‘Máquinas de mentira não podem ter mais uma eleição’, diz autor do projeto que combate fake news
Autor do projeto que trata do combate às fake news e da regulação das empresas de redes sociais, o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) defende que o texto precisa ser votado com urgência, apesar das divergências sobre o tema. Ele argumenta com o calendário, lembrando que o processo eleitoral se aproxima e que o país não pode voltar às urnas sem um controle mais rígido da internet. As críticas mais comuns têm sido de que a falta de um critério claro para definir fake news pode limitar a liberdade de expressão das pessoas, e que a obrigação de cessão de dados às empresas donas das redes pode expor os usuários. Sem consenso, a votação da proposta esta semana foi adiada. O senador quer vê-la na pauta do plenário da próxima semana.
Seu projeto conseguiu unir petistas e bolsonaristas. Ambos os lados dizem, por exemplo, que o texto fere a liberdade de expressão. O senhor aceitou parte das críticas?
A gente continua achando as críticas desarrazoadas. Não há no texto qualquer risco à liberdade de expressão. Mas a gente tomou uma providência. A gente retirou dele as referências em relação à situação de (o que é) desinformação, checagem de fatos, enfim, aquela questão toda. No projeto, a gente tentava regulamentar isso, o que já é feito pelas empresas, pela plataforma. E a gente deixou esse tema para um debate posterior. Não há risco à liberdade de expressão, privacidade ou confidencialidade.
Entrevista: Rede de ‘fake news’ é financiada e organizada, diz diretor da DAPP/FGV
Críticos apontam que, ao tentar reforçar o controle das redes, o projeto acaba por fornecer em demasia dados dos usuários às plataformas. Dizem que vamos virar uma sociedade patrulhada e que esses dados podem ser usados equivocadamente.
Não vejo nenhum sentido. As empresas de tecnologia já têm um volume imenso de dados sobre cada cidadão. O que a gente está focado em garantir não é mais dado para empresa, mas o direito a uma eventual vítima de identificar o autor daquela ofensa, daquele crime. Para que isso aconteça, você precisa ter o suficiente para a identificação do usuário. Não vejo esse risco. Esse dado só seria acessível via ordem judicial. Não tem de colocar “Amanda” e seu CPF em seu perfil. Apenas ter o dado disponível para se a Justiça necessitar.
Outra crítica é de atropelo no debate, já que o projeto corre em meio à pandemia, sem passar pelas comissões.
Durante uma pandemia, a mentira e a desinformação matam. Isso é um ponto muito claro. E, segundo, a gente está se aproximando de um novo momento eleitoral. E a gente não pode chegar a mais uma eleição com máquinas de mentiras, de desinformação, de ataques, disponíveis nas redes sociais. A gente sabe o impacto que isso tem. É plenamente justificada a necessidade de votação imediata. E já passou de uma centena de reuniões com todas as plataformas, com entidades de direitos nas redes, com especialistas. Todo mundo foi ouvido, alguns mais de uma vez, tiveram oportunidade de deixar sua sugestão, várias incorporadas. Então, não vejo falta de debate.
Do projeto original, o senhor vê alguma mudança fundamental?
A gente teve mudanças, como a que suscitava esse debate da subjetividade. As empresas já verificam conteúdo, já tarjam conteúdo. A gente queria que isso fosse de forma bastante transparente. Mas, para evitar qualquer tipo de incompreensão, optamos por tirar esse pedaço. Nosso eixo está claro. O projeto objetiva garantir a identificação dos usuários, acabar com contas falsas e redes artificiais não declaradas, a rede de robôs. Hoje, estão levantando uma hashtag sobre o Fábio Porchat. Você vê aquele volume imenso de mensagens iguais. Isso custa de dinheiro. Alguém paga. Só que o usuário final, na ponta, não sabe que está interagindo com uma máquina, pensa que é gente mesmo. Isso tem impacto violento na sociedade. Tanto para fins eleitorais como para moldar comportamentos. Você pode continuar manifestando sua opinião, inclusive ofensiva. É um direito e vai ser responsabilizado, caso alguém se sinta agredido. A situação atual impede a responsabilização e isso é muito ruim.
O relator fala sobre a necessidade de recadastrar linhas pré-pagas. Quer controle mais rígido. Diz que é a raiz das fake news por dificultar a identificação dos titulares. O senhor concorda?
