STF tem maioria para obrigar Congresso a atualizar número de deputados por Estado
Por Rayssa Motta / O ESTADÃO DE SP
O Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria nesta sexta-feira, 25, para obrigar o Congresso a atualizar a distribuição de cadeiras na Câmara dos Deputados, com base na população de cada Estado. O prazo para a recontagem vai até 30 de junho de 2025.
O número de cadeiras (513) permanecerá inalterado. O que pode mudar é a divisão das vagas, ou seja, a quantidade de deputados por Estado. O critério para a revisão deve ser o último Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Se os parlamentares não cumprirem a data limite, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) deverá determinar o número de deputados federais de cada Estado e do Distrito Federal para a legislatura que começa em 2027.
Os ministros do STF concluíram que houve “omissão institucional”, porque não foi feita uma revisão periódica da distribuição das vagas, como prevê a Constituição.
O ministro Luiz Fux, relator do processo, defendeu que a atualização é necessária para restabelecer o “equilíbrio da relação deputado/população”.
“A omissão legislativa em análise, para além significar per se uma ofensa à Constituição, implica também em ofensa ao direito político fundamental ao sufrágio das populações dos Estados subrepresentados e, por conseguinte, ao princípio democrático”, escreveu.
O julgamento está em curso no plenário virtual do STF. Nessa modalidade, não há reunião ou debate entre os ministros. Eles apenas registram os votos em uma plataforma online. Até o momento, o placar é unânime. Fux foi seguido por Gilmar Mendes, Edson Fachin, Cristiano Zanin, Rosa Weber, Cármen Lúcia e Alexandre de Moraes.
Ser e parecer
É positivo que esteja em votação no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) uma resolução com o objetivo de restringir e disciplinar a participação de magistrados em palestras e eventos assemelhados.
A norma, proposta pelo ministro Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, do Tribunal Superior do Trabalho, veda práticas como o coaching, estipula teto para presentes que podem ser recebidos (R$ 100, exceto livros) e prevê um sistema eletrônico de monitoramento que registra as participações de juízes.
As novas regras limitam, ainda, subvenções que entidades privadas com fins lucrativos podem fornecer a esse tipo de encontro.
Por enquanto a resolução conta com dois votos favoráveis —e recebeu elogios da ministra Rosa Weber, que preside o CNJ e o Supremo Tribunal Federal. A votação, contudo, foi suspensa.
Tem sido de resistência a reação de parcela significativa da magistratura diante de iniciativas que limitam suas interações com eventuais jurisdicionados. No caso em tela, a justificativa é a de que palestras, agrados ou presença em festas não afetariam a independência que o cargo de juiz exige.
Como a proverbial mulher de César, juízes devem ser e parecer honestos. Seu comportamento deve contribuir para a credibilidade da instituição a que pertencem.
A confraternização de magistrados com políticos e empresários que têm ou podem vir a ter vínculos com processos compromete princípios republicanos, como a separação entre público e privado e a imparcialidade do Judiciário.
É natural, por exemplo, que a sociedade questione a presença de ministros do STF em encontro do grupo de empresários ligado ao ex-governador de São Paulo João Doria, em Nova York, no ano passado.
Do mesmo modo, a proximidade dos magistrados com políticos e empresários no Fórum Jurídico de Lisboa, em junho último, afeta a imagem da corte.
Será oportuno que o CNJ aprove a resolução —e que os ministros do Supremo, que não estão sob jurisdição do conselho, debatam regras do gênero.
ESTADÃO / BLOG DO FAUSTO MACEDO EDVAR RODRIGUES XIMENES EDVAR RODRIGUES XIMENES Caso Bolsonaro: STF vai rediscutir se envia à 1ª instância ações de políticos que perderam foro
Por Rayssa Motta e Andreza Matais / O ESTADÃO DE SP
A investigação das joias, que coloca o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) no centro de suspeitas de um esquema de desvios de presentes diplomáticos, acendeu o debate sobre a competência de o Supremo Tribunal Federal (STF) conduzir um caso envolvendo autoridade que perdeu a prerrogativa de foro. O Estadão apurou que o Supremo deve enfrentar novamente esse debate e pode mudar a posição atual em meio ao julgamento do caso envolvendo o ex-presidente.
