Brasil chega pessimista a dia de tarifas de Trump e teme que aço seja taxado duas vezes
Sem avanço nas negociações com os Estados Unidos, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) chega pessimista ao dia do anúncio do tarifaço imposto pelo presidente Donald Trump, previsto para esta quarta-feira (2), às 17 h (de Brasília).
Com poucos sinais de Washington, o Brasil teme que a possível tarifa linear se some a outras taxas já em vigor, como as aplicadas recentemente sobre o aço e o alumínio, gerando um efeito cumulativo.
Produtos semiacabados de aço, como blocos e placas, estão entre os principais itens exportados pelo Brasil aos EUA, ao lado de petróleo bruto, produtos semiacabados de ferro e aeronaves. Segundo dados do governo americano, o Brasil está entre os três maiores fornecedores de aço ao país (ao lado de México e Canadá), com US$ 2,66 bilhões vendidos no ano passado.
Recentemente, Trump também anunciou tarifas sobre automóveis importados, medida que pode impactar o setor de autopeças nacional. Em 2024, o Brasil exportou cerca de US$ 1,3 bilhão em componentes do tipo para os Estados Unidos.
Nas últimas semanas, o Palácio do Planalto começou a trabalhar com a expectativa de um quadro mais extremo do que o inicialmente previsto. Além das já anunciadas taxas sobre aço e alumínio, o governo admitiu a possibilidade de ser afetado por um imposto linear sobre praticamente toda a pauta exportadora brasileira para os EUA.
Um integrante da Casa Branca confirmou essa expectativa ao dizer na semana passada que, se o Brasil for incluído na lista dos países alvo, as tarifas serão lineares e aplicadas a todos os bens.
Segundo um membro do governo brasileiro, não será surpresa se a medida anunciada pelos americanos for "a pior" possível para o Brasil. Essa pessoa admite que é alto o risco de o Brasil estar entre os países mais afetados pelo tarifaço, apesar dos esforços diplomáticos para esclarecer pontos da relação comercial. Entre esses pontos estão a tarifa efetiva média sobre produtos importados dos EUA e o fato de a balança comercial ser historicamente favorável aos americanos.
Na Esplanada, há a avaliação de que documentos e declarações da administração Trump sugerem que os EUA consideram o Brasil problemático devido à discrepância tarifária e demais barreiras não tarifárias.
Documento divulgado nesta segunda (31) pelo USTR (Escritório do Representante de Comércio dos EUA) apontou que o Brasil impõe tarifas de importação relativamente altas a uma vasta gama de setores, como automóveis e suas peças, tecnologia da informação e eletrônicos, produtos químicos, plásticos, maquinário industrial, aço, têxteis e vestuário.
Para dois membros do governo, o esforço feito em Washington na última semana focou principalmente na negociação de cotas para as tarifas aplicadas sobre aço e alumínio. Isso porque, como o governo não sabe quais sobretaxas "recíprocas" serão aplicadas ao país, não havia o que negociar.
Integrantes da administração Lula estão em um momento de extrema imprevisibilidade às vésperas do anúncio. A conversa que o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, teria nesta segunda com o chefe do USTR, Jamieson Greer, acabou cancelada. Por ora, não há perspectivas de nova reunião.
Por causa dessa incerteza, funcionários do governo dizem que o governo só saberá, de fato, o que vai enfrentar após o anúncio nesta quarta.
Outra dificuldade externada por interlocutores é o fato de que as decisões estão concentradas em Trump, que tem um método agressivo e caótico de negociação. Isso amplia os desafios pela falta de poder de decisão dos auxiliares do presidente com quem o governo brasileiro vem conversando.
Um funcionário da Casa Branca afirmou não ser possível cravar a decisão até a divulgação do detalhamento da medida.
Segundo jornais americanos, Trump tinha sobre a mesa na manhã de terça ao menos dois cenários. Em um, aplicaria uma tarifa universal fixa de 20% a todos os países. Em outro, definiria taxas diferentes para cada nação a depender das barreiras impostas aos Estados Unidos por cada um.
Na segunda, o presidente afirmou em entrevista a jornalistas que os EUA seriam "muito gentis, relativamente falando" em relação a algumas nações.
No domingo (30), Peter Navarro, um dos principais conselheiros para comércio externo do republicano, disse à Fox News que os EUA poderiam arrecadar US$ 6 trilhões com as novas sobretaxas. Segundo jornais americanos, o cálculo ecoaria a conta feita caso Trump opte pela tarifa universal.
Nesse cenário, o Brasil vem trabalhando no ambiente doméstico para a criação de um arcabouço legal que permita ao país responder de forma mais rápida caso seja submetido a medidas protecionistas que gerem impacto no comércio internacional.
Como mostrou a Folha, o país tem hoje um conjunto limitado de normas jurídicas para reagir imediatamente à imposição de tarifas.
Cientes do dano que a medida anunciada por Trump poderá causar, o governo Lula e a bancada ruralista se uniram no Senado pela aprovação, de forma unânime, do PL (projeto de lei) que impõe a reciprocidade de regras ambiental e comercial nas relações do Brasil com outros países. Foram 16 votos a favor e nenhum contra na CAE (Comissão de Assuntos Econômicos). Agora, o texto será analisado pela Câmara dos Deputados.
Ceará tem 59 obras do PAC Educação com pendências de documentação junto ao Governo Federal; veja municípios impactados
Um quantitativo de 59 obras de creches e escolas de educação infantil e escolas em tempo integral a serem construídas por prefeituras cearenses, em parceria com o Governo Federal por meio do Novo Programa de Aceleração do Crescimento (Novo PAC), estão com pendências na documentação. O número foi informado pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) ao Diário do Nordeste na quinta-feira (27).
Ao que indicou o FNDE, numa lista enviada à reportagem, constam nesta condição gestões que tiveram as propostas analisadas e foram identificadas pendências, e também as que não enviaram documentação para análise.
