STF determina que União reative Fundo Amazônia em até 60 dias
Por Gabriel Shinohara — Brasília / O GLOBO
O plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu omissão do governo federal na administração do Fundo Amazônia e determinou a reativação do fundo em até 60 dias. O instrumento que visa a preservação da floresta foi desativado no início do governo Jair Bolsonaro, em 2019, após conflitos sobre o modelo de governança com Noruega e Alemanha, os dois principais investidores do fundo.
Nesta quinta-feira, os ministros Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia e Gilmar Mendes acompanharam a relatora, ministra Rosa Weber, na inconstitucionalidade de decretos que extinguiram comitês técnicos e administrativos do Fundo em 2019.
Na sessão passada, o restante dos ministros já tinham compartilhado desse entendimento iniciado por Weber, que apresentou um longo voto com críticas à política ambiental do governo Bolsonaro. Apenas o ministro Nunes Marques teve posição divergente, formando uma posição de 10 ministros contra 1.
O ministro Gilmar Mendes, decano da Corte, foi o último a votar. Mendes disse que reconhecia a ação pela omissão administrativa no gerenciamento do fundo e acompanhou a posição da relatora Rosa Weber.
— Governos democraticamente eleitos dispõe de poder para dispor de políticas públicas, mas as políticas públicas precisam ser consonantes com o que está estabelecido na constituição — disse.
O plenário analisou um pedido feito por PSB, PSOL, Rede e PT, que alegaram omissão da União sobre o Fundo Amazônia. Na conta dos partidos, o governo federal está deixando de disponibilizar R$ 3,3 bilhões para financiar novos projetos de preservação.
Após a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva nas eleições do último domingo, os governos da Noruega e da Alemanha sinalizaram que vão retomar o financiamento do Fundo Amazônia.
Depois do julgamento, o embaixador da Alemanha no Brasil, Heiko Thoms, publico no Twitter que a Noruega e a Alemanha "saúdam" a decisão do STF e que o Brasil pode repetir os resultados "impressionantes" na redução do desmatamento na Amazônia.
O Fundo
O Fundo Amazônia foi criado em 2008 e tinha o BNDES como gestor. As diretrizes do fundo eram feitas pelo Comitê Orientador do Fundo Amazônia (Cofa), que era formado por membros do governo federal, governos estaduais e da sociedade civil.
Já os recursos foram paralisados em 2019, quando o governo Bolsonaro promoveu mudanças na administração do fundo com a extinção de órgãos técnicos e a diminuição da participação de ONGs. Os dois principais investidores, Noruega e Alemanha, não concordaram.
Na época, representantes dos dois países argumentaram que a participação da sociedade civil no conselho do Fundo injetava a “confiança necessária” para o tipo de investimento e parceria de longo prazo.
Grupo de procuradores cobram que Aras investigue Bolsonaro por omissão
Um grupo de 186 procuradores da República de todo o país enviou manifestação ao procurador-geral da República, Augusto Aras, solicitando a abertura de um inquérito para investigar o presidente Jair Bolsonaro (PL).

MPF
No documento, os procuradores defendem que a suposta omissão de Bolsonaro diante da onda de protestos que tentam deslegitimar o resultado da eleição e bloquearam rodovias pelo país deve ser apurada.
"É inadmissível que qualquer autoridade, diante de uma escalada que quer suplantar a legitimidade do voto popular pela força e pela desordem, assista impassivelmente a esse cenário, sem qualquer consequência", diz trecho do documento.
Os procuradores também cobram uma atuação mais enérgica de Aras sobre o caso e lembram que uma das missões do Ministério Público é defesa do regime democrático.
"Diante disso, representamos a Vossa Excelência que, sem prejuízo das decisões já proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, e da atuação do Ministério Público Federal em 1ª instância, já em curso em todos os Estados, não apenas atue na coordenação do Ministério Público Federal para desmobilizar esse cenário de insurreição, como também requisite a instauração de inquérito policial com o objetivo de apurar a eventual prática, por quaisquer autoridades que gozam de foro de prerrogativa de função no STF, de crimes relacionados aos movimentos de bloqueio de vias em tela", cobram os procuradores.
PRF também na mira
Em outra frente, o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União pediu para a corte investigar se a Polícia Rodoviária Federal foi omissa ao combater os bloqueios causados por bolsonaristas insatisfeitos com o resultado das eleições.
Desde segunda-feira (31/10), um dia após a vitória de Lula (PT) sobre Jair Bolsonaro (PL) nas urnas, bolsonaristas têm bloqueado diversas estradas por todo país, apesar de ordens judiciais determinando a imediata desinterdição das vias.
