AGU vai pedir exclusão de posts que considerar ‘desinformação’ e ameaça à democracia
Por Tácio Lorran / O ESTADÃO
BRASÍLIA - O procurador-geral da União, Marcelo Eugênio, confirmou hoje ao Estadão que a advocacia do governo vai atuar para pedir a exclusão de posts que considerar desinformação. O assunto tem causado polêmica sobre qual o conceito que o governo irá usar para definir o que é ou não desinformação e abriu discussão sobre risco de censura nas redes sociais.
O perfil oficial no Twitter da Secretaria de Comunicação (Secom) da Presidência da República tem sido alvo de críticas devido ao compartilhamento de informações consideradas inverídicas. Nessa terça-feira (24/1) o governo publicou que não há risco de prejuízo nos financiamentos do BNDES. “Os acordos têm garantias, seguro e há um larga tradição de receber o que emprestou”, diz a imagem, cuja publicação principal tem mais de 170 mil visualizações às 17h desta quarta.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, também alegou que não é possível corrigir a tabela do Imposto de Renda já em 2023 por conta do chamado princípio da anterioridade. No entanto, isso não se aplicaria ao reajuste na faixa da isenção, desde que o governo reduza o imposto para todas as faixas, e não aumente para nenhuma. A página oficial do Palácio do Planalto também tratou de “golpe” o impeachment de Dilma Rousseff, o que é uma inverdade.
As ações contra o que o governo entender como desinformação serão elaboradas na recém criada Procuradoria Nacional de Defesa da Democracia, vinculada à Advocacia-Geral da União (AGU). “Vamos atuar em qualquer ameaça à integridade da nação. Eventualmente, se houver algo dessa natureza, dentro, efetivamente, do conceito de desinformação, é possível [atuar na exclusão de publicações]”, afirmou ao Estadão o procurador-geral da União, Marcelo Eugênio.
Ele explicou que o conceito de desinformação ainda será definido e negou se tratar de censura. “O raio de ação da Procuradoria é garantir a liberdade de expressão. Quando se tem fluidez na desinformação, existe uma limitação da liberdade de expressão. Mas o nosso foco é a integridade da ação pública, risco da ação pública, do acesso aos serviços públicos, da deslegitimização dos poderes”, explicou, ao afirmar que extremismo não tem lado, nem direita nem esquerda.
O procurador vai coordenar o grupo de trabalho da Procuradoria. A equipe deve ouvir a sociedade civil e especialistas sobre o assunto. Representantes das plataformas digitais também foram convidados para o debate.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva criou a nova Procuradoria dentro da estrutura da AGU para atuar em nome do governo no combate à “desinformação sobre políticas públicas”. Não existe, no entanto, no ordenamento jurídico do País a definição do conceito de desinformação. Como mostrou o Estadão, críticos da iniciativa veem risco de avaliações arbitrárias no órgão ligado à AGU que atua na defesa do governo na esfera judicial.
Nesta manhã, o ministro-chefe da AGU, Jorge Messias, recebeu jornalistas para apresentar a nova gestão do órgão. Um dos principais desafios, segundo ele, é a atuação na defesa da democracia. “Nós não temos o direito de ser amador nesse tema. Nós sabemos que há um ecossistema de desinformação estritamente profissional, monetizado e colocado a serviço de desestabilização das instituições democráticas. É nosso dever constitucional zelar, guardar, pelas instituições democráticas. O Estado precisa estar preparado para responder esse desafio”, disse.
Messias ponderou, contudo, que a AGU não vai virar fiscal de redes sociais. “A desinformação corrói a confiança da sociedade nas instituições democráticas. A AGU vai virar fiscal de redes sociais? Jamais. Nós temos que ter uma visão estratégica de que a nossa atuação precisa ser certeira. Estamos falando aqui de que desinformação? A desinformação que coloca em risco o acesso aos serviços públicos e às políticas públicas, que compromete a ordem pública.”
