É a hora da sociedade civil
O Estado Democrático de Direito está gravemente ferido. É necessário reconstruir a democracia, da qual um dos alicerces consiste na confiança da população nos agentes políticos que elege. Hoje, justificadamente, essa confiança inexiste no Brasil.
A democracia destaca-se por viver e conviver com as divergências, a serem superadas pelo diálogo e pela persuasão para a formação de uma maioria parlamentar legítima, respeitada pelas minorias. Todavia o confronto de ideias e de perspectivas, próprio da democracia, desapareceu do cenário político, substituído por entendimentos promovidos graças a arranjos financeiros com dinheiro público subtraído de empresas como Petrobrás, Sete Brasil, BR Distribuidora, Angra 3, Belo Monte.
Não se fez política, nem se praticou a democracia. Apenas se transitou num bazar de venda de apoios por dinheiro vivo ou graças à ocupação de cargos na administração, colocando apaniguados em postos estratégicos para obtenção de vantagens ou para demonstração de prestígio. Instalou-se a desabusada prática de exercer o poder para institucionalizar a ação corrosiva da corrupção como normalidade. A democracia foi corroída por dentro ao se obter uma maioria marrom, enlameada pela compra de consciências e do convencimento.
O poder econômico privado aliou-se a administradores públicos venais, abocanhando serviços superfaturados cujos frutos reverteram em parte para deputados e senadores, bem como para seus partidos, visando a assegurar ao Executivo uma maioria comprada. Os partidos da base governista fizeram caixa para enfrentar, com muitos recursos, as futuras eleições.
Contabilidade do Planalto indica margem de 50 votos para barrar o impeachment
Ontem, sexta-feira, foi feita uma contagem conservadora entre a presidente Dilma Rousseff e ministros petistas. Hoje, o governo escaparia do processo de impeachment na Câmara dos Deputados, mas por uma margem considerada pequena. Apesar dos números apresentados por líderes de partidos aliados, que aponta uma margem de mais de 80 votos acima do mínimo necessário, o Palácio do Planalto só contabiliza de forma segura 50 votos acima dos 171 deputados para barrar o impedimento de Dilma.
A estratégia é chegar a uma margem segura. Por isso, vai ser intensificada a relação com a base aliada. Como o Blog revelou, o Planalto já iniciou uma negociação com o líder do PMDB, deputado Leonardo Picciani (RJ), para entregar a Secretaria de Aviação Civil à bancada e, com isso, conseguir ampliar o apoio de deputados peemedebistas. O ministro Eliseu Padilha já comunicou sua decisão de deixar o governo. Gerson Camarotti / Portal g1
Quase tudo em ruínas
Agora que tudo está em ruínas, exceto algumas instituições que resistem, não me preocupo em parecer pessimista. Quando anexei às listas das crises o grave momento ambiental, algumas pessoas ironizaram: el Niño? Naquele momento falava apenas da seca, da tensão hídrica, das queimadas e enchentes. Depois disso veio o desastre de Mariana, revelando o descaso do governo e das empresas que, não se contentando em levar a montanha, transformam o Doce num rio de lama.
No fim de semana compreendi ainda outra dimensão da crise. O Brasil, segundo especialistas, vive uma situação única no mundo: três epidemias produzidas pelo Aedes Aegypti (dengue, chikungunya e o zika vírus). O zika está sendo apontado como o responsável pelo crescimento dos casos de microcefalia. Sabe-se relativamente pouco sobre ele. E é preciso aprender com urgência. O dr. Artur Timerman, presidente da Sociedade Brasileira de Dengue e Arboviroses, considera a situação tão complexa como nos primeiros momentos da epidemia de aids.
Agora que está tudo em ruínas, restam os passos das instituições que funcionam, o prende aqui, prende lá, delata ou não delata, atmosfera de cena final, polícia nos calcanhares. Lembra-me a triste cena final do filme Cinzas e Diamantes, de Andrzej Wajda. A Polônia trocava um invasor, os nazistas, por outro, os comunistas: momento singular. No entanto, há algo de uma tristeza universal na Polonaise desafinada e no passeio do jovem casal por uma cripta semidestruída pelos bombardeios.
Aqui, a cena não é de filme de guerra, ocupação militar, mas de um thriller policial em que a quadrilha descoberta vai sendo presa progressivamente. Enquanto isso, não há governo para responder ao desemprego, empobrecimento, epidemias, mar de lama e ao sofrimento cotidiano dos brasileiros.
Uma luz no fim do túnel
Dilma Rousseff e Eduardo Cunha selaram seus próprios destinos na quarta-feira, quando romperam o impasse político que vinha paralisando o País desde o início do ano. Fizeram a catarse de suas angústias em dois pronunciamentos que justificam o aforismo que pontuou boa parte das análises e comentários publicados ontem nos meios de comunicação: a hipocrisia é a homenagem que o vício presta à virtude. Por seus próprios meios e méritos, a presidente da República e o presidente da Câmara dos Deputados, a partir de posições antagônicas, caminharam na direção do mesmo e merecido fim: o banimento da vida pública.
Cunha chega ao ocaso obrigado a lançar mão do valioso trunfo com que vinha hipocritamente chantageando o governo: o poder de decidir sobre o início do processo de impeachment da presidente. Daqui para a frente pouco lhe resta, senão usar sua influência minguante para a consecução da vendetta contra Dilma e o PT. O Conselho de Ética, onde seu destino político será decidido, está fora de seu alcance, até porque seus bajuladores agora começarão a se afastar. E a política brasileira estará virando uma página que nada de louvável acrescenta à História.
Rui Falcão: 'Temer não vai participar de golpismo'

O presidente do PT Rui Falcão disse nesta quinta (3) que confia no vice-presidente Michel Temer para que o pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff aceito pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) não siga adiante; "Eu tenho segurança no que ele diz porque é um constitucionalista de renome e não vai participar de nenhuma forma de golpismo, nenhuma tratativa pra conspirar contra um governo do qual ele participa. Essa luta em defesa da democracia, do mandato conquistado nas urnas, é uma batalha que o PT travará de bom grado", afirmou; ele avaliou que a atitude de Cunha ao aceitar o pedido de impeachment “é um caso típico de desvio de finalidade e abuso de poder”; o petista ainda ressaltou que a estratégia do PT “é atuar junto ao parlamento e debater na sociedade e criar processo de mobilização grande contra o tapetão com envolvimento do ex-presidente Lula” BRASIL 247
Impeachment: o risco e a libertação
"Depois de 12 anos de servidão ao poder para conservá-lo, o PT fez o gesto que lhe pode custar a Presidência, mas aponta para a sobrevivência política e a libertação, tanto do partido como da presidente Dilma, aparentemente jogada ao mar pela decisão petista de votar contra Eduardo Cunha no Conselho de Ética", observa a jornalista Tereza Cruvinel; a colunista avalia que, "nesta primeira hora, o fato novo, mas tão esperado, será ruim para o país, para economia, para sua percepção externa. Mas o Brasil ganhará encerrando este ciclo, venham Dilma e o PT a ganhar ou perder a parada. O que não dava mais para continuar era a incerteza, a ciclotimia, o temor paralisante"; BRASIL 247