativos impactaram o resultado do consumo das famílias no ano passado”, afirmou Rebeca Palis.
*Matéria alterada às 11h10 de hoje (4) para acréscimo de informações.
Edição: Graça Adjuto / AGÊNCIA BRASIL
Brasil recebe lote da vacina pediátrica da Pfizer contra covid-19
A Pfizer entregou ontem (3) um novo lote de vacinas pediátricas contra a covid-19 fabricadas pela Pfizer/BioNTech para imunização de crianças de 5 a 11 anos. O lote contém 1,668 milhão de doses e chegou às 7h45, no Aeroporto de Viracopos, em Campinas.
Além das doses pediátricas, a Pfizer enviou, no mesmo voo, 5.850 doses da doses de vacinas contra a covid-19 destinadas a maiores de 12 anos.
Os imunizantes serão distribuídos nos próximos dias.
A dose pediátrica é diferente da vacina aplicada em adultos: a cor do frasco é laranja e a dosagem é menor. A vacina é segura e foi aprovada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Edição: Maria Claudia / AGÊMCIA BRASIL
Covid-19: Brasil passa das 650 mil mortes
O Brasil ultrapassou a marca das 650 mil mortes causadas por complicações associadas à covid-19. Nas últimas 24 horas, foram registrados 578 óbitos. Com isso, o total de vidas perdidas para a pandemia chega a 650.578.
Ainda há 3.138 mortes em investigação. As mortes em investigação ocorrem pelo fato de haver casos em que o paciente faleceu, mas a investigação se a causa foi covid-19 ainda demandar exames e procedimentos posteriores.
Já a soma de pessoas infectadas desde o início da pandemia chegou a 28.904.030. De ontem (2) para hoje (3), foram confirmados 61.870 diagnósticos positivos para a covid-19.
A quantidade de casos em acompanhamento está em 1.443.166. O termo é dado para designar casos notificados nos últimos 14 dias que não tiveram alta nem evoluíram para morte.
Até hoje, 26.810.286 pessoas se recuperaram da covid-19. O número corresponde a 90,5% dos infectados desde o início da pandemia.
Os dados estão no balanço diário do Ministério da Saúde, divulgado nesta quinta-feira (3). Nele, são consolidadas as informações enviadas por secretarias municipais e estaduais de Saúde sobre casos e mortes associados à covid-19.
Os números em geral são menores aos domingos, segundas-feiras ou nos dias seguintes aos feriados em razão da redução de equipes para a alimentação dos dados. Às terças-feiras e dois dias depois dos feriados, em geral há mais registros diários pelo acúmulo de dados atualizado.
Estados
Segundo o balanço do Ministério da Saúde, no topo do ranking de estados com mais mortes por covid-19 registradas até o momento estão São Paulo (164.835), Rio de Janeiro (71.837), Minas Gerais (59.722), Paraná (42.381) e Rio Grande do Sul (38.384).
Já os estados com menos óbitos resultantes da pandemia são Acre (1.976), Amapá (2.102), Roraima (2.134), Tocantins (4.110) e Sergipe (6.261).
Vacinação
Até hoje, foram aplicadas 378,6 milhões de doses de vacinas contra a covid-19, sendo 169,7 milhões com a primeira dose e 145,7 milhões com a segunda dose ou dose única. Outras 56 milhões de pessoas já receberam a dose de reforço.
Edição: Fernando Fraga / AGÊNCIA BRASIL
Energia solar no Brasil ultrapassa Itaipu
O Brasil ultrapassou 14 gigawatts de potência operacional da fonte de energia solar fotovoltaica, superando Itaipu, segundo a Absolar (associação do setor).
A marca considera a capacidade de usinas de grande porte instaladas no país e os sistemas de geração própria de energia elétrica em telhados e pequenos terrenos.
A expectativa do setor é de forte crescimento neste ano, com o aumento na conta de energia elétrica e o marco legal, sancionado em janeiro.
Ronaldo Koloszuk, presidente do conselho de administração da Absolar, diz que prevê avanço dos investimentos em energia solar no Brasil neste ano, porque o período de transição legal garante a manutenção das regras atuais, mais vantajosas ao consumidor, até 2045.
