Governo muda metas, expõe fragilidade do arcabouço e propõe revisão de gastos com INSS e Proagro
Por Daniel Weterman , Bianca Lima e Alvaro Gribel / O ESTADÃO DE SP
O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) anunciou, nesta segunda-feira, 15, uma mudança nas metas para as contas públicas em 2025 e 2026 – a primeira alteração desde que o novo arcabouço fiscal entrou em vigor, há menos um ano.
Os alvos foram reduzidos de um superávit de 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB) para 0% em 2025, a mesma meta deste ano, que foi mantida; e de um superávit de 1% do PIB para 0,25% em 2026. Os alvos de 2027 e 2028, que ainda não haviam sido fixados, ficaram em saldos positivos de 0,50% e 1% do PIB, respectivamente.
Em 2025, de acordo com as projeções da equipe econômica, o déficit zero só será alcançado porque o pagamento de precatórios (dívidas judiciais da União), por decisão do Supremo Tribunal Federal, não será contabilizado na meta, assim como acontece neste ano. O impacto dessa despesa é de R$ 39,9 bilhões no próximo ano. Se o valor fosse considerado, haveria um déficit primário de 0,23% do PIB em 2025.
Na prática, essas mudanças nos alvos fiscais significam que o governo adiou a expectativa de colocar as contas no azul com resultado positivo na comparação entre receitas e despesas no Orçamento. O anúncio também expõe as fragilidades do novo arcabouço fiscal, pois o governo contava com aumento de arrecadação para cumprir a regra.
Ao mudar a meta, o governo sinaliza que a arrecadação não vai crescer como ele esperava anteriormente e, portanto, a balança entre receitas e despesas vai ficar com um resultado menor. Dúvidas sobre a arrecadação a partir do segundo bimestre de 2024 e sobre o desempenho da economia em 2025 foram obstáculos apontados por economistas e integrantes do governo.
Há, ainda a preocupação com a trajetória dos gastos obrigatórios, sobretudo das despesas previdenciárias e assistenciais, que são atreladas ao salário mínimo. Para 2025, o governo projetou na LDO o valor de R$ 1.502 para o mínimo, uma alta de 6,37% – quase o dobro da inflação projetada pelo governo para 2024, de 3,25% para o INPC.
Isso porque, atualmente, o mínimo é corrigido pela inflação do ano anterior mais a variação do PIB de dois anos antes. Essa indexação aumenta, automaticamente, o valor de pensões e benefícios do INSS, que são o principal gasto público.
Na apresentação do documento, o secretário-executivo do Ministério do Planejamento e Orçamento, Gustavo Guimarães, avaliou, porém, “que a nova trajetória das metas mantém a sustentabilidade das contas públicas”.
E reforçou o recado que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, vem dando reiteiradas vezes, de olho nas atuações do Congresso e do Judiciário: “Gostaríamos de frisar compromisso com a sustentabilidade da dívida e lembrar que essa é uma missão compartilhada por todos os Poderes”, disse.
A mensagem, porém, não conteve as críticas por parte do mercado financeiro, que analisa os números com lupa. O economista Gabriel de Barros, da Ryo Asset, destaca que os parâmetros utilizados na LDO são “irrealistas”. Ele entende que houve despesas subestimadas pela equipe econômica, como Previdência, Benefício de Prestação Continuada (BPC), abono e seguro-desemprego.
“As despesas me parecem subestimadas para fazer caber dentro da trajetória de primário escolhida. Ou seja, a conta é feita de trás para frente. É conta de chegada, e não resultado de projeções críveis de cada uma das rubricas de despesa primária. É um PLDO irreal, utópico, sem aderência com a realidade da dinâmica de cada uma das rubricas de gasto”, afirmou.
Governo projeta redução de custeio a partir de 2026 e propõe revisão de gastos
O governo projetou uma redução nas despesas discricionárias (soma de investimentos e custeio da máquina pública) a partir de 2026 – ano de eleição presidencial. Por outro lado, previu um aumento de despesas obrigatórias a cada ano, o que exigirá revisão dos gastos.
