Em São Paulo, ao menos seis pessoas morrem em casa por dia
Fabiana Cambricoli, O Estado de S.Paulo
Ao menos 409 pessoas morreram dentro de casa com suspeita ou confirmação de covid-19 na cidade de São Paulo desde o início da pandemia, revelam dados da Secretaria Municipal da Saúde. Os números, referentes ao período de 16 de março (quando o primeiro óbito pela doença na capital foi registrado) a 21 de maio, representam 6,1 mortes em domicílio por dia, mais do que o dobro da média de mortes diárias em domicílio por problemas respiratórios observada em cinco anos anteriores, segundo levantamento do Estadão.
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De acordo com dados do portal Datasus, do Ministério da Saúde, o número médio de pessoas mortas em domicílio por doenças respiratórias na cidade de São Paulo foi de 2,8 entre os anos de 2014 a 2018, último período com dados disponíveis, menos da metade do observado agora entre vítimas da covid-19.
A maioria das vítimas com suspeita ou confirmação de infecção pelo novo coronavírus que morreram em casa, sem ter acesso à assistência médica, era idosa. De acordo com os dados da secretaria, 336 (82,1%) tinham 60 anos ou mais, das quais 240 eram maiores de 75 anos, a faixa etária mais afetada.
Apesar da predominância de mortes em domicílio entre os mais velhos, foram registrados ainda 41 óbitos em domicílio cujas vítimas tinham idades entre 50 e 59 anos, 20 mortes entre pessoas de 40 a 49 anos, e 11 entre menores de 40 anos – incluindo duas crianças. Uma morte não teve a idade declarada.
Quanto à região da cidade, os distritos com o maior número de mortes em casa foram Cidade Ademar, na zona sul, e Pirituba, zona norte, ambos com 11 ocorrências cada. Aparecem em seguida, com dez óbitos cada, os distritos de Capão Redondo, Cidade Dutra, Grajaú (todos na zona sul), Cangaíba (zona leste) e Vila Medeiros (zona norte). “As mortes em casa que a gente atende são todas na periferia. Você quase não vê isso acontecer em bairros de classe média-alta porque é uma população que tem mais acesso a um médico e está mais atenta aos primeiros sinais da doença. Já as classes mais pobres são as que estão mais expostas e que encontram o serviço de saúde mais saturado”, contou ao Estadão um médico do Samu que diz estar atendendo mais casos do tipo nos últimos dois meses.
O profissional, que não quis ter o nome divulgado, relatou que as equipes do serviço de emergência já estavam habituadas, antes da pandemia, a atender algumas mortes em domicílio, principalmente no início da manhã. “Antes, geralmente eram idosos que tinham morte súbita enquanto dormiam e, quando o familiar ia acordá-lo, percebia que havia algo errado. Agora, continuam sendo principalmente idosos, mas atendemos mortes em domicílio o dia todo”, diz.
O médico socorrista conta que são duas as situações mais comuns que explicam as frequentes mortes por covid-19 nas residências: ou o paciente buscou uma unidade de saúde e, por não apresentar inicialmente tanta gravidade, acabou liberado a voltar para casa, ou ele nem chegou a ter tempo de buscar assistência porque teve uma piora repentina.
“A família geralmente relata que a pessoa já estava apresentando tosse, febre baixa e prostração (fraqueza), mas como eram sintomas leves, ainda não tinha ido ao médico. Só que é muito comum a pessoa estar com manifestações leves e ter uma súbita descompensação. De repente, ela afunda de vez”, alerta o especialista.
Ele diz que isso é comum entre os idosos, que já têm uma prevalência maior de doenças crônicas que agravam um eventual quadro de infecção pelo coronavírus. “Se o idoso já tem uma patologia e pega covid-19, o vírus descompensa as doenças de base e evolui muito mais rápido e de forma menos favorável”, diz o médico ao Estadão. “A chance dessa pessoa ter uma morte súbita em domicílio é maior. Se ela retardar um pouquinho a ida ao pronto-socorro, pode piorar repentinamente. Mas também não foram poucas as situações em que a família conta que o paciente tinha procurado o serviço médico. A verdade é que os hospitais acabam internando só os casos graves.”
Dados do Portal da Transparência do Registro Civil, que reúne números de cartórios, mostram que o fenômeno não é exclusivo da cidade de São Paulo. No mesmo período analisado (16 de março a 21 de maio), o País teve aumento de 15,8% no número de mortes em domicílio em relação ao registrado em 2019, considerando todas as causas, não só as respiratórias. O número de ocorrências do tipo passou de 36.263 em 2019 para 41.995 neste ano.
O escândalo da hidroxicloroquina: estudo contra foi mentiroso
“Tem pessoas defendendo a hidroxicloroquina porque gostam de Donald Trump e pessoas se opondo a ela porque não gostam de Donald Trump.”
“Este assunto deveria envolver dados, não opiniões, muito menos política. O mundo enlouqueceu.”
Impossível definição melhor do que a do médico catalão Carlos Chaccour, em entrevista ao Guardian, o mais tradicional jornal de esquerda da Inglaterra.
A simpatia ideológica do Guardian é mencionada para ressaltar o mérito da imparcialidade do jornal ao ser o primeiro a tratar de um assunto que saiu da medicina e caiu na política, com os péssimos e previsíveis resultados.
Aparentemente, a questão também pode ter sido manipulada por aproveitadores.
O estudo sobre a hidroxicloroquina que apareceu na revista médica The Lancet já foi chamado por um jornal indiano de um dos maiores escândalos científicos do século.
Indiano porque envolve dois autores originários da Índia, o cardiologista Mandeep Mehra, o diretor de um hospital importante em Boston, e Sapan Desai, criador de um agora suspeitíssimo site com informações médicas em tempo real chamado Surgisphere.
Motivo das suspeitas: dois estudos, com dados impossíveis ou desmentidos, um sobre a hidroxicloroquina, outro sobre um vermífugo também usado, em base emergencial, para pacientes com Covid-19. Ambos usaram o banco de dados da Surgisphere.
Sobre a hidroxicloroquina, os autores disseram que não apenas