Hoje, empreendimentos de geração distribuída de energia operam com um sistema de compensação: o consumidor proprietário da usina recebe um crédito na conta de luz pelo saldo positivo de energia gerada e inserida na rede, após desconto de seu consumo. O segmento é isento do pagamento de alguns componentes tarifários, como a tarifa de uso do sistema de distribuição (TUSD fio B).
FOLHA DE SP
O Estado de bem-estar social
28 de fevereiro de 2022 | 03h00
A discussão política acerca da esquerda e da social-democracia no Brasil é frequentemente confundida com o debate sobre a noção de Estado de bem-estar social, como se este fosse fruto da esquerda. Note-se, a respeito, que a trajetória histórica de constituição desta forma de Estado foi liderada por vários partidos, adotando todos os valores da democracia e da igualdade. Na Itália, sucederam-se vários governos de orientação democrata-cristã, muitas vezes com apoio dos comunistas e socialistas. Na Alemanha foram governos também de orientação democrata-cristã, alternando-se no poder no transcurso de décadas com governos social-democratas. Nada de essencial mudava nesta alternância política, salvo em questões menores, nenhuma delas comprometendo as liberdades, a democracia, as medidas sociais e a economia de mercado. Na França, governos de orientação gaullista se alternaram com governos socialistas, sem que os pilares do Estado fossem comprometidos. Em nenhuma destas alternâncias em diferentes países adversários políticos foram tratados como inimigos a serem eliminados.
É uma falácia considerar que o valor da liberdade é representado pela direita, enquanto o da igualdade o seria pela esquerda. Tais valores têm características universais, não se prestando a apropriações partidárias ou ideológicas. Se há um certo consenso de que a liberdade é fundante da democracia representativa ou liberal, alguns a dizendo por isso de direita, não há o mesmo consenso relativamente à igualdade. Nos países comunistas, uma vez passado o período da distribuição da riqueza capitalista então existente, a experiência mostrou a sua incapacidade na produção de novas riquezas, fazendo com que a população padecesse níveis de vida baixíssimos, além de privilegiar socialmente a burocracia comunista. Qualquer discordância ou crítica era suprimida pela polícia, quando não pela tortura e morte.
Quem quiser verificar a diferença, basta comparar o destino da Alemanha Oriental e da Ocidental, da Coreia do Norte e da do Sul. O século 20 nos apresenta esta experiência única. A Alemanha Oriental desaparece, sendo a queda do Muro de Berlim o seu símbolo, após o desmoronamento, por crises internas, da União Soviética. A Coreia do Norte, dinástica, militarizada, comunista e liberticida, continua oprimindo os seus cidadãos, enquanto a Coreia do Sul, próspera, exibe um outro caminho. A experiência europeia do pós-guerra é a da formação do Estado de bem-estar social, do Estado Democrático de Direito e da economia de mercado. Observe-se, ainda, que o atendimento das necessidades sociais não é tampouco uma criatura da esquerda, pois faz parte da Torá segundo os judeus, do Antigo Testamento segundo os cristãos, em particular o livro de Levítico. É uma obrigação moral de qualquer pessoa, de qualquer empresário, dar atenção às viúvas, aos órfãos e aos idosos que não podem ser abandonados. As primeiras medidas políticas nesse sentido foram tomadas por Bismarck em 1883 e pelo ministro Winston Churchill quando, após a Grande Guerra de 1914-1918, criou mecanismos estatais de atendimento às vítimas de guerra, a saber, viúvas, órfãos, idosos e mutilados.
Em nosso país, a esquerda petista procura reivindicar para si esta ideia de igualdade, posicionando-se contra a social-democracia nacional, como se fosse de direita – neoliberal, para utilizar o seu jargão. Toda sua preocupação consistiu em considerar os tucanos como inimigos, arrogando-se a posição de verdadeira esquerda. Em seu primeiro governo, Lula não hesitava em condenar a “herança maldita”, quando ela foi a responsável por seu sucesso inicial. Aliás, não dá para entender como um setor dos tucanos ainda insiste em namorar com os petistas quando estes sempre os desprezaram, além de terem, no poder, erigido a corrupção em modo de governar. Qualquer afinidade ideológica é, aqui, um mero disfarce, salvo se for uma questão psicanalítica, a do PSDB no divã.