Foram apontadas obras das seguintes prefeituras: Pires Ferreira, Tamboril, Itatira, Varjota, Moraújo, Canindé, Iguatu, Pacoti, Apuiarés, Cascavel, Ararendá, Morrinhos, Martinópole, Barbalha, Itaitinga, Independência, Senador Pompeu, Pentencoste, Madalena, Crato, Pindoretama, Ibaretama, Alto Santo, Ipaporanga, Jati, Beberibe, Ipueiras, Orós, Poranga, Milagres, Tianguá, Morada Nova, Aracoiaba, Massapê, Saboeiro, Paracuru, Marco, Cariús, Aratuba, Barreira, Itarema, Maranguape, Amontada, Maracanaú, Miraíma, Paraipaba, Mombaça, Nova Olinda, São Luís do Curu, Jaguaruana, Ibicutinga, Barroquinha, Croatá, Ubajara e Guaraciaba do Norte.
Segundo o órgão federal vinculado ao Ministério da Educação (MEC), as obras relacionadas com pendências fazem parte de um pacote de ações anunciadas em março do ano passado. Os documentos precisam ser apresentados para que os processos licitatórios sejam seguidos e as obras selecionadas pelo programa de investimentos possam ser iniciadas.
As obras que não superarem a fase serão canceladas. Além disso, as gestões que não cumprirem os requisitos poderão enfrentar restrições na submissão de propostas nas próximas edições do Novo PAC.
O Ceará é o estado com mais ocorrências do tipo. Além dele, são destaques o Rio Grande do Norte (com 46 obras), Pernambuco (com 44 obras), Pará (com 44 obras), São Paulo (com 41 obras), Bahia (com 41 obras) e Minas Gerais (com 39 obras). Em todo o Brasil, até esta quinta, 611 obras de creches e 685 de escolas de tempo integral selecionadas ainda estavam com pendências ou sem documentação enviada.
Ao que destacou a divisão do Governo Federal, a quantidade de obras enquadradas nesta relação muda diariamente, conforme as demandas são resolvidas pelos entes. O prazo de regularização vai até 30 de abril. E, de acordo com o FNDE, uma ação para auxiliar as administrações públicas com dificuldades para atender aos requisitos técnicos foi intensificada.
Entre a próxima terça-feira (1º) e a quinta-feira (3), a autarquia irá realizar uma série de eventos virtuais para orientar os gestores na resolução dos problemas — as inscrições devem ser realizadas por meio de um formulário disponibilizado pelo FNDE.
No início de março, a Confederação Nacional de Municípios (CNM) emitiu um alerta para os municípios verificarem a situação das propostas cadastradas na plataforma usada pelo governo para obras na área da educação.
“Os ajustes para garantir o cumprimento da pactuação devem ser realizados até 30 de abril, que é o prazo limite de vencimento da cláusula suspensiva”, frisou a entidade no comunicado.
O que disseram as prefeituras
Contatada, a Prefeitura de Maranguape esclareceu que as pendências indicadas dizem respeito a dois equipamentos selecionados pelo Novo PAC Educação, uma creche e uma escola em tempo integral. E que, após análise dos terrenos, foi observada a necessidade de adaptações nos projetos básicos apresentados.
“A mudança proposta, baseada em critérios técnicos e nas normas de engenharia, visa garantir a segurança, a confiabilidade, a durabilidade e a viabilidade da obra. A implementação das alterações propostas é fundamental para o sucesso do empreendimento e para proporcionar um ambiente seguro e adequado para as crianças”, escreveu.
Conforme a gestão de Maranguape, toda a documentação solicitada será protocolada na primeira quinzena de abril, para normalizar a situação com o Governo Federal.
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A problemática é parecida com a que foi apontada pelo município de Varjota. “Durante a fase de elaboração do projeto executivo, foram identificadas necessidades de adequações técnicas ao padrão estabelecido pelo FNDE, a fim de assegurar a viabilidade da obra em nosso território”, justificou o governo varjotense em nota.
O texto enviado pela Prefeitura de Varjota frisou que “tem adotado todas as medidas necessárias para a regularização da cláusula suspensiva que condiciona a continuidade do projeto”. As modificações necessárias, segundo a prefeitura, foram realizadas pela equipe técnica e já estão sendo analisadas pela Caixa Econômica Federal.
Já a Secretaria de Educação de Nova Olinda, na região do Cariri, negou que tivesse pendências de obras com o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação.
O Diário do Nordeste acionou todas as prefeituras citadas, através dos meios de contato disponibilizados em seus canais oficiais, a fim de buscar informações sobre as ocorrências. O espaço está aberto e o conteúdo será atualizado caso haja alguma manifestação.
Assistência, saúde e religião: a operação por trás da retirada de 100 pessoas em situação crítica de viaduto no Papicu
Desde o último sábado (29), quem passa pelo viaduto do Papicu percebe uma mudança significativa do cenário urbano. Naquele local, em situação degradante, viviam mais de 100 pessoas que foram removidas para estruturas de acolhimento e atendimento da Prefeitura de Fortaleza. A ação, sem resistência, foi concluída no sábado, mas durou mais de três semanas, apurou esta coluna.
Servidores e técnicos da gestão municipal fizeram um trabalho de retaguarda com atendimento psicológico, assistência social e equipes de saúde, além do apoio de lideranças religiosas.
A principal ação ocorreu sob o viaduto da Avenida Farias Brito, no bairro Papicu, área que dá acesso à Avenida Dom Luís. Também houve intervenções semelhantes em viadutos das avenidas Antônio Sales e Santos Dumont com Engenheiro Santana Júnior.
O trabalho incluiu consultas médicas, atendimentos de urgência com presença de equipes do Samu e encaminhamentos para abrigos, unidades de reabilitação para casos de si de drogas e Centros de Atenção Psicossocial (Caps). Os acolhidos também tiveram acesso a serviços como emissão de documentos e assistência básica.
Evandro diz que operação teve êxito
Em contato com esta Coluna, o prefeito de Fortaleza, Evandro Leitão, classificou a operação como bem-sucedida. Ele afirmou que outras regiões da cidade também estão recebendo ações semelhantes, com foco na população em situação de rua.
