PT quer deixar para 2023 discussão sobre tabela do Imposto de Renda
Promessa de campanha do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a correção da tabela do Imposto de Renda deve ser discutida apenas no próximo ano, defendem integrantes do partido.
A votação do projeto que amplia a faixa de isenção do Imposto de Renda ainda neste ano foi sinalizada pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), após a vitória de Lula sobre o presidente Jair Bolsonaro (PL). Durante a campanha eleitoral, o petista prometeu isentar do pagamento de IR quem ganha até R$ 5.000.
Passado o segundo turno, a equipe de Lula passou a negociar com o Congresso a apresentação de uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição) para autorizar despesas extras acima do teto de gastos em 2023, incluindo o Auxílio Brasil [que deve ser rebatizado de Bolsa Família] de R$ 600 e o aumento real [acima da inflação] do salário mínimo.
A estimativa é que essa PEC tenha um custo de pelo menos R$ 100 bilhões –alguns falam em R$ 200 bilhões.
A proposta de ampliação das faixas do Imposto de Renda, no entanto, não está sendo discutida no âmbito desta PEC.
Por acarretar renúncia fiscal, o projeto precisa estar contemplado no Orçamento de 2023, em tramitação no Legislativo. A estimativa é que o custo da medida seja de R$ 22 bilhões –maior do que a proposta para incluir todas as crianças de até seis anos no benefício social extra de R$ 150, que exigiria R$ 16 bilhões.
Diante do aperto fiscal, parlamentares do PT defendem que a discussão seja feita somente no próximo ano. Nesta sexta-feira (4), durante a visita do PT ao CCBB (Centro Cultural Banco do Brasil), onde será a sede da transição, o senador Paulo Rocha (PT-PA) disse que a correção da tabela do Imposto de Renda é "outra coisa que vai ficar para depois".
Adiar para 2023 evitaria uma espécie de incoerência. Isso porque, de um lado, a PEC da transição está sendo discutida sob argumento de que não há espaço no Orçamento para contemplar os gastos sociais. Do outro, o governo eleito estaria abrindo mão de uma receita relevante.
Além disso, há a avaliação de que não haveria por que cumprir todas as promessas de campanha antes de o novo governo tomar posse. A PEC, portanto, contemplaria as principais propostas, e as demais seriam acomodadas no Orçamento ao longo do mandato.
"Para nós, a prioridade é qualquer projeto que volte a tributar lucros e dividendos e que reduza a cobrança de Imposto de Renda sobre os mais pobres", diz o deputado Enio Verri (PT-PR), coordenador do PT na CMO (Comissão Mista de Orçamento).
"O governo Lula começa no dia 1º de janeiro. Não dá para fazer este tipo de debate no governo Bolsonaro. Então, quando começar o ano, quando nós tomarmos posse é que nós vamos começar o debate da tabela do Imposto de Renda, se possível um pouco mais ampla. Se não for uma grande, pelo menos uma pequena reforma tributária."
Uma ala da Câmara defende que se vote o projeto de ampliação da tabela ainda neste ano. Autor do texto que estende a isenção do IR para quem ganha até R$ 5.200, o deputado Danilo Forte (União Brasil-CE) afirma que a correção é uma demanda antiga da sociedade.
"Entendo que temos uma ótima janela para avançar no projeto, uma vez que o tema esteve presente como prioridade nas duas campanhas", disse.
"A Câmara tem demonstrado uma grande determinação em colocar a agenda da redução de impostos, como ficou provado na aprovação do teto do ICMS. Nos colocamos à disposição do governo eleito para tocar este tema e acredito que é possível entrar no próximo ano com essa questão equalizada, já com a medida em vigor."
Forte defende ainda que não é razoável manter "uma taxação injusta sobre a população, especialmente a mais carente, por mais um ano, se temos a oportunidade de tratar disso agora". Para ele, a discussão poderia ser feita no âmbito da PEC da transição.
Líder do governo na Câmara, o deputado Ricardo Barros (PP-PR) afirma que a intenção é negociar com o líder da oposição, Wolney Queiroz (PDT-PE), temas que tenham reflexo na gestão Lula –o que incluiria a proposta de Imposto de Renda.
A tabela de cobrança do Imposto de Renda é a mesma há sete anos, quando o salário mínimo era de R$ 788. Se não houver reajuste, brasileiros que ganham 1,5 salário mínimo, atualmente isentos, terão de pagar imposto no próximo ano.