Em 2025, por exemplo, o projeto prevê R$ 212,7 bilhões em despesas discricionárias (que não são obrigatórias). Já em 2026, o volume cairia para R$ 212,3 bilhões e seria reduzido para R$ 168 bilhões em 2027. Como os investimentos não podem cair, até porque têm um patamar garantido no arcabouço fiscal, o cenário forçaria o governo a cortar o custeio dos ministérios, que envolvem gastos com serviços de saúde, manutenção de universidades e despesas do dia dia dos órgãos federais.
Nesse cenário, a LDO trouxe estimativas de economia de gastos com revisão de programas obrigatórios do governo, para manter uma folga nas despesas discricionárias e evitar um “apagão” nas contas. Com o INSS, a estimativa é de uma redução de R$ 7,2 bilhões em 2025. Já com o Proagro, espécie de seguro rural voltado à agricultura familiar, a estimativa é de corte de R$ 2 bilhões.
Apenas essas duas rubricas foram indicadas no projeto de lei, como antecipou o Estadão no mês passado. Até 2028, a equipe econômica estimou um corte de gastos de R$ 37,3 bilhões, no total, com esses dois programas, uma média de R$ 9,3 bilhões por ano.
“A agenda das receitas está sendo positiva, mas a revisão dos gastos vai ser um instrumento bastante importante para fechar as contas no médio e longo prazo”, afirmou Guimarães.
Segundo o secretário de Orçamento Federal, Paulo Bijos, a contenção das despesas em rubricas como a Previdência já representa o esforço feito pela equipe econômica para conter gastos via revisão dos programas.
Por outro lado, ele diz que a projeção de queda das despesas discricionárias para os próximos anos representa um desafio. “A contenção das despesas previdenciárias já representa o esforço para contenção dos gastos. Quando olhamos todos os itens de despesas obrigatórias, há um fator a ser considerado em valores nominais. Isso traz desafios em relação a sua contrapartida para despesas discricionárias”, disse.
Fragilidade do arcabouço
O arcabouço impõe um aumento real (acima da inflação) de despesas a cada ano. Por isso, para sustentar a nova âncora fiscal, o governo depende de forte aumento na arrecadação. Conforme o Estadão publicou, a equipe econômica vê a agenda de crescimento de receitas perder força diante das dificuldades no Congresso Nacional, do próprio desempenho da economia e de questões políticas como o ano eleitoral e a queda de popularidade do presidente Lula.
Na semana passada, a Câmara aprovou uma proposta que pode fragilizar o arcabouço. O projeto autoriza Lula a aumentar as despesas em R$ 15,7 bilhões neste ano por decreto, definindo livremente a destinação do dinheiro. Atualmente, esse aumento só poderia ser feito após o final de maio, dependendo do comportamento das receitas e ainda de autorização do Congresso. Houve um acordo para rateio do dinheiro entre indicações do governo e indicações de parlamentares.
Recentes movimentos do governo Lula e do Congresso mostram que o arcabouço fiscal repete dribles feitos durante a vigência do antigo teto de gastos, mas de forma mais rápida – colocando em risco a credibilidade da nova regra para controle das contas públicas. Conforme o Estadão mostrou, os “furos” nos limites de gastos vigentes em 2023 e 2024 somam R$ 28 bilhões desde a aprovação da nova âncora fiscal, em agosto do ano passado.
CNJ afasta ex-juíza da Lava-Jato, atual titular da vara da operação e dois desembargadores do TRF-4
Por Mariana Muniz e Daniel Gullino— Brasília / o globo
O corregedor-nacional de Justiça, ministro Luís Felipe Salomão, afastou a juíza Gabriela Hardt, que foi responsável pela Operação Lava-Jato, o atual titular da 13ª Vara da Justiça Federal de Curitiba e dois desembargadores do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), por supostos atos de burla à ordem processual, violação do código da magistratura e prevaricação.
Hardt atuou como juíza substituta de Sergio Moro na 13ª Vara Federal. O caso pelo qual ela foi afastada é uma reclamação disciplinar a respeito da homologação do acordo para criar uma fundação a partir de recursos recuperados da Petrobras. Ela foi a responsável por homologar u, acordo fechado pela estatal com o Ministério Público Federal (MPF), a partir de outro acordo que havia sido feito com autoridades dos Estados Unidos, em 2019.