Ademais, os petistas se posicionaram contra a Constituição de 1988, que é um projeto de instaurar por lei o Estado de bem-estar social, com todos os inconvenientes daí derivados, de uma tentativa jurídica que não oferece os meios financeiros e executivos de sua realização. Nossa Carta Maior está repleta de direitos e de poucos deveres, tornando-a capenga e submetida a necessárias reformas periódicas por meio de diferentes PECs. Mais concretamente, o PT se posicionou contra o Estado de bem-estar social, quando agora procura apropriar-se de sua bandeira. Ou, ainda, em outra linguagem, posicionou-se contra a “social-democratização” do Estado brasileiro.
Os únicos verdadeiros defensores do Estado de bem-estar social foram os governos de Fernando Henrique Cardoso e Michel Temer – um tucano, outro emedebista –, pois, além de terem implementado medidas de cunho eminentemente social, preocuparam-se com suas formas de financiamento, por exemplo, por meio da Lei de Responsabilidade Fiscal e da do teto dos gastos públicos.
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PROFESSOR DE FILOSOFIA NA UFGRS. E-MAIL: O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo.
A grande revolução do cano enterrado
02 de março de 2022 | 03h00
É um velho refrão que “cano enterrado não dá voto”. Analogamente, as instituições civis dedicadas ao saneamento sabem que ele não traz popularidade. Mas aqueles que trabalharam pelo novo Marco do Saneamento podem se regozijar por serem protagonistas daquela que pode ser a maior revolução social da história do Brasil.
Cerca de 35 milhões de brasileiros não têm acesso à água potável, quase 100 milhões não têm coleta de esgoto e 4,4 milhões, sem nenhum esgoto, são obrigados a defecar a céu aberto. Além da ofensa à dignidade humana, isso acarreta imensos problemas ambientais, sanitários e econômicos. A calamidade estarrece não só pelo seu tamanho, mas pela sua resiliência. Os números são praticamente os mesmos há anos.
Em 2014, o Plano Nacional de Saneamento estabeleceu a universalização do abastecimento de água até 2023 e a da rede de esgoto até 2033, com investimentos de R$ 25 bilhões anuais. Na última década, a média de investimentos ficou em metade disso. Nesse ritmo a universalização só seria atingida em 2060. Para piorar, não só os investimentos vinham caindo (entre 2014 e 2018 a redução foi de 12,3%), como o cálculo parece defasado: especialistas apontam a necessidade de investir entre R$ 30 bilhões e R$ 60 bilhões ao ano.
A Constituição determinou que os serviços públicos fossem precedidos de licitação e proibiu o tratamento privilegiado às estatais. Mas, ao contrário de áreas como energia, transporte e telecomunicações, o saneamento ainda agonizava entre regras retrógradas. As companhias estaduais operam sem capacidade de investimento. As parcerias público-privadas, mesmo respondendo por 20% dos investimentos, representam só 6% do mercado.
O novo Marco, aprovado em 2020, centralizou a regulação na esfera federal da Agência Nacional de Águas (ANA), promovendo a uniformização das normas pulverizadas entre milhares de municípios, e exigiu licitação e adesão a metas para os contratos. Com isso garantiu segurança jurídica e competitividade ao setor, ajudando a atrair investimentos e promover a eficiência. Além disso, previu a montagem de blocos regionais, combinando localidades rentáveis e deficitárias, de maneira a permitir que as primeiras compensem as carências técnicas e financeiras das últimas.
Os resultados já se fazem sentir. Em 2021, os megaleilões em grandes cidades elevaram em 15% os investimentos. Entre 2022 e 2023, a expectativa é de que as 23 licitações previstas (12 em cidades pequenas) aumentem os investimentos em 18%.
O saneamento não é só um imperativo moral, mas econômico. Estima-se que cada R$ 1 gere um retorno de até R$ 4 entre redução de gastos com saúde, aumento da produtividade, valorização imobiliária ou receitas do turismo.
A solução para a calamidade sanitária e econômica precipitada pela pandemia passa em boa medida pelo saneamento. Ele melhorará as condições sanitárias da população e é o setor de infraestrutura com maior perspectiva de investimentos.
Entre os desafios ainda estão uma regulação equilibrada por parte da ANA; uma reforma tributária que aumente a capacidade de arrecadação e investimento municipal; e um plano de ação da União que priorize investimentos em municípios mais precários.