A gestão avalia repetir o modelo em áreas com concentração de pessoas em vulnerabilidade social e vivendo em territórios marcados por ocupações precárias.
Lula protela reforma, e ministros viram ‘zumbis’, com eventos cancelados e ausência em viagens; veja quem está na fritura
Por Jeniffer Gularte / O GLOBO
A indefinição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva sobre novas alterações na equipe tem causado desgaste a ministros, que sofrem com a fritura após seus nomes figurarem na lista de possíveis demissões. Aliados do petista avaliam que o presidente, ao protelar a continuidade da reforma ministerial, deixou parte dos auxiliares como “zumbis” em seus postos. O cenário inclui eventos desmarcados, ausência em viagens e lançamentos de programas adiados.
Um dos que estão nessa situação é o ministro Márcio Macêdo, da Secretaria-Geral da Presidência, pasta alvo de cobiça de setores do PT. O cargo é considerado estratégico por fazer parte da chamada “cozinha” do Palácio do Planalto, formada pelos ministérios que ficam localizados na sede do Executivo, com acesso direto ao gabinete presidencial. Após a saída de Alexandre Padilha (Secretaria de Relações Institucionais) e de Paulo Pimenta (Secretaria de Comunicação Social), que também integravam esse seleto grupo, a demissão de Macêdo passou a ser dada como certa por integrantes do governo.
Macêdo é considerado um ministro apagado e sem protagonismo por alas do governo, que defendem usar a Secretaria-Geral como uma espécie de motor político da gestão. A pasta é responsável pela relação do governo com a sociedade civil e movimentos sociais. Esses grupos comentam que o ministro foi “esquecido” por Lula e chamam atenção para o fato de ele não viajar mais com o presidente, além de ter poucas reuniões com o chefe, mesmo despachando diariamente no 4º andar do Planalto, um acima do gabinete presidencial. Segundo registros das agendas oficiais, não houve nem uma reunião sequer entre os dois neste ano. No mesmo período de 2024, foram cinco compromissos.
Fora de viagens
Além disso, no início de março Lula foi a Minas Gerais participar de um evento com o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Macêdo não foi chamado. Duas semanas depois, o presidente fez um tour por estados do Nordeste, região do ministro, que é de Sergipe, mas novamente não levou o auxiliar. Aliados do ministro argumentam que nenhuma das viagens dizia respeito à Secretaria-Geral. Em relação às reuniões no Planalto, afirmam que nem sempre as conversas com o presidente ficam registradas na agenda oficial dos dois. Procurado, Macêdo não comentou.
No caso da ministra Cida Gonçalves, das Mulheres, o gabinete presidencial havia indicado à sua equipe que Lula participaria com ela de um evento alusivo ao Dia Internacional da Mulher no qual seriam anunciadas políticas públicas voltadas ao segmento. A pasta chegou a mudar a data do evento para se adequar à agenda do presidente. Porém, dias depois, a participação de Lula foi cancelada, o evento suspenso, e os anúncios previstos até hoje não foram feitos.
Este foi o primeiro ano do atual mandato em que Lula não se envolveu diretamente nos eventos alusivos ao Dia da Mulher, como fez em 2023 e 2024. As ações da data mais importante para a pasta acabaram reduzidas a uma campanha contra o feminicídio, realizada na Marques de Sapucaí, no Rio. O episódio causou desânimo em integrantes da equipe de Cida, que admitem, sob reserva, a sensação de que a demissão da ministra pode ocorrer a qualquer momento.
Outro sinal visto como “desprestígio” dentro da pasta foi a desistência da primeira-dama, Janja da Silva, de ir a Nova York ao lado da ministra para a 69ª sessão da Comissão sobre a Situação da Mulher (CSW), evento ligado à Organização das Nações Unidas (ONU). As equipes de Cida e Janja vinham se reunindo para preparar a participação do Brasil no evento e já estava tudo combinado para a viagem, quando assessores da primeira-dama avisaram que ela não iria mais. Não houve justificativa.
Decisões de longo prazo, como a contratação de pessoas para cargos de confiança que estão vagos, estão em compasso de espera devido à possibilidade de saída da ministra. A exemplo de Macêdo, Cida também não teve nenhum despacho com Lula neste ano, a não ser na reunião ministerial de 20 de janeiro. Nos primeiros dois anos do governo, ela foi recebida nove vezes por Lula. Também procurada, a titular da pasta das Mulheres não quis se manifestar.
Outro que está na corda bamba, o ministro do Desenvolvimento Agrário, Paulo Teixeira, vive um cenário diferente. Diante da crise causada pela alta no preço dos alimentos, ele participou de reuniões com o presidente ao longo do mês, quando foi um dos mais cobrados por Lula. Ele enfrenta resistências dentro do MST, que cobra um número maior de assentados, e disputa pelo cargo dentro do PT.
Teixeira também é cobrado pela gestão da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), que, na visão de alas do governo, não investiu o suficiente em estoques reguladores que poderiam ter sido usados para minimizar os efeitos da inflação. O preço dos itens nos supermercados é um dos fatores que afetaram diretamente a popularidade de Lula.
Sinal de fôlego
Uma agenda do ministro ao lado de Lula em Minas, no começo de março, foi vista por seu entorno como um sinal de fôlego. Além disso, a leve queda no preço de alguns alimentos, como carne, arroz e ovo, foi comemorada pela equipe do ministro como resultado das políticas da pasta.
Teixeira chegou ao comando do Ministério do Desenvolvimento Agrário pelas mãos de Gleisi Hoffmann, então presidente do PT, que durante a transição de governo quis contemplar a corrente do ministro, a Resistência Socialista. O movimento ocorreu em troca do apoio que Teixeira deu a Gleisi em sua reeleição à presidência do partido em 2019. Procurado, o ministro não quis se manifestar.
Tanto aliados de Teixeira quanto de Macêdo nutrem esperança de que o presidente já tenha encerrado as mudanças no primeiro escalão. Um dos principais argumentos é que, a um ano da desincompatibilização para aqueles que irão concorrer nas eleições de 2026, os novos ministros teriam pouco tempo para criar uma marca no cargo.