Lula diz que BNDES vai voltar a financiar projetos para ‘ajudar’ países vizinhos a crescer
Por Eduardo Gayer e Giordanna Neves / O ESTADÃO
BUENOS AIRES - O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou nesta segunda-feira, 23, a empresários em Buenos Aires que o BNDES vai voltar a financiar projetos de engenharia para ajudar empresas brasileiras no exterior e ajudar “países vizinhos a crescer”.
“O BNDES vai voltar a financiar as relações comerciais do Brasil e vai voltar a financiar projetos de engenharia para ajudar empresas brasileiras no exterior. E para ajudar que países vizinhos possam crescer e até vender resultado desse enriquecimento para países como Brasil”, afirmou o petista. “O Brasil parou de compartilhar a possibilidade de crescimento com outros países”.
O papel do banco de fomento nos financiamentos de orbas em países da América Latina e da África durante as gestões petistas foi alvo de investigações da Operação Lava Jato e sempre foi criticada pela oposição e também pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, que falava em “caixa preta”.
Para Lula, porém, há quatro anos o BNDES não empresta dinheiro para o desenvolvimento, o que teria ajudado na estagnação do crescimento brasileiro. “Todo o dinheiro do BNDES é voltado para o Tesouro que quer receber o empréstimo feito”, disse o presidente em referência aos recursos devolvidos pela instituição de fomento ao Tesouro em pagamento a dívida bilionária acumulada na gestão petista. Ainda faltam cerca de R$ 25 bilhões para serem devolvidos.
De 2008 a 2014, o banco recebeu cerca de R$ 440 bilhões, em valores nominais, como parte de “políticas anticíclicas” contra a crise financeira internacional. O Tribunal de Contas da União (TCU) considerou parte desses aportes irregular em março de 2021 e determinou que a dívida fosse quitada de forma antecipada, mas o BNDES e o governo entraram em um “cabo de guerra” em torno do ritmo do pagamento.
Apesar da resistência do empresariado brasileiro e do mercado financeiro à política de financiamento de bancos públicos a obras no exterior, Lula já tinha citado o BNDES ao falar em formas possíveis de financiar o gasoduto Néstor Kirchner, que pretende levar o gás de xisto da região de Vaca Muerta ao Brasil.
“Se há interesse dos empresários, se há interesse do governo e nós temos um banco de desenvolvimento para isso, eu quero dizer que nós vamos criar as condições para fazer o financiamento que a gente puder fazer para ajudar o gasoduto argentino”, declarou o presidente a jornalistas na Casa Rosada, durante a visita oficial à Argentina.
Em dezembro, já após a vitória de Lula nas eleições, autoridades argentinas chegaram a anunciar que o BNDES financiaria até US$ 689 milhões (o equivalente a R$ 3,5 bilhões em cotação atual) para a obra, uma das mais ambiciosas da Argentina. Ainda no governo Bolsonaro, o banco de fomento emitiu nota negando.
A ideia é construir um gasoduto para transportar gás natural produzido no campo de Vaca Muerta, localizado na Província de Neuquén, a oeste da região da Patagônia, até os principais mercados consumidores. Lula disse que os empresários brasileiros têm interesse no gasoduto Néstor Kirchner, assim como nos fertilizantes.
“De vez em quando nós somos criticados por pura ignorância, pessoas que acham que não pode haver financiamento para outros países. Eu acho não só que pode, como é necessário que o Brasil ajude a todos os seus parceiros. E é isso que nós vamos fazer dentro das possibilidades econômicas do nosso País. O BNDES é muito grande. Durante a crise de 2008, se não fosse o BNDES e os bancos públicos, a economia brasileira teria quebrado”, acrescentou.
Para o petista, foi “graças ao financiamento de 500 bilhões de reais do BNDES” que o Brasil teria sido “o último país a entrar na crise [de 2008] e o primeiro a sair”. O petista disse ter “orgulho” de quando o BNDES tinha mais recursos para financiar do que o Banco Mundial.
