Ministério da Saúde entrega menos de 10% das vacinas da Covid prometidas para 2024
Mateus Vargas / FOLHA DE SP
O Ministério da Saúde do governo Lula (PT) entregou menos de 10% das vacinas atualizadas contra a Covid-19 prometidas para 2024.
Com poucas doses, a campanha tem ritmo lento e público-alvo limitado. A pasta informou na sexta-feira (5) que repassou 5,7 milhões de vacinas da nova geração desde o começo de maio.
O volume é parte dos 12,5 milhões de imunizantes da Moderna, adaptados para a variante XBB, comprados com atraso pela pasta. O plano é distribuir 70 milhões de doses até o fim do ano, mas o edital para a compra complementar nem sequer foi lançado pelo ministério.
Em nota, a Saúde afirma que o "novo processo de aquisição" está em "fase interna". Ainda declara que irá lançar a disputa depois desta etapa.
A pasta não apontou prazo para finalizar a compra e entregar as novas doses. O ministério também não confirma quantas unidades do modelo atualizado já foram aplicadas.
Segundo a pasta comanda por Nísia Trindade, os dados "estarão disponíveis na RNDS (Rede Nacional de Dados) após ajuste de questões técnicas".
O número de imunizantes da Moderna entregues também estão fora dos painéis públicos do site do Ministério da Saúde.
A diretora da SBIm (Sociedade Brasileira de Imunizações), Isabella Ballalai, afirma que uma campanha com restrições de doses pode aumentar a hesitação vacinal, ou seja, quando pessoas relutam ou se recusam a tomar a vacina.
"Não é só uma questão de desinformação, fake news, etc. O maior fator [da hesitação] é a falta de informação. A gente também sabe como o acesso às doses é importante. Inclusive o ministério está indo às escolas para melhorar o acesso de adolescentes", diz Ballalai.
A médica afirma que a população deixou de perceber o perigo da doença, ainda que a Covid sido a causa de cerca de 3,9 mil mortes no Brasil em 2024.
"Há um surto de Covid no hemisfério Norte. Normalmente, na sequência tem o nosso surto. É preciso ter uma comunicação mais assertiva sobre a doença, não pode ser só quando chega a vacina. A gente tem que falar mais da Covid no país", declara a diretora da SBIm.
A conduta negacionista de Jair Bolsonaro (PL) na pandemia e o desdém do ex-presidente pelas vacinas foram fortemente explorados por Lula na campanha eleitoral de 2024.
O atraso na compra dos imunizantes, porém, atraiu críticas a Lula feitas por integrantes da comunidade científica e profissionais de saúde.
Em abril, o site "Qual Máscara?", que reúne informações sobre o combate ao novo coronavírus, publicou uma nota cobrando novas doses, no momento em que ainda se arrastava a primeira compra feita com a Moderna.
O ministério afirma que planejava uma compra de vacinas da Covid desde meados de 2023, mas aguardou novas versões surgirem no mercado. A Saúde abriu um processo de compra emergencial das 12,5 milhões de doses após o aval dado pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), em dezembro, à vacina da Pfizer adaptada à variante XBB.
Em fevereiro, a secretária de Vigilância em Saúde, Ethel Maciel, havia dito no X, antigo Twitter, que o imunizante adaptado à variante XBB chegaria ao Brasil no mês seguinte. A ministra Nísia Trindade prometeu começar a vacinar grupos prioritários em abril.
Com o atraso, as doses começaram a ser entregues em maio.
"As 70 milhões de doses prevista, em 2024, buscam atender a população alvo, com base nos dados do IBGE [Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística]", disse a Saúde.
Em nota, o conselho que representa secretários estaduais, Conass, afirmou que é "importante a manutenção da aquisição e distribuição de doses dos imunizantes contra a Covid-19, conforme planejado para o ano de 2024".
A entidade disse que a baixa adesão preocupa, "sendo essencial que o Ministério da Saúde intensifique as ações de comunicação, de forma articulada e integrada com estados e municípios".
O conselho dos secretários municipais, Conasems, disse apenas que segue orientações do ministério.
O governo ainda demonstra dificuldades logísticas para montar a campanha de imunização da Covid.
Como a Folha mostrou, a Saúde incinerou em 2024 cerca de 6,4 milhões de doses de vacinas contra a doença que perderam a validade. Os imunizantes descartados foram fabricados pela Janssen e usam a tecnologia de vetor viral. Esse tipo de vacina perdeu força no SUS (Sistema Único de Saúde) desde o fim de 2022, quando a Saúde passou a priorizar os imunizantes de RNA mensageiro, como da Pfizer e Moderna.
A atual gestão considera que herdou de Bolsonaro um estoque desorganizado e repleto de produtos com validade curta ou já vencidos.
A Saúde já havia perdido cerca de R$ 2 bilhões em vacinas da Covid, de diversos fabricantes, até o começo de 2023. Estes imunizantes perderam validade principalmente entre o fim de 2022 e o começo de 2023.
Relatório da ONU sobre fome no Brasil vira divisor de águas para discurso social de Lula
Por Eduardo Gayer / O ESTADÃO DE SP
O relatório “Estado da Segurança Alimentar e Nutrição no Mundo”, produzido pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO, da sigla em inglês), será um divisor de águas para o discurso social do governo federal. Com divulgação prevista para 24 de julho, o texto vai dizer, desde já, se o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) terá a chance de anunciar, no ano da sua provável tentativa à reeleição, em 2026, que tirou o Brasil do Mapa da Fome.
Para sair do Mapa da Fome, um país precisa registrar taxa de falta crônica de alimentos inferior a 2,5% da população, por três anos seguidos, no relatório da FAO. O número é divulgado todo mês de julho com dados referentes ao ano anterior. É por isso que, para anunciar a possível conquista em 2026, Lula precisa do indicador abaixo de 2,5% já em 2024, e ainda terá repetir o feito nos dois anos seguintes.
No ano passado, a insegurança alimentar no Brasil bateu 4,2%, com dados referentes ao último ano do governo Jair Bolsonaro. Para reverter a tendência de alta, Lula lançou o Plano Brasil Sem Fome, que reúne programas como o Bolsa Família e a busca ativa por cidadãos em situação permanente de desnutrição. Oficialmente, o prazo estabelecido é tirar o Brasil do Mapa da Fome até 2030, mas o presidente quer alcançar a meta ainda neste mandato.
“Todos os estudos e pesquisas divulgados apontam grande redução da insegurança alimentar no Brasil. Confio que voltamos à boa notícia da tendência de queda da insegurança alimentar. Mas o resultado, só quando a FAO divulgar”, afirmou à Coluna do Estadão o ministro do Desenvolvimento Social, Wellington Dias, em tom de otimismo para os dados referentes ao primeiro ano de governo Lula.
