Fundo eleitoral ou orçamento secreto: o que importa nas eleições
No Brasil atual existem dois fundos públicos que custeiam a atividade eleitoral.
O Fundo Partidário (Lei 9.096/95), que serve para custear as despesas quotidianas dos partidos, como luz, água, aluguel, contadores, advogados, impulsionamento de conteúdo na internet etc. É deste fundo que saiu o dinheiro para que o partido político Podemos blindasse o carro do ex-juiz e ex-ministro Sérgio Moro, que era seu candidato a presidente da República, mas, ao trocar de partido, se tornou um ex-candidato a presidente. Consta que o partido político Podemos gastou cerca de R$ 3 milhões com a ex-candidatura de Sérgio Moro, incluindo R$ 22 mil de salários mensais. O valor que foi distribuído em 2021 para todos os partidos equivaleu a R$ 1 bilhão.
Outro é o Fundo Eleitoral (Lei 13.487/17), que surgiu para custear as eleições após o STF ter declarado que nossa Constituição proíbe o financiamento privado de campanhas. Para esse Fundo foi alocado o montante de R$ 4,9 bilhões para serem distribuídos em 2022 (cinco vezes mais que o Fundo Partidário). A divisão dos recursos ocorre através dos partidos políticos, na proporção de suas bancadas no Congresso, considerando a última eleição - portanto, não se deve olhar a situação partidária atual, mas a que resultou das urnas nas eleições de 2018. Neste ponto, a maior bancada era a do PSL, que recentemente se fundiu com o DEM, e resultou no UB (União Brasil), que receberá quase 16% desse total. O PT receberá quase 10% e assim por diante. O PL (Partido Liberal), que é o atual partido do presidente Bolsonaro, presidido por Waldemar da Costa Neto, está em sétimo lugar neste ranking, recebendo quase 6% dos R$ 4,9 bilhões).
Observe-se que, a serem mantidas estas regras, terá mais dinheiro do Fundo Eleitoral para as eleições de 2026 quem eleger maior número de deputados e senadores em 2022. Logo, para muitos partidos a estratégia é a de ampliar suas bancadas, para que se fortaleçam e tenham mais recursos à frente.
Essa descrição dá a entender que, quanto mais dinheiro tem um partido, maior poder de atração de candidatos ele tem. Afinal, no jogo eleitoral, quem tem mais dinheiro, tem mais poder — ocorre que essa frase é verdadeira e falsa ao mesmo tempo.
É verdadeiro afirmar que, quem tem mais dinheiro, tem mais poder.
É falso afirmar que o dinheiro/poder advém do Fundo Eleitoral, pois aqui entra uma variável externa ao sistema de financiamento eleitoral, mas que vai deturpá-lo, que são as emendas de relator, conhecidas como orçamento secreto, conforme importante série de reportagens do jornal O Estado de São Paulo, tendo à frente o repórter Breno Pires.
É fácil explicar: o orçamento secreto é composto por uma montanha de dinheiro, estimada em mais de R$ 16 bilhões, para ser distribuída ao sabor de apenas duas canetas: a do Presidente da Câmara e a do Presidente da República, tendo este terceirizado esta função para o Ministro Chefe da Casa Civil.
Pense comigo e responda, o que é mais atrativo: (1º) Disputar os R$ 4,9 bilhões do Fundo Eleitoral, que é dividido entre todos os partidos conforme o quadro eleitoral de 2018, ou (2º) disputar R$ 16 bilhões do orçamento secreto que serão divididos ao bel-prazer de duas pessoas, independente de partidos, sendo suficiente que o político se alie ao governo? Bingo! A segunda alternativa é a mais interessante.
Isso é facilmente demonstrado através da movimentação partidária, pois o União Brasil perdeu 30 deputados, embora tenha mais dinheiro do Fundo Eleitoral, e o PL, que é o partido do presidente, recebeu 42 deputados. Logo, retorna-se à parte verdadeira da frase acima: quem tem mais dinheiro, tem mais poder. E, neste caso, o orçamento secreto desequilibra qualquer jogo de forças eleitoral, pois tem mais dinheiro, é de mais simples distribuição, e é suprapartidário. É dezesseis vezes maior que o Fundo Partidário e três vezes maior que o Fundo Eleitoral, podendo ainda ser ampliado. Simples assim.
Tudo isso lembra a antiga AP (ação popular) 470, conhecida como julgamento do mensalão, relatada no STF pelo ministro Joaquim Barbosa, através da qual 25 pessoas foram condenadas (ver aqui). O confuso acórdão, com mais de 8.400 páginas (não é o processo, é só o acórdão), indica que a distribuição dos recursos era feita à margem da lei.