De acordo com uma simulação feita em julho pelo Sindifisco Nacional, que representa os auditores fiscais da Receita Federal, uma pessoa que recebe R$ 5.000, após deduções, paga atualmente R$ 505,64 de IR. Se toda a defasagem da tabela fosse corrigida, esse valor cairia para R$ 24,73.
Foi no segundo ano do governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB) que a atualização anual deixou de ser feita. A partir da gestão tucana, a correção passou a ser feita de maneira inconstante, como em 2002 e, nos governos do PT, entre 2005 e 2015 —último ano em que houve reajuste.
Para Débora Freire, professora de economia do Cedeplar da UFMG (Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional da Universidade Federal de Minas Gerais), uma reforma completa seria o mais adequado.
"Em condições ideais, a gente poderia ter tributação de lucros e dividendos efetiva, que utilizasse alíquotas progressivas, para que a gente conseguisse aumentar a arrecadação via Imposto de Renda, corrigir distorções, como a tendência à pejotização, ao mesmo tempo, dar uma boa isenção como essa que tem sido proposta", afirmou.
Mas a especialista ressalta o alto custo político de um projeto mais amplo na transição do governo. "Tem a chance de passar algo ruim e é uma reforma. Então, é melhor deixar para o ano que vem a reforma completa", disse. "Não dá para passar uma correção que seja muito expressiva porque a gente não vai ter como compensar isso agora, mas acredito que há espaço para passar uma correção mais parcimoniosa".
Transição ao normal
Com sua lacônica admissão da derrota eleitoral, dois dias depois do resultado do pleito, o presidente Jair Bolsonaro (PL) afastou eventuais temores quanto a uma irresponsável obstrução do processo de transição para o novo governo.
A passagem de bastão, com a necessária transmissão de informações para os próximos gestores, está prevista em lei de 2002 e é regulada por decreto de 2010.
A legislação prevê o acesso de um coordenador e uma equipe de até 50 indicados a dados dos órgãos públicos federais —e estipula que os entendimentos comecem no segundo dia útil após o anúncio do resultado eleitoral e terminem até dez dias após a posse presidencial.
Bolsonaro, portanto, cumpriu sua obrigação formal em tempo hábil. Informalmente, na realidade, os contatos entre a equipe do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), e membros da atual administração já haviam se iniciado.
Coube ao ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, acenar com salutares pragmatismo e senso de responsabilidade a representantes do candidato vitorioso.
A boa atitude do ministro nos bastidores tornou-se oficial, após o pronunciamento de Bolsonaro, que lhe atribuiu a missão de conduzir os entendimentos.
Da parte de Lula, mostrou-se sensata e promissora a indicação do vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin (PSB), para coordenar a tarefa. Trata-se de político equilibrado e prudente, com farta experiência como governador de São Paulo, capacidade de diálogo e ótimo trânsito no meio político, inclusive entre conservadores.
A escolha não deixa de ser um sinal —a ser confirmado— da disposição do presidente eleito de formar, como prometeu em campanha, um governo que transcenda o PT e se abra para um leque mais amplo de colaboradores e ideias. O MDB, aliás, foi convidado a ter um representante na transição.
A designação de Alckmin faz lembrar a opção para o mesmo posto por Antonio Palocci, já então um petista moderado e disposto a abraçar, como faria na pasta da Fazenda, a racionalidade econômica.
Diante dos problemas que o país terá de enfrentar, a começar por lacunas de dezenas de bilhões de reais no Orçamento de 2023, e da urgência de um reconhecimento da situação, com vistas a economizar tempo e formular políticas para o próximo ciclo, seria deplorável que se erguessem dificuldades ao longo do processo.
A alternância de poder é uma virtude da democracia que precisa transcorrer em ambiente de maturidade institucional e respeito ao bem comum. É o que o Brasil espera assistir nessa nova etapa.
Ceará é o estado no Brasil em que Bolsonaro mais cresceu entre o primeiro e o segundo turno
Inácio Aguiar / DIARIONORDESTE
O ex-presidente Lula (PT) voltou a vencer a eleição em todos os municípios cearenses neste segundo turno. Entretanto, o presidente Jair Bolsonaro (PL) registrou um crescimento de 18,6% em sua votação entre o primeiro e o segundo turno. O Ceará, assim, foi o Estado em que Bolsonaro registrou o maior crescimento proporcional de votos entre os dois turnos da eleição.
Em números absolutos, o presidente, que perdeu a reeleição, obteve em todo território cearense no primeiro turno, o total de 1.377.827 votos. Já no segundo turno, esse número saltou para 1.634.477, um saldo positivo de 256.650 votos.