Desde 1.º de janeiro, quando deixou o Palácio do Planalto, Bolsonaro não detém mais foro privilegiado. Com isso, os processos criminais contra ele deveriam em tese tramitar na primeira instância, a não ser que a ação envolva outras pessoas com prerrogativa de foro – o que não é de conhecimento público. O caso está no Supremo porque o ministro Alexandre de Moraes alega que há conexão com outras investigações que tramitam na Corte, entendimento que tem gerado polêmica.
Segundo dois ministros ouvidos pelo Estadão, para evitar as discussões a respeito da competência do STF, a tendência é rediscutir a atual jurisprudência com grandes chances de a Corte voltar o entendimento pelo qual se a ação for iniciada no Supremo ela deve seguir na Corte mesmo que a pessoa perca a prerrogativa de foro.
Ao contrário de países como Estados Unidos, onde nem o presidente tem tratamento excepcional na Justiça, o Brasil estende o foro a deputados, ministros, desembargadores e até prefeitos.
A partir de 2018, por uma proposta do ministro Luís Roberto Barroso, o Supremo entendeu que só ficariam na Corte as ações criminais que envolvessem crimes cometidos durante o mandato e relacionados ao cargo atual da autoridade. Como Bolsonaro não tem mais cargo, por esse entendimento, ele perde o foro. Essa compreensão foi justificada na época pelo acúmulo de ações criminais tramitando no Supremo. Eram 500 ações na época. Com isso, os casos baixaram para 50.
Agora, entretanto, o número de ações criminais voltou a subir e está em cerca de 1.500, das quais 1.300 estão com o ministro Alexandre de Moraes e são relacionadas ao golpe de 8 de janeiro. O discurso dos ministros para justificar a incoerência é que os políticos têm influência sobre a Justiça dos seus Estados e os casos acabam não sendo julgados. Se o entendimento mudar, as discussões sobre se Bolsonaro pode ou não ser julgado no Supremo se encerram.
Casa Bolsonaro deve ir para primeira instância?
“A regra (atual) é que Bolsonaro não deveria ser investigado, a priori, pelo STF, mas é cedo para fazer esse julgamento”, afirma o professor Álvaro Palma de Jorge, da Faculdade de Direito da FGV-Rio. “O ministro Alexandre de Moraes está em uma posição privilegiada em termos de informação. Se a gente olhar o histórico de investigações sobre Bolsonaro, vem aparecendo uma coisa atrás da outra, com algum encadeamento.”
“O fato de o ex-presidente da República ter deixado o cargo me faz acreditar que o caso deveria ser remetido para a primeira instância, respeitando-se, assim, o princípio do juiz natural. É incontestável que o STF tem exercido papel fundamental para a defesa da democracia e do Estado Democrático de Direito, mas é tempo de avaliar se essa concentração de poder ainda faz sentido, evitando-se mais questionamentos sobre a sua atuação”, avalia o advogado Dinovan Dumas, sócio do escritório MFBD Advogados.
Outra hipótese capaz de atrair a competência do Supremo para conduzir o caso das joias seria a conexão da investigação com outros inquéritos em curso na Corte. Foi essa a brecha usada por Moraes, relator do caso, para justificar a intervenção do tribunal.
“O STF firmou entendimento que investigações e ações penais devem ser encaminhadas para a justiça competente após o a perda de foro por prerrogativa de função. Apenas em situações excepcionais, como na conexão, é que se poderia falar em manutenção da competência do STF”, explica o advogado e professor de Direito Rodrigo Faucz Pereira e Silva.
Moraes afirma que a PF suspeita de uma organização criminosa com atuação em cinco eixos: 1) ataques virtuais a opositores; 2) ataques ao Poder Judiciário e ao processo eleitoral; 3) tentativa de golpe de estado; 4) boicote às vacinas e a medidas sanitárias na pandemia; 5) uso da estrutura do Estado para obtenção de vantagens. O envolvimento do mesmo grupo seria um dos elementos de conexão.