E agora? Tudo isso está sendo feito dentro da lei? Ou estará sendo feito dentro da lei, mas fora das quatro linhas da Constituição? Vale transcrever o artigo 14, §9º, da Constituição: Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para exercício de mandato considerada vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta. Esta parte final merece muita atenção.
Fernando Facury Scaff é professor titular de Direito Financeiro da Universidade de São Paulo (USP), advogado e sócio do escritório Silveira, Athias, Soriano de Mello, Bentes, Lobato & Scaff Advogados.
Revista Consultor Jurídico, 12 de abril de 2022, 8h00
Eleições não são vencidas apernas no dia da votação, porém muito antes, e a distribuição do dinheiro é importantíssima nesse contexto.
O que fazer? A palavra está com as autoridades jurisdicionais constituídas.
Pelo tema e pelo momento em que vivemos, fará muita falta a voz e a presença de Dalmo Dallari, falecido semana passada. Minhas condolências à família e ao Brasil.
Ipespe: Bolsonaro cresce em São Paulo e reduz vantagem de Lula
12 de abril de 2022 | 08h34
De fevereiro a abril, o presidente Jair Bolsonaro (PL) cresceu quatro pontos na disputa nacional em São Paulo e se aproximou de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que, por sua vez, ficou estagnado. Segundo pesquisa Ipespe divulgada na segunda-feira, 11, o chefe do Executivo passou de 26% a 30% nas intenções de voto, enquanto Lula se manteve com 34%.
Na pesquisa espontânea, aquela em que os entrevistados expressam sua preferência sem que seja lida uma lista de opções, Bolsonaro e Lula têm 28% e 29%, respectivamente, o que representa empate na margem de erro. A distância entre ambos era de 6 pontos porcentuais em fevereiro, mas o petista oscilou um ponto e Bolsonaro cresceu quatro.
Quanto à composição de palanques estaduais, os apoios de um e de outro exercem influência parecida sobre as candidaturas para governador. Segundo o levantamento, 42% dos eleitores dizem que a chance de votar em um candidato diminui se ele for apoiado por Lula; e 43% afirmam o mesmo sobre Bolsonaro. O petista apoiará Fernando Haddad (PT), enquanto o chefe do Planalto espera eleger Tarcísio de Freitas (Republicanos).
Haddad lidera a disputa pelo Palácio dos Bandeirantes com dez pontos de vantagem. Ele tem 29% das intenções de voto, enquanto o ex-governador Márcio França (PSB) tem 19%. Tarcísio aparece em terceiro lugar, com 13%.
A pesquisa Ipespe ouviu mil pessoas por telefone entre os dias 6 e 9 de abril. A margem de erro é de 3,2 pontos, para mais ou para menos. O levantamento foi registrado no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sob os protocolos BR-00800/2022 e SP06962/2022.
Ipespe em SP: Haddad tem 29%; França, 19%; Tarcísio, 13%
11 de abril de 2022 | 10h14
O ex-prefeito Fernando Haddad (PT) lidera com dez pontos de vantagem, neste momento, a disputa pelo governo de São Paulo, segundo pesquisa Ipespe para o Estado. O petista tem 29% das intenções de voto, enquanto o ex-governador Márcio França (PSB) tem 19% e o ex-ministro da Infraestrutura Tarcísio de Freitas (Republicanos), 13%. Rodrigo Garcia (PSDB), que é o atual governador, tem 5%.
No cenário sem França, a margem de Haddad alcança 17 pontos e ele passa a ter 35% da preferência, contra 18% de Tarcísio de Freitas. Nessa hipótese, Garcia sobe para 9%. O PSB de França e o PT de Haddad estão juntos no plano nacional, mas separados no estadual. Caso ambos mantenham suas pré-candidaturas, existe a possibilidade que a chapa do presidenciável Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tenha dois palanques em São Paulo.
No levantamento espontâneo, aquele em que os entrevistados expressam sua preferência sem que seja lida uma lista de opções, Tarcísio aparece com 9%, colado em Haddad, que tem 10%. O ex-ministro será apoiado pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) no Estado.
A pesquisa Ipespe ouviu mil pessoas por telefone entre os dias 6 e 9 de abril. A margem de erro é de 3,2 pontos, para mais ou para menos. O levantamento foi registrado no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sob os protocolos BR-00800/2022 e SP06962/2022.
Problema de fundo
Soluções voluntaristas para problemas complexos, mal estudadas, com frequência produzem novas distorções sem resolver as originais. Tem sido assim com o financiamento, impingido aos pagadores de impostos, de eleições no Brasil.
Deflagraram a mudança do modelo as revelações, em meados da década passada, de corrupção soberba envolvendo políticos e companhias interessadas em contratos e regulações estatais. O diagnóstico, absorvido no calor do momento, foi o de que a causa do descalabro era a permissão de doações de empresas para candidaturas.
