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Desinformação viceja na leniência

Notas&Informações, O Estado de S.Paulo

14 de agosto de 2022 | 03h00

É certo que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), os partidos políticos e a imprensa profissional, além dos próprios eleitores, estão mais bem preparados para lidar com a desordem informacional do que estavam há quatro anos. Muitas lições foram aprendidas de 2018 para cá. Isso não significa, no entanto, que a eleição de 2022 esteja totalmente blindada contra a influência de mentiras disseminadas por candidatos e seus apoiadores. Longe disso.

Tanto é assim que, em boa hora, uma das ações preparatórias adotadas pelo TSE para a realização do próximo pleito foi convidar as grandes empresas de tecnologia que administram as redes sociais para, juntos, adotarem medidas que visam à despoluição do debate público. Os eleitores devem tomar suas decisões com base em informações fidedignas. Em última análise, trata-se de salvaguardar a própria democracia.

Em uma primeira rodada, reuniram-se com as autoridades do TSE representantes do Twitter, TikTok, Kwai, Telegram, Meta (Facebook, Instagram e WhatsApp) e Google (YouTube). Depois, a Corte Eleitoral também firmou parcerias com o LinkedIn e com o Spotify. A boa notícia é que todas essas grandes empresas de tecnologia reconheceram que são parte fundamental de um ecossistema de combate à desinformação, haja vista que é por meio das redes sociais e dos aplicativos de mensagens que as mentiras e distorções da realidade mais circulam. A má notícia é que, na esmagadora maioria dos casos, as chamadas big techs têm falhado miseravelmente em cumprir a parte que lhes cabe nos acordos firmados com o TSE.

Pesquisadores do Instituto Nacional de Ciência & Tecnologia em Democracia Digital (INCT.DD), da Universidade Federal da Bahia, acompanham o cumprimento desses acordos. Em relatório divulgado há poucos dias, eles alertaram que as big techs já implementaram a maioria das ações acordadas com o TSE, mas, na prática, têm demorado demais para analisar conteúdos, processar denúncias e, assim, aumentar a transparência nas redes sociais para combater a desinformação. “O processo eleitoral é muito dinâmico e, desde o último pleito, o período de campanha oficial foi reduzido para dois meses”, disseram os pesquisadores Rodrigo Carreiro e Maria Paula Almada em seu relatório. Hoje, não há prazo definido para que as empresas de tecnologia analisem e removam, quando for o caso, uma postagem com conteúdo enganoso. O prazo ideal, segundo os pesquisadores, seria de 24 a 48 horas da publicação.

De fato, agilidade é um fator determinante para a eficácia de uma ação de combate à desinformação nas redes sociais, ambiente marcado pela velocidade de propagação de uma mensagem e por seu alcance, virtualmente ilimitado. Quanto mais tempo uma publicação de teor duvidoso permanecer no ar, maior será seu alcance. Consequentemente, qualquer ação de restauração da verdade dos fatos demandará muito mais esforço, e com menos chances de ser bem-sucedida.

Estadão procurou todas as empresas que participaram das negociações com o TSE para questionar seus prazos para processar uma denúncia de conteúdo falso. Nenhuma delas respondeu. É importante destacar que não há uma lei que determine qual deveria ser o protocolo operacional dessas empresas. E nem haveria de ter. No entanto, foram essas mesmas empresas que, voluntariamente, aceitaram o oportuno convite do TSE e decidiram colaborar para tornar as redes sociais, hoje mídias incontornáveis, um ambiente mais sadio para o debate público. Para isso, assumiram compromissos que, até agora, não têm sido plenamente cumpridos. Não é pedir muito que elas façam o que disseram que fariam.

Os dois candidatos que lideram as intenções de voto para a Presidência da República, Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL), não são inocentes no que concerne à disseminação de mentiras nas redes sociais. Os petistas praticamente inventaram a máquina de destruição de reputações na internet, uma nódoa na atividade política no Brasil do século 21. Bolsonaro, por sua vez, elevou a má-fé à categoria de política de governo. De ambos, portanto, não se deve esperar bom comportamento no curso da atual campanha.