No discurso, Lula destacou que tinha orgulho de quando o banco de desenvolvimento financiava obras na América do Sul e nos países africanos. “Porque é isso que os países maiores têm que fazer, tentando auxiliar os países que têm menos condição em determinado momento histórico”, afirmou.
Governo Lula vai garantir crédito ao importador argentino que comprar produto brasileiro
Por Adriana Fernandes / O ESTADÃO
BRASÍLIA - Para facilitar o comércio bilateral com a Argentina, o governo Luiz Inácio Lula da Silva vai usar o Fundo de Garantia à Exportação (FGE) para garantir linhas de créditos de bancos privados e públicos para que importadores argentinos comprem produtos brasileiros.
A medida deverá ser anunciada nesta segunda-feira, 23, pelo presidente Lula em memorando de entendimento com o governo da Argentina, o principal parceiro do Mercosul. O documento inclui a criação de um grupo de trabalho para viabilizar a criação nos próximos anos de uma moeda comum para as transações comerciais com a Argentina e posteriormente com os outros países da região.
Presidência usa melodia associada a campanha de Lula em postagem
A Secretaria de Comunicação da Presidência da República usou em um vídeo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), postado em sua conta oficial no Twitter, uma melodia que é frequentemente entoada pela militância em atos políticos e de campanha.
As notas musicais são as mesmas do grito de guerra "olê, olê, olê, olá... Lula, Lula...", que acompanha o petista desde o início de sua carreira política. Elas podem ser ouvidas ao final de um vídeo de 1 minuto de duração postado nesta quinta-feira (19), com trecho de entrevista concedida pelo presidente à GloboNews.
A Secretaria de Imprensa da Presidência afirmou ao Painel que não tem planos de se valer do mesmo recurso outras vezes. Questionada sobre o uso da referência de campanha em uma postagem oficial, a Presidência não se manifestou. FOLHA DE SP
Covid em 2023: com 18,7 milhões de doses bivalentes paradas, Brasil ainda não tem definição sobre nova fase da vacinação
Por Bernardo Yoneshigue / O GLOBO
Embora tenham chegado ao Brasil há mais de um mês, as vacinas bivalentes para a Covid-19, que ampliam a proteção contra a variante Ômicron, ainda não têm definição sobre os públicos para os quais elas serão destinadas e em que momento estarão disponíveis nos postos de saúde. Em outros países, como Estados Unidos e Chile, os imunizantes começaram a ser ofertados ainda em setembro e outubro do ano passado.
O Ministério da Saúde planeja uma ampla campanha de imunização para ter início em fevereiro, porém ainda não foi definido se as formulações adaptadas farão parte, ao menos para grupos prioritários, ou se os esforços serão direcionados somente para aumentar as coberturas vacinais com as doses originais no resto da população, que estão baixas em relação à terceira e à quarta aplicação.
Procurado, o ministério confirmou a campanha de fevereiro, porém disse que, em relação às vacinas bivalentes, “tem discutido a estratégia a ser adotada, considerando os estoques disponíveis e o cenário epidemiológico”. A pasta não respondeu se há previsão para que os imunizantes sejam ofertados, e para quem.
Ao todo, já chegaram ao Brasil 18,7 milhões de doses desde o dia 9 de dezembro. Segundo a Pfizer informou ao GLOBO, serão enviadas ainda mais 19,4 milhões de unidades até o fim de janeiro, totalizando 38 milhões. De acordo com informações do Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a Covid-19, o total seria suficiente para cobrir todos os maiores de 60 anos.
— Esses de maior risco indiscutivelmente precisam ser vacinados novamente o quanto antes, e a vacina bivalente é a preferencial. Enfrentamos agora uma nova onda e vimos que esses são os que respondem por grande parte das hospitalizações e óbitos. Até fevereiro, já temos quantidades suficientes para esses grupos prioritários, então precisamos começar o quanto antes — avalia o vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), Renato Kfouri.