Outra ala, no entanto, assegura que Lula findará as trocas no retorno da viagem à Ásia, nesta semana. Esse grupo vê a demora do presidente em definir as alterações de ministros petistas como consequência da intenção do presidente de atrelá-las à sucessão no PT, em que seu candidato, Edinho Silva, enfrenta resistências.
Na corda bamba
Márcio Macêdo
Ministro da Secretaria-Geral não viaja mais com o presidente e tem poucas reuniões com Lula, mesmo despachando no Planalto. Segundo registros das agendas oficiais, não houve nenhuma reunião entre os dois neste ano. No mesmo período de 2024, foram cinco compromissos.
Cida Gonçalves
Lula cancelou participação em evento alusivo ao Dia Internacional da Mulher. Com isso, a cerimônia foi suspensa, e os anúncios previstos até hoje não foram feitos. Janja também cancelou, sem justificativa, ida a Nova York com a ministra das Mulheres para evento ligado à ONU.
Paulo Teixeira
Apesar de cotado para cair na reforma, o ministro do Desenvolvimento Agrário participou de reuniões com Lula devido à crise causada pela alta no preço dos alimentos. Uma agenda ao lado do presidente em Minas, no início de março, foi vista por seu entorno como um sinal de sobrevida.
Primeiras trocas
Paulo Pimenta
Titular da Secom deixou o cargo no início de janeiro, após reclamações públicas de Lula sobre a comunicação do governo. Ele foi substituído pelo marqueteiro Sidônio Palmeira, que fez a campanha de Lula em 2022 e tem como principal missão reverter a queda de popularidade do presidente.
Lula demitiu a ministra da Saúde em fevereiro após demonstrar insatisfação com a falta de resultados. O posto foi ocupado por Alexandre Padilha, que era responsável pela articulação política do governo e foi titular da pasta durante o governo de Dilma Rousseff.
Promessa descumprida
Por Notas & Informações / O ESTADÃO DE SP
Pelo segundo ano consecutivo, o Brasil corre o risco de não ter acesso a dados de alfabetização no Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb), principal avaliação usada para mensurar a qualidade da nossa educação básica. É uma lacuna grave para um governo que anunciou, com pompa e circunstância, que alfabetizar crianças é uma prioridade nacional.
Um ofício do Inep, órgão do Ministério da Educação (MEC) responsável pelas avaliações, indica que, neste ano, publicará somente os microdados referentes aos exames do 5.º e 9.º anos do ensino fundamental, e também do 3.º ano do ensino médio de Português e Matemática, ocultando os resultados das provas aplicadas para alunos do 2.º ano do fundamental, que avaliam níveis de alfabetização. O ofício, assinado pelo presidente do Inep, Manuel Palácios, e endereçado à diretora de Avaliação da Educação Básica do órgão, Hilda Aparecida Linhares da Silva, foi divulgado pelo jornal Folha de S.Paulo.
Até aqui o MEC não desmentiu nem o ofício nem a recomendação do Inep. Entre os técnicos há o argumento de que existem diferenças entre os resultados do Saeb e o indicador “Criança Alfabetizada”, criado pelo atual governo. Em maio, quando o novo indicador foi divulgado, o MEC e o presidente Lula da Silva celebraram o fato de que o Brasil atingiu, no ano passado, a marca de 56% de crianças alfabetizadas na idade adequada, recuperando o desempenho anterior à pandemia de covid-19, meta estabelecida pelo ministério por meio do Programa Compromisso Nacional Criança Alfabetizada. O novo indicador mostrou um resultado 20 pontos porcentuais maior do que o desempenho exibido no Saeb de 2021, e 1 ponto porcentual acima da avaliação de 2019.
Embora não haja qualquer razão para acreditar que a gestão do ministro Camilo Santana tenha decidido esconder resultados de uma avaliação já aplicada por algum motivo pouco republicano, não é bom sinal o recuo na promessa de divulgá-los. O compromisso foi anunciado também no ano passado, quando o MEC resolveu fatiar o anúncio do Saeb. À época, o ministério tornou conhecido o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) de 2023, indicador composto pelo desempenho dos alunos no Saeb e pelas taxas de aprovação escolar. Antes disso, o governo mostrou o novo indicador de alfabetização, a partir de avaliações feitas em 2023 pelas redes estaduais. O próprio ministro sublinhou então que eram metodologias distintas.
De fato são, mas nenhuma diferença, seja de resultado, seja de método, justifica a ocultação de dados específicos que se mostram úteis para mapear a alfabetização das crianças. Embora não seja calculado o Ideb para o 2.º ano do ensino fundamental, alunos dessa série fazem a prova do Saeb e seus resultados refletem a alfabetização das crianças com cerca de sete anos de idade. Não há razão para ocultar qualquer dado, mesmo à guisa de aperfeiçoamento ou ajuste na qualificação das análises. Sobretudo quando mostra o nível de aprendizado dos alunos em Português e Matemática numa etapa especialmente importante da jornada de sua formação.
Pé-de-Meia: cidades de Bahia, Pará e MG têm mais gente recebendo benefício
Por André Shalders / O ESTADÃO DE SP
BRASÍLIA – Uma das principais apostas do terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o Programa Pé-de-Meia tem mais beneficiários do que alunos matriculados na rede pública em pelo menos três cidades, localizadas na Bahia, no Pará e em Minas Gerais. O programa também chega a contemplar mais de 90% dos alunos de ensino médio em pelo menos 15 cidades de cinco Estados. Além disso, há casos de beneficiários que aparentam ter renda acima da permitida pela regra do programa que paga bolsa para alunos mais carentes. Procurado, o MEC afirmou que a responsabilidade pelas informações prestadas é das Secretarias estaduais de Educação. A pasta disse ainda que trabalha com os Estados para corrigir eventuais problemas.