O Brasil saiu do Mapa da Fome em 2014, durante o governo Dilma Rousseff, mas retrocedeu a ele em 2018.
O relatório da ONU será divulgado no dia 24 de julho, durante agenda do G20 no Brasil, no Rio de Janeiro, na presença do diretor-geral da FAO,Qu Dongyu, e o economista-chefe, Maximo Torero.
Mudança em pisos não resolve problemas do Orçamento e aumenta poder de emendas na Saúde
Por Daniel Weterman / o estadão desp
BRASÍLIA – A mudança nos pisos mínimos de gastos com Saúde e Educação, hoje vinculados à arrecadação do governo, não é suficiente para resolver os problemas do Orçamento público e bancar os recursos necessários em outras áreas nos próximos anos, de acordo com números do Tesouro Nacional. A principal causa é o crescimento das despesas obrigatórias, como salários, aposentadorias e benefícios assistenciais, que continuam pressionando o arcabouço fiscal.
Além disso, especialistas consultados pelo Estadão apontam que uma diminuição do piso da Saúde aumentaria a participação das emendas parlamentares no orçamento do setor, elevando ainda mais o poder das indicações políticas nos recursos e causando uma distorção no financiamento dos serviços públicos entre as regiões do Brasil (leia mais abaixo).
Em março, o Tesouro divulgou um relatório mostrando que uma mudança nos pisos de Saúde e Educação poderia tirar até R$ 133 bilhões dessas duas áreas em 2033, abrindo espaço para outros gastos. Em resposta a um requerimento de informação da liderança do PSOL na Câmara, ao qual o Estadão teve acesso, o órgão divulgou os cálculos que levaram a essa projeção.
Os números mostram que, mesmo com o espaço aberto, faltaria dinheiro para bancar o custeio da máquina pública e os investimentos federais nas outras áreas (fora Saúde e Educação) a partir de 2029. A falta de dinheiro é verificada na aplicação das três regras diferentes estudadas pela equipe econômica para a evolução dos pisos: limite de despesas do arcabouço, de no máximo 2,5% acima da inflação; crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) per capita; e crescimento populacional.
Atualmente, os gastos mínimos com Saúde e Educação são calculados de acordo com a arrecadação de impostos federais (15% da Receita Corrente Líquida para a Saúde e 18% da Receita Líquida de Impostos para a Educação) e crescem mais que os limites do arcabouço fiscal, de 2,5% acima da inflação, pressionado a nova âncora das contas públicas. Conforme o Estadão mostrou, os pisos vão deixar outras áreas sem recursos até 2028, incluindo habitação, Auxílio Gás, Defesa Civil e custeio dos órgãos federais.
Em resposta à reportagem, o Tesouro Nacional afirmou que a simulação foi realizada com parâmetros macroeconômicos de janeiro deste ano e que não refletem necessariamente as escolhas políticas nem as bases fixadas no Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) de 2025, encaminhado em abril. Além disso, a destinação final das despesas supera a alçada do governo, pois depende também das emendas parlamentares, disse o órgão.
Se nada for feito, as outras despesas discricionárias (não obrigatórias) ficariam com R$ 41,8 bilhões em 2029. Em 2030, o resultado seria negativo e faltariam R$ 14,8 bilhões. O recurso necessário para manter a máquina federal funcionando e não entrar em colapso é calculado em no mínimo R$ 76,9 bilhões para as demais despesas não obrigatórias (tirando Saúde e Educação), de acordo com regra fixada no novo arcabouço fiscal.
Se os pisos forem corrigidos conforme o mesmo limite de despesa do arcabouço, de até 2,5% de crescimento real, as outras despesas discricionárias teriam um espaço maior, de R$ 52,4 bilhões em 2019 e R$ 11,2 bilhões em 2030, ainda abaixo do necessário. Ou seja: mesmo com a mudança, faltaria dinheiro para pagar as despesas com conta de luz dos órgãos federais, sem falar de investimentos em rodovias e Defesa Civil, por exemplo. No cenário mais drástico, que é corrigir os pisos conforme o crescimento populacional, faltariam recursos suficientes para cobrir as outras despesas a partir de 2030.
Segundo o pesquisador Camillo Bassi, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), o principal problema da rigidez orçamentária que pressiona as contas públicas é o alto volume de gastos obrigatórios. Hoje, eles superam 90% do Orçamento. Mesmo que os pisos fossem mexidos, explica ele, os compromissos obrigatórios do governo federal com Saúde e Educação continuariam existindo. Por isso, nem mesmo uma flexibilização pela Desvinculação de Receitas da União (DRU) resolveria o problema.
“No caso da complementação da União do Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica), por exemplo, é impossível atrelar os gastos a um indicador diferente, como o teto do arcabouço ou a inflação. Independentemente do indicador, essa é uma despesa blindada de regramento em termos de crescimento porque é um gasto exógeno”, diz o especialista. Até 2026, a União terá de contribuir com uma complementação equivalente a 23% do Fundeb para Estados e municípios.
O Ministério do Planejamento e Orçamento afirmou à reportagem que “a dinâmica prevista para o conjunto de despesas da União é desafiadora”. A pasta ressaltou que novas medidas de revisão de gastos serão anunciadas em momento oportuno e que o Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) de 2025 está em elaboração e será devidamente detalhado até 31 de agosto.
Emendas tomariam conta do orçamento da Saúde se piso fosse revisto
Atualmente, as emendas parlamentares consomem 40% das despesas não obrigatórias das ações e serviços públicos de saúde, como custeio de postos de saúde, hospitais, exames e cirurgias. Uma mudança no piso constitucional da Saúde faria que com as emendas ocupassem mais da metade desse orçamento, de acordo com especialistas consultados pelo Estadão.
As emendas individuais, aquelas indicadas por cada deputado e senador, são atreladas à receita e metade deve ir obrigatoriamente para a Saúde. Mexer no piso diminuiria o orçamento total da área, mas não as emendas, fazendo com que a participação dessas indicações aumentassem. Além disso, cada vez mais outros tipos de recursos carimbados pelo Congresso capturam uma parcela maior do dinheiro do setor, como foi o caso do orçamento secreto e agora das emendas de comissão.
“Sem o piso, as emendas parlamentares vão ocupar todo o gasto discricionário do ministério e implodir o planejamento sanitário”, diz Élida Graziane Pinto, procuradora do Ministério Público de Contas do Estado de São Paulo e professora da Fundação Getúlio Vargas (FGV). “Gastar melhor em Saúde e Educação passa pela efetiva aderência dos seus recursos vinculados aos respectivos planos setoriais.”