Há ainda mais 10 milhões de doses bivalentes a serem entregues até junho, parte da extensão do acordo com a farmacêutica assinada pelo governo federal também em dezembro. O contrato envolve ainda 40 milhões de unidades para bebês e crianças das doses originais.
Covid-19: Brasil registra 12,7 mil casos e 91 mortes em 24 horas
O Ministério da Saúde divulgou hoje (18) novos números da pandemia da covid-19 no país. De acordo com levantamento diário feito pela pasta, o Brasil registrou, em 24 horas, 12,7 mil novos casos da doença e 91 óbitos.
Desde o início da pandemia, o país acumula 36,6 milhões de casos confirmados da covid-19 e 695,6 mil mortes registradas. O número de pacientes recuperados soma 35,6 milhões.
O estado de São Paulo tem o maior número de registros de covid-19 e de mortes em consequência da doença – 6,3 milhões de casos e 177,7 mil óbitos. Em seguida, aparecem Minas Gerais (4,1 milhões de casos e 64,7 mil óbitos); Rio Grande do Sul (2,93 milhões de casos e 41,7 mil óbitos) e Paraná (2,90 milhões de casos e 45,8 mil óbitos).
Amapá, com 2.166, Roraima, com 2.180, e Acre, com 2.041, são os estados com menor número de óbitos provocados pela doença.
Vacinação
Segundo o vacinômetro do Ministério da Saúde, 500 milhões de doses de vacinas contra a covid-19 já foram aplicadas no país, sendo 181,7 milhões da primeira dose e 164,2 milhões da segunda, além de 103,1 milhões da primeira dose adicional e 41,1 milhões do segundo reforço.
Edição: Nádia Franco / AGÊNCIA BRASIL
“É preciso colocar o rico no imposto de renda”, diz Lula
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva reafirmou hoje (18) que quer reajustar a tabela do Imposto de Renda Pessoa Física com isenção para quem ganha até R$ 5 mil, e que começará a trabalhar na reforma tributária.
“Isenção e aumento de imposto precisa de lei, não pode fazer no grito, a gente tem que construir”, disse. “É necessário muito convencimento no Congresso e organização da sociedade”, disse o presidente durante encontro com dirigentes de centrais sindicais, no Palácio do Planalto.
Ontem (17), o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que o governo quer votar a proposta de reforma tributária sobre a renda, no segundo semestre. Já a parte centrada nos impactos sobre o consumo deve ser votada no primeiro semestre.
“O pobre de hoje que ganha R$ 3 mil proporcionalmente paga mais que alguém que ganha R$ 100 mil. Quem ganha muito paga pouco porque quem ganha muito recebe como dividendo, como lucro, para pagar pouco imposto de renda”, argumentou o presidente.
A falta de correção da tabela do imposto de renda nos últimos anos vai fazer com que, em 2023, pessoas que recebem um salário mínimo e meio tenham de pagar imposto pela primeira vez. A última atualização da tabela foi feita em 2015 e o limite atual para isenção é de quase R$ 1.903,98. Com o valor do mínimo em R$ 1.302, quem ganha um salário e meio ganha R$ 1.953, acima, portanto, da faixa de isenção.
A correção da tabela do imposto de renda é um dos pontos centrais na agenda econômica do novo governo e promessa de campanha de Lula.
“Eu tenho uma briga com os economistas do PT. O pessoal fala assim ‘se fizer isenção até R$ 5 mil são 60% da arrecadação desse país’. Então vamos mudar a lógica, vamos diminuir para o pobre e aumentar para o rico”, disse Lula.
“A gente não ganha isso [correção da tabela] se não houver mobilização do povo brasileiro para mudar, uma vez na vida, a política tributária para colocar o pobre no Orçamento da União e colocar o rico no imposto de renda, para ver se a gente arrecada o suficiente para fazer política social nesse país”, completou.
Edição: Denise Griesinger / AGÊNCIA BRASIL
Planalto paga mais de R$ 216 mil para hotel em que Lula está hospedado
O Palácio do Planalto pagou R$ 216.824 para o hotel em que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e a primeira-dama, Rosângela da Silva, a Janja, estão hospedados em Brasília.