Em Riacho de Santana (BA), cidade de 35 mil habitantes localizada a cerca de 500 quilômetros de Salvador, a parcela do Pé-de-Meia de fevereiro foi paga a 1.231 pessoas, segundo dados divulgados pelo MEC. No entanto, segundo o que a direção do único colégio público que atende ao ensino médio na cidade disse ao Estadão, por telefone, há no momento 1.024 alunos matriculados. Procurada, a Secretaria de Educação do Estado da Bahia disse que seriam 1.677 alunos. Já o MEC fala em 1.860 no Colégio Estadual Sinésio Costa, que conta com 15 salas de aula.
O benefício foi pago no município baiano a 456 estudantes menores de 18 anos, inscritos no ensino regular; e 775 maiores, que cursam o ensino médio na modalidade de Educação de Jovens e Adultos (EJA). Ao todo, os pagamentos em Riacho de Santana somam R$ 1,75 milhão em fevereiro. Segundo o Estadão apurou, a maioria dos problemas e pagamentos indevidos do Pé-de-Meia ocorre na modalidade EJA.
O cenário se repete na cidade de Porto de Moz (PA), cidade de 41 mil habitantes às margens do Rio Xingu, no norte do Pará. São 1.687 beneficiários do Pé-de-Meia, que receberam R$ 2,75 milhões em fevereiro, de acordo com os dados do MEC. Segundo os diretores das duas escolas estaduais da cidade, há 1.382 alunos matriculados, ou seja, menos que o número de recebedores do Pé-de-Meia. Procurado, o MEC fala em 3.105 alunos de ensino médio na cidade, mais que o dobro do observado pelos diretores.
Pé-de-Meia:cidades na Bahia, Pará e Minas tem mais gente ganhando benefício do que aluno matriculado
Em Natalândia (MG), os dados do MEC para o mês de fevereiro registram 326 beneficiários do Pé-de-Meia. Mas, segundo a direção da escola estadual da cidade, são 317 alunos de ensino médio matriculados atualmente. Já o MEC fala em 600 estudantes na Escola Estadual Alvarenga Peixoto, que tem apenas sete salas de aula.
Há outras cidades nas quais o número de beneficiários do Pé-de-Meia em fevereiro passa de 90% dos alunos matriculados. Em Quixabá (PB), são 66 beneficiários do Pé-de-Meia em fevereiro, e 67 alunos matriculados – ou seja, só um a menos. Em Alcântara (MA), cidade que abriga o Centro Espacial de mesmo nome, são 833 beneficiários do Pé-de-Meia e 839 alunos do ensino médio: só seis a menos. Os dados atualizados de matrículas foram fornecidos pelas Secretarias de Educação desses Estados por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI).
O MEC afirmou que a cobertura quase integral do Pé-de-Meia nesses casos se deve ao perfil socioeconômico dos municípios. O Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDH-M) de Quixabá era de 0,622 em 2010, na última vez que o índice foi calculado para o município. O valor é considerado “médio” e põe Quixaba em 30º lugar no ranking do Estado, composto por 223 municipalidades – a média do Estado foi de 0,587. Já Alcântara (MA) aparece no meio do ranking de IDH dos municípios maranhenses. Em 2010, o IDH da cidade era de 0,573 – a média do Estado era de 0,576. Alcântara tinha então o 106º melhor índice dos 217 municípios maranhenses.
Em alguns casos, as Secretarias de Educação estaduais enviam dados errados ao MEC. Na base de registros do Pé-de-Meia para fevereiro, a cidade de Elísio Medrado (BA) aparece com 742 beneficiários do Pé-de-Meia – mas, segundo a direção do colégio estadual da cidade, são só 355 estudantes matriculados, menos da metade. Questionado pela reportagem, o MEC disse inicialmente que a cidade teria 1.145 alunos de ensino médio.
O número é pouco factível: significaria que um em cada oito moradores do município estaria matriculado. Mais tarde, o ministério constatou um erro da Secretaria de Educação baiana, que juntou os alunos de Elísio Medrado com os de Cocos (BA).
Na verdade, Elísio Medrado tem 390 alunos e 224 beneficiários do Pé-de-Meia, diz o MEC. “Os números de 2024 tinham estudantes de Elísio e Cocos registrados em Elísio Medrado. Em função disso, os dados da planilha disponível no portal serão atualizados com as informações retificadas pela rede na próxima janela de correção, prevista em lei”, disse a pasta.
Descumprimento do critério de renda
Nessas cidades, também há descumprimento do critério de renda para receber o benefício. O Estadão encontrou servidoras das prefeituras com rendimentos líquidos de mais de R$ 5 mil mensais listados como responsáveis por jovens que receberam o Pé-de-Meia. De acordo com as regras do programa, o benefício só pode ser pago a jovens de famílias com renda mensal de até meio salário mínimo (R$ 759) por pessoa.
Nos dados divulgados pelo MEC, uma das pessoas listadas é Amélia de Souza Oliveira – ela aparece como responsável por um estudante de menos de 18 anos que recebeu R$ 1 mil do Pé-de-Meia em fevereiro. No entanto, Amélia é professora da rede municipal em Riacho de Santana desde 2019, com salário líquido de cerca de R$ 4,3 mil. Além disso, ela é dona de uma pequena farmácia no centro da cidade baiana, chamada Posto de Medicamentos Santa Clara. Ao Estadão, Amélia confirmou ser mãe de um jovem que recebe o Pé-de-Meia, mas disse que seu filho já é maior de idade, e cursa a etapa na modalidade EJA.
Na mesma cidade, também figura como responsável por um jovem menor de 18 anos a professora Nelma de Oliveira Silva Rocha – o aluno recebeu R$ 1 mil em fevereiro. O salário líquido de Nelma é de cerca de R$ 3,8 mil, e não há indicação de que ela tenha recebido o Bolsa Família ou outro programa social, como o Pé-de-Meia exige. O Estadão não conseguiu contato com Nelma.