"Os atos atribuídos à magistrada Gabriela Hardt se amoldam também a infrações administrativas graves, constituindo fortes indícios de faltas disciplinares e violações a deveres funcionais da magistrada, o que justifica a intervenção desta Corregedoria Nacional de Justiça e do Conselho Nacional de Justiça", afirmou Salomão na decisão desta segunda-feira.
Já o afastamento dos desembargadores Thompson Flores e Loraci Flores de Lima e do juiz Danilo Pereira Júnior, que atuou no TRF-4 e é o atual titular da 13ª Vara Federal de Curitiba, segundo Salomão, ocorreu em razão do descumprimento de decisões do STF.
"É perfeitamente possível depreender que a conduta dos ora reclamados não é fruto de simples falta de zelo na prestação jurisdicional, havendo os indícios, por sua vez, da prática de “bypass processual”, há muito reconhecida pela doutrina e jurisprudência como técnica censurável de se burlar as decisões ao Supremo Tribunal Federal do STF", diz o ministro na decisão sobre os desembargadores.
As decisões de Salomão foram tomadas em duas reclamações disciplinares: uma mira Gabriela Hardt e o ex-juiz e atual senador Sergio Moro (União Brasil-PR) e a outra tem como alvos Danilo Pereira Júnior, Thompson Flores e Loraci Flores de Lima.
A primeira ação foi aberta a partir de uma correição extraordinária que foi realizada na 13ª Vara e na 8ª Turma do TRF-4. Já a segunda foi instaurada a partir de um ofício do ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF). Entretanto, Salomão também usou elementos da correição para determinar o afastamento do juiz e dos dois desembargadores.
Os três processos — as duas reclamações e a correição — estão na pauta da sessão do CNJ de terça-feira, e o afastamento pode ser analisada pelos demais conselheiros. Cabe ao presidente do CNJ, Luís Roberto Barroso, definir os casos que serão avaliados.
Juíza admitiu conversa 'informal'
O acordo entre Petrobras e MPF, que foi homologado por Hardt, foi questionado no CNJ pela presidente do PT, Gleisi Hoffmann (PR), sob a alegação de que a magistrada havia extrapolado as suas competências ao homologar o acordo.
Um dos pontos citados para o afastamento é que, em depoimento, a magistrada admitiu ter conversado "informalmente" com o ex-procurador Deltan Dallagnol sobre um pedido de homologação de acordo entre a Lava-Jato e a Petrobras. Hardt depois homologou o acordo. Para Salomão, a decisão da juíza foi tomada "sem o feito estar devidamente instruído, com diversas ilegalidades patentes".
Sergio Moro também é alvo da mesma reclamação disciplinar. O corregedor ressaltou, no entanto, que as suspeitas contra ele serão analisadas futuramente, já que "não há nenhuma providência cautelar a ser adotada no campo administrativo". Como Moro deixou o cargo de juiz em 2018, o CNJ não poderia afastá-lo.
Descumprimento de ordem
O procedimento contra os desembargadores do TRF-4 envolve o julgamento sobre a suspeição do juiz Eduardo Appio, que atuou na 13ª vara Federal de Curitiba. A reclamação foi aberta de ofício pelo CNJ a partir de um pedido do ministro do STF Dias Toffoli.
Segundo a corregedoria, ao julgar Appio, os magistrados teriam descumprido ordem do Supremo por impulsionar processos que estavam suspensos, e utilizado prova declarada inválida pelo STF, "causando especial gravame aos réus investigados".
Para o corregedor, a "não observância de regra deveras elementares" conduz "à insegurança jurídica e à anarquia, em manifesta contrariedade à ordem jurídica, que se sustenta no respeito ao princípio da legalidade e à fidelidade aos princípios federativo e republicano. Noutras palavras, a todos os magistrados se impõe a reverência à Constituição da República Federativa do Brasil".