De acordo com a Secretaria de Comunicação da Presidência, o pagamento contempla hospedagem também de equipes de segurança.
O casal está no Meliá, na zona central da capital, desde o período de transição. Continuaram, contudo, após a posse, porque a primeira-dama disse que encontrou o Palácio da Alvorada deteriorado e precisando de uma reforma.
O montante pago foi publicado no Diário Oficial da União nesta quarta-feira (18), citando a inexigibilidade de licitação. A justificativa é de que há "necessidade de implantação de medidas de proteção da autoridade e familiares nas residências oficiais".
A Secom disse que, a pedido da Polícia Federal, que realiza a segurança presidencial, a hospedagem no local foi estendida, uma vez que o Alvorada não foi aberto para vistoria de segurança e das equipes do casal presidencial antes de 30 de dezembro, quando o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) deixou a residência.
Além disso, o local já estava com estrutura de segurança montada desde novembro de 2022. Em nota, o Planalto disse ainda que a hospedagem está prevista até 2 de fevereiro, quando deve se encerrar a reforma do Alvorada.
Inicialmente, a previsão do término de obras era no dia 25 de janeiro. Também havia a expectativa de que Lula e Janja poderiam se mudar à residência oficial quando ele voltasse das viagens internacionais que fará na próxima semana.
Lula fará sua primeira viagem oficial para Buenos Aires, nos dias 23 e 24, onde participará de reunião bilateral com o presidente Alberto Fernandes e de encontro da Celac (Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos). No dia 25, o petista vai para Montevidéu, de onde retornará para o Brasil.
Em café da manhã com jornalistas na semana passada, o petista criticou as condições deixadas por Bolsonaro no Alvorada. Segundo ele, foram retiradas camas, colchões e sofás, o que impediu que o novo casal presidencial se mude para o local.
Ele disse que não tem onde morar porque, além do Alvorada, o ex-ministro da Economia Paulo Guedes deixou a Granja do Torto "abandonada".
"Vocês sabem que nós estamos vivendo um momento sui generis neste país, e eu a [primeira-dama] Janja ainda não temos casa para morar", afirmou o presidente.
"Quando ele saiu em 20 de dezembro, eu e a Janja fomos lá fazer uma visita para ver se era possível a gente morar. O Torto precisa ser recuperado, parece uma coisa abandonada, apesar de o Guedes estar morando lá. Ou seja, tem coisa totalmente deteriorada", disse.
Em relação ao Alvorada, Lula disse que está "tudo desarrumado". "Não sei como é que fizeram, porque que fizeram, não sei se eram coisas particulares do casal, mas levaram tudo. Então a gente está fazendo uma reparação, porque aquilo é um patrimônio público, tem que ser cuidado", afirmou.
Governo Lula poderia corrigir a tabela do IR? Entenda as regras para alteração
Por Jessica Brasil Skroch / O ESTADÃO
No início deste ano, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, sinalizou que a correção da faixa de isenção da tabela do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) só entrará em vigor no ano que vem, pois, segundo ele, é necessário seguir o princípio da anterioridade que rege a tributação do IR. Especialistas apontam, no entanto, que o reajuste poderia ser imediato. O problema da decisão, na verdade, é o seu impacto no Orçamento, devido à diminuição de arrecadação.
Pelo princípio da anterioridade, citado por Haddad, uma medida de aumento das alíquotas do IR só pode entrar em valor no ano seguinte. Para diminuir a carga tributária para o contribuinte, como seria o caso de reajuste da tabela, o princípio não se aplica, segundo especialistas ouvidos pelo Estadão.
“A anterioridade existe para não surpreender o contribuinte de forma negativa. Por isso, há tributos que não podem sofrer aumento de forma imediata, apenas em 90 dias ou no ano seguinte, como o Imposto de Renda”, afirma Mauro Silva, presidente da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Unafisco). Dessa forma, seria possível fazer um reajuste da tabela do IR por projeto de lei, em que seria preciso esperar a aprovação, ou por medida provisória, de forma imediata.