As manifestações antidemocráticas e golpistas, que podem configurar crime, foram feitas a despeito da PRF, que seria encarregada de agir. Posteriormente, diretores da corporação afirmaram que não há corpo mole no combate à arruaça promovida.
Clique aqui para ler a manifestação dos procuradores
Revista Consultor Jurídico, 2 de novembro de 2022, 14h46
Julgamento de 'rachadinha' no STF será retomado em meio a temor de prescrição
Por João Paulo Saconi / o globo
Consta na pauta do plenário do STF para a tarde desta quinta-feira um julgamento que a Corte arrasta desde dezembro de 2010: o da suspeita de “rachadinha” no gabinete de Silas Câmara, do Republicanos no Amazonas, recém-reeleito para o sétimo mandato como deputado federal. É uma das mais antigas do tipo no país, precursora daquelas que surgiram contra Flávio e Carlos Bolsonaro, no Rio de Janeiro.
O caso de Câmara deveria ter sido retomado ontem, mas foi postergado depois que os ministros se alongaram na discussão sobre o Fundo Amazônia, também deixada para hoje.
O parlamentar é acusado de ter se apropriado de salários de assessores pagos pelo Congresso entre 2000 e 2001. O relator da ação é o ministro Luís Roberto Barroso, que no fim de 2020 pediu cinco anos e três meses de prisão para Câmara — o voto foi acompanhado por Edson Fachin.
Entre adversários políticos do amazonense, há um temor de que a demora no julgamento, suspenso três vezes, leve à prescrição da denúncia, oferecida em 2009 pela PGR e aceita em dezembro de 2009 por Joaquim Barbosa. A tese entre esses opositores é que, se a pena de Barroso for mantida pelos outros ministros, o crime de peculato estará prescrito até dezembro deste ano. Para que a punição seja válida, Câmara teria que ser condenado antes deste prazo, quando a tramitação completa 12 anos.
A defesa de Câmara afirma que ele é inocente e diverge da hipótese: projeta que, sem a pena fixada, a prescrição só aconteceria em 2026.
Na sessão de mais tarde, o primeiro voto será de Kassio Nunes Marques, que no ano passado aumentou a demora na resolução do caso levando-o do plenário virtual para o presencial. O segundo da lista é André Mendonça: os desafetos de Câmara temem que o ministro peça vista do processo e, assim, favoreça a hipótese de prescrição do suposto crime.
Vencedor da eleição presidencial poderá usar Avenida Paulista no domingo, decide Justiça
Por Bianca Gomes, Sérgio Roxo e Malu Mões — São Paulo / o globo
O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP) decidiu nesta quinta-feira que o vencedor da eleição presidencial terá o direito de utilizar a Avenida Paulista no próximo domingo, a partir das 20h30. A decisão impõe uma derrota aos apoiadores do presidente Jair Bolsonaro (PL), que já tinham organizado um ato para acompanhar a apuração na via.
Como mostrou o GLOBO na quarta-feira, o uso da Paulista no dia da votação do segundo turno era alvo de disputa por parte de bolsonaristas e petistas. Seis grupos de direita tinham solicitado o uso da Paulista no próximo dia 30 a partir das 17h, com previsão para colocar três caminhões de som na avenida. No entanto, nesta terça-feira, o diretório estadual do PT também enviou um ofício à Polícia Militar informando intenção de usar a via.
"Decide-se no sentido de que, quanto à intenção de manifestação mediante ocupação da Avenida Paulista por entes ou movimentos na data de 30 de outubro, depois do horário de votação, deverá dar-se conforme estritamente o resultado da eleição", escreveu o juiz Randolfo Ferraz de Campos na decisão obtida pelo GLOBO.
Campos afirma que as decisões sobre o uso da Paulista são sempre vinculadas à eleição presidencial, e não estadual. Por isso, num cenário em que Luiz Inácio Lula da Silva (PT) é eleito presidente e Tarcísio de Freitas (Republicanos), governador, o direito de festejar na avenida será dos petistas.
Embora haja um rodízio para a utilização da via, o juiz pondera que não "se cuida mais de uma reles sucessão de manifestações no espaço público. Trata-se de manifestação a coroar (no âmbito da manifestação da vontade popular) processo complexo e demorado, que é o processo eleitoral".