Fragilidade da regra fiscal fica mais evidente
À custa de sua própria credibilidade, o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) patrocinou uma manobra para ampliar o limite de gastos do Orçamento em R$ 15,7 bilhões neste ano. A mudança —que só deveria ocorrer em maio, a depender da alta da arrecadação— foi incluída num outro projeto e aprovada pela Câmara sem alarde.
Com isso, fica menos provável o contingenciamento de gastos para atingir a já pouquíssimo crível meta de zerar o déficit das contas federais neste ano.
Também ficam preservadas as emendas parlamentares a poucos meses das eleições municipais, sem dúvida um dos motivos para a colaboração dos congressistas para a alteração casuística.
É verdade que o aumento do limite de gastos era esperado, mas a facilidade com que se mudam as regras é evidência da baixa disposição para ajustar as contas.
Integrantes do Ministério da Fazenda minimizam a importância da alteração e argumentam que a espinha dorsal da regra fiscal está preservada. Referem-se ao limite para as despesas, que só podem ser ampliadas em 70% da expansão das receitas a partir deste ano —recorde-se que, em 2023, os desembolsos subiram exorbitantes 12,5% acima da inflação.
Não será fácil para o Planalto cumprir os compromissos assumidos. Já está claro, por exemplo, que nas próprias projeções da Fazenda a perspectiva de mais arrecadação se esvazia e que sem contenção de gastos não será possível restaurar saldos positivos nas contas em 2025 e 2026.
Pior, também está à vista de todos que o novo regime fiscal é inconsistente por não conter a expansão contínua dos pagamentos obrigatórios, que perfazem cerca de 90% do Orçamento da União.
Não basta, como se faz na lei complementar que baliza o regime, fixar limites máximos para a despesa total enquanto desembolsos com Previdência e assistência social, benefícios trabalhistas, educação e saúde seguem regras próprias que garantem correção maior.
Sem alterar tais critérios, o que depende de um amplo conjunto de medidas corajosas, o resultado inevitável é o progressivo encolhimento dos recursos necessários para obras de infraestrutura e o custeio da máquina pública
Reformas como a desvinculação entre benefícios previdenciários e o salário mínimo e mudanças nos critérios de correção das despesas em saúde e educação são necessárias, mas impensáveis para o governo petista.
Talvez ainda não esteja claro para Lula, mas a opção apenas por mais gastos não se sustenta e, se mantida, ameaça resultar em degradação da economia nos dois anos finais de seu atual mandato.
STF – democracia e golpe
Por Carlos Alberto Di Franco / o estadão de sp
Bons propósitos não justificam o recurso a meios ilegais ou antiéticos. É a isso que, infelizmente, estamos assistindo no Brasil. A cada dia surgem novos sinais de abusos em nome da defesa da democracia. Não se protege a Constituição violando-a nem se fortalece o Estado de Direito sem o devido processo legal.
Não julgo intenções, mas analiso fatos. O ativismo intenso de um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), respaldado pelo silêncio cúmplice ou a omissão irresponsável de seus pares, tem gerado, aqui e lá fora, a percepção de forte insegurança jurídica, politização do Judiciário e crescente comprometimento da própria democracia.
Os desvios, creio, começaram já vão lá cinco anos. A Corte passou a conduzir inquéritos secretos e excessivamente elásticos para apurar fake news. Nas mesmas condições, como bem lembrou editorial do jornal O Estado de S. Paulo, instaurou inquéritos contra milícias digitais e as manifestações de vandalismo do 8 de Janeiro. “Sob a justificativa da excepcionalidade, hermenêuticas extensivas e fundamentações heterodoxas motivaram censuras, bloqueio de contas, quebras de sigilos bancários e telemáticos, multas exorbitantes e indiciamentos e prisões preventivas no atacado”.
Mas a coisa não para por aí. A cada dia, talvez para manter a corda permanentemente esticada, temos uma novidade pouco amigável com a democracia. Recente decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de determinar, por meio de uma resolução, que as plataformas digitais poderão ser punidas caso não tirem do ar conteúdos considerados prejudiciais à lisura das próximas eleições representa mais um ataque frontal ao Marco Civil da Internet e à liberdade de expressão.