Está fora do escopo inicial do projeto. O relator está apontando um problema que é real. Você realmente tem dificuldade grande para encontrar usuários de aparelhos pré-pagos. Mas não sei como ele vai resolver isso tecnicamente. Estou aguardando o relatório para analisar.
O controle das ferramentas é o suficiente para o combate às notícias falsas?
No projeto, há a obrigação de o Estado promover o processo educacional, do ponto de vista da segurança e da independência, de liberdade de pensamento. Assim que se resolve definitivamente, qualificando o cidadão que consome informação. O crime sempre vai existir. Mas, hoje, é muito difícil de ser punido e altamente compensador.
Sob argumento de combater fake news, o STF abriu um inquérito próprio, alvo de críticas. O senhor concorda?
Eu entendo e manifesto desde o início que esse inquérito é inconstitucional. Você não pode ser, ao mesmo tempo, a vítima, o acusador e o juiz. Dito isso, entendo que é inconstitucional, mas que os fatos apurados são graves e precisam ser investigados.
Amanda Almeida / O GLOBO
Bolsonaro parece, enfim, adotar o pragmatismo. E isso pode até dar certo II
CONTINUAÇÃO.....
O mesmo pragmatismo foi exercido por Bolsonaro ao esquecer outra promessa de campanha – a de enxugar o número de ministérios – , para criar mais um e dá-lo ao deputado federal Fábio Faria (PSD-RN), um político do Centrão, mas, mais do que isso, um negociador, articulador, pessoa disposta muito mais ao diálogo do que ao enfrentamento, o que pode facilitar a vida do governo na relação com a classe política. O movimento já era ensaiado desde abril e foi revelado por Radar, embora Faria tenha feito questão de negar o que havia sido publicado (leia aqui).
Também parece haver pragmatismo na mudança de tom em relação ao Judiciário, com tentativas de aproximação com ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), onde tramitam casos que interessam diretamente a ele e ao futuro do seu governo. Também nesse ponto, está tendo que enfrentar críticas de seguidores radicais nas redes sociais, que gostariam que ele adotasse uma postura mais incendiária, do tudo ou nada, do confronto institucional.
Quanto tempo isso vai durar e se isso implica uma mudança consistente de rumo do governo, é difícil saber, porque Bolsonaro tem um temperamento difícil de controlar e uma personalidade talhada no confronto e na produção de crises. Mas parece haver uma mudança em curso. A ver. VEJA
Bolsonaro parece, enfim, adotar o pragmatismo. E isso pode até dar certo
O presidente Jair Bolsonaro, que parecia ter feito a opção por levar o seu governo na base das caneladas quase diárias com os outros Poderes – especialmente o Congresso -, parece estar ensaiando uma mudança de rota, adotando um pragmatismo raro na sua trajetória.
A aproximação com o Centrão é o exemplo mais visível. A negociação com o grupo, que ficou conhecido pelo desembaraço com que troca votos por poder – de preferência em forma de cargos -, pode representar uma nova etapa no relacionamento de Bolsonaro com o Parlamento.
O bloco, que reúne de 200 a 220 deputados e partidos importantes no jogo político da Câmara, como PSD, PL, Progressistas e Republicanos, pode ajudar o presidente muito além de protegê-lo de eventuais tentativas de cassação do mandato – há mais de 30 pedidos de impeachment protocolados na Casa.
O presidente pode, enfim, ter algum apoio sólido na tentativa de fazer avançar os seus projetos na Casa. Desde o começo do mandato, a articulação política de Bolsonaro ficou conhecida pela fragilidade, principalmente em razão da pouca experiência dos líderes que nomeou, como Major Vitor Hugo (PSL-GO) e Joice Hasselmann (PSL-SP), políticos de primeiro mandato, um problema para quem precisa conhecer os atalhos da Casa e os meandros das negociações de bastidores. A coisa era tão mambembe que Bolsonaro brigou com o próprio partido, o PSL, arrumou opositores de graça e jogou no lixo quase metade dos 52 votos que tinha na legenda – agora, parece também ensaiar uma aproximação com a antiga sigla.
Com o Centrão, além de mais de duas centenas de votos, Bolsonaro ganha gente mais experiente para conduzir os seus projetos, mesmo que seja gente enrolada com a Justiça, como o líder informal de seu governo, Arthur Lira, na Câmara, e Ciro Nogueira, no Senado, ambos do Progressistas. Mas se tem uma coisa que não falta ao bloco é conhecimento das regras de como o jogo é jogado no Congresso.