Campos justificou a decisão argumentando que as duas campanhas já haviam entrado em consenso no primeiro turno de que, se houvesse vencedor no dia 2 de outubro, a paulista ficaria com o candidato eleito. Assim, avaliou que a decisão deveria ser a mesma para o segundo turno. Ele ainda apontou que "se trata de manifestação a coroar" e que o resultado da eleição "expressará exatamente a soberania" da vontade popular, e essa que deve ser considerada para ocupar a paulista.
"A manifestação, como regra, dá-se pelo conjunto de pessoas, num pleito eleitoral, aderentes ao seu resultado conforme ideia básica de que se destina a comemorá-lo", escreveu o juiz.
— A decisão garante os direitos constitucionais de reunião e livre manifestação de pensamento, coroando a eleição como a festa da democracia. Isso porque permitirá que a avenida Paulista seja ocupada para comemorações do grupo que se sagrar vencedor das eleições presidenciais — afirmou ao GLOBO Michel Bertoni Soares, advogado do Diretório Estadual do Partido dos Trabalhadores.
Pela decisão do TJ-SP, eventual festa na Paulista não poderá ocorrer antes do término do horário de votação. Por segurança, o grupo vencedor deverá aguardar ao menos até 20h30min.
PT dividido
Integrantes da campanha presidencial petista afirmaram reservadamente ao GLOBO na quarta-feira que não foi feito nenhum pedido da parte de Lula para usar a avenida, sendo a solicitação à PM e à Justiça de autoria do diretório estadual da legenda.
O assunto foi discutido informalmente pela campanha de Lula e Haddad no começo da noite de quarta. Na ocasião, não havia um consenso sobre uma festa na Paulista, mas a posição deve ser reavaliada nesta quinta após decisão da Justiça.
Decisão repete 1º turno
No primeiro turno, em resposta a uma ação do diretório estadual do PT, a 14ª Vara da Fazenda Pública decidiu que o vencedor da eleição teria direito de usar a Paulista e, em caso de segundo turno, os petistas poderiam realizar atos na avenida no dia 2 de outubro — cenário que se concretizou na prática.
A Justiça proíbe que grupos politicamente antagônicos se manifestem no mesmo lugar, justamente para evitar confrontos. Desde 2020, foi estabelecido um rodízio entre oposição e situação para o uso da Avenida Paulista. O revezamento vale sempre que os dois lados solicitarem a utilização da via para o mesmo dia. Não considera, por exemplo, o ato bolsonarista realizado nesta terça-feira na Paulista.
Se a Justiça considerasse o rodízio como critério único para a escolha de quem usará a Paulista no domingo, a vez no segundo turno seria dos bolsonaristas, visto que o PT ocupou a avenida após o primeiro turno.
TSE diz que servidor foi exonerado por atuar com ‘motivação política’
Por Weslley Galzo / o estadão
BRASÍLIA – O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) divulgou nota nesta quarta-feira, 26, na qual afirma que exonerou o servidor Alexandre Machado por “motivação política” e “indicações de reiteradas práticas de assédio moral”. A Corte informou que abrirá uma processo administrativo para investigar a conduta do funcionário público.
Alexandre Machado trabalhava na área que lidava com as propagandas eleitorais. Ele foi exonerado nesta quarta. Logo em seguida, procurou a Polícia Federal para dizer que estava sendo perseguido pela Corte por ter feito reiterados alertas de falhas na veiculação das propagandas eleitorais. O relato do servidor segue a denúncia que a campanha do presidente Jair Bolsonaro apresentou esta semana ao TSE. Os advogados do presidente alegam que rádios no Nordeste teriam veiculado mais inserções de campanha do petista Luiz Inácio Lula da Silva do que de Bolsonaro durante o segundo turno.
“A reação do referido servidor foi, claramente, uma tentativa de evitar sua possível e futura responsabilização em processo administrativo que será imediatamente instaurado. As alegações feitas pelo servidor em depoimento perante a Polícia Federal são falsas e criminosas e, igualmente, serão responsabilizadas”, diz a nota do TSE.
O tribunal afirmou ainda que Machado nunca fez relatos sobre supostas irregulares na veiculação de propaganda. “Ao contrário do informado em depoimento, a chefia imediata do servidor esclarece que nunca houve qualquer informação por parte do servidor que ‘desde o ano 2018 tenha informado reiteradamente ao TSE de que existam falhas de fiscalização e acompanhamento na veiculação de inserções de propaganda eleitoral gratuita’. Se o servidor, no exercício de suas funções identificou alguma falha nos procedimentos, deveria, segundo a lei, ter comunicado imediata e formalmente ao superior hierárquico, sob pena de responsabilização”, diz a nota.