Na cidade de Porto de Moz, há casos de professoras do ensino fundamental listadas como responsáveis por alunos de menos de 18 anos que receberam o Pé-de-Meia em fevereiro. Uma delas é Ana Claudia Oliveira de Abreu, professora com carga horária de 20 horas semanais e que recebeu R$ 5,3 mil em fevereiro. Outro caso similar é o de Ana Paula do Socorro Pontes Filho, que teve ganhos líquidos de R$ 5,9 mil. No total, são quatro professoras com ganhos líquidos acima de R$ 5 mil na lista do programa.
As professoras foram contratadas no começo deste ano e eram beneficiárias do Bolsa Família até recentemente – o que sugere que eram pessoas de baixa renda. Segundo o Estadão apurou, a exclusão de pessoas que têm um aumento de renda do Cadastro Único (CadÚnico) pode levar vários meses. Enquanto isso não ocorre, os beneficiários continuam recebendo, mesmo sem se enquadrar nos critérios do programa. A reportagem procurou a prefeitura de Porto de Moz para comentários sobre a situação das professoras, mas não houve resposta.
Onde estão os beneficiários do Pé-de-Meia
O Pé-de-Meia é um programa educacional criado pelo governo Lula com o objetivo de diminuir a evasão escolar no ensino médio e aumentar o percentual de pessoas que concluem essa etapa de ensino. Os participantes precisam estar matriculados na rede pública; terem renda familiar de até R$ 759 por pessoa; e irem a pelo menos 80% das aulas no mês.
Em fevereiro deste ano, o benefício foi pago a mais de 4 milhões de estudantes em todo o País. Como mostrou o Estadão, as regiões Norte e Nordeste são as mais impactadas pela medida, o que significa que o mapa do Pé-de-Meia coincide com o dos votos de Lula na eleição de 2022. Se guardar todo o dinheiro recebido ao longo do ensino médio, o estudante pode juntar até R$ 9,2 mil. O custo anual do programa é estimado em R$ 12,5 bilhões.
Para esta reportagem, o Estadão cruzou dados dos beneficiários do Pé-de-Meia em fevereiro deste ano, publicados pelo MEC, com informações do Censo Escolar de 2023. A partir do cruzamento das informações, foram identificadas 81 cidades no País todo onde o número de beneficiários era pelo menos 20% maior que o de alunos.
A reportagem passou, então, a contatar as escolas para tentar descobrir o número atual de estudantes. Os dados atualizados de matrículas nessas cidades também foram pedidos via Lei de Acesso à Informação (LAI) para as Secretarias estaduais de Educação.
Ao longo do ensino médio, o estudante recebe vários pagamentos do Pé-de-Meia. Há bolsas mensais de R$ 200, que podem ser sacadas a qualquer momento; e um incentivo de R$ 1 mil ao fim de cada ano letivo, que só pode ser sacado ao fim do terceiro ano. Há também pagamentos para quem participar do Enem. O estudante não precisa se inscrever para receber: basta estar matriculado e pertencer a uma família que faça parte do CadÚnico.
Segundo a professora do Insper Laura Müller Machado, é preciso melhorar o Cadastro Único, que serve de base para o pagamento dos benefícios sociais do governo federal. “O pesquisador e ganhador do Prêmio Nobel (de Economia, o indiano) Abhijit Banerjee diz que o maior problema social hoje é ter boas estratégias para ter bons cadastros únicos. Não só no Brasil, mas no mundo todo”, afirmou. “O pobre é subnotificado, e a gente não vai conseguir falar com ele sem ter um cadastro de qualidade. Existem hoje estratégias para melhorar esses cadastros. Dificilmente ele será perfeito, mas pode ser melhor”, disse.
Além de diminuir a evasão escolar, o MEC também espera, com o Pé-de-Meia, levar as Secretarias de Educação estaduais a modernizarem – e padronizarem – a forma como fazem o registro de frequência nas escolas. Há ainda relatos de diminuição das faltas dos próprios professores, que passam a ser cobrados por alunos interessados em obter a frequência mínima de 80% necessária para continuar recebendo os pagamentos.
Para Gabriel Corrêa, diretor de políticas públicas da ONG Todos Pela Educação, o Pé-de-Meia aponta na direção certa ao atacar a evasão no ensino médio – experiências locais no Brasil e em outros países mostram que esse tipo de pagamento costuma surtir efeito. No entanto, segundo ele, o MEC falha em implementar outras ações que também são necessárias para melhorar o ensino médio e reduzir a evasão, e que deveriam acompanhar o Pé-de-Meia. Ele cita aprimorar o espaço físico das escolas e ampliar a oferta de vagas em tempo integral como exemplos.
Segundo Corrêa, o Pé-de-Meia é atualmente o programa mais caro do Orçamento do MEC. “O programa ficou muito amplo, e muito caro. A evasão hoje é de 4% a 5% ao ano no ensino médio. Hoje, pagamos o Pé-de-Meia para mais de um terço dos estudantes. Será que está sendo efetivo? Será que está realmente chegando ao jovem que precisa?”, questionou.
“Agora, o governo federal vai ter de colocar o Pé-de-Meia no orçamento do MEC, e vai ocupar uma parcela importante desse orçamento. Sendo que existem vários outros desafios, na educação básica, que precisam ser superados para reduzir a evasão e aumentar a aprendizagem no ensino médio”, acrescentou.
MEC diz apoiar redes estaduais e monitorar programa
Em nota enviada ao Estadão, o Ministério da Educação informou que, de acordo com a lei que criou o Pé-de-Meia, a responsabilidade pelas informações dos estudantes aptos a receber os pagamentos é dos Estados. Mesmo assim, a pasta disse apoiar as redes estaduais e também monitorar possíveis erros no programa.
”Apesar de a responsabilidade pela transmissão dos dados ser dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios, o Ministério da Educação (MEC) oferece apoio técnico a todas as redes por meio de documentos, formações e canais de ouvidoria. Além disso, o MEC monitora e sinaliza às redes possíveis inconsistências encontradas nos dados enviados, permitindo que realizem correções e ajustes conforme previsto nos normativos do programa”, disse a pasta.