“O Supremo fala muito, na sua competência, do imbricamento de fatos. Quando há uma relação fundamental de provas, é a situação de conexão probatória”, diz Helena Lobo da Costa, professora de Direito Penal da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP).
Em artigo publicado no blog nesta segunda-feira, 21, o ex-ministro da Justiça Miguel Reale Júnior defendeu a competência do STF para processar o caso. “A prova de um fato implica e interfere na prova de outro”, escreveu.
O criminalista Celso Vilardi, mestre em Direito Processual Penal, discorda. Para o advogado, a manutenção do caso no STF contraria o histórico de decisões do próprio tribunal.
“O STF vinha se posicionando de forma absolutamente restritiva em relação ao foro por prerrogativa de função, mesmo em casos com conexão evidente. Por exemplo, há casos de acusação de corrupção contra autoridade com foro e coautor sem foro que o Supremo chegou a mandar embora”, relembra.
Investigações sensíveis a Bolsonaro estão com Moraes
A alegada conexão do caso das joias remonta a outras investigações sensíveis a Bolsonaro que estão nas mãos de Alexandre de Moraes. A principal delas, citada expressamente na decisão que autorizou buscas sobre a venda das joias, é a investigação das milícias digitais.
O inquérito das milícias digitais nasceu derivado de outra frente de apuração que mira aliados e apoiadores bolsonaristas: o inquérito dos atos antidemocráticos. Na ocasião, o caso precisou ser arquivado por determinação da Procuradoria-Geral da República (PGR). Antes de encerrá-lo, porém, Moraes, na condição de relator, autorizou o intercâmbio de provas e mandou rastrear o que chamou de “organização criminosa”. Bolsonaro é um dos investigados no caso.
O procurador de Justiça César Dario Mariano, do Ministério Público de São Paulo, não vê conexão entre o inquérito das milícias digitais e o caso das joias. “Até agora não há ninguém foi processado pela tal das milícias digitais e a gente nem sabe se haverá. Esse inquérito não pode ficar aberto infinitamente atraindo outras investigações”, afirma.
Para o procurador, o Supremo Tribunal Federal é “absolutamente incompetente” para processar a investigação as joias. Ele alerta que, se um eventual julgamento for mantido no STF, os denunciados serão prejudicados, porque terão direito a recurso. “Isso viola o duplo grau de jurisdição. A pessoa não pode recorrer, não tem a quem recorrer”, explica.
Em 2019, quando o STF se tornou alvo de pesados ataques, após decidir que casos de corrupção ligados a crimes eleitorais deveriam ser processados na Justiça Eleitoral, o tribunal fixou que estava apto a se defender. A Corte validou, em votação quase unânime no plenário, uma interpretação ampliada do regimento interno para confirmar a própria atribuição na investigação de ofensas e ameaças aos ministros e instituições democráticas. O caso ficou conhecido como inquérito das fake news e também mira bolsonaristas.
“Eu não vejo uma ampliação de competência do STF relacionada ao governo Bolsonaro. Eu acho que é mais relacionada a um contexto de perigo do Estado Democrático de Direito, que se materializa no 8 de janeiro”, segue Helena.
O professor Álvaro Palma de Jorge vai na mesma linha: “A questão do alargamento das competências do Supremo é um fenômeno maior, que não está restrito ao tema Bolsonaro”, defende. “O processo de afirmação do Supremo como um poder que interpreta a Constituição, uma Constituição ampla, importa, se olhamos de 1988 para cá, numa ampliação do seu papel político-constitucional. Ninguém tem dúvidas de que ele foi ampliado. Mas acho errado tirar a conclusão de que foi por uma excepcionalidade do período Bolsonaro. O período foi conturbado, mas as instituições foram se articulando e jogando dentro do que tinham competência para fazê-lo.”
Esquema das joias começou a ser investigado em São Paulo
O caso das joias começou a ser investigado em São Paulo, sob a supervisão da Justiça Federal, depois que o Estadão revelou a apreensão de um conjunto avaliado inicialmente em R$ 16,5 milhões com uma comitiva do Ministério de Minas e Energia no aeroporto de Guarulhos.