TRE-CE mantém cassação de prefeitos de Iguatu e de Pacujá; novas eleições serão convocadas
O Tribunal Regional Eleitoral do Ceará (TRE-CE) manteve, nesta semana, a cassação das chapas eleitas, em 2020, para as prefeituras de Iguatu e de Pacujá. Com isso, o prefeito de Iguatu, Ednaldo Lavor (PSD), e o de Pacujá, Raimundo Filho (PDT), devem ser afastados do cargo. Além disso, novas eleições devem ser convocadas nos dois municípios cearenses.
Ainda cabe recurso no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), mas os gestores já são afastados após a publicação da decisão.
Com o afastamento do prefeito eleito em 2020, quem assume o comando do Executivo municipal é o presidente da Câmara Municipal de cada ente. Contudo, em Pacujá, o presidente do legislativo municipal, Braz Rodrigues (PDT), também foi cassado na decisão da Justiça Eleitoral.
Neste caso, a Câmara precisa eleger um novo presidente, segundo as regras do regimento interno da casa legislativa. Após isso, o novo presidente assume a Prefeitura de Pacujá inteirinamente até as novas eleições.
Ainda nesta semana, o Tribunal também reverteu a cassação do prefeito de Capistrano, Júnior Saraiva (PSD), e do vice, Cláudio Saraiva.
CASSAÇÃO EM IGUATU
Em julgamento nesta terça-feira (25), os magistrados do Tribunal negaram embargos de declaração apresentados pelo prefeito de Iguatu, Ednaldo Lavor (PSD). Com isso, fica mantida a cassação dele e do vice, Franklin Bezerra.
Ambos haviam sido cassados no final de julho por abuso de poder político. Eles também foram condenados a uma multa de R$ 50 mil por aglomeração em infringência às normas sanitárias em razão da pandemia da Covid-19.
Também foi declarada a inelegibilidade de Ednaldo Lavor por oito anos, a contar da eleição de 2020.
Em publicação no Instagram, Ednaldo Lavor disse que deve recorrer ao TSE e defendeu que o "processo virou essencialmente político". Ele lembrou que a 1ª instância da Justiça Eleitoral decidiu pela improcedência da ação – o que acabou revertido pelo pleno do TRE-CE.
"Estamos confiantes e vamos, com a proteção de Deus, vencer mais essa batalha. Que a liberdade e o respeito à vontade do povo prevaleçam sempre", completa.
Segundo o processo que resultou na condenação da chapa eleita para Prefeitura de Iguatu, durante a campanha eleitoral de 2020, foram utilizados os canais institucionais para promoção da candidatura do então prefeito e candidato à reeleição.
CASSAÇÃO EM PACUJÁ
O TRE-CE também negou, na segunda-feira (24), embargos de declaração do processo envolvendo o prefeito de Pacujá, Raimundo Filho (PDT), e o vice, José Antônio. Eles haviam sido cassados por abuso de poder econômico e captação ilícita de sufrágio no final de junho.
No mesmo processo, também foram cassados os vereadores Braz Rodrigues, Júnior Brito, Washington Luís e Lincélica Maria – todos do PDT. Braz Rodrigues é o presidente da Câmara Municipal de Pacujá e deveria assumir, no caso da cassação do prefeito, o comando do Executivo.
Contudo, como ele também será afastado, será necessária uma nova eleição para a presidência do legislativo municipal em Pacujá. O novo presidente será o responsável por assumir o Município de forma interina.
A cassação é resultado de investigações da operação "Mensalinho", na qual foram foram obtidas informações que revelaram pedidos de voto em troca de benefícios, tais como compra de passagens aéreas, entrega de materiais de construção, depósito de valores e entrega de dinheiro em espécie.
No processo, a defesa de todos os investigados havia alegado "ausência de individualização das condutas por parte do Ministério Público" e "ilicitude das provas" presentes no processo.
Negaram ainda "a participação nos fatos imputados pelo órgão ministerial, bem como afirmaram que não há provas suficientes de infração à legislação eleitoral durante a campanha", segundo texto da decisão na primeira instância.
Após a decisão, o prefeito Raimundo Filho publicou nas redes sociais reforçando ter sido "democraticamente eleito pelo povo de Pacujá" e onde disse que acredita "na justiça e no meu Deus todo poderoso".
O Diário do Nordeste tentou contato com o prefeito para comentar a decisão, mas sem sucesso.
CASSAÇÃO REVERTIDA EM CAPISTRANO
Também em julgamento nesta segunda, o TRE-CE reverteu a cassação dos diplomas do prefeito de Capistrano, Júnior Saraiva, e do vice, Cláudio Saraiva.