“Quanto ao apontamento relacionado ao alto percentual de estudantes beneficiados pelo programa em uma rede de ensino, como a proporção de 97% mencionada por você, esse fato pode ocorrer considerando o contexto socioeconômico dos municípios”, acrescentou o MEC.
“Por fim, este Ministério reitera seu compromisso com as melhores práticas de transparência ativa, em cumprimento ao artigo 16 da Lei nº 14.818/2024 (lei que criou o programa), e reforça seu compromisso com a visibilidade das ações do Pé-de-Meia”, concluiu a pasta.
Governo Lula dá presente a parlamentares para promover Pé-de-Meia e não diz quanto gastou
Por Eduardo Barretto / O ESTADÃO DE SP
O governo Lula não informou quanto gastou para enviar de presente a deputados e senadores, esta semana, pares de meias na divulgação do programa Pé-de-Meia. Procurado pela Coluna do Estadão, o Ministério da Educação disse, genericamente, que o gasto faz parte das “ações de lançamento do programa”, e também envolve recursos da Caixa.
Além das meias com a marca do programa, o material trazia uma página com o slogan do governo federal e agradecia aos parlamentares pela aprovação do Pé-de-Meia, “uma conquista que não seria possível sem a participação dos parlamentares”. O documento também classificou o programa de uma “ação extraordinária”.
O Pé-de-Meia é uma bolsa paga a estudantes do ensino médio para incentivar a permanência dos jovens nos estudos. Em janeiro, o Tribunal de Contas da União (TCU) bloqueou R$ 10 bilhões do programa, por estarem fora do Orçamento. No último dia 12, o TCU liberou os pagamentos e deu 120 dias para o governo regularizar a verba.
Procurado, o Ministério da Educação afirmou que o material enviado aos parlamentares seguiu “as políticas internas e as regras de utilização de recursos para esse fim” e foi custeado com recursos da pasta e da Caixa, agente financeiro do Pé-de-Meia. “A divulgação de programas geridos pelo ministério visa a potencializar o alcance ao público beneficiado pela iniciativa”, disse a pasta, sem informar os valores gastos.
Procurada, a Caixa afirmou: “A ação de distribuição de kits do Pé-de-Meia aos parlamentares contendo par de meias alusivas ao programa não teve participação do banco”.
Governo quer aumentar pena máxima de 8 para 12 anos de prisão a quem recebe ou vende celular roubado
Por Jeniffer Gularte — Brasília / O GLOBO
O Ministério da Justiça estuda enviar ao Congresso Nacional um projeto de lei que endurece a punição a quem recebe ou vende celular roubado, a partir da alteração do crime de "receptação qualificada". Pesquisas internas contratadas pelo governo indicam que o furto de smartphones é um dos motivos de maior insatisfação da população. Uma minuta da pasta comandada pelo ministro Ricardo Lewandowski foi redigida e enviada ao Palácio do Planalto, onde o texto é analisado pela Casa Civil. O estudo sugere a alteração da pena máxima desse tipo de crime de seis anos de prisão para 12 anos.
Ainda de acordo com o texto, a pena mínima passaria de três anos para quatro anos. A receptação de cabos e outros equipamentos referentes a serviços de telecomunicações também são incluídos no mesmo trecho da lei.
A alteração legislativa busca reduzir o furto de celular sob encomenda de organizações criminosas, que revendem os produtos em mercado paralelo. Também será responsabilizado por nesse crime quem transportar, conduzir, ocultar ou tiver em depósito peças roubadas de telefones.
A mudança no Código Penal proposta pelo Ministério da Justiça também traz as mesmas mudanças para a receptação qualificada na comercialização do serviço conhecido como “gatonet”.
Uma das justificativas da equipe de Ricardo Lewandowski para propor penas mais duras aos crimes relacionados ao furto de celular é a de que em 2024 houve quase milhão de registros desses crimes em delegacias de todo país. Uma média de quase dois aparelhos subtraídos a cada minuto.
A iniciativa do Ministério da Justiça mira uma preocupação que foi levada ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Auxiliares do presidente têm levado ao gabinete presidencial pesquisas que apontam que a segurança pública é um dos principais problemas para o brasileiro atualmente.
Os estudos mostram que o temor em relação ao celular atinge todas as camadas sociais e envolve um bem indispensável para o dia a dia, seja para trabalho ou lazer e apontam que muitas pessoas já foram vítimas do crime mais de uma vez.
Lula foi alertado que, assim como a inflação de alimentos, esse é um problema que também arranha a imagem do governo federal, apesar de a segurança pública ser uma atribuição dos estados, de acordo com a Constituição.
Além disso, a reclamação sobre furto e roubo de celular se concentra em um eleitor que “flutua” entre a esquerda e a direita, revelam os levantamentos.
Carga tributária atinge maior patamar em 15 anos e vai a 32,3% do PIB
Idiana Tomazelli /FOLHA DE SP
A carga tributária brasileira atingiu 32,3% do PIB (Produto Interno Bruto) em 2024, o maior patamar em 15 anos, segundo dados divulgados nesta sexta-feira (28) pelo Tesouro Nacional.
Houve um crescimento de 2,06 ponto percentual do PIB em relação a 2023, e a maior parte é explicada pela tributação federal (com aumento de 1,5 ponto). O restante do impulso adicional veio de estados (0,45 ponto) e municípios (0,12 ponto).
A chamada carga tributária bruta é estimada pelo Tesouro Nacional seguindo o padrão do manual de estatísticas do FMI (Fundo Monetário Internacional). A série histórica começou em 2010 —ou seja, o número de 2024 é o maior já observado. O dado oficial da carga tributária costuma ser divulgado pela Receita Federal no meio do ano.
A constatação de alta na carga tributária ocorre após o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) virar alvo de críticas, do Congresso e da população, pelas investidas legislativas para elevar a arrecadação. A estratégia inclusive fez com que o ministro Fernando Haddad (Fazenda) virasse meme nas redes e ganhasse o apelido jocoso de "Taxadd".