Em paralelo, a Polícia Federal em Brasília deu início a uma investigação mais ampla, sobre a venda de presentes diplomáticos - como as próprias joias e esculturas -, que deveriam ter sido restituídos pelo governo Jair Bolsonaro ao patrimônio da União. Com o avanço do novo inquérito, o Ministério Público Federal (MPF) em São Paulo pediu a união das duas frentes de investigação no STF.
Os especialistas consultados pelo Estadão avaliam que, no caso de uma eventual revisão da competência do STF e do declínio do caso das joias para a primeira instância, não há espaço para anular a investigação até o estágio em que ela houver avançado. Um dos princípios para resguardar o inquérito é a chamada “teoria do juízo aparente”, que prevê como, na fase provisória da apuração, a competência não é clara e pode ser alterada com o andamento do caso.
“A fase de investigação é naturalmente dinâmica: vão surgindo elementos novos que podem levar a uma alteração de competência. Não tem e não dá pra ter uma sequência legal”, explica a professora Helena Lobo da Costa. “A nulidade dessa fase não contamina a ação penal.”
STF quer regular uso da inteligência artificial antes de o Congresso tomar uma decisão
Por J.R. Guzzo / o estadão de sp
O ministro Alexandre de Moraes, numa de suas últimas conferências, voltou a deixar claríssimo, mais uma vez, o tamanho do abismo que está sendo aberto entre dois tipos de Brasil. O primeiro é o Brasil que funciona segundo determinam as regras da Constituição Federal. O segundo é o Brasil como o STF acha que ele tem de ser. No Brasil constitucional, as leis que afetam todos os brasileiros têm de ser aprovadas pelo Congresso Nacional – todas as leis, sobre todos e quaisquer assuntos, sem exceção.
No Brasil de Alexandre de Moraes e da maioria de seus colegas, o Supremo tem o direito, e possivelmente o dever, de criar leis em áreas sobre as quais o Congresso ainda não tomou decisões. Não é assim em nenhuma democracia séria do mundo. Lá só os eleitos pelo voto livre e universal dos cidadãos têm o direito de aprovar uma lei - e só a suprema corte tem o direito de resolver se a Constituição está sendo obedecida nas questões que são levadas ao seu julgamento.
A lei que o ministro Moraes quer fazer, agora, é sobre a inteligência artificial. Não diz que se trata de lei, e sim de “regulamentação” – mas em termos práticos dá exatamente na mesma. Segundo afirmou, de duas uma: ou o Congresso aprova logo (até as próximas eleições, pelo que deu para entender) uma legislação sobre o uso da IA no Brasil, ou o STF “vai ter” de decidir a respeito. “Não é possível a justiça eleitoral dizer: ‘Como não há regulação, não podemos julgar isso.’”, afirma o ministro. “É isso que pode atrapalhar a lisura das eleições”. Na sua opinião, existe no caso até uma injustiça em relação ao STF. “Aí entramos naquele ciclo vicioso”, disse Moraes. “Se não há regulação, há necessidade da justiça regulamentar, e aí o Judiciário é acusado de usurpar o Legislativo”.
Não ocorre ao STF, nem à esquerda que lhe dá apoio automático, fazer uma pergunta muito simples: “E porque há ‘necessidade’ da justiça regular o que o Congresso ainda não regulou?” Não há necessidade nenhuma, e o texto da Constituição não permite em lugar algum, que o Judiciário (ou o Executivo) faça leis que até agora não foram feitas. E se alguém levar à justiça uma questão que não está regulamentada? É só o juiz, ou o STF, dizerem: “Não é possível julgar essa causa, pois não há lei a respeito.
Quando houver, voltem aqui”. Se não existe no Brasil nenhuma lei sobre o uso da IA, é porque o Congresso ainda não quis fazer – e os parlamentares não têm absolutamente nenhuma obrigação legal de aprovar qualquer tipo de lei, sobre qualquer assunto, e dentro de qualquer prazo.