Defasagem
A correção integral da tabela do imposto de renda é um debate antigo: a última vez que foi reajustada de forma devida, de acordo com a inflação, foi em 1995. Em 2015, no governo Dilma, houve ampliação da faixa de isenção, que passou de até R$ 1,787,77 para até R$ 1.903,98 - o mesmo teto que é aplicado hoje. Na época, o salário mínimo era R$ 788, o que significa que as pessoas que ganhavam até 2,4 vezes o salário mínimo estavam isentas. Atualmente, aqueles que ganham a partir de 1,5 salário mínimo já precisam arcar com o tributo.
A defasagem acumulada da tabela desde 1996 é de 134,53% para o ano-calendário deste ano, aponta levantamento da Unafisco. Para 2024, a diferença é ainda maior, de 148,1%. Mais de 18 milhões de brasileiros ficariam isentos da cobrança do imposto de renda na declaração deste ano se a tabela fosse corrigida totalmente pela inflação, segundo dados da associação.
O imposto de renda deve respeitar a capacidade contributiva, de acordo com a Constituição. Por isso, Silva acredita que o reajuste não deveria ser tomado como uma renúncia fiscal, mas como cumprimento da Constituição. Para Rodrigo Helfstein, pesquisador do Núcleo de Estudos Fiscais da Fundação Getúlio Vargas, a defasagem também está relacionada com o valor do salário mínimo, que não reflete os efeitos da inflação ao longo dos anos.
Arrecadação
O problema do reajuste parece não estar relacionado ao princípio da anterioridade, mas de espaço no Orçamento, diz Luiz Eguchi, diretor de Tax da Mazars Brasil, empresa especializada em auditoria, impostos e consultoria. Para as declarações deste ano, a arrecadação prevista é de R$ 328,56 bilhões. Caso a tabela fosse corrigida integralmente pela inflação, o governo deixaria de arrecadar R$ 184,29 bilhões.
Dessa maneira, um reajuste integral da tabela poderia inviabilizar as metas fiscais e as execuções previstas no Orçamento, afirma Helfstein. “Caso houvesse a correção, teria que compensar a perda de arrecadação de alguma forma para seguir com o plano orçamentário. Não conseguiríamos cobrir o déficit e as metas fiscais”, explica o pesquisador.
Helfstein e Eguchi sugerem que o assunto seja discutido em uma reforma tributária mais ampla, e não de forma isolada. Nesse momento, o pesquisador da FGV considera que um reajuste integral da tabela traria desequilíbrio das contas. De forma mais imediata, o pesquisador propõe um meio termo, com a utilização de um índice inflacionário mais recente, como do ano passado ou dos dois últimos anos, aliado a um reajuste do salário mínimo mais compatível com a inflação.
Silva também concorda que o mínimo seria ajustar a tabela com a inflação do ano passado. Para ele, uma das alternativas para compensação seria a volta da tributação da distribuição de lucros e dividendos, em regras mais rígidas que impeçam a pejotização, ou seja, dificultem que gerentes e diretores com altos salários abram micro empresas para ganharem seus pagamentos. Além disso, ele indica rever as isenções para investimentos internacionais, sem que o Brasil perca a competitividade.
Eguchi avalia que o governo parece estar com as mãos atadas. “Em termos legais, o reajuste é possível, mas tem a trava do orçamento, que não tem a ver em si com a parte tributária”, afirma.
Alternativas
Helfstein e Eguchi sugerem que o assunto seja discutido em uma reforma tributária mais ampla, e não de forma isolada. Nesse momento, o pesquisador da FGV considera que um reajuste integral da tabela traria desequilíbrio das contas. De forma mais imediata, o pesquisador propõe um meio termo, com a utilização de um índice inflacionário mais recente, como do ano passado ou dos dois últimos anos, aliado a um reajuste do salário mínimo mais compatível com a inflação.