Afastando-se do cânone da divisão de Poderes, o agente da mudança não foi o Congresso Nacional, mas o Supremo Tribunal Federal. De repente toda e qualquer forma de custeio empresarial foi declarada inconstitucional pela corte.
Desse modo açodado, embalado em boas intenções, nasceu o monstro do financiamento público de campanhas à brasileira. Do ciclo de eleições de 2018 para este de 2022, o repasse compulsório dos contribuintes para os partidos promoverem candidatos saltou 235%, para R$ 5,7 bilhões. A inflação no período não passará de 35%.
Esse maná de recursos foi canalizado para uma estrutura cartorial e oligárquica de partidos. Seus chefes, entronizados nos postos como capitães hereditários, assumiram um poder colossal, de vida e morte, sobre as candidaturas. Regulamentações supervenientes, como a fixação de cotas para mulheres, mal arranham essa relação.
Quando as doações vêm diretamente da sociedade, ou quando os partidos se abrem organicamente aos anseios de seus eleitores e militantes e se oxigenam periodicamente, o financiamento da atividade política reflete melhor o ideal da representatividade.
Na realidade brasileira, ao contrário, o mandonismo enriquecido das cúpulas partidárias inibe movimentos que poderiam espelhar as disposições do eleitorado. A desertificação do solo no interstício que vai de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a Jair Bolsonaro (PL) na disputa presidencial é apenas o exemplo mais visível desse processo.
Acrescente-se o efeito de dezenas de bilhões de reais em emendas distribuídas conforme a proximidade do parlamentar com os mandachuvas do Congresso, e o resultado são obstáculos difíceis de contornar para quem está fora do esquema estabelecido —sem falar das notáveis brechas abertas à corrupção que se queria evitar.
Há dinheiro demais nas mãos dos chefes dos partidos, democracia de menos nas organizações partidárias e barreiras espessas para a alternância de poder. A continuar assim, a distância entre o cotidiano de 214 milhões de brasileiros e a atividade política só fará crescer.
Alckmin acusa Doria de comprar prefeitos com repasse de verbas
Sérgio Roxo / O GLOBO
SÃO PAULO — O ex-governador Geraldo Alckmin (PSB), provável vice na chapa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), acusou neste sábado o seu ex-colega de partido João Doria (PSDB) de “comprar prefeitos”. O ex-tucano também criticou a elevação de impostos no estado de São Paulo.
Eleições:PSB formaliza indicação de Alckmin para vice de Lula e pede espaço no programa de governo
Ao discursar no evento de debate sobre o programa de governo da pré-candidatura de Márcio França (PSB) ao governo de São Paulo, Alckmin abordou a forma como a atual gestão investiu recursos públicos e disse:
— Como aplicou o dinheiro? Fisiologismo, política do século XIX, dinheiro público que precisa ser respeitado. Você comprar prefeito? É inacreditável. Eu fui prefeito do MDB no auge da ditadura e não chegava a esse ponto. Você pôr a faca no peito e dizer que se ele não mudar de partido, não recebe dinheiro público, dinheiro do povo, pago com sacrífico de impostos. Não é possível isso. É preciso mudar — disse o ex-governador, sem citar o nome de Doria, que deixou o comando do estado no último dia 31 para disputar a Presidência da República.
Alckmin saiu o PSDB em dezembro do ano passado depois de 33 anos no partido por desentendimentos com Doria, de quem já foi padrinho político.
Na visão de Alckmin, o governo paulista errou também ao definir sobre a tributação de produtos no estado.
— O governo é escolha. Você escolhe quem tributa e para quem coloca dinheiro. O governo aqui de São Paulo neste momento fez as duas escolhas erradas.
Acusou ainda a gestão Doria de prejudicar os mais pobres.
— Tributou o trabalhador, o consumo, aumentou imposto de comida em plena pandemia, de remédio, de cadeira de roda, de insumos de saúde.
Alckmin disse que, por outro lado, seu ex-colega de partido deu benefício para a elite.
— Baixou o imposto do querosene do avião, do jatinho, do transporte de elite, mas aumentou o do óleo diesel, que pega o transporte de tudo. Está aumentando a inflação.
Para o ex-governador, a elevação de impostos de materiais de construção em São Paulo "afeta a construção civil, setor que mais gera emprego".
Indicado na sexta-feira pelo PSB para ser vice na eleição presidencial, Alckmin, por outro lado, usou o mesmo assunto, a questão tributária, para elogiar Lula:
— O que o Lula fala? Vou pôr o rico no imposto de renda e o pobre no orçamento. Isso é civilizatório.
No evento que reuniu especialistas para debater propostas para o estado, Alckmin disse que França pode conter com ele. O PT alimenta a expectativa que o pré-candidato do PSB desista de concorrer para apoiar o ex-prefeito Fernando Haddad.