Estudo do Ipea publicado na semana passada mostra que, entre 2014 e 2022, a participação das emendas aumentou de 3,2% para 9,8% no orçamento do Ministério da Saúde, incluindo todos os gastos obrigatórios e não obrigatórios, e trouxeram problemas para o financiamento do setor — pois não se pautam nas regiões que mais precisam dos recursos, mas nas escolhas livres dos congressistas por critérios políticos.
Segundo o texto, o governo deve perder cada vez mais o poder de estimular as políticas prioritárias diante do aumento do espaço das emendas parlamentares no Orçamento federal da área. O dinheiro alocado pelos parlamentares acaba priorizando municípios pequenos, sem condições de gastar o dinheiro e atender a população e a atenção básica, sem dar conta das necessidades envolvendo alta e média complexidade.
“Hoje, existem localidades que recebem muitos recursos em detrimento de outras. Com o cobertor curto, isso acaba gerando mais desigualdade no sistema”, afirma Fabiola Sulpino Vieira, especialista em políticas públicas e gestão governamental do Ipea e uma das autoras do estudo.
“Ao enviar um volume grande de recursos para município pequeno, esse município tem atenção primária. Dinheiro de emenda não pode ser usado para pagar despesa de pessoal e o principal item de despesa na atenção primária é pessoal — são médicos, enfermeiros e agentes de saúde. Esse recurso vai ser usado para quê?”, questiona.
Padilha diz que Tarcísio precisa explicar ausência em eventos oficiais com Lula
Ana Gabriela Oliveira Lima / FOLHA DE SP
O ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, disse em entrevista nesta sexta-feira (5) em Osasco que o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) precisa se explicar sobre por que não tem participado de atos com o presidente Lula.
Segundo ele, o presidente segue convidando prefeitos e governadores durante atos que tem feito pelo país, independentemente do partido, mas que foi Tarcísio quem mudou de postura e tem decidido não comparecer aos eventos.
O presidente Lula fechou nesta sexta-feira (5) o ciclo de viagens oficiais pelo país que contaram com a participação de pré-candidatos nas eleições 2024 aliados ao petista. A partir deste sábado (6), candidatos não podem comparecer a inaugurações de obras públicas, segundo a legislação eleitoral.
Pela manhã, o presidente participou de inauguração de um novo edifício no campus em Osasco da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo). No período da tarde, visitou obras do CEU (Centro Educacional Unificado) em Diadema.
Em Osasco, o pré-candidato pelo PT é o deputado estadual Emidio de Souza. Diadema é considerada reduto petista. Nela, José de Fillipi Jr., prefeito pelo partido, é pré-candidato a tentar a reeleição.
No mesmo dia, o deputado federal Guilherme Boulos (PSOL), aposta do PT para as eleições da capital paulista, participou de uma agenda promovida pelo governo federal sobre o projeto Cozinha Solidária com os ministros Wellington Dias (Desenvolvimento Social) e Márcio Macêdo (Secretaria-Geral da Presidência da República).
O primeiro semestre deste ano foi de agenda intensa de viagens pelo Brasil, incluindo cidades consideradas estratégicas no mapa eleitoral do PT e do governo. O Palácio do Planalto nega caráter eleitoral nas viagens e argumenta que as agendas ocorrem em todo o Brasil.
O presidente tem aparecido publicamente com aliados em eventos de diferentes cidades pelo país. Na terça-feira (2), ele esteve na Bahia, onde participou de cortejo do 2 de Julho com o governador, Jerônimo Rodrigues (PT), Geraldo Júnior (MDB), vice-governador e pré-candidato a prefeito de Salvador, e Fabya Reis (PT), candidata a vice.
No sábado (29), Lula esteve em São Paulo anunciando, ao lado de Boulos, a inauguração de campi de instituições federais e a expansão do metrô.
Na ocasião, o presidente reclamou da ausência do prefeito Ricardo Nunes (MDB) e de Tarcísio. O governador participava de viagem internacional, e Nunes disse à imprensa que não iria ao evento porque o ato era político, não de governo.
Lula também afirmou que não citaria Boulos durante o evento, apesar de estar ao lado do deputado, após ter sido condenado por campanha antecipada no 1º de Maio.
Na quinta-feira (4), em cerimônia de entrega de ambulâncias do Samu em Salto (SP), Lula voltou a questionar a ausência de Tarcísio em eventos no estado. "É uma pena, porque o governador podia vir com a gente, mas ele não vem em nenhum lugar que eu convido", disse.
Nesta sexta, Tarcísio participa de eventos de inauguração de ambulatório em Osvaldo Cruz pela manhã. De tarde, a programação prevê entrega de moradias em Macedônia e em Cardoso.
Ao mesmo tempo em que tem promovido encontros públicos com aliados, Lula decidiu não ir a evento em Santa Catarina na véspera de encontro de Jair Bolsonaro (PL) e o presidente da Argentina, Javier Milei, no estado.
Bolsonaro e Milei participam neste fim de semana de conferência conservadora em Balneário Camboriú, enquanto viagem de Lula ao estado nesta semana chegou a ser divulgada pela mídia local.
A avaliação do Palácio do Planalto é que havia risco de desgaste político e hostilidade contra o presidente, considerando a força local do bolsonarismo e a realização do evento da direita. Já a Secom (Secretaria de Comunicação Social da Presidência) afirmou que a viagem nunca esteve na programação.
Em junho, o presidente admitiu se candidatar à reeleição para derrotar o que chamou de "trogloditas".
"Se for necessário ser candidato para evitar que os trogloditas que governaram esse governo voltem, eu serei candidato", afirmou à rádio CBN.
O ex-presidente Jair Bolsonaro está inelegível, mas tem dito a pessoas próximas que aposta em recursos no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) para reaver o direito de se candidatar.
Nesta quinta-feira (4), ele foi indiciado pela Polícia Federal em caso envolvendo investigação sobre venda de joias. O ex-presidente, que é suspeito de associação criminosa, peculato e lavagem de dinheiro, também é investigado por outros crimes, como adulteração de cartão de vacina e tentativa de golpe.
Lula inaugura câmpus da Unifesp em Osasco, promessa feita por ele em 2008
Por Isabela Moya, Altamiro Silva Junior (Broadcast) e Francisco Carlos de Assis (Broadcast) / O ESTADÃO DE SP
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) inaugurou nesta sexta-feira, 5, o novo câmpus da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) em Osasco, na região metropolitana de São Paulo. A construção dessa unidade havia sido prometida pelo próprio petista em 2008, mas só agora as obras principais estão concluídas.