Silva também concorda que o mínimo seria ajustar a tabela com a inflação do ano passado. Para ele, uma das alternativas para compensação seria a volta da tributação da distribuição de lucros e dividendos, em regras mais rígidas que impeçam a pejotização, ou seja, dificultem que gerentes e diretores com altos salários abram micro empresas para ganharem seus pagamentos. Além disso, ele indica rever as isenções para investimentos internacionais, sem que o Brasil perca a competitividade.
Reajuste do piso do magistério terá impacto de R$ 1,2 bi para prefeituras do Ceará e gera impasse
, / DIARIONORDESTE
Publicado no Diário Oficial da União (DOU) na última terça-feira (17) pelo ministro da Educação Camilo Santana (PT), o reajuste de 14,95% para o magistério tem colocado de um lado o Governo Federal e os profissionais da educação e de outro os gestores municipais. O cerne do impasse está no impacto financeiro do aumento salarial da categoria, que pode custar R$ 19,4 bilhões aos cofres municipais no Brasil.
Só no Ceará, esse reajuste deve representar um aumento de despesas para as prefeituras de R$ 1,2 bilhão. Cidades como Fortaleza, Caucaia, Sobral e Itapipoca serão as mais afetadas, caso o aumento seja concedido pelos prefeitos. A estimativa foi divulgada nesta terça-feira (17) pela Confederação Nacional de Municípios (CNM).
O presidente da entidade, Paulo Ziulkoski, teceu duras críticas à decisão do Ministério da Educação de anunciar o reajuste e cobrou mais diálogo entre a pasta federal e os gestores municipais. A determinação do reajuste foi feita por meio da portaria 17/2023, do Ministério da Educação (MEC), indicando um aumento de rendimento dos profissionais de R$ 3,8 mil para R$ 4,4 mil.
"A valorização dos nossos profissionais da educação é fator determinante para o crescimento do nosso país", comentou Camilo Santana ao anunciar o aumento. O piso é a base do vencimento inicial das carreiras do magistério público da educação básica para a formação em nível médio, na modalidade normal, com jornada de 40 horas semanais.
Historicamente, a atualização no valor é aplicada automaticamente no dia 1º de janeiro de cada ano e é relacionado ao crescimento do valor anual mínimo por aluno referente aos anos iniciais do ensino fundamental urbano, definido nacionalmente pelo Fundeb.
IMPACTO NAS CONTAS PÚBLICAS
Conforme os dados divulgados pela CNM, 36 cidades cearenses terão um aumento de despesas superior a R$ 10 milhões por conta do reajuste do salário da categoria. “Os municípios vão se tornar ingovernáveis", reclamou o presidente da entidade.
Ziulkoski afirmou ainda que o aumento do salário dos profissionais da educação em 14,95% é “inconstitucional” e “irresponsável”.
“Há um vácuo jurídico na correção do piso que não pode ser suprimido por uma portaria. O prefeito que conceder esse aumento com base na portaria estará cometendo improbidade administrativa, porque ela não tem base em lei”PAULO ZIULKOSKIPresidente da CNM
A crítica da Confederação de Municípios gira em torno de um suposto "vácuo jurídico”, porque o reajuste do piso se baseia em critérios que remetem à Lei 11.494/2007, do antigo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb). Atualmente, está em vigor a Lei 14.113/2020, de regulamentação do novo Fundeb.
Segundo ele, a diretriz de reajuste adotada pelo Ministério da Educação do Governo Lula foi a mesma adotada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), ambas fazem referência à legislação do antigo Fundeb. “Eles editaram uma portaria infralegal, que não é baseada em lei (...) O critério de reajuste do piso não tem eficácia legal e persistem inseguranças devido ao vácuo jurídico”, acrescentou.
LEI DO PISO
A CNM argumenta ainda que a Lei 11.738, de 16 de julho de 2008, que instituiu o piso salarial profissional nacional para os profissionais do magistério público da educação básica, tornou-se “desatualizada” em decorrência das alterações promovidas pela legislação do novo Fundeb.