O STF, ou quem quer que seja, está achando que é preciso regulamentar isso ou aquilo? Perfeito; talvez seja preciso mesmo. Mas só o Congresso, como representante legal da população brasileira, está autorizado a fazer isso. Não tem a menor obrigação de querer as mesmas leis que o STF quer. Não tem de obedecer aos seus prazos – tal lei, sobre tal assunto, tem de ser aprovada até tal dia.
Não tem, acima de tudo, de fazer o que ainda não fez. Vai fazer quando achar que deve, ou porque há pressão popular para que faça – ou então vai deixar as coisas como estão. Há alguém na frente do Congresso, em Brasília, dizendo: “Queremos a regulamentação da Inteligência Artificial, já?” Não há ninguém, e os congressistas sabem perfeitamente disso. Numa democracia de verdade, caberia ao STF esperar a decisão do Congresso. Mas isso aqui é o Brasil.
MPF volta a pedir que Ibama negue à Petrobras licença para exploração de petróleo na Foz do Amazonas
/ FOLHA DE SP
O MPF (Ministério Público Federal) pediu nesta sexta-feira (18) que o Ibama negue o pedido de reconsideração da Petrobras de conceder uma licença ambiental à petroleira para perfurar a bacia da Foz do Amazonas, no Amapá, e afirmou que adotará "medidas judiciais cabíveis" caso a recomendação não seja atendida.
O presidente do órgão ambiental, Rodrigo Agostinho, já havia indeferido este ano o pedido de licença ambiental realizado pela Petrobras, alegando que a companhia não atendeu aos requisitos necessários para seguir adiante com as atividades, mas a empresa disse que iria recorrer da decisão.
A recomendação do MPF reforça o conteúdo de um documento enviado pelo órgão público que abordava "inconsistências" do pedido de licença da Petrobras, incluindo "premissas equivocadas apresentadas pela empresa, que distorcem ou reduzem as manifestações do Ibama em pareceres anteriores".
Também foi destacada a falta de manifestação da Petrobras sobre aspectos "cruciais" para o indeferimento da licença para a operação na bacia, disse o MPF.
A bacia da Foz do Amazonas é parte da margem equatorial brasileira, uma ampla área do litoral que vai do Rio Grande do Norte ao Amapá e inclui ainda as bacias Pará-Maranhão, Barreirinhas, Ceará e Potiguar, cada região com características distintas.
Toda a região é vista como uma nova fronteira exploratória de petróleo, com grande potencial para descobertas de petróleo, mas com enormes desafios socioambientais.
O MPF fixou prazo de dez dias úteis para que o Ibama informe sobre o acatamento ou não da recomendação e disse que encaminhou os documentos acerca das providências adotadas no caso.
"O Ibama também foi advertido que o desatendimento do que foi recomendado importará na adoção das medidas judiciais cabíveis, para os fins de corrigir as ilegalidades constatadas e promover as respectivas responsabilidades que venham a ser configuradas", disse o órgão público em nota.
A Petrobras não respondeu de imediato ao pedido de comentário da Reuters.
PF intima Bolsonaro a depor em caso de empresários que discutiram golpe de Estado por WhatsApp
Por Paolla Serra — Brasília / O GLOBO
A Polícia Federal intimou o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) a prestar depoimento sobre investigações acerca de num grupo de empresários que discutiu um golpe de Estado por WhatsApp. De acordo com as investigações, o ex-mandatário teria solicitado no grupo o repasse de mensagens sobre fraude nas eleições e ataques a autoridades. A oitiva foi marcada para o próximo dia 31, na sede da corporação, em Brasília.
Em uma das conversas analisadas pela PF, Bolsonaro pediu a um empresário para "repassar ao máximo" uma mensagem que insinuava, sem provas, uma fraude do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) nas eleições do ano passado, e ainda continha ataques ao ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF).
A mensagem consta em um relatório da Polícia Federal (PF) sobre conversas do fundador da Tecnisa, o empresário Meyer Nigri, que recebeu o texto em junho do ano passado. Bolsonaro tinha o hábito de mandar a mesma mensagem para diversos contatos, o que indica que o mesmo texto possa ter sido enviado para outras pessoas.