Otimismo de apoiadores de Lula com atos do 11/8 contrasta com avanços de Bolsonaro

Julia Chaib
Julia Chaib

Repórter em Brasília / FOLHA DE SP

O otimismo gerado pelos atos que marcaram a leitura de cartas pró-democracia nesta semana contrasta com dados pessimistas que bateram à porta do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Levantamentos analisados pelo partido mostram avanço do principal alvo do manifesto: Jair Bolsonaro (PL) cresceu em Minas Gerais e São Paulo.

É claro que a leitura dos documentos definitivamente não foi notícia boa para o atual presidente.

O texto elaborado por ex-alunos de direito da USP (Universidade de São Paulo) reuniu mais de um milhão de assinaturas, incluindo banqueiros, empresários, advogados e sindicalistas, entre tantos outros.

O movimento foi um rechaço retumbante aos arroubos autoritários de Bolsonaro. No mínimo, serve para ampliar o isolamento do chefe do Executivo em parcela do eleitorado que o apoiou em 2018, antes refratária a Lula.

Por outro lado, não encontra eco em necessidades urgentes da população de baixa renda mais atingida pelos efeitos nocivos da alta de preços.

Foi justamente nesse segmento que a campanha de Lula constatou alta de Bolsonaro e teme evolução ainda maior.

Dado que aliados do petista sentem a consolidação do voto no Nordeste, tudo indica que a disputa mais ferrenha se dará no triângulo do Sudeste (Minas, São Paulo e Rio), e a senha será o discurso da economia.

Já o tamanho do estrago que o discurso golpista terá na campanha de Bolsonaro dependerá do próprio presidente.

Ele promete reação no dia 7 de setembro. Se o presidente dobrar a tática de questionamento às urnas, pode alimentar contra si uma onda capaz de levar setores médios hoje resistentes a Lula a optar pelo petista em nome da estabilidade.

Resta saber se um recuo estratégico pode conter um movimento que outrora ficaria ainda maior.
Instintivo, Bolsonaro influenciará o tom da orquestra a ser tocada a partir do Dia da Independência.

Votar em 'a' ou 'b'?

Dom Odilo Pedro Scherer, O Estado de S.Paulo

13 de agosto de 2022 | 03h00

As eleições de outubro aproximam-se a passos largos. Em destaque, no interesse geral, está a campanha presidencial, e até parece que as eleições para os Executivos estaduais e a renovação do Parlamento nos níveis federal e estadual são secundárias. A disputa vai se acirrando e a aposta, na prática, acabou sendo plebiscitária, envolvendo duas candidaturas com posições ideológicas opostas. Os principais focos são os nomes de candidato a e candidato b. É votar à direita ou à esquerda. Em torno desses polos acabam se abrigando as agremiações partidárias menores, jogando com time a ou com time b, apostando na condição de vencedores ou arriscando-se a ficar na posição dos opositores.

No entanto, é mal que se pergunte, quais são, de fato, as propostas e os programas de cada um desses lados para o Brasil? Votaremos no candidato por simpatia ou aversão, ou por propostas e promessas convincentes que, depois, possam ser efetivamente implementadas e cobradas?

A eleição dos deputados e senadores é, certamente, subestimada e a composição do Congresso Nacional e das Assembleias Legislativas dos Estados mereceria maior atenção, pois o presidente e o governador não governarão sozinhos – assim se espera! A menos de dois meses das eleições, quem conhece os candidatos já definidos para as Casas legislativas?

Enquanto isso, aumentam os preços do leite, da carne, do feijão, do arroz, do transporte, do remédio e de tanto mais que se faz necessário para viver e fica cada vez mais fora do alcance da população pobre. O desemprego mantém-se na população mais carente, que sobrevive graças a programas assistenciais e emergenciais. Triste é constatar que a fome voltou a bater à porta de mais de 30 milhões de brasileiros, que precisam fazer uma ginástica sofrida para sossegar o estômago a cada dia. Aumentam os números de moradores de rua e dos que precisam optar entre pagar aluguel, água e luz ou comer, realidade sempre mais constrangedora também na poderosa economia de São Paulo.

Crescem a violência, a insegurança, a crise ambiental e a falta de confiança nas instituições. Tudo culpa da pandemia de covid-19? Da guerra na Ucrânia? Não se desconhece nem se subestima a influência de tais fatores circunstanciais, mas nosso problema não é novo e a atual crise social brasileira é mais velha que esses fatores. As eleições seriam um momento privilegiado de exercício da cidadania e para implementar a convivência democrática. Que pena, estamos desperdiçando energias na reafirmação da confiabilidade das urnas eletrônicas, em vez de empenhá-las, bem melhor, na discussão daquilo que realmente importa para melhorar o Brasil e para abrir horizontes de esperança para os descartados e sofridos, que precisam lutar pela sobrevivência de cada dia.