Eles haviam sido condenados na 1ª instâncias por suposto abuso de poder político e econômico. Contudo, ainda não haviam sido afastados, já que o caso foi levado ao Tribunal Regional.
Os magistrados entenderam que não haviam provas suficientes no processo para provar suposto abuso de poder pelos então candidatos durante campanha eleitoral de 2020.
Não à censura. Não ao ativismo judicial. Sim à democracia. Sim à liberdade.
Por Otavio Torres Calvet / consultor juridico
Sou magistrado. Juiz do Trabalho. Vitalício.
Sou professor. Mestre e doutor em Direito. Atuo como jurista.
Fiz um juramento: defender a Constituição e as leis do país.
Preciso acreditar no que vivo, no que pratico.
A Loman (Lei Orgânica da Magistratura Nacional) autoriza em seu artigo 36, III a crítica a decisões judiciais através de obras técnicas ou no exercício do magistério.
O presente artigo constitui a expressão do meu entendimento, como jurista, da decisão proferida pelo Tribunal Superior Eleitoral que a mídia vem enquadrando como censura, principalmente no que diz respeito à proibição da emissora Jovem Pan em expressar determinados conteúdos contrários a um dos candidatos à presidência da República e ao canal Brasil Paralelo de publicar documentário sobre o atentado a Jair Bolsonaro em 2018.
Poderei ser perseguido, lacrado, cancelado ou mesmo exonerado da magistratura? Possível. Já passei por algo semelhante, quando critiquei decisão judicial de uma colega no caso da dispensa em massa feita pela churrascaria Fogo de Chão durante a pandemia.
Na época, respondi a procedimento administrativo instaurado pela Corregedoria e, depois de cinco horas de deliberação pelo Pleno do TRT do Rio de Janeiro, houve o arquivamento por não atingido o quórum necessário para abertura do processo disciplinar contra mim.
Talvez, então, sofra tudo de novo. E obviamente o primeiro ponto é refletir o motivo dessa exposição pública. Simples. Porque eu preciso acreditar no Estado Democrático de Direito. Preciso acreditar que a minha profissão é real, que, como magistrado, confio no Poder Judiciário e, talvez, esta seja a minha melhor contribuição para o jurisdicionado e para o país.
Se eu, magistrado, não acreditar que posso exercitar meus direitos com medo do próprio Poder Judiciário, de fato seria o fim. Firme, então, na lei que rege a minha profissão, na Constituição da República, que garante a liberdade de expressão, e na liberdade de cátedra, vou em frente.
A perplexidade começa com o contraste entre os Princípios de Bangalore, que trazem os valores que informam nossa carreira, e o que hoje está estampado na mídia, sobre a imparcialidade da magistratura.
Como se observa dos comentários publicados pelo Conselho da Justiça Federal, "A imparcialidade é essencial para o apropriado cumprimento dos deveres do cargo de juiz. Aplica-se não somente à decisão, mas também ao processo de tomada de decisão".
Tal qual a célebre frase, "a mulher de Cesar não basta ser honesta, deve parecer honesta", a magistratura não basta ser imparcial, deve parecer imparcial. E não sou eu quem cria esta máxima. Está, novamente, nos Comentários ao Princípio de Bangalore acima mencionado:
"Percepção de imparcialidade
52. A imparcialidade é a qualidade fundamental requerida de um juiz e o principal atributo do Judiciário. A imparcialidade deve existir tanto como uma questão de fato como uma questão de razoável percepção. Se a parcialidade é razoavelmente percebida, essa percepção provavelmente deixará um senso de pesar e de injustiça realizados destruindo, consequentemente, a confiança no sistema judicial. A percepção de imparcialidade é medida pelos padrões de um observador razoável. A percepção de que o juiz não é imparcial pode surgir de diversos modos, por exemplo, da percepção de um conflito de interesses, do comportamento do juiz na corte, ou das associações e atividades do juiz fora dela."
O ponto, portanto, não é questionar se os ministros do Tribunal Superior Eleitoral, ou outros magistrados de todas as instâncias, são parciais, mas se estão gerando na sociedade tal percepção. E basta examinar as redes sociais, as manchetes, as conversas entre conhecidos, os almoços de família, para constatarmos que existe, sim, um mal estar generalizado neste sentido.
Algo não está sendo feito da melhor forma possível. Fruto, talvez, da cultura recente de exposição midiática de decisões judiciais, do fenômeno da judicialização da política, da dificuldade de compreensão do povo quanto às idas e vindas dos entendimentos da magistratura.