Em junho do ano passado, um contato identificado como "Pr Bolsonaro 8" — que a PF afirma ser do ex-presidente — enviou a Nigri uma mensagem afirmando que Barroso cometeu "interferência" e "desserviço à democracia" por atuar contra a adoção do voto impresso. O texto ainda afirma, sem provas, que o Datafolha estaria "inflando" os números do então pré-candidato Luiz Inácio Lula da Silva para "dar respaldo" ao TSE.
Ao final, a mensagem dizia: "Repasse ao máximo". Nigri, então, respondeu: "Já repassei pra vários grupos!".
A PF afirma que a mensagem tinha "conteúdo não lastreado ou conhecidamente falso (fake news), atacando integrantes de instituições públicas especialmente Ministros do STF, desacreditando o processo eleitoral brasileiro".
O trecho da conversa entre Bolsonaro e Nigri foi utilizado como justificativa pelo ministro Alexandre de Moraes para prorrogar uma investigação contra o empresário.
O ministro concordou com um pedido da PF e considerou que o órgão "ratificou a existência de vínculo entre ele (Nigri) e o ex-presidente Jair Bolsonaro, inclusive com a finalidade de disseminação de várias notícias falsas e atentatórias à Democracia e ao Estado Democrático de Direito".
Na segunda-feira, Moraes arquivou uma investigação seis empresários por trocarem mensagens de cunho golpista em um grupo de WhatsApp. O ministro, contudo, prorrogou a apuração contra Nigri e outro alvo, Luciano Hang.
Em agosto do ano passado, os oito empresários foram alvos de mandados de busca e apreensão, após suas conversas serem reveladas pelo site "Metrópoles". Os outros seis empresários do grupo do WhatsApp são: Afrânio Barreira Filho, dono do Coco Bambu; André Tissot, da Sierra Móveis; Ivan Wrobel, da W3 Engenharia; José Isaac Peres, da Multiplan; José Koury, do Barra World Shopping e Marco Aurélio Raymundo, da Mormaii.
Juiz condena hacker a 20 anos de prisão por crimes na Operação Spoofing
Por Mariana Muniz e Daniel Gullino — Brasília
O juiz Ricardo Leite, da 10ª Vara Federal Criminal do Distrito Federal, condenou a 20 anos e um mês de prisão o hacker Walter Delgatti Neto, em razão da Operação Spoofing, deflagrada em 2019 para apurar o vazamento de diálogos de procuradores da extinta força-tarefa da Lava-Jato.
Delgatti foi condenado por crime de organização criminosa, lavagem e ocultação de bens, direitos e valores, por invadir dispositivo informático de uso alheio com o fim de obter, adulterar ou destruir provas.
Ao aplicar a pena ao hacker, o magistrado aponta para uma "culpabilidade em grau exasperado", uma vez que os ataques cibernéticos realizados por Delgatti "foram direcionados a diversas autoridades públicas, em especial agentes responsáveis pela persecução penal, além de diversos outros indivíduos que possuem destaque social, bastando verificar as contas que tiveram conteúdo exportado".
"É reincidente, conforme comprova sua ficha criminal e possui outros registros penais. Conduta social que deve ser avaliada de forma desfavorável, já que, para continuar com seu intento criminoso e escapar do cumprimento do mandado de prisão emitido em seu desfavor, utilizou-se do nome de Danilo Cristina Marques", afirma o juiz.
Leite também classifica que Delgatti tem "personalidade que deve ser avaliada de forma desfavorável, ante o exibicionismo de suas condutas ilícitas (materializadas nas imagens encontradas em seu computador) e a qualificação de forma pública e virtuosa de seus atos criminosos, intitulando-os de “ajuda ao povo brasileiro”".
Ainda segundo o juiz, é "inequívoca a posição de Walter como líder da organização criminosa, utilizando-se de facilidades que cada um dos denunciados poderia lhe proporcionar, situação que contribuiu para o sucesso da atividade criminosa".
O hacker foi condenado por crimes previstos no Código Penal e na Lei de Interceptação Telefônica. Entre eles estão o crime de invasão de dispositivo alheio, organização criminosa, lavagem e ocultação de bens, direitos e valores.