Algumas das medidas implementadas pelo governo de fato contribuíram para o aumento da carga. Segundo o relatório do Tesouro, a taxação dos fundos exclusivos de investimentos, voltados para os chamados "super-ricos", e dos recursos mantidos em paraísos fiscais (offshores) ajudou a ampliar em 0,5 ponto do PIB a arrecadação de impostos sobre a renda.
A reoneração de tributos federais sobre combustíveis também influenciou o resultado. Segundo o Tesouro, houve um incremento de 0,81 ponto do PIB nas receitas com impostos sobre bens e serviços, entre os quais se destacam PIS e Cofins. O crescimento da economia e seu reflexo positivo sobre a venda de bens também ajudaram a ampliar a arrecadação.
Ao todo, a União respondeu por uma carga de 21,43% do PIB, um patamar recorde na série. Mas o relatório destaca que uma parcela dessas receitas é repartida com estados e municípios. A arrecadação líquida do governo federal foi menor, equivalente a 16,8% do PIB —abaixo dos números observados entre 2010 e 2013, todos iguais ou acima dos 17% do PIB. A comparação indica que, com o passar dos anos, a União ampliou as transferências aos governos regionais.
Na esfera estadual, o aumento da carga decorreu principalmente da reoneração do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) sobre combustíveis e do crescimento da venda de bens.
Já nos governos municipais, o principal fator foi a maior arrecadação com o ISS (Imposto sobre Serviços), influenciada pela expansão no volume de vendas desse setor em 2024.
Em 2023, a carga tributária bruta ficou em 30,3% do PIB. Esse número foi revisado recentemente pelo Tesouro Nacional. Quando divulgado originalmente, no ano passado, ele era de 32,1% do PIB.
Segundo o órgão, a revisão de metodologia foi uma recomendação do FMI, que aconselhou os técnicos a retirarem do cálculo os recolhimentos ao FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço) e as contribuições para o Sistema S.
A reclassificação segue o entendimento de que o FGTS é uma espécie de fundo de poupança dos trabalhadores. Já as receitas do Sistema S ficam fora do controle governamental e, por isso, foram enquadradas como recursos do setor privado.
A revisão foi aplicada em toda a série, desde 2010, de modo que o patamar da carga caiu nos anos anteriores, mas não houve mudança em sua trajetória —que atingiu patamar recorde em 2024.
Alta dos alimentos não é passageira
Por Notas & Informações / O ESTADÃO DE SP
A inflação dos alimentos, que abalou a popularidade de Lula da Silva e estimulou uma série de ideias e declarações estouvadas do presidente, não é um fenômeno passageiro. Há mais de uma década os preços alimentícios têm registrado crescimento acima da média da cesta de produtos do índice geral de inflação, o IPCA, e sofrem agora o forte abalo das mudanças climáticas, que afetam também a produtividade agrícola. É um fenômeno complexo, que se espalha pelo mundo e que atinge com mais intensidade países como o Brasil em razão de carências estruturais internas.
Numa minuciosa análise publicada no blog do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre), na qual compila levantamentos de diferentes pesquisadores do instituto, o diretor do FGV Ibre, Luiz Guilherme Schymura, faz um raio X do deslocamento mundial da alta dos preços dos alimentos da inflação cheia, que por cerca de duas décadas – de 1980 até meados dos anos 2000 – tiveram trajetórias próximas. E examina com especial atenção a perda de produtividade agrícola do Brasil, despreparado para mitigar prejuízos dos fenômenos extremos do clima.
Diante da análise do economista, parecem ainda mais caricatas as medidas propostas por Lula da Silva para tentar forçar a queda de preços num estalar de dedos – como se uma simples palestra presidencial com produtores e varejistas tivesse o condão de baixar custos, ou como se uma resolução de isenção tributária de importação abarrotasse de alimentos baratos o mercado doméstico, a despeito de uma crise que é mundial.
Não cabem superficialidades numa questão tão profunda. Alguns preços podem até baixar diante da reversão de fatores que intensificaram a alta. Na pecuária, por exemplo, depois do chamado “ciclo do boi”, com redução da oferta a cada cinco ou seis anos, a alta extraordinária do preço da carne tende a recuar. O arroz, que no ano passado teve o preço pressionado pelas perdas expressivas de produção em razão das enchentes no Rio Grande do Sul, pode estabilizar, mas o fato é que o encarecimento do produto ocorre desde 2019, como mostram os dados da FGV.
Como exemplo da dimensão dos eventos que nos últimos cinco anos contribuíram de forma intensa para a alta dos alimentos, os pesquisadores da FGV listaram a disrupção de oferta causada pela pandemia em 2020/2021; a crise hídrica extremamente severa no Brasil, em 2021, e na Argentina, em 2023; a invasão russa da Ucrânia, um importante produtor global de grãos; e a conjunção dos fenômenos El Niño e La Niña em 2023 e 2024, com efeito particularmente forte no Brasil.
Schymura chama a atenção para a necessidade de recolocar em pauta a agenda pública de políticas de suprimento e segurança alimentar, com foco nas culturas que produzem alimentos que vão diretamente para a mesa dos brasileiros. Isso pode ser traduzido como uma atuação mais forte do governo no monitoramento da produção, na recomposição de estoques públicos, nos incentivos para investimentos em silagem, nas vias de escoamento e no crédito mais voltado a essas culturas, e não apenas nas que são altamente rentáveis.
O Brasil se prepara para colher uma supersafra recorde de grãos, estimada em 328,3 milhões de toneladas pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Recente reportagem da revista Forbes destaca que a atual capacidade estática de armazenagem no País é estimada em 210,1 milhões de toneladas, ou seja, uma diferença de 118,2 milhões de toneladas entre o que será colhido e o que poderá ser estocado.
É sobre a infraestrutura que o governo deveria estar se debruçando, se a preocupação fosse baratear alimentos de forma estrutural, com resultados mantidos no longo prazo, e não onerar exportações para ampliar a oferta doméstica, como chegou a ser aventado. Como resumiu Schymura, o foco deve ser o de estimular a produção adicional de alimentos, e não dificultar outras áreas do agronegócio.