Realmente é complicado as pessoas compreenderem, no caso do candidato Luiz Inácio Lula da Silva, a sua atual situação jurídica quanto às ações criminais que tramitam perante a Justiça Federal. O fato é que houve condenação em primeiro grau, em segundo grau e no Superior Tribunal de Justiça, e, após, decisão do Supremo Tribunal Federal anulando os julgamentos por questão de competência, voltando as ações ao ponto inicial.
No momento, portanto, inexiste condenação pendente, vigorando a presunção de inocência prevista em nossa Constituição. O futuro dirá, após o trâmite das ações, o resultado final acerca da inocência ou não de Lula. Simples assim.
Seria melhor para a preservação da percepção da imparcialidade do Poder Judiciário, creio, deixar os meios de comunicação se expressarem da forma como entendem a questão, cabendo ao cidadão formar seu convencimento após o livre debate de todas as vertentes, buscando os canais que lhe passem credibilidade.
Impedir qualquer veículo de expor fatos, a ponto dos seus comentaristas e apresentadores receberem orientação jurídica para não usarem expressões sobre o candidato Lula, como "ex-presidiário" e "descondenado", fere o óbvio, o senso comum do cidadão que, há pouco tempo, inclusive, fez romarias para a porta da prisão no movimento "Vigília Lula Livre".
Ora, se ele não era presidiário, por qual motivo as pessoas se direcionavam à porta da prisão para exigir sua liberdade? Colegas aqui do meu tribunal, inclusive, encamparam tais romarias, chegando a responder a questionamentos das corregedorias em procedimentos que foram, corretamente, arquivados, pois a liberdade de expressão e manifestação do magistrado, que não configure prática de política partidária, são garantidas pela Loman.
O segundo ponto, que há anos debatemos internamente, são os limites da decisão judicial, que traz o problema do ativismo judicial.
Ativismo, aqui, sem nenhuma conotação política, muito menos político partidária, mas no sentido de como deve proceder o magistrado ao interpretar e aplicar a Constituição e as leis do país.
Como já defendi algumas vezes, e não estou sozinho neste debate, o Poder Judiciário, que não detém de legitimidade pelo voto, precisa se justificar pelo fundamento de suas decisões, exercendo sempre a autocontenção, atuando como o fiel da balança dos demais Poderes da República, sempre forte na defesa da Constituição. Saber os limites e gerar essa confiança para a sociedade. Daí a enorme crítica que o voto da ministra Carmem Lúcia está recebendo, com todas as vênias, quando justificou uma espécie de suspensão de valores consagrados na Carta Magna até o segundo turno das eleições, nos seguintes termos como publicado no jornal O Globo:
"— Não se pode permitir a volta de censura sobre qualquer argumento no Brasil. Este é um caso específico e que estamos na eminência de ter o segundo turno das eleições — ressaltou.
A ministra ainda destacou que, caso a decisão indique algum 'cerceamento à liberdade de expressão', a decisão deve ser revista.
— (...) Mas com esse cuidado de se imaginar que, o relator principalmente, que é quem dirige o processo, tiver qualquer tipo de informação do sentido de que isto desborda ou configura algum tipo de cerceamento à liberdade de expressão precisa de ser reformado, inclusive a liminar — pontuou."
A percepção da sociedade, como é notório, findou por gerar a sensação de retorno da nefasta prática da censura, há anos erradicada de nosso país, gerando medo na expressão do que se pensa, dificultando o trabalho de jornalistas e, portanto, afetando a própria democracia.
Não podemos perder a confiança no Poder Judiciário, nem querer, após as eleições, iniciar uma espécie de revanchismo quanto à magistratura, muito menos calar ou exonerar seus integrantes.
Precisamos aprender com tudo que está acontecendo. Como o ministro Luis Roberto Barroso nos ensina, em brilhante artigo, "o ativismo judicial, até aqui, tem sido parte da solução, e não do problema. Mas ele é um antibiótico poderoso, cujo uso deve ser eventual e controlado. Em dose excessiva, há risco de se morrer da cura. A expansão do Judiciário não deve desviar a atenção da real disfunção que aflige a democracia brasileira: a crise de representatividade, legitimidade e funcionalidade do Poder Legislativo. Precisamos de reforma política. E essa não pode ser feita por juízes".
Da minha parte, não tenho dúvidas, já chegamos na "dose" máxima do ativismo. Está na hora de recalcularmos a rota para, jamais, voltarmos a ter censura, temor ou qualquer tipo de perseguição ideológica em nosso país.
Quanto a mim, seja o que Deus quiser.