O que ganha a população pobre com a atual disputa eleitoral? Que perspectivas melhores terá o desempregado, quem faz bico nas calçadas e esquinas movimentadas de nossa cidade? Pode o morador de rua, aquele que vive nas extensas e carentes periferias de nossas metrópoles, ou no profundo interior do Nordeste e da Amazônia, esperar que sua situação mude para melhor com a vitória de time a ou de time b?

O atual clima de polarização ideológica vivido no Brasil não traz boas perspectivas de futuro. Seria tempo de olharmos as eleições como ocasião para mudar o foco para os problemas reais do povo brasileiro no presente e do futuro. Lembro, aqui, palavras do papa Francisco na encíclica Fratelli tutti, sobre a fraternidade e a amizade social (2020). Os problemas atuais, entre os quais a pandemia de covid-19, deveriam ajudar-nos na busca solidária e fraterna de solução, superando agressividades destrutivas e a afirmação individualista. Sem exceção, dependemos uns dos outros e ninguém se salva sozinho. Em vez de construir mundos fechados e levantar muros, é preciso construir pontes e acreditar na colaboração. Populismos messiânicos, de qualquer matiz, já se mostraram danosos e ineficazes para resolver os problemas dos povos. É perigoso acirrar a polarização ideológica, jogando cidadãos contra cidadãos. Que se debatam propostas e projetos.

Há dois modos de enxergar o embate eleitoral que se aproxima: pelo lado dos concorrentes, que envidam suas energias para ganhar o preito. E o olhar do eleitor, que espera mudanças e melhoras em sua vida. É justo que o eleitor se pergunte: que ganho eu com a eleição? Minha situação vai melhorar? A situação do Brasil vai melhorar? Não me refiro à vantagem miúda de um benefício ocasional, eventualmente fruto de corrupção eleitoral. O que importa é perguntar: quem deveria sair mais beneficiado nas próximas eleições? Grupo a ou o grupo b?

Quem, finalmente, deveria ganhar com o resultado das eleições é o Brasil, saindo-se mais apaziguado e esperançoso. Sobretudo o Brasil descartado, pobre, faminto, doente, sem casa, sem trabalho, sem escola, sem esperança. O Brasil de todos os brasileiros, solidário e fraterno, sem derrota nem exclusão. Isso é esperar demais?

*

CARDEAL-ARCEBISPO DE SÃO PAULO

Pacotaço em ação

Neste agosto, o governo Jair Bolsonaro (PL) gastará R$ 12,1 bilhões com o novo Auxílio Brasil de R$ 600 —um salto repentino ante os R$ 7,3 bilhões mensais até então desembolsados pelo programa. No ano eleitoral de 2018, o Bolsa Família gastava não mais de R$ 3,3 bilhões ao mês, em valores corrigidos.

Conforme as estimativas oficiais, o valor ampliado chegará a 20,2 milhões de famílias. Segundo a mais recente pesquisa Datafolha, 1 de cada 4 brasileiros aptos a votar recebe ou mora com alguém que recebe o benefício assistencial.

Também em agosto, os índices de preços ao consumidor devem mostrar nova deflação, repetindo, ainda que em menor intensidade, o que ocorreu em julho. A guinada no custo de vida foi obtida por meio de um corte brutal de impostos sobre combustíveis e energia elétrica, de caráter, em princípio ao menos, temporário.

Na quinta-feira (11), enquanto Bolsonaro minimizava os atos em favor da democracia que reuniram os mais diferentes setores da sociedade, a Petrobras —que passou por duas trocas de comando somente neste ano— anunciava uma queda do preço do diesel, aproveitando-se também de um momento mais benigno no mercado global.

A percepção de melhora material é favorecida, ademais, pela queda consistente do desemprego, que independe de ações de governo e é impulsionada pela recuperação de setores fundamentais como serviços e construção civil.

Difícil imaginar que o pacote descomunal de medidas lançado a três meses do pleito presidencial não vá ter impacto nas pesquisas de intenção de voto. Trata-se, decerto, da maior intervenção econômica num ano eleitoral desde o Plano Real, lançado em julho de 1994.