Também ajuda o trabalho feito por articuladores como os ministros Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo) e Walter Braga Netto (Casa Civil), generais mais afeitos à conversa e ao entendimento do que políticos como Onyx Lorenzoni, que tentou, claramente sem sucesso, desempenhar o mesmo papel no início do mandato.
É possível que, assim, Bolsonaro consiga ficar menos nas mãos de Rodrigo Maia (DEM-RJ), que foi decisivo na aprovação de reformas como a da Previdência, mas que nunca teve uma relação muito tranquila com presidente. O fato é que os principais projetos aprovados no Congresso só o foram porque eram do amplo interesse da sociedade e contavam com uma boa vontade que ia além da identificação com o governo. Para outros projetos e outros debates, o Planalto precisará de muito mais.
Choque com o eleitor
E o mais importante é que Bolsonaro resolveu ser pragmático mesmo sabendo que isso lhe custaria desagradar boa parte de seu eleitorado ao abrir mão de bandeiras que empunhou com veemência na campanha eleitoral, como a de que não cederia à estratégia de trocar cargos por votos, a de que não se aliaria à “velha política” e a de que seria um governante que iria “quebrar o sistema”. A mudança de discurso implica agora convencer quem acreditou em tudo isso de que ele vai ter de adotar outra postura para levar adiante o seu governo e as suas propostas.VEJA
Todos são iguais perante a lei, exceto os 11 brasileiros do STF
Se for correto o entendimento predominante na doutrina, no sentido de que não há como controlar abusos de poder cometidos pelo STF, há um equívoco no texto do caput do art. 5º da Constituição, ao dizer que todos são iguais perante a lei. O correto seria dizer que quase todos são iguais perante a lei, pois 11 brasileiros são totalmente diferentes dos demais.
Neste texto, volto ao que já escrevi neste mesmo espaço em 07/05/20 ("Supremo não é sinônimo de absoluto") do qual transcrevo fragmentos. Supremo, conforme registram os dicionários, é o que está acima de todos, num determinado grupo. O Supremo Tribunal Federal é apenas um órgão do Poder Judiciário, que está acima dos demais órgãos desse mesmo Poder. Supremo é o órgão, o colegiado, não seus integrantes individualmente. Estes são apenas ministros, tais como os outros ministros, integrantes dos tribunais superiores. Em síntese, o Poder Judiciário é apenas um dos poderes da República; não é superior (nem muito menos supremo) com relação aos demais.
O artigo 2º da Constituição afirma que o Legislativo, o Executivo e o Judiciário são poderes independentes e harmônicos. Cada um deles tem funções próprias e específicas, que são estabelecidas no Título IV — Da Organização dos Poderes, a partir do artigo 44 até o artigo 75. Já é cediço que a separação (ou especificação) dos poderes da República serve exatamente para evitar excessos, para delimitar atribuições e, fundamentalmente, para que qualquer um dos poderes não invada a área de atribuições constitucionalmente reservada a outro poder.
Coronavírus: em plena reabertura, Brasil é o país com mais mortes em junho
Em processo de abertura da quarentena em diversas regiões, o Brasil figura como país com maior registro de mortes por coronavírus neste mês de junho. De acordo com o levantamento diário realizado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) foram 8.300 novos registros de óbitos entre as análises publicadas de 1º de junho a 10 de junho, a mais recente.
O Brasil está à frente, inclusive, dos Estados Unidos, que registrou 8.130 novas mortes durante o mesmo período e que segue como o país com mais mortes totais pela doença (1,9 milhão, segundo o último levantamento da OMS). As secretarias de Saúde brasileiras também registraram no levantamento de junho mais mortes que o México (4.274), Reino Unido (2.394), Itália (628), França (488) e Alemanha (218), outras nações com altas taxas de mortes pela Covid-19.
Desde o final de maio, o Brasil e os Estados Unidos revezam-se entre os maiores índices de mortes diárias pelo coronavírus em todo o mundo. Segundo o último levantamento da OMS, publicado nesta quarta-feira, 10, o Brasil tinha 679 vítimas fatais e os Estados Unidos, 550. No dia anterior, as médias foram 904 mortes nas últimas 24 horas no Brasil e os EUA, 708.