Os cursos do câmpus de Osasco começaram a funcionar em 2011, em um prédio cedido pela prefeitura da cidade. Agora ficaram prontos os edifícios acadêmico e administrativo da Escola Paulista de Política, Economia e Negócios (Eppen) do novo câmpus, em Quitaúna, mas ainda falta a conclusão da biblioteca.
A pedra fundamental dessa unidade foi colocada por Lula no terreno em 2008, quando ganhava força um programa de expansão da rede federal de ensino superior, o Reuni. No seu segundo mandato, as unidades federais cresceram e se interiorizam.
Essa ampliação, no entanto, sofreu críticas, incluindo de parte dos professores e alunos, pelas restrições de estrutura e por atrasos em obras. A Unifesp foi uma das instituições que se expandiram, com a criação de unidades em mais cidades, como Guarulhos, Diadema e Baixada Santista.
O contrato para o câmpus Quitaúna foi assinado apenas em 2016, com prazo previsto para a construção do prédio de 18 meses. As obras, porém, duraram 8 anos.
No total, o projeto custou R$ 102 milhões. O espaço atenderá 1,4 mil alunos, com salas de aulas, auditórios, restaurante universitário, laboratórios, entre outras estruturas acadêmicas e estudantis. A biblioteca, cuja construção começou em 2022, deve ficar pronta só no ano que vem.
Na cerimônia de inauguração, o presidente foi cobrado por uma aluna do 3º ano de Direito, Jamile Fernandes,. “A obra não está concluída. O que está sendo inaugurada hoje é apenas metade da obra. Faltam moradias estudantis, restaurante e auditórios”, reclamou.
Em sua breve fala no evento, o ex-ministro da Educação e atual titular da Fazenda, Fernando Haddad, rebateu a cobrança da universitária, alegando que a construção de universidades não tem fim.
“A USP (Universidade de São Paulo) até hoje está sendo construída, prédios estão sendo construídos e professores sendo contratados”, disse Haddad se dirigindo à aluna.
Nas redes sociais, Lula criticou os governantes que o sucederam e atribuiu a demora das obras a “irresponsabilidades” e “falta de vontade”. Entre os presidentes desse período, está sua aliada, Dilma Rousseff (PT).
Em nota, a Unifesp informou que nos anos seguintes a 2016 “houve aporte de recursos pontuais sobretudo de emenda de bancada e emendas individuais, o que possibilitou que a obra não parasse, mesmo no período de pandemia”.
Em 2023, conforme a instituição, o Ministério da Educação (MEC) anunciou o recurso de R$ 18 milhões para a obra, “o que possibilitou a finalização dos edifícios acadêmico e administrativo do campus Osasco da Unifesp”.
Procurado pela reportagem, o MEC não comentou,
Seis cursos serão ministrados no campus:
Em ano eleitoral, Lula vive cenário hostil nos estados com ausência de governadores
Por Caio Sartori / O GLOBO
Depois de um primeiro ano de governo marcado pela presença de governadores de oposição em agendas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nos estados, o petista tem enfrentado cenário mais hostil nos últimos meses, às vésperas das eleições municipais. Ao mesmo tempo em que cancela eventos em redutos do bolsonarismo, Lula vê chefes de Executivos nos maiores colégios eleitorais do país se ausentarem de eventos públicos — nos quais, quando comparecem, costumam ser vaiados pela militância do presidente.
Nos últimos dias, Lula participou de inaugurações nos três maiores estados — São Paulo, Minas Gerais e Rio —, mas não teve a companhia de governadores em nenhum deles. No caso paulista, nem mesmo o prefeito da capital, Ricardo Nunes (MDB), prestigiou a solenidade, o que motivou críticas do presidente a ele e ao governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), potencial adversário do petista na disputa presidencial de 2026.
Em Minas, Romeu Zema (Novo) enviou o vice, Professor Mateus Simões (Novo), que foi vaiado. O presidente saiu em defesa do alvo da militância, classificado por ele como um “convidado” que “merece respeito”. O mesmo ocorreu na ida ao Recife, na terça-feira, quando a governadora Raquel Lyra (PSDB) também foi vaiada, mesmo ao lado do presidente no palanque.
Quem costumava comparecer às visitas do presidente no Rio, mas não esteve no último fim de semana, foi o governador Cláudio Castro (PL), também vaiado mais de uma vez por apoiadores do PT ao acompanhar Lula em solo fluminense.
Entre aliados do presidente, existe a leitura de que as eleições de outubro exercem papel crucial nessa mudança de postura de governadores e prefeitos. Com o bolsonarismo estridente das redes sociais, eles não querem ter que responder aos apoiadores por que motivo estão posando lado a lado com Lula. Além das municipais, a proximidade da disputa presidencial de 2026 ajuda a pintar um ambiente menos propício às aparições — sobretudo no caso de Tarcísio, já atento à necessidade de se posicionar como opositor.
O caso citado como exemplar dessa mudança de postura é mesmo o de São Paulo, cidade em que Lula pretende ser atuante na tentativa de eleger Guilherme Boulos (PSOL), principal adversário de Nunes na disputa deste ano. Apoiado por Tarcísio e pelo PL do ex-presidente Jair Bolsonaro, o atual prefeito não tem interesse em aparecer ao lado de Lula neste momento, e Boulos, hoje deputado federal, esteve nas entregas feitas pelo presidente no fim de semana passado, o que aumentaria o “climão”.
Assinatura em SP
Durante o anúncio de um acordo de expansão do metrô, o presidente comentou que adiaria a assinatura da medida por causa da ausência de Tarcísio e Nunes. Na segunda-feira, o governador ironizou. Ao publicar uma foto em que aparece almoçando hambúrguer, o chefe do Palácio dos Bandeirantes escreveu que estava “com a tranquilidade de quem sabe que o aditivo do contrato que vai levar a Linha 5 do Metrô até o Jardim Ângela já está assinado”.
Em fevereiro, o roteiro foi diferente: Tarcísio participou de evento com Lula e caiu na gargalhada ao ouvir gritos de “volta para o PT”, referência ao período em que trabalhou no governo Dilma Rousseff.
No Rio, há descompasso entre o grau de envolvimento de Castro e do prefeito Eduardo Paes (PSD) nas aparições de Lula. Paes desponta como o principal chefe de Executivo do Sul e do Sudeste, nas esferas municipal e estadual, a abrir palanque para o presidente. Nas agendas do petista na cidade este ano, o prefeito prestigiou quase todas — muitas delas eram entregas da própria prefeitura com algum auxílio federal.
Castro, por sua vez, tem como candidato na eleição carioca o deputado federal Alexandre Ramagem (PL). Mesmo após vaias, ele não deixou de estar ao lado do presidente em anúncios de obras ou solenidades a portas fechadas, mas passou a se ausentar recentemente.