Otavio Torres Calvet é diretor da Escola da ABMT (Associação Brasileira de Magistrados do Trabalho).
Revista Consultor Jurídico, 25 de outubro de 2022, 8h00
Moraes determina remoção de postagens de Janones sobre Bolsonaro e Roberto Jefferson
Por Bela Megale / O GLOBO
O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Alexandre de Moraes, determinou que as postagens do deputado federal André Janones (Avante-MG) que relacionaram Bolsonaro ao ex-parlamentar Roberto Jefferson, preso ontem após lançar granadas e tiros contra policiais, sejam removidas.
Moraes acatou o pedido da defesa de Bolsonaro, que afirmou que as publicações de Janones eram irreais e descontextualizadas.
“O conteúdo veiculado nas postagens realizadas pelo representado, em 23/10/2022, se descolam da realidade, por meio de inverdades e suposições, fazendo uso de recortes e encadeamentos inexistentes, com o intuito de induzir o eleitorado negativamente, a crer que Roberto Jefferson seria o coordenador de campanha de Jair Messias Bolsonaro e que o candidato teria manifestado apoio aos atos criminosos cometidos na data de hoje”, escreveu o ministro.
Na representação levada ao TSE, a defesa da campanha de Bolsonaro alegou ainda que a vinculação feita por Janones “não passa de uma lastimável estratégia de indução de efeitos psicológicos negativos sobre o candidato à reeleição (Bolsonaro)”.
Em sua decisão, Moraes também determinou que Janones se abstenha de publicar novos posts com esses conteúdos sob risco de multa de R$ 100 mil.
Para quem o Supremo garantiu o direito à creche?
Graça é uma mãe que trabalha como faxineira diarista. Em um almoço, conversávamos sobre trabalho e família, e Graça desabafou que a grande limitação para conseguir um emprego estável era não ter alguém para ficar com sua filha pequena.
Perguntei se ela tinha tentado vaga em creche pública, ao que ela me respondeu: "Sim, no ano passado minha filha era número 20 da fila, mas neste ano ela foi para 60". Enquanto eu refletia sobre o enigma da fila que anda para trás, Graça emendou: "Acho que eu também vou procurar o Ministério Público". Ela já tinha entendido que quem pede vaga via Justiça tem prioridade.
Essa conversa me marcou. Primeiro, ficou muito concreto que decisões judiciais alocativas de recursos escassos possuem ganhadores e perdedores. Segundo, ficou claro que a decisão judicial foi normalizada como determinante para se receber uma vaga, prevalecendo sobre critérios como ordem de chegada ou vulnerabilidade social.
Lembrei dessa conversa ao estudar a recente decisão do Supremo Tribunal Federal que firmou a tese de que a educação infantil —que inclui creche e pré-escola —é um direito fundamental subjetivo e que indivíduos podem demandar judicialmente a oferta imediata de vaga pelo poder público.
Os ministros entenderam se tratar de uma escolha entre, de um lado, proteger as finanças públicas e, de outro, proteger o direito à educação. Colocada dessa maneira, a resposta é quase óbvia: pouca coisa é mais importante do que a educação de uma criança e a autonomia da mulher (que frequentemente é responsável por cuidar dos filhos), o que a creche proporciona.
Porém, como diz o ditado inglês: "a pergunta errada só pode gerar a resposta errada". A questão real não é se o acesso a creche é um direito fundamental de primeira importância ou se é um bom investimento público (claro que é), mas se ordens judiciais para obrigar a matrícula de uma criança são o meio adequado para promover esse direito.
A rigor, um município não precisa abrir mais vaga para atender uma decisão judicial: basta fazer a fila andar para trás, como Graça a duras penas aprendeu. Não é orçamento versus direitos, mas o direito de quem entra pela via judicial versus o mesmo direito de quem receberia a vaga se a fila seguisse seu curso.
Seria possível argumentar que ações individuais forçam o aumento do total de vagas. Porém, não houve esforço do STF em mostrar que essa judicialização realmente altera os incentivos e constrangimentos existentes para esse aumento. Mesmo se isso fosse demonstrado, existe ainda o ônus de justificar que aumentar vagas no longo prazo compensa a injustiça na sua distribuição hoje.
A decisão do Supremo tem importância simbólica e sinaliza para outros atores da sociedade. Porém, não basta que uma corte afirme princípios. Ela precisa considerar se a proteção do direito de quem chega à Justiça não prejudica a política pública que realiza o direito para a coletividade. Existe um ônus, que não foi satisfeito pelo STF, de justificar sua decisão a Graça e a outras pessoas que têm a concretização de seus direitos obstaculizada por decisões judiciais.