O resultado final ficou longe do percentual colocado como uma espécie de meta pela campanha do PL no Estado, que seria atingir 45% dos votos, entretanto, pode ser considerado como um dado vitorioso dos aliados do presidente no Estado, diante do cenário do restante do País.
A estratégia bolsonarista no Ceará durante o segundo turno foi capaz de convencer um maior contingente de eleitores, gerando um crescimento a Bolsonaro maior do que conseguiram os aliados do presidente eleito Lula, em que pese o petista ter uma ampla maioria de votos no Estado, chegando a 69,9% neste segundo turno, contra 30% de Bolsonaro.
A alta de votos de Lula entre o primeiro e o segundo turno no Estado, em números gerais, foi de 229.536 votos, o que correspondeu a 6,4% de incremento. A ponderação, evidentemente, é que o petista já havia conseguido uma ampla maioria no primeiro turno.
MINAS GERAIS AO LADO DO CEARÁ
O segundo estado que, proporcionalmente, turbinou o desempenho do presidente no País foi Minas Gerais. Lá, Lula conseguiu vencer, mas Bolsonaro saltou de um total de 5.239.264 votos no primeiro turno, para 6.141.310 no segundo turno, alta de 17,2%.
Em todo o País, a maioria de 6,1 milhões de votos a favor de Lula ocorrida no primeiro turno caiu para 2,1 milhões de votos no segundo turno. Bolsonaro conseguiu crescer, mas não o suficiente para virar o placar.
JAIR BOLSONARO (PL)
- 1º turno: 1.377.827 votos
- 2º turno: 1.634.477 votos
- Crescimento total: 256.650 votos
- Crescimento percentual: 18,6%
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
- 1º turno: 3.578.355 votos
- 2º turno: 3.807.891 votos
- Crescimento total: 229.536 votos
- Crescimento percentual: 6,4%
‘Acabou’, diz Bolsonaro a ministros do STF sobre resultado das eleições em encontro na Corte
Por Weslley Galzo / O ESTADÃO
BRASÍLIA - Logo após romper o voto de silêncio que durou quase 45 horas depois de ter sido derrotado nas urnas por Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o presidente Jair Bolsonaro (PL) se dirigiu à sede do Supremo Tribunal Federal (STF), onde se reuniu com sete integrantes da Corte e com o ministro da Economia, Paulo Guedes.
Segundo o ministro Edson Fachin, Bolsonaro disse que considera o assunto resultado das eleições encerrado. “O presidente da República usou o verbo ‘acabar’ no passado. Acabou. Portanto, olhar para a frente”, afirmou o ministro.
Após o encontro, o STF divulgou a seguinte nota, que partiu da presidente da Corte, Rosa Weber:
O Presidente da República, Jair Bolsonaro, esteve na tarde desta terça-feira (1º) no Supremo Tribunal Federal a convite da Presidência, onde conversou com os Ministros da Corte que estavam presentes em Brasília: a presidente Rosa Weber, o decano Gilmar Mendes, Luiz Fux, Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Nunes Marques e André Mendonça. Compareceu também o Ministro da Economia, Paulo Guedes.
Os Ministros do STF reiteraram o teor da nota oficial divulgada, que consignou a importância do reconhecimento pelo Presidente da República do resultado final das eleições, com a determinação do início do processo de transição, bem como enfatizou a garantia do direito de ir e vir, em razão dos bloqueios nas rodovias brasileiras.
Tratou-se de uma visita institucional, em ambiente cordial e respeitoso, em que foi destacada por todos a importância da paz e da harmonia para o bem do Brasil.
Foi a segunda nota do Supremo em pouco mais de duas horas. Às 17h34, a Corte já havia divulgado um posicionamento reforçando a importância do pronunciamento do presidente para “garantir o direito de ir e vir em relação aos bloqueios e, ao determinar o início da transição, reconhecer o resultado final das eleições”.
Os ministros Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes saíram juntos da reunião e se mantiveram em silêncio diante das perguntas de jornalistas sobre eventuais arranjos acertados para uma tentativa de pacificar o País. Moraes, que também é presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), foi alvo de severas críticas do presidente nos últimos anos.
Também participaram da reunião, que durou cerca de uma hora e dez minutos, os ministros Luiz Fux, Kassio Nunes Marques e André Mendonça, os dois últimos indicados por Bolsonaro à Corte. O encontro durou cerca de uma hora e dez minutos.
Ao deixar o prédio, o presidente se manteve em silêncio. O ministro Paulo Guedes afirmou apenas que o encontro foi “supertranquilo” e “amistoso”.