Mais do que tudo, é preciso uma revolução na consciência pública. Nenhum setor expõe com tanta crueldade a desigualdade do País e todo progresso econômico será ilusório enquanto as pessoas não tiverem acesso à água e esgoto. Políticos confortáveis com o adágio “cano enterrado não dá voto” deveriam ter sua ambição à vida pública morta e enterrada. Mas para isso a população precisa se conscientizar. Uma pesquisa da Kimberly-Clark revelou que entre os 10 problemas que mais preocupam os entrevistados o saneamento está em 9.º lugar, e 70% subestimam o problema.
O Marco do Saneamento foi só o primeiro passo rumo à universalização. A defasagem é profunda, os desafios são enormes, mas tudo indica que, literalmente sob nossos pés, a grande revolução já começou. Para que seja consumada, será necessária a mobilização de todos. Basta de tolerar o intolerável.
Com cancelamento de anuência para construção, o que vai acontecer com a Transnordestina em Caucaia?
O cancelamento pela Prefeitura de Caucaia da anuência para a construção de um terminal da Transnordestina no município da Região Metropolitana de Fortaleza pode resultar em mais um atraso no cronograma das obras e em um novo aumento de custos do projeto bilionário. Essa é a avaliação de especialistas ouvidos pelo Diário do Nordeste.
A Prefeitura de Caucaia informou que um dos motivos que fizeram a administração atual optar pelo cancelamento da anuência foi a ausência de critérios técnicos por parte da gestão municipal anterior. (Veja nota completa abaixo)
O presidente da Câmara Setorial de Logística do Estado (CSLog), Bruno Iughetti, pontua que o cancelamento da autorização traz implicações preocupantes para a continuidade da construção da ferrovia.
"O problema está criado com o cancelamento da Prefeitura. Agora, evidentemente, isso traz implicações significativas, porque o projeto está pronto e será necessário que se reveja. Com certeza teremos novo atraso", afirma.
Ele também revela não saber os motivos que basearam a decisão, uma vez que é um projeto aguardado por anos e que deve gerar inúmeros benefícios para a movimentação de carga no Estado, especialmente até o Porto do Pecém.
Iughetti ainda lembra que a possível revisão da ferrovia irá acarretar elevação dos custos.
"Não tenham nem dúvida que alteração de projeto e suas consequências vai implicar no sobrepreço significativo da previsão atual para a conclusão da linha. É inegável que isso aconteça. Porém, a gente tem que entender o que motivou essa decisão", ressalta.
Importância do equipamento
O professor de Engenharia de Transportes da Universidade Federal do Ceará (UFC), Bruno Bertoncini, explica que, apesar de desconhecer o terminal em questão, geralmente o equipamento é um ponto onde existe processamento de cargas, seja carregamento ou descarregamento.
Em sua avaliação, a construção da ferrovia sem um terminal retira o propósito do projeto.
"As ferrovias sem terminais perdem sentido, pois são eles que possibilitam a integração entre modais, o que é fundamental para geração das viagens", esclarece.
Ele também indica haver necessidade de ajustes apenas no esperado para grandes projetos como o da Transnordestina, embora reconheça que a Transnordestina Logística, a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) e órgãos ambientais poderiam ser mais precisos no detalhamento.
Respingos da decisão
O impasse também começa a repercutir nos setores envolvidos indiretamente na construção da ferrovia. O presidente do Sindicato da Indústria da Construção Pesada do Ceará (Sinconpe-CE), Dinalvo Diniz, demonstrou preocupação.
Para ele, além dos impactos econômicos, o imbróglio envolvendo as licenças "pode afastar investidores e elevar custos para o setor da construção" e "gerando insegurança jurídica para todas as partes envolvidas", afirmou em nota.
"Esse é um projeto aprovado já há bastante tempo. E um projeto dessa magnitude não pode ficar parado. A administração pública deve resguardar a segurança jurídica dos contratos. Sem isso, há perda da confiança por parte dos investidores e aumento dos custos das obras. Acreditamos que não seja do interesse do município de Caucaia que essa obra fique parada", reforçou.