Campanha de Bolsonaro deve explorar imagem de perseguido pelo TSE
A campanha do presidente Jair Bolsonaro (PL) deve utilizar as decisões do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) sobre os direitos de resposta ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para reforçar a mensagem de que o mandatário é perseguido pela corte e tem sido alvo de censura.
De acordo com interlocutores, a mensagem deve ser explorada independentemente do resultado do julgamento do plenário virtual do TSE neste sábado (22), quando os direitos de resposta concedidos a Lula serão mantidos ou anulados. Isso porque aliados do presidente acreditam que os ministros da corte tendem a confirmar uma decisão pró-Lula.
Nos últimos dias, integrantes do TSE decidiram conceder direitos de resposta na TV às campanhas de Lula e Bolsonaro —sendo que o petista foi o maior beneficiado.
Se o plenário do TSE confirmar todas as decisões, a reta final da propaganda de rádio e TV será alterada.
Somados os blocos diários e das inserções de 30 segundos, o petista pode acumular cerca de 5 horas e o presidente, 2 horas.
Outras decisões que geraram críticas por suposta censura por parte de aliados de Bolsonaro são a que expandiu os poderes do TSE no combate a fake news e a que abriu investigação contra a rede Jovem Pan por suposto tratamento desigual a candidatos.
Auxiliares de Bolsonaro dizem que já contavam com uma possível avalanche de direitos de resposta por causa da agressividade de peças veiculadas nas últimas semanas. Consideram que valeu a pena correr o risco porque as inserções associando Lula à votação em presídios e à corrupção foram importantes para manter aceso o antipetismo no eleitorado cortejado por Bolsonaro.
Aliados já colocaram em prática a retórica de acusar o TSE de cometer censura. De acordo com eles, além de repercutir bem entre apoiadores mais ideológicos do bolsonarismo, esse argumento é efetivo em algumas parcelas de votantes em São Paulo, um dos principais focos da campanha.
O ministro da Secretaria-Geral, Luiz Eduardo Ramos, disse em seu Twitter: "Pelos últimos acontecimentos, não podemos admitir que a censura se instale no Brasil em pleno século 21".
"Nosso lado está impedido de divulgar fatos que foram noticiados, enquanto o outro lado alega ‘liberdade de expressão’ para caluniar, injuriar, difamar, ameaçar, incitar prática de discriminação, mentir, manipular... Nunca foi tão fácil escolher", afirmou João Henrique Nascimento de Freitas, assessor do gabinete pessoal de Bolsonaro.
Integrantes da campanha reconhecem que não é positivo perder o espaço na televisão para Lula na reta final, mas minimizam a capacidade do petista de virar votos com as inserções.
Em tese, Lula deverá responder apenas sobre temas relacionados aos pedidos de direito de resposta. Ou seja, ele deverá rebater em diversas inserções a declaração de que é o mais votado em presídios e as acusações de ser ladrão e corrupto.
O tema da corrupção, para integrantes da equipe de Bolsonaro, é o calcanhar de Aquiles de Lula. Para a campanha do atual presidente, ele não tem conseguido responder de forma satisfatória a provocações sobre o tema.
Segundo assessores de Bolsonaro, quem ainda não foi convencido da inocência de Lula dificilmente mudará de opinião nos últimos dias da campanha —o que reduz o potencial ofensivo dos direitos de resposta sobre esse assunto.
Na quinta-feira (20), Moraes anunciou uma reunião entre as equipes jurídicas de Lula e Bolsonaro para tentar alcançar um acordo no sentido de reduzir os ataques na última semana do pleito e adotar um tom mais propositivo. De acordo com interlocutores, o entendimento envolveria uma negociação entre as partes para que os pedidos de direitos de resposta fossem eventualmente retirados.
Um gesto nesse sentido foi descartado por Lula. "Hoje falei com o advogado, ele ia conversar com o Alexandre de Moraes. Houve uma proposta de acordo e eu disse que não tem acordo. Se nós ganhamos 184 [inserções] e perdemos 14. Ele que utilize os nossos 14 e nós utilizamos os 184 dele", declarou Lula.
Aliados do petista dizem que os direitos de resposta foram conquistados por causa de ataques disparados por Bolsonaro e que não há razão para abrir mão de um direito concedido pelo tribunal. Além do mais, eles dizem que o histórico de fake news criadas pela equipe do atual presidente dá pouca credibilidade a qualquer promessa por uma campanha menos agressiva.