O prédio do STF está fechado nesta terça-feira, 1º, por causa do risco de invasão por apoiadores de Bolsonaro e do feriado de Finados. Além de ter o seu perímetro isolado por barricadas da Polícia Militar do Distrito Federal, o prédio do Supremo reforçou a sua segurança. É possível avistar agentes da polícia judicial portando fuzis ao fazer a ronda no prédio, que geralmente é realizada com o porte de armas não letais e pistolas de baixo calibre.
Com Raquel Lyra e Fátima, Brasil chega a dez governadoras eleitas na história
Com o fim do segundo turno, neste domingo (30), todos os estados da federação escolheram seus governadores, e duas mulheres ocuparão a chefia de Executivos estaduais no próximo ano —Raquel Lyra (PSDB) em Pernambuco e Fátima Bezerra (PT) no Rio Grande do Norte.
O resultado marca o segundo maior número de mulheres comandando governos estaduais: o pico foi em 2006, com três. Desde a redemocratização, a cifra total de mulheres à frente de estados chegou a dez.
Fátima já ocupava o Palácio de Despachos de Lagoa Nova e conquistou a reeleição em primeiro turno, enquanto a tucana derrotou Marília Arraes (Solidariedade), aliada do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em uma volta final pouco nacionalizada e após a morte de seu marido, Fernando Lucena.
A chapa de Lyra, com Priscila Krause (Cidadania) como candidata a vice, é a primeira totalmente feminina a ser eleita na história do Brasil, de acordo com o TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
Mas a relação entre eleitas e candidatas ainda é baixa. No pleito deste ano, o Brasil contou com 35 candidaturas femininas em todos os estados, resultando em uma taxa de eleição de quase 6%.
Historicamente, 13 estados brasileiros já foram comandados por mulheres no país em caráter substitutivo ou definitivo. A primeira a assumir efetivamente um governo estadual foi Iolanda Fleming (MDB), no Acre, em 1986, após a renúncia de Nabor Júnior, que deixou o cargo para se candidatar ao Senado.
Oito anos depois, o Maranhão elegeu Roseana Sarney (MDB), a primeira alçada por meio de votação popular ao cargo na história do Brasil. Ela foi reeleita em 1998 e depois voltou à administração estadual em 2009, após cassação da chapa vitoriosa em 2006. Em 2010, foi reconduzida ao cargo outra vez.
Em 2002, duas mulheres se tornaram governadoras —Rosinha Garotinho no Rio de Janeiro e Wilma de Faria no Rio Grande do Norte. Quatro anos depois, o ápice: além da reeleição de Wilma, o Rio Grande do Sul e o Pará alçaram, respectivamente, Yeda Crusius (PSDB) e Ana Júlia Carepa (PT) aos governos.
O número voltou a cair em 2010, com a eleição de Roseana e de Rosalba Ciarlini (DEM) no Rio Grande do Norte, e em 2014, quando apenas Suely Campos (PP) se saiu vitoriosa em Roraima. Em 2018, outra vez só uma mulher se elegeu. Fátima, no Rio Grande do Norte, estado que mais escolheu mulheres —foram três.
Naquele ano, instituiu-se a cota de 30% dos recursos do fundo eleitoral para mulheres, após decisão do Supremo Tribunal Federal. Em 2022, o repasse mínimo para mulheres foi objeto de uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição) aprovada em maio. Sob a nova regra, o pleito levou as mulheres a 52% das chapas para governos estaduais, mas a maioria era candidata a vice. O avanço consolida uma tendência que teve início há quatro anos, com a definição dos gastos da cota financeira como pano de fundo.
Isso porque os critérios de distribuição dos recursos são definidos pelos partidos, que podem destinar a verba a candidaturas majoritárias lideradas por homens e que têm mulheres como vice. Nesta eleição, o fundo eleitoral foi de R$ 4,9 bilhões. O pleito deste ano também teve participação feminina recorde na disputa pelo Palácio do Planalto, em uma eleição em que as mulheres tiveram peso nos votos e nas propostas, sendo foco das campanhas de Lula e Jair Bolsonaro (PL), que protagonizaram a disputa.
Mesmo assim, ainda há desafios. Em suas trajetórias, as postulantes relatam ceticismo e fogo amigo. No Legislativo, o número de deputadas na Câmara passará de 77 para 91, representando menos de um quinto do total, cifra distante da paridade de gênero no Brasil, já que as brasileiras são 52% da população do país.