A comparação, porém, termina por aí. À diferença do programa que controlou a inflação há quase três décadas, o conjunto de providências ora em vigor —que inclui até benesses para caminhoneiros e taxistas— foi instituído às pressas e sem planejamento. Ninguém sabe se e como tudo será mantido depois de fechadas as urnas.

De mais imediato, o pacotaço eleitoreiro dá nova configuração à corrida ao Planalto às vésperas do início oficial da campanha, marcado para terça-feira (16). Bolsonaro, tudo indica, vai temperar sua pregação golpista com propaganda dos feitos econômicos, e a intensidade da primeira dependerá dos resultados dos últimos.

Seu principal adversário, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), se verá compelido a defender os novos benefícios e, ao mesmo tempo, explicar como pretende reequilibrar as finanças públicas em um eventual governo. Nesse cenário, a margem para um debate mais qualificado se mostra estreita.

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Ministros do TSE veem 'precedente perigoso' em decisão que mandou excluir vídeos de Lula sobre Bolsonaro

Por Mariana Muniz — Brasília

Ministros do TSE veem 'precedente perigoso' em decisão que mandou excluir vídeos de Lula sobre Bolsonaro
O presidente Jair Bolsonaro e seu principal oponente nas pesquisas de intenção de voto, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva 
 

A decisão do ministro Raul Araújo, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), de determinar a remoção de vídeos em que Luiz Inácio Lula da Silva (PT) chama de "genocida" o presidente Jair Bolsonaro (PL), causou preocupação entre demais integrantes da Corte. Na avaliação de magistrados ouvidos reservadamente pelo GLOBO, o argumento usado pelo ministro pode abrir um precedente para o tribunal ser acionado por candidatos em qualquer situação em que se sintam ofendidos, sob o risco de ferir o direito à liberdade de expresão, além de uma enxurrada de ações durante a campanha eleitoral.

Na decisão em que mandou o YouTube excluir os vídeos de Lula, o ministro afirma que "a palavra ou expressão 'genocida' tem o sentido de qualificar pessoa que perpetra ou é responsável pelo extermínio ou destruição de grupo nacional, étnico, racial ou religioso". Araújo escreve, na decisão, que "o genocídio é crime e está previsto na Lei no 2.889/1956, que foi recepcionada pela Constituição Federal de 1988".

Ministros do TSE ouvidos pela reportagem afirmam, contudo, que a remoção de conteúdos deve ser considerada uma medida extrema e pontual, sobretudo na época da pré-campanha. No entendimento desses magistrados, o adjetivo "genocida" está inserido dentro de um contexto político e, por isso, não deveria ser considerado uma "ofensa à honra". Comparam, por exemplo, a candidatos que chamam seus adversários de "ladrão", como o próprio Bolsonaro costuma se referir ao ex-presidente e adversário na disputa ao Palácio do Planalto.

A questão da ofensa à honra de Bolsonaro por Lula foi justamente um dos pontos considerados por Araújo na decisão de quarta-feira. "Ainda em juízo de cognição sumária, é possível detectar aparente ofensa à honra e à imagem de pré-candidato ao cargo de presidente da República, porquanto a conduta de imputar a determinado adversário político o atributo de genocida poderia, em tese, configurar crime de injúria ou difamação", afirmou o ministro.

Caso Lollapalooza

Esta, porém não foi a primeira vez que uma decisão de Araújo envolvendo manifestações na pré-campanha gerou incômodo na Corte. Em março, o ministro classificou como propaganda eleitoral antecipada manifestações políticas da cantora Pabllo Vittar no festival Lollapalooza. Na ocasião, o PL, partido de Bolsonaro, acionou a Corte após a artista levantar, durante o show que fez no evento, uma bandeira com a foto de Lula. O ministro também determinou uma multa de R$ 50 mil por cada ato de descumprimento da decisão.

No caso do Lollapalooza, Araújo avaliou que os artistas fizeram "comentários elogiosos" a Lula e "pediram expressamente que a plateia presente exercesse o sufrágio em seu nome, vocalizando palavras de apoio e empunhando bandeira e adereço em referência ao pré-candidato de sua preferência". A decisão do ministro foi alvo de críticas na época e considerada como "censura" por juristas. Diante da repercussão negativa da medida, o PL acabou desistindo da ação.

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