A maioria desses eventos nos últimos meses marcava parcerias entre o governo federal e a prefeitura de Paes — nos quais, segundo aliados do governador, a presença dele não faria sentido.
Agendas canceladas
Além de ver governadores de oposição de fora dos palanques de entregas, Lula cancelou agendas que teria em redutos bolsonaristas, como Santa Catarina e Goiás. No caso catarinense, a visita do presidente, planejada para esta semana, seria em data próxima à Conferência de Ação Política Conservadora (CPAC), fórum que reunirá figuras da direita latina em Balneário Camboriú.
A estrela do evento que ocorre no sábado e domingo é o presidente argentino, Javier Milei, que chamou Lula de “comunista” e “corrupto” — o brasileiro foi orientado a evitar respostas. O governador do estado, Jorginho Mello (PL), é dos mais ferrenhos aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro.
Em Goiás, o presidente visitaria a capital Goiânia e Aparecida de Goiânia, hoje, mas cancelou a viagem por “choque de compromissos”. Também apoiador de Bolsonaro, o governador Ronaldo Caiado (União Brasil) é um dos nomes que disputam votos no campo da direita em 2026 diante da inelegibilidade de Bolsonaro pelo Tribunal Superior Eleitoral.
A correlação de forças nos principais governos estaduais, na esteira da força bolsonarista, é diferente da que Lula encarou nos primeiros mandatos. Hoje, dos estados mais populosos, apenas os do Nordeste têm governadores considerados mais abertos ao petista.
PF cumpre no RJ novos mandados em caso de fraude em cartão de vacinação de Bolsonaro
A Polícia Federal deflagrou nesta quinta-feira (4) a segunda fase da operação Venire, que investiga a falsificação de certificados de vacinas contra a Covid-19 em torno do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), já indiciado neste caso.
Os investigadores cumprem mandados de busca e apreensão contra agentes públicos de Duque de Caxias (RJ) que teriam viabilizado a inserção de dados falsos no SI- PNI (Sistema de Informação do Programa Nacional de Imunizações). A PF pretende também identificar novos eventuais beneficiários.
Entre os alvos da nova operação estão Washington Reis, secretário estadual de Transportes e ex-prefeito de Duque de Caxias, e Célia Serrano, secretária de Saúde do município. As diligências foram autorizadas pelo STF (Supremo Tribunal Federal) a pedido da PGR (Procuradoria Geral da República).
O procurador-geral da República, Paulo Gonet, pediu ao Supremo em abril o aprofundamento das investigações que envolvem Bolsonaro. Em março, a PF indiciou no caso o ex-presidente, o ex-ajudante de ordens Mauro Cid, o deputado federal Gutemberg Reis (MDB-RJ) e outras 14 pessoas.
Bolsonaro foi alvo da primeira fase da operação em Venire. As apurações avançaram após a delação premada assinada por Cid.
Em depoimento à PF, o tenente-coronel disse que a fraude no cartão de vacinação de Bolsonaro e da filha dele, Laura, foi feita a pedido do próprio mandatário na época e que os certificados foram impressos e entregues "em mãos" ao então presidente.
Todos eles foram indiciados sob suspeita dos crimes de inserção de dados falsos em sistema público e associação criminosa. Os investigadores ainda disseram que a fraude pode ter sido realizada no escopo da tentativa de aplicar um golpe de Estado no país e impedir a posse de Lula (PT).
A pena para associação criminosa é a reclusão de 1 a 3 anos. Já a inserção de dados falsos em sistema de informações tem pena de reclusão de 2 a 12 anos e multa.
A investigação está vinculada ao inquérito das milícias digitais, que tramita em sigilo no STF sob a relatoria do ministro Alexandre de Moraes. No âmbito deste inquérito foi feito o acordo de delação premiada de Mauro Cid.
Para Gonet, apesar de "relevantes achados que constam do minucioso relatório final da investigação", ainda não há uma resposta do DoJ (o Departamento de Justiça dos EUA) a pedido Polícia Federal de "esclarecimento sobre se os investigados fizeram uso dos certificados de vacinação ideologicamente falsos quando da entrada e estada no território norte-americano".
"É relevante saber se algum certificado de vacinação foi apresentado por Bolsonaro e pelos demais integrantes da comitiva presidencial, quando da entrada e permanência no território norte-americano", diz o chefe da PGR.
Durante a pandemia, Bolsonaro destacou-se pelo negacionismo. Ele falou e agiu em confronto com as medidas de proteção, em especial a política de isolamento da população. O então presidente usou as palavras histeria e fantasia para classificar a reação da população e da imprensa à pandemia.
Bolsonaro também distribuiu remédios ineficazes contra a doença, incentivou aglomerações, atuou contra a compra de vacinas, espalhou informações falsas sobre a Covid-19 e fez campanhas de desobediência a medidas de proteção, como o uso de máscaras.
À época do indiciamento, a defesa de Bolsonaro reclamou do que chamou de vazamento da investigação, criticou o indiciamento e disse que o relatório da PF era precipitado. No seu depoimento à PF, o ex-presidente admitiu que não foi vacinado, mas negou ter dado ordem para a falsificação.
O ex-presidente já foi condenado pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) por ataques e mentiras sobre o sistema eleitoral. Neste momento, ele está inelegível ao menos até 2030.
Caso seja processado e condenado pelos crimes de tentativa de golpe de Estado, tentativa de abolição do Estado democrático de Direito e associação criminosa, Bolsonaro poderá pegar uma pena de até 23 anos de prisão e ficar inelegível por mais de 30 anos.
No caso das joias e no da trama golpista, as próximas etapas são a finalização da investigação pela PF, análise da PGR e definição por parte do STF se Bolsonaro se transforma em réu para ser julgado em seguida pelo plenário. Caso não se justifique uma preventiva até lá, a eventual prisão dele ocorreria somente após essa última etapa, caso condenado.
Incêndios na Amazônia batem recorde de 20 anos no 1º semestre; fogo destrói o Pantanal
O ESTADÃO DE SP
O Pantanal não foi o único bioma a fechar o primeiro semestre com número de queimadas acima do normal. A Amazônia registrou 13.489 focos – 62% a mais ante o mesmo período de 2023 e o pior número em 20 anos para o intervalo de janeiro a junho, segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), órgão ligado ao Ministério da Ciência e Tecnologia.
Conforme o presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho, a alta foi puxada pelos focos em Roraima, onde a temporada de fogo, que costuma ser entre novembro e dezembro, se estendeu para janeiro e fevereiro. Roraima concentrou 34% dos registros no semestre (4627), atrás apenas de Mato Grosso.