De costas para a Constituição, em mais um movimento autoritário, o TSE avança na censura prévia.
O Marco Civil da Internet está em vigor há dez anos e prevê a responsabilização dos provedores somente mediante ordem judicial específica, ou seja, quando um juiz determina a remoção de um conteúdo e a plataforma não cumpre a decisão. O TSE, mais uma vez, invade competência exclusiva do Congresso Nacional para legislar sobre temas como fake news, discurso de ódio, etc.
O ministro aposentado do STF e ex-presidente do TSE Marco Aurélio Mello vem alertando, em sucessivas entrevistas à imprensa, sobre a necessidade de a Corte Eleitoral se ater neste ano à sua função básica, de mera coordenadora da disputa eleitoral. Para ele, as resoluções emitidas pelo TSE para regulamentar as eleições de 2024 implicarão retrocessos à democracia, pois seus regramentos estariam sendo ditados sem respeitar os limites do Judiciário definidos pela Constituição.
E os artífices do modelo autoritário fecham o cerco a qualquer crítica ou comentário que, mesmo indiretamente, possa atingir seu poder abusivo e inconstitucional.
Como também lembrou o editorial do jornal O Estado de S. Paulo, “antes mesmo da apuração de um bate-boca envolvendo o ministro Alexandre de Moraes e seus familiares em Roma, o então ministro da Justiça, Flávio Dino, hoje ministro do STF, declarou que o assédio poderia ser tipificado como crime contra o Estado Democrático de Direito. O presidente Lula sentenciou que o suspeito era um ‘animal selvagem’ e prometeu ‘extirpar’ essa ‘gente que renasceu no neofascismo’.
O STF assumiu a jurisdição de um caso típico de primeira instância e despachou mandados de busca e apreensão na investigação da Polícia Federal por suposta tentativa de ‘abolição violenta do Estado Democrático de Direito’. Um óbvio absurdo – que ameaça se normalizar”, concluiu o editorial.
Outro exemplo, amigo leitor: em ofício datado de 27 de março, o ministro Gilmar Mendes, do STF, pede que a Polícia Federal investigue um cidadão brasileiro que teria dito algumas palavras desagradáveis no Aeroporto de Lisboa, onde o ministro fazia uma conexão durante uma viagem entre Brasília e Berlim. O que teria dito de tão grave esse indivíduo? Segundo relato do próprio ministro, as terríveis palavras que ele não suportou ouvir foram: “Gilmar, você já sabe, mas não custa relembrar.
Só dizer que você e o STF são uma vergonha para o Brasil e para todo o povo de bem. Só isso, tá? Infelizmente, um país lindo como o nosso está sendo destruído por pessoas como você”. Por fim, o inacreditável: o homem ainda publicou nas mídias sociais o vídeo do ocorrido.
Qualquer crítica é encarada como um atentado à democracia. Não vimos isso nem nos piores momentos da ditadura militar. O poderoso Humberto de Alencar Castelo Branco, primeiro presidente do regime militar, foi carimbado na imprensa com um comentário nada lisonjeador: “Mais feio por dentro do que por fora”. Uma alusão indelicada à feiura presidencial. O que aconteceu? Nada. Pois bem, hoje pode acontecer. E tudo em nome da defesa da democracia.
É muito sério o que está acontecendo no Brasil. Com um Congresso leniente, não obstante algumas exceções de parlamentares combativos, parte da imprensa surpreendentemente silenciosa, uma sociedade amedrontada e um Judiciário politizado e fascinado com o poder, caminhamos para um sistema claramente autoritário. Fala-se muito em tentativa de golpe. Ele não estará em plena execução?
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Janja diz que se vê como articuladora e que tem total autonomia
Painel
Editado por Fábio Zanini, espaço traz notícias e bastidores da política. Com Guilherme Seto e Danielle Brant / FOLHA DE SP
Casada com o presidente Lula (PT), Rosângela da Silva, a Janja, afirma ter um papel de articuladora e diz que, desde a campanha eleitoral, queria ressignificar o posto de primeira-dama por não ter o perfil tradicional de anfitriã de eventos de caridade e que visita instituições filantrópicas.