O banco de dados da OMS coleta registros pandemia com intervalo de 24 horas em todos os países do mundo. Há no entanto, um atraso em relação aos dados diários publicados por todos os países e o que é divulgado nos boletins da entidade. Esse fato, no entanto, não é impeditivo para determinar que o Brasil segue na dianteira da letalidade do coronavírus em todo o mundo neste mês de junho.
Se considerados apenas os dados mais recentes (entre 3 e 10 de junho), o país ainda é o que registra mais mortes no período. São 7.197 mortes registrados durante a janela de oito boletins. Em segundo lugar está os EUA, com 5.762 e em terceiro o México, com 3.886. VEJA
Voto de Fachin pede ajustes em inquérito das fake news
O ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, votou ontem pela validade do controverso inquérito das fake news, mas defendeu ajustes que podem limitar o alcance das investigações. Entre os pontos, a delimitação de um foco específico da apuração nos ataques feitos a integrantes da Corte e a instituições, a maior participação do Ministério Público Federal no caso e o respeito à liberdade de expressão.
O inquérito é criticado por ser amplo demais e, até agora, tem como principais alvos apoiadores do presidente Jair Bolsonaro.
Em seu voto, Fachin afirmou que “são inadmissíveis”, no estado democrático de direito, a defesa da ditadura, do fechamento do Congresso Nacional ou do Supremo. “Não há liberdade de expressão que ampare a defesa desses atos. Quem quer que os pratique precisa saber que enfrentará a Justiça constitucional de seu país”, afirmou Fachin. “Quem quer que os pratique precisa saber que este Supremo Tribunal Federal não os tolerará.”
A investigação passou a ser fonte de preocupação no Palácio do Planalto após uma operação policial há quinze dias fechar o cerco contra o chamado “gabinete do ódio”, grupo de assessores do Palácio do Planalto comandado pelo vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ), filho do chefe do Executivo. A existência desse núcleo foi revelada em reportagem do Estadão em setembro do ano passado.
Entre os alvos da ação policial estavam blogueiros, youtubers e empresários suspeitos de participar de uma rede que atua na disseminação de fake news e de ataques aos ministros do STF e seus familiares.
Para Fachin, o objeto do inquérito deve ser limitado a manifestações que ameacem membros do STF e familiares, atentando contra o Supremo e a democracia. Segundo ele, o inquérito não deve avançar sobre reportagens, postagens e compartilhamentos em internet e redes sociais que não façam parte de um esquema de divulgação em massa.
O ministro ponderou, no entanto, ser preciso garantir direitos fundamentais dos cidadãos, como a liberdade de expressão, a liberdade de imprensa, além do direito de investigados terem acesso aos conteúdos dos procedimentos criminais dos quais são alvo.
Controvérsias
O inquérito teve início em meio a polêmica de ter sido instalado por ato de ofício, assinado pelo presidente do Supremo, ministro Dias Toffoli, sem uma provocação do Ministério Público Federal, prática considerada incomum.
Igualmente questionada foi a escolha do relator do inquérito dentro do STF. Toffoli escolheu o ministro Alexandre de Moraes para comandar a investigação sem que houvesse um sorteio ou consulta aos demais ministros em plenário.
Na ação que começou a ser julgada ontem, a Rede Sustentabilidade se opôs ao inquérito por considerá-lo ofensivo ao preceito constitucional da separação dos Poderes e por entender que o STF estaria extrapolando suas competências ao conduzir uma investigação criminal. Fachin é o relator deste pedido e, por isso, foi o primeiro a votar. O julgamento deve ser retomado na semana que vem com o voto dos demais ministros.
Em seu voto, o ministro-relator reconheceu que “investigar, acusar, defender e julgar são afazeres e funções distintas” e que “nas democracias há um sistema de Justiça a ser preservado”. Mas, na visão dele, o regimento interno do Supremo permite à Corte determinar a abertura de inquéritos. Apesar disso, Fachin alertou que a regra não pode funcionar como um “salvo-conduto genérico, amplo e sem limites”.
O procurador-geral da República, Augusto Aras, disse em sua manifestação que não pedia para acabar com o inquérito. “Mas, simplesmente, para que esta Suprema Corte estabeleça as balizas necessárias para que o inquérito não se eternize, mantenha-se no objeto delimitado, e que todos os atos e diligências sejam previamente submetidos à apreciação do MPF”, disse. ISTOÉ