R$ 1.230.812.619,33é o valor do impacto nas prefeituras do Ceará, segundo a CNM
“Esse critério de reajuste do piso tem causado controvérsia. O entendimento é de que o critério perdeu a eficácia legal com a entrada em vigor do novo Fundeb, sendo necessária sua regulamentação por lei específica”, aponta a entidade.
Com base nesses argumentos, o presidente da CNM, Paulo Ziulkoski, orientou, nesta terça-feira (17), que os prefeitos que não concedam o reajuste de aproximadamente 15%. “Estamos recomendando que os municípios não adotem esse critério, o município é soberano e que não, pode com base nessa portaria, ser concedido esse aumento”, disse.
BASE DO REAJUSTE
O MEC rebate o argumento de que a legislação que institui o piso está “desatualizada”. A pasta, inclusive, toma como base para o reajuste justamente a Lei nº 11.738 de 2008, regulamentando uma disposição já prevista na Constituição Federal e na Lei de Diretrizes e Base da Educação (LDB).
O MEC ainda reafirmou que o aumento é calculado com base na comparação do valor aluno-ano do Fundeb dos dois últimos anos.
PACTUAÇÃO
Ao recomendar que os gestores descumpram a portaria do MEC, Paulo Ziulkoski ainda cobrou diálogo e pactuação da educação do País.
R$ 19.442.920.477,51é o valor do impacto nas prefeituras do Brasil, segundo a CNM
“Destaca-se que o piso do magistério não impacta as contas do governo federal, pois quem paga são Estados e Municípios. Já quando se trata de medidas que impactam as finanças da União, como o salário mínimo e o valor per capita do Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae), há indefinição sobre o reajuste”, criticou em nota a entidade.
“Se houvesse um diálogo mínimo, desde o período de transição, tudo isso poderia ter sido evitado. Mas há pessoas no governo, desde a gestão anterior, que não têm simpatia por nós (...) Agora, estamos abertos ao diálogo, temos boa relação, estamos aguardando. Se o Governo achar o subsídio, temos tranquilidade para negociar”, acrescentou Ziulkoski.
REAÇÃO DO MAGISTÉRIO
Principal parte interessada no reajuste, os profissionais do magistério reagiram ao posicionamento do presidente da CNM.
“Ao invés de buscarem mais recursos, tentam inibir a aplicação do piso alegando falta de recursos. A recomposição do piso é necessária e as prefeituras precisam ajustar os orçamentos para garantir a prioridade para a educação”, defendeu Anízio Melo, presidente do Sindicato dos Servidores Públicos da Educação do Ceará (Apeoc).
“Faremos tudo para que o piso seja cumprido, não podemos deixar essa alegação dos prefeitos, através de sua organização de classe, atravessar um processo histórico de valorização da categoria”ANÍZIO MELOPresidente do Sindicato Apeoc
Questionado sobre o apontamento de ilegalidade feito pela CNM, Anízio rebateu. “A lei existe, que os prefeitos se organizem com os maus deputados e mudem a legislação, se quiserem, tem que ter a coragem de tentar anular, porque a lei já existe”, criticou.
SILÊNCIO DOS GESTORES CEARENSES
Sobre os impactos do reajuste e a recomendação da CNM, o presidente da Associação dos Municípios do Estado do Ceará (Aprece), Júnior Castro, e o vice-presidente, José Helder, prefeitos de Chorozinho e Várzea Alegre, foram procurados pela reportagem, mas não responderam.
A assessoria de imprensa da entidade recomendou buscar a União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime) Ceará. A presidente Luiza Aurélia Teixeira, dirigente Municipal de Educação de Crateús, trocou mensagens com a reportagem, mas parou de responder ao ser informada sobre o assunto. O vice-presidente da Undime Ceará, José Marques Aurélio, da Educação de Jucás, não foi localizado.
O MEC também foi contactado, mas não respondeu.