Respostas
Procurada, a Prefeitura de Caucaia esclareceu por meio de nota que cancelou a anuência para a construção do terminal "pela ausência de critérios técnicos por parte da gestão municipal anterior, que havia concedido autorização contrariando Parecer Técnico constante do processo administrativo, avaliação mais do que suficiente para embasar o cancelamento anteriormente concedido".
O comunicado detalha que a prefeitura não encontrou no processo, documentos necessários para concessão de anuência e que, ao longo de 2021, a atual gestão não foi procurada para apresentação do projeto e debate dos impactos ambientais, sociais e econômicos.
"A gestão tem todo o interesse no andamento do projeto e após a realização de reunião com a empresa interessada, iniciou uma força-tarefa com o objetivo de criar as condições legais para que o licenciamento possa ocorrer", acrescenta o texto.
CONFIRA ABAIXO A NOTA NA ÍNTEGRA:
"Diante de especulações e desinformação divulgadas acerca dos trabalhos da ferrovia Transnordestina em nosso município, a Prefeitura de Caucaia informa que:
Primando sempre pela responsabilidade e priorizando o interesse dos caucaienses, foi realizada a anulação da Carta de Anuência 005/2020, que trata do projeto de construção do Terminal de Uso Privado – TUP, obra requerida pela empresa NORDESTE LOGÍSTICA – NELOG, anulação esta motivada pela ausência de critérios técnicos por parte da gestão municipal anterior, que havia concedido autorização contrariando o Parecer Técnico constante do processo administrativo 2020010651, avaliação mais do que suficiente para embasar o cancelamento anteriormente concedido.
A prefeitura esclarece também, que não encontrou no processo, documentos necessários para concessão de anuência.
A gestão atual informa ainda que, ao longo do ano de 2021, nosso primeiro ano de gestão, nunca foi procurada para apresentação do projeto e debate dos impactos ambientais, sociais e econômicos, a fim de salvaguardar os direitos dos caucaienses. Informa ainda que a gestão tem todo o interesse no andamento do projeto e que após a realização de reunião na semana passada com a empresa interessada, iniciou uma força-tarefa com o objetivo de criar as condições legais para que o licenciamento possa ocorrer. O interesse do município é que seja, sim, realizada a obra de forma que respeite todos os trâmites legais, a transparência e, acima de tudo, a qualidade de vida das comunidades no entorno da área a ser implantado.
Reafirmamos, assim, o compromisso de continuar promovendo o desenvolvimento local, sem jamais deixar de cumprir com todos os trâmites legais e garantias técnicas, visando acima de tudo o bem estar da população de Caucaia."
Procurada, a Transnordestina Logística informou que não irá se pronunciar sobre o assunto. COM DIARIONRDESTE.
Governo federal inaugura trecho de 17 km da BR-153 em São Paulo
O governo federal inaugurou hoje (24) um trecho de duplicação da BR-153 de 17,8 quilômetros, localizado em São José do Rio Preto (SP), entre o km 54,3 e o km 72,1. Foram investidos R$ 268,5 milhões no empreendimento, valor que inclui restaurações e intervenções em viadutos, ponte e passarelas.
Segundo o Ministério da Infraestrutura, cerca de 1 milhão de pessoas que moram na região poderão ser beneficiadas. O município fica a 442 quilômetros da capital, e, segundo a pasta, exerce influência direta sobre uma região com mais de 100 cidades.
Aproveitando a ida a São Paulo para inaugurar a obra, o presidente Jair Bolsonaro voltou a criticar o que classifica de “medidas populistas”, adotadas por governadores que defendem o isolamento social como forma de combate à pandemia da covid-19.
“Assistimos, ao longo dos últimos dois últimos anos, vimos e sentimos na pele protótipos de ditadores por todo o Brasil. Esses aprendizes de ditadores tomaram medidas, algumas populistas e outras não pensadas, que afetaram diretamente nossas vidas”, disse Bolsonaro. “Ser líder não é estar ao lado do politicamente correto. É decidir por gestos, e por exemplo, estar ao lado do povo”, acrescentou.
“Eu tinha e tenho o poder de fechar todo o Brasil por decreto. Jamais cogitei isso porque a liberdade está em primeiro lugar. Quase todos governadores obrigaram o povo a ficar em casa, mas não pensaram nas consequências”, completou.
Matéria alterada às 17h17 para ajustes na edição do texto
Edição: Juliana Andrade / AGÊNCIOA BRSIL