As declarações estão em uma reportagem da BBC sobre primeiras-damas. "Meu papel é de articuladora, que fala sobre política pública. Nós [Janja e o presidente] podemos estar em espaços diferentes e falando a públicos diferentes quando necessário", afirma.
Janja cita o episódio em que foi criticada por ir ao Rio Grande do Sul durante as fortes chuvas que atingiram o estado —opositores disseram que, como ela não tinha cargo público, a primeira-dama estaria indo além de seu papel.
"[Lula] me dá total autonomia para eu fazer o que faço", ressalta, acrescentando não haver hierarquia entre ela e o presidente.
Ela diz se tratar de escolhas. "É sobre quebrar a caixa na qual as primeiras-damas são forçadas a entrar", disse. "É sobre não ter essa caixa. Ela pode fazer o que quiser."
Nísia mantém discurso sem brilho, e operação para salvar ministra da Saúde expõe fragilidades
Matheus Teixeira / FOLHA DE SP
A ministra da Saúde, Nísia Trindade, manteve a fala desanimada apesar dos esforços do governo para que ela mudasse seu estilo e defendesse a gestão federal com maior contundência.
O discurso de cerca de 40 minutos que fez na última segunda-feira (8) mostrou que o treino dado dias antes e as cobranças do presidente Lula (PT) não funcionaram.
A entrevista coletiva no Palácio do Planalto era uma daquelas marcadas pelo petista para ampliar a visibilidade do trabalho do Executivo em setores-chave e fortalecer a atuação do ministro da respectiva área.
O evento fez parte da operação desencadeada pelo presidente para salvar Nísia das investidas de Arthur Lira (PP-AL) e do Centrão e mantê-la no cargo. Ela está na berlinda devido a críticas de parlamentares pela falta de traquejo político e problemas na distribuição de emendas.
Também há contestações no governo por problemas da pasta e pela timidez em defender a atuação do Executivo em um dos ministérios que mais afetam a população.
Dias atrás, o marqueteiro do PT na eleição de 2022, Sidônio Palmeira, se reuniu com Lula no Palácio da Alvorada para discutir como melhorar a comunicação do governo e, depois, seguiu para o Ministério da Saúde para dar dicas a Nísia sobre como melhorar sua imagem.
Dias antes, em meio ao esforço do presidente para o governo comunicar melhor suas entregas, o marqueteiro havia dado uma palestra ao alto escalão do Executivo e afirmou que "comunicação sem amor, vontade, tesão, sem brilho não vai a lugar nenhum".
A mesma orientação, aparentemente, não foi dada a Nísia —ou, ao menos, ela não conseguiu cumpri-la. Após a reunião com Palmeira, foi convocada a entrevista coletiva da ministra ao lado de Lula no Planalto.
A ideia era explorar o conhecimento técnico de Nísia, que foi presidente da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz), para mostrar seu trabalho e tentar ofuscar os problemas da pasta, como a dificuldade para combater a dengue, a morte de yanomamis e os problemas nos hospitais do Rio de Janeiro. No entanto, a emenda saiu pior do que o soneto.
A ministra fez um discurso inicial de mais de 40 minutos, com uma apresentação burocrática, cheia de números e letras miúdas para a plateia ler.
A notícia, ao final, não foi a explanação de Nísia, mas as entrelinhas da fala do presidente. Lula elogiou a ministra, mas disse que ela "fala manso" —não grosso, como havia cobrado— e discursa "sem passar entusiasmo".
"Seu jeito delicado de falar sem rompante, sem tentar passar entusiasmo além do necessário, você consegue falar com alma e consciência das pessoas", disse.
Este não foi um movimento isolado na operação para salvá-la. Nas últimas semanas, Nísia ampliou a exposição pública, demitiu parte da equipe e fez acenos ao mundo religioso.
A operação para fortalecer a ministra, porém, teve o efeito contrário. As entrevistas expuseram sua dificuldade para vender o peixe do governo. As demissões evidenciaram que os problemas de gestão, de fato, existem. E a sua imagem, na verdade, ficou mais frágil.