Segundo Agostinho, têm pesado os efeitos do El Niño, cuja influência no clima terminou há poucas semanas, e o aquecimento global. A Amazônia não é adaptada ao fogo e focos naturais são raros.
No bioma, a dinâmica das chamas normalmente segue o rastro do desmate, que costuma ser seguido de queimadas para limpar terrenos. Mas, em anos de seca extrema como os de El Niño, o fogo extrapola esse padrão.
No ano passado, a gestão Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi alvo de críticas pela crise na Amazônia, onde a seca dos rios dificultou até o abastecimento de comida e remédios e o aumento de queimadas fez cidades serem encobertas pela fumaça.
Neste ano, como o Estadão mostrou, novas falhas de prevenção do governo agravam o problema no Pantanal, que corre risco de enfrentar desastre pior do que o de 2020. Lula tem defendido a bandeira ambiental no exterior e organiza uma Cúpula do Clima (COP) das Nações Unidas em Belém, em 2025, para projetar o Brasil nos debates climáticos.
Agostinho nega omissão do governo e diz mobilizar mais dinheiro e equipes para frear as chamas. No Pantanal, segundo o órgão, há 500 agentes federais no combate às chamas. O Ibama não detalhou o cronograma de chegada de mais brigadistas à Amazônia.
Ainda segundo ele, a greve dos servidores do Ibama não vai prejudicar o combate. “De comum acordo, os servidores decidiram que a área de fogo não será impactada pela greve. Tem muitas outras áreas burocráticas do Ibama que de fato estão paradas”, disse. Além de prejudicar a fiscalização de crimes ambientais, a paralisação tem causado perdas bilionárias a diversos setores.
“A gente está conseguindo diminuir o desmatamento, mas o calor intenso, os períodos de seca, a fragmentação florestal e o efeito de borda estão aumentando a degradação em regiões da Amazônia. E isso leva a uma situação de áreas mais sensíveis ao fogo”, afirmou ao Estadão.
Especialistas têm alertado que, com a piora do aquecimento global, fenômenos climáticos extremos vão se tornar cada vez mais intensos e frequentes, o que exigirá maior capacidade de prevenção e resposta por parte das autoridades, além de fiscalização de crimes ambientais.
Ibama cita ‘orçamento insuficiente’ e destaca contratação de brigadistas
Segundo Agostinho, foram empenhados R$84 milhões este ano em medidas de prevenção ao fogo, além de reforço de R$4,5 milhões recebidos no fim de junho do governo federal. O Ibama diz ainda que houve promessa de crédito extraordinário, que pode chegar a R$ 40 milhões.
“Isso não é de agora. É um processo que se iniciou no 2º semestre do ano passado e perdura. Deveríamos ter visto grandes chuvas sobre a Amazônia de dezembro a maio, mas não teve.”
Isso acende um alerta para o período mais seco do ano, que acabou de começar e vai até setembro. “A perspectiva nos próximos três meses é que continue (sem precipitações)”, alerta.
A recomposição orçamentária foi feita após a crise do Pantanal, já que a verba para fiscalização ambiental, prevenção e combate a incêndios havia sido reduzida de R$144 milhões em 2023 para R$ 106 milhões em 2024 no orçamento aprovado pelo Congresso e sancionado por Lula.
“Era um orçamento insuficiente e nós fizemos todos os remanejamentos possíveis”, acrescentou Agostinho. “Conseguimos antecipar praticamente dois meses a contratação dos brigadistas, conseguimos ter as aeronaves. Quando os incêndios no Pantanal começaram, a gente já estava lá”, diz.
Floresta também está mais seca
Assim como o Pantanal, que sofre com a estiagem nas áreas de nascentes, a Amazônia também está mais seca em relação às médias para esta época do ano. Segundo o meteorologista do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, Renato Senna, os sinais de que o problema climático se formava já eram notados em 2023.
As chuvas escassas foram insuficientes para encher os grandes rios amazônicos. Embora estejam na cheia, eles apresentam atualmente volumes muito inferiores aos que normalmente são registrados nessa época.
É o caso do Rio Negro, que registrou em junho cota máxima de 27 metros, bem abaixo das médias históricas. Isso vem ocorrendo de forma generalizada nas bacias que compõem a Amazônia, principalmente nos rios da margem direita. Ele também manifesta preocupação com as nascentes de rios como o Madeira.
“Associado à ausência de chuva, normalmente tem elevação de temperatura. Há muita matéria seca junto ao solo da floresta, tem (acúmulo de biomassa) combustível. As pessoas tentam colocar fogo para limpar o campo e aumentam a incidência de queimadas”, continua o pesquisador.
Fumaça de queimadas afeta saúde em SP
Todo o regime hídrico do Centro-Oeste e Sudeste é influenciado pela Amazônia. O ciclo hidrológico na floresta faz com que as moléculas de água – vindas do oceano e precipitadas sobre o bioma – sejam evaporadas e voltem em forma de chuvas na região entre 5 a 8 vezes. Quando essa enorme massa de ar se desloca no sentido da Cordilheira dos Andes, migra para o Sudeste, formando os “rios voadores”.
A alteração desse ciclo pelo desmatamento é sentida nas mudanças de comportamento das tempestades que afetam o País no verão: cada vez mais frequentes, intensas e localizadas, de acordo com especialistas.
Estudos também já mostraram que a fumaça de queimadas na Amazônia e no Pantanal afeta a qualidade do ar da cidade de São Paulo, conforme mostrou uma pesquisa de cientistas da Universidade de São Paulo (USP) e do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen) publicada em 2023.
A partir de cinco pontos de medição instalados na cidade, o projeto vem monitorando a fumaça oriunda de incêndios florestais e também as concentrações de gases do efeito estufa.
A poluição do ar é a principal causa ambiental de doenças e mortes prematuras no mundo. Partículas finas de poluição do ar ou aerossóis, também conhecidas como partículas finas, são responsáveis por 6,4 milhões de mortes todo ano, causadas por doenças como cardiopatia isquêmica, acidente vascular cerebral, câncer de pulmão, pneumonia, diabete e distúrbios neonatais.
Além da saúde, a poluição atmosférica está ligada à perda de biodiversidade e ecossistema.
A nova pesquisa Ipec de avaliação do governo Lula
Por Lauro Jardim / O GLOBO
Neste fim se semana os entrevistadores do Ipec vão às ruas de todo o Brasil para a sétima rodada de uma ampla pesquisa de avaliação do governo Lula. Serão ouvidas 2002 pessoas presencialmente. A pesquisa será concluída na quarta-feira que vem e divulgada provavelmente na sexta-feira, 12.
A pesquisa anterior foi feita no início de março. E mostrou o pior resultado para o governo desde que Lula tomou posse. Apenas 33% consideravam o governo ótimo ou bom contra 32% que o avaliavam ruim ou péssimo.
Mas isso foi há quatro meses. Tempo suficiente para o humor mudar. Pra melhor ou para pior.
O que esperar da pesquisa deste início de julho?
Os números da economia, como taxas de emprego, consumo e inflação, estão em um bom momento. Mas, pesando contra, há a sombra do dólar em viés de alta e da discussão do controle dos gastos à espreita.
O Palácio do Planalto tem apostado alto em duas frentes para que a aprovação e a confiança em Lula melhorem: as entrevistas do presidente, que desde a dada à CBN, duas semanas atrás têm sido quase diárias, e a série de viagens de Lula pelo país, entregando obras (ou, na maioria das vezes, anunciando o início delas).
A pesquisa do Ipec será um bom teste para verificar se as entrevistas e viagens deram algum resultado.
TCU E GOVERNO PLANEJAM DAR DESCONTO DE ATÉ R$ 17 BILHÕES PARA OI
Breno Pires, de Brasília / FOLHA DE SP
Sem alarde, o Tribunal de Contas da União (TCU) julgará nesta quarta-feira (3) um polêmico acordo entre a Oi, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) e o Ministério das Comunicações, em que o poder público está abrindo mão de até 17 bilhões de reais. O caso tramita há um ano no TCU sob sigilo, mas a piauí teve acesso a dois documentos: o parecer da procuradora-geral do Ministério Público junto ao tribunal (MP-TCU), Cristina Machado, e um relatório da unidade de auditoria especializada em telecomunicações. Os dois apontam irregularidades no acordo, sugerindo que a negociação pode caracterizar “uso indevido de recursos públicos para a consecução de interesses privados”.
A negociação prevê que a Oi migre do regime público de concessão de telefonia fixa (com obrigações de universalização e continuidade, financiados por tarifas) para o regime privado de autorização (com preços livres e redução nos custos operacionais). Ou seja, a empresa não será mais detentora de uma concessão pública. Segundo a lei, portanto, a Oi deveria nesse momento devolver à União os chamados “bens reversíveis” – isto é, ativos, como prédios, veículos, infraestrutura – que lhe foram cedidos na época da privatização, em 1998, quando a empresa ainda se chamava Telemar. Pelo acordo que foi costurado agora, a Oi permanecerá com esses bens e, em troca, pagará à Anatel 5,8 bilhões de reais em forma de investimentos em infraestrutura de telecomunicações.
Os 5,8 bilhões de reais, no entanto, são um valor muito inferior ao inicialmente calculado pela Anatel, que variava entre 19,92 bilhões e 23,26 bilhões de reais, dependendo das apurações que estavam sendo realizadas pelo TCU antes das negociações para o acordo. Segundo escreveu a procuradora Cristina Machado, os 5,8 bilhões representam “uma redução de quase 75% do que foi avaliado pela Anatel em termos de valor econômico da adaptação”.
Para a procuradora, o valor do pagamento “foi definido de forma pragmática, sem amparo de metodologia de cálculo devidamente fundamentada”. Ela afirma que “a drástica redução verificada” não encontra respaldo na Lei Geral das Telecomunicações, que não contempla a possibilidade de “modulação, desconto, parcelamento ou aplicação de condicionantes”. A minuta do acordo já foi aprovada pelo Ministério das Comunicações e pela Anatel, faltando a aprovação do TCU.
Dentro do tribunal, o único apoio ao acordo veio de uma nova secretaria criada pelo atual presidente do TCU, ministro Bruno Dantas: a Secretaria de Controle Externo de Solução Consensual e Prevenção de Conflitos, chamada internamente de SecexConsenso. A secretaria foi concebida com a função de mediar litígios complexos entre a administração pública e empresas. Os críticos dizem que a nova função de produzir consensos desvia o tribunal de sua missão principal, que é a fiscalização, e cria um potencial conflito: o órgão que fiscaliza o uso do dinheiro público vira o mesmo que negocia o uso do dinheiro público com os fiscalizados.
Nas negociações do acordo, para chegar aos 5,8 bilhões, a SecexConsenso fez o seguinte cálculo: estimou em 19,73 bilhões o valor que a Oi deve à União, e subtraiu desse número 12,97 bilhões, referentes aos bens reversíveis não amortizados (isto é, investimentos da concessionária que ainda não foram ressarcidos). A secretaria, além disso, subtraiu outros 2,47 bilhões, que se referem aos custos da Oi de manutenção das redes de telefonia fixa. Com essas duas deduções, o valor cairia para 4,28 bilhões de reais. Os negociadores, porém, sem explicação clara, fixaram o valor em 5,8 bilhões.
A procuradora do Ministério Público rebateu o desconto maior: “A parcela de 12 bilhões de reais de bens reversíveis não amortizados que seriam devidos à Oi ao final da concessão (…) não faz frente ao valor que a União abriria mão com a concretização da adaptação por esta solução consensual, no total de 101 bilhões de reais, segundo informado pela Anatel no mesmo documento, a reforçar a pertinência da manutenção da discussão sobre bens reversíveis nas instâncias competentes, inclusive no Tribunal.” Os 101 bilhões a que ela se refere são de um cálculo anterior feito pela Anatel sobre os valores dos bens reversíveis da Oi, conta essa que foi desconsiderada no acordo.
A procuradora Cristina Machado disse que “admitir o entendimento esposado [nas negociações] é tornar ineficaz o poder regulamentar previsto no nosso ordenamento jurídico, além de excepcionalizar, pela via indireta, a própria obediência ao princípio da legalidade”. Em seu parecer, ela inclusive menciona um trecho das conclusões da área do TCU especializada em telecomunicações, na qual estão apontados cinco motivos para rejeição do acordo. Entre eles, estão a ausência de boas garantias para os investimentos e a ausência de mecanismo para que o poder público assegure o cumprimento do acordo por parte da V.tal, credora da Oi e braço do banco BTG Pactual. O trecho ainda menciona a inserção de cláusulas com os seguintes problemas:
- “fogem do escopo da proposta de acordo e do campo de atuação do poder público”
- “desequilibram unilateralmente as prerrogativas regulatórias da Anatel”
- “buscam definir, sem respaldo legal, o andamento de processos do TCU”
Oacordo, se aprovado, será uma capitulação da União em uma disputa que já dura uma década sobre os tais “bens reversíveis”. Há vários processos em discussão, sem desfecho, sobre o valor dos bens que estão em posse da Oi. Nenhuma estimativa, porém, é tão baixa quanto à cifra pactuada na SecexConsenso.
O modelo adotado na negociação, segundo o Ministério Público, “impacta de forma desequilibrada e negativa o erário” e “beneficia o particular de modo injustificado e indevido, em detrimento do patrimônio público, na medida em que são admitidos como de sua propriedade infraestrutura que envolve cifras bilionárias”. Por particular, no caso, entenda-se não só a Oi, mas também a V.tal, a empresa de telecomunicações de propriedade do BTG Pactual, o maior banco de investimentos do país, liderado por André Esteves, que é credora da Oi. O acordo proposto permitirá, se aprovado, transferir a propriedade definitiva dos bens reversíveis para a Oi, que, a partir daí, poderá fazer com eles o que bem entender — como, por exemplo, vendê-los à V.tal.
Como credora da Oi, a V.tal assumirá o compromisso de realizar 5 bilhões dos investimentos, dos 5,8 bilhões totais. Isso quer dizer que, no acordo da Oi, 86% dos recursos serão providos pela empresa que pertence ao banco de André Esteves. Com um detalhe: a responsabilidade, em caso de inadimplência, será somente da Oi. A V.tal “não poderá ser responsabilizada, em nenhuma esfera independentemente da natureza da infração, pelas obrigações da Oi”. A auditoria especializada considerou essa situação irregular.
À espera do aval dos ministros do TCU, que pode vir já na sessão do plenário marcada para as 14h30 desta quarta-feira, o acordo teve participação ativa do Ministério das Comunicações, chefiado pelo ministro Juscelino Filho, que é deputado federal licenciado do União Brasil-MA e responde a um inquérito por corrupção e desvio de dinheiro do orçamento secreto.
O relator do caso no TCU é o ministro Jorge Oliveira, que foi o principal conselheiro jurídico do governo Jair Bolsonaro e colega dos então ministros das Comunicações, Fábio Faria, e da Advocacia-Geral da União (AGU), Bruno Bianco. Por coincidência, os dois aprovaram reduções nas dívidas da Oi, por duas vezes, quando estavam no governo. Na primeira vez, em 2020, o valor baixou de 14,33 bilhões de reais para 7,2 bilhões. Na segunda, caiu ainda mais: de 20,2 bilhões, foi para 9,1, um desconto de 54,99%. Com o encerramento da gestão de Bolsonaro, foram trabalhar no BTG Pactual.
Neste momento, a Oi tenta, junto à Advocacia-Geral da União do governo Lula, reduzir pela terceira vez as dívidas, mas ainda não obteve o aval. A piauí apurou que André Esteves e Bruno Bianco, como representantes da V.tal, participaram de reuniões em Brasília sobre o acordo da Oi.
“Dadas as considerações expostas ao longo deste parecer, temos por devido não recomendar a assinatura do termo de autocomposição proposto, em razão das condições desvantajosas ao interesse público presentes em suas disposições”, escreveu a procuradora Cristina Machado. Uma dessas condições desvantajosas é que grande parte dos investimentos da Oi será destinada a projetos já planejados pela V.tal, como construção de data centers e cabos submarinos, em vez de priorizar a implantação de infraestrutura em áreas carentes. É aí que mora outra parte do problema do acordo.
A procuradora detalha esse ponto: “A maior parte dos 5 bilhões de reais de compromissos de investimento acordados coincidem com projetos que fazem parte do plano de expansão da empresa V.tal, e que não priorizam a implantação de infraestrutura de rede de alta capacidade de comunicação em áreas sem competividade e/ou desprovidas de tal infraestrutura”. O parecer destaca que 65,6% dos valores de investimentos fixos ajustados são destinados à construção de Data Centers e à implantação de cabos submarinos. Segundo a procuradora, o quadro pode vir a caracterizar “uso indevido de recursos públicos para a consecução de interesses privados”.
Pela legislação, o valor da migração — do regime de concessão para o de autorização — não volta para os cofres da União, mas deve ser investido em serviços de telecomunicações, como, por exemplo, infraestrutura de redes de banda larga e de telefonia móvel, levando em consideração locais com serviço mais precário.
Dos 5,8 bilhões, porém, só 1,2 bilhão será destinado à implantação de internet de banda larga em escolas e outros 800 milhões de reais irão para a manutenção do serviço de telefonia fixa até 2028. A procuradora-geral lembrou que, conforme a Lei Geral de Telecomunicações, “os compromissos de investimento priorizarão a implantação de infraestrutura de rede de alta capacidade de comunicação de dados em áreas sem competição adequada e a redução das desigualdades, nos termos da regulamentação da Agência”.
Em defesa do acordo, a SecexConsenso argumenta que a convergência de interesses público e privado não desfavorece o resultado da renegociação e que os compromissos de investimento não são direcionados para projetos já realizados ou em realização pela V.tal. Outro argumento da SecexConsenso em favor do acordo afirma que a Oi, que está em sua segunda recuperação judicial, com dívidas da ordem de 45 bilhões, pode falir, caso não haja a aprovação. E que, se esse cenário se materializar, a União teria de assumir a operação da concessão de telefonia fixa, com custos bilionários. Segundo os dados apresentados pelo governo, caso o Estado passe a operar diretamente o sistema de telefonia fixa (STFC), “haveria a necessidade de investimento de recursos públicos para manter o STFC em seu formato atual, com custo anual estimado aproximadamente entre 2 bilhões e 4 bilhões de reais” — valor bastante impreciso.
No entanto, o Ministério Público contesta a afirmação de que os compromissos de investimento não contemplam projeto da V.tal. Argumenta que os recursos utilizados nos compromissos acordados são essencialmente públicos e deveriam ser aplicados para reduzir desigualdades regionais e sociais, conforme a política pública vigente.
“Assim, como pontuou a AudComunicações, é irregular o emprego de recursos oriundos da adaptação da concessão da Oi em projetos que já fazem parte do planejamento de investimentos de construção ou expansão, mesmo que apenas futuros, da V.tal, especialmente em locais de atratividade econômica. Ainda que parte dos compromissos assumidos contemple regiões consideradas prioritárias pela legislação (Norte e Nordeste), o objeto ajustado direciona os recursos para, indiretamente, atender aos interesses privados da V.tal, em prejuízo à política pública que deveria ser beneficiada”, disse a procuradora-geral.
Ao longo dos últimos dez anos, o TCU fez diversas auditorias e fiscalizações a respeito dos bens reversíveis. Historicamente, o plenário do tribunal esteve alinhado com a área técnica especializada em telecomunicações. Agora, com a secretaria criada por Bruno Dantas, deu-se a divergência. A SecexConsenso está de um lado, pró-acordo, e a área técnica está de outro, contra o acordo. Se for aprovada, essa será a primeira “solução consensual” a ser validada contrariando a área técnica especializada e, também, o Ministério Público junto ao TCU.