Delgatti havia sido preso na Operação Spoofing, deflagrada em julho de 2019 pela Polícia Federal. Ele próprio admitiu ter invadido o Telegram das autoridades. Em setembro de 2020, porém, a Justiça revogou sua prisão preventiva e determinou a utilização de tornozeleira eletrônica.
O "hacker de Araraquara", como ficou conhecido, foi preso novamente em outras duas ocasiões. A última delas ocorreu por ordem do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, em razão da suspeita de invasão dos sistemas do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para inserir documentos e alvarás de soltura falsos no Banco Nacional de Mandados de Prisão (BNMP).
Com votos de Kassio e Fachin, STF faz 6 a 1 e tem maioria para validar juiz de garantias
Por Pepita Ortega / O ESTADÃO DE SP
Com os votos dos ministros Kassio Nunes Marques e Edson Fachin, o Supremo Tribunal Federal formou maioria nesta quinta-feira, 17, para validar o modelo do juiz de garantias, em que um magistrado fica responsável somente pela condução de inquéritos, enquanto outro deve julgar o mérito do caso.
Na retomada do julgamento, nesta quinta-feira, 17, os ministros acompanharam o voto do ministro Dias Toffoli, no sentido de confirmar a constitucionalidade do artigo 3-B da lei anticrime. Já haviam votado em tal sentido os ministros Alexandre de Moraes, Cristiano Zanin e André Mendonça.
Em seu voto, Kassio ressaltou que a Constituição não impõe nem proíbe o juiz de garantias, estando sua criação dentro da ‘margem de discricionariedade’ do legislador. Ele classificou a implementação da dinâmica como a ‘maior mudança do processo penal brasileiro desde o Código de Processo Penal’.
Segundo Kassio, que integrou o Tribunal Regional Federal da 1ª Região antes de ser alçado ao STF, ‘haverá um aumento de custos seguramente’, mas é possível a implementação do modelo.
Ele sugeriu um prazo de até 36 meses para que os tribunais de todo o País se adaptem à nova dinâmica, mas sinalizou apoio ao prazo inicialmente proposto por Toffoli, de 12 meses. Indicou ainda que deve haver um ‘reconhecimento’ em caso de tribunais que realizem uma ‘implementação mais célere’ do modelo.
O ministro Edson Fachin ainda não terminou de ler seu voto, uma vez que o julgamento abarca outros pontos da lei anticrime, mas já se manifestou sobre a constitucionalidade do juiz de garantias. Ele ressaltou que a Corte máxima ainda deve discutir o prazo de implantação do modelo, mas indicou que segue o posicionamento do ministro Dias Toffoli.
Por hora, o relator, Luiz Fux, está isolado. O ministro defendeu tornar facultativa a implementação da dinâmica. Restam votar os ministros Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Gilmar Mendes e Cármen Lúcia.
Pagamento de dívida extingue punição por crime tributário, decide STF por unanimidade
Eduardo Cucolo /FOLHA DE SP
Por unanimidade, o STF (Supremo Tribunal Federal) considerou constitucional a legislação que suspende a punição por crimes tributários após o parcelamento dessas dívidas e prevê sua extinção após o pagamento integral dos valores cobrados.
Em 2009, a Procuradoria-Geral da República ajuizou ação direta de inconstitucionalidade contra artigos que tratam do tema na lei 11.941. A questão (ADI 4.273) foi julgada pelo plenário virtual do Supremo finalizado à meia-noite desta segunda-feira (14).
A PGR argumentava que "só a ameaça de pena permite a arrecadação de tributos e contribuições previdenciárias, que, por sua vez, possibilitarão maior distribuição de renda e justiça social".
Dizia ainda que os dispositivos da lei de 2009 atingem o caráter pedagógico da pena e "reforçam a percepção da dupla balança da Justiça: penaliza sistematicamente os delitos dos pobres e se mostra complacente com os delitos dos ricos".
O relator do caso, ministro Nunes Marques, afirmou em seu voto que a extinção da punibilidade em função da reparação integral do dano causado ao erário é uma opção política, há muito tempo adotada no ordenamento jurídico brasileiro, e que demonstra a prevalência do interesse na arrecadação, em detrimento da sanção penal.
Para o ministro, a opção do legislador visa estimular a reparação integral do dano causado ao erário em decorrência da prática da sonegação.
O voto foi acompanhado pelos outros dez ministros do STF.
"O parcelamento e o pagamento integral dos créditos tributários, além de resultarem em incremento da arrecadação, exercendo inequívoca função reparatória do dano causado ao erário em razão da prática dos crimes tributários, constituem mecanismos de fomento da atividade econômica e, em consequência, de preservação e de geração de empregos", afirma o ministro.
Gabriela Arcentales, advogada da área Penal Empresarial do Machado Meyer Advogados, afirma que a posição dos ministros do STF está em linha com outras decisões do Judiciário e reforça um instrumento arrecadatório do Fisco. Ela lembra também que nesses casos não há responsabilização penal da pessoa jurídica, mas de seus executivos, o que reforma o incentivo à regularização.
"O STF acabou decidindo por unanimidade da maneira mais adequada. Permitir essas medidas despenalizadoras para o contribuinte, ao contrário do que foi dito pela PGR, não viola os princípios de uma sociedade igualitária e contribui com a questão econômica", afirma a advogada.
Fernando Munhoz, sócio da área de tributário do Machado Meyer, afirma que a maioria das cobranças está relacionada a divergências em relação à interpretação da legislação tributária, e não a fraudes e outros crimes —pelos quais os dirigentes de uma empresa ainda podem ser responsabilizados.
"Há um entendimento consolidado de que nesses crimes contra ordem tributária a materialidade e justa causa está ligada a um débito que seja exigível do contribuinte. A partir do momento em que temos uma circunstância em que esse débito não é mais exigido, não há porque seguir com as medidas de persecução penal", afirma o advogado.
Prende-se muito e mal
No Brasil, a repressão a drogas se caracteriza, em grande medida, por prender por tráfico pessoas sem qualquer relação com facções criminosas, como mostram resultados preliminares da pesquisa "Perfil do processado e produção de provas nas ações criminais por tráfico de drogas".
O levantamento, elaborado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), aponta que em apenas 13% dos processos analisados há menção às facções. Confirma-se em números o que já se intui a partir das práticas judicial e policial: prende-se muito e mal por tráfico de entorpecentes no país.
A Lei de Drogas, de 2006, não definiu a quantidade de substância ilícita que qualificaria uso individual, o que torna nebulosa a distinção entre usuário e traficante.
Ao analisar 41 mil processos de tribunais estaduais com decisões no primeiro semestre de 2019, o estudo esmiúça a engrenagem judicial que produz desigualdades sob a justificativa do combate ao crime.
A maioria dos processados é homem (87%) jovem (72%) negra (67%), com baixa escolaridade (75%), desempregada ou autônoma (66%) —e possui passagem anterior pela Justiça (50%).
Em 80% dos casos, os réus permaneceram presos de forma preventiva durante o processo, inchando ainda mais o sistema carcerário.
A forma como as denúncias chegam ao Judiciário é digna de nota. Investigação por órgãos especializados, como Polícia Civil, responde por apenas 20% dos processos. A maioria do restante tem origem em ações nas ruas da Polícia Militar.
Revela-se, assim, a preferência pelo policiamento ostensivo, em detrimento da inteligência em apuração, que pode atingir facções criminosas ligadas ao tráfico.
O levantamento mostra ainda que as polícias usam justificativas genéricas para abordagens, como patrulhamento (32,5%) e denúncia anônima (30,9%). Neste último caso, em 93% dos processos, há só menção genérica às denúncias, sem registro do autor ou do conteúdo do relato.
O tema está em debate no Supremo Tribunal Federal. O julgamento se encontra suspenso com placar de quatro votos a zero em favor da descriminalização do porte de drogas para uso pessoal.
Trazer mais objetividade à lei pode contribuir para a redução do encarceramento massivo de negros e pobres como traficantes. Já o Congresso deveria desenhar uma política de drogas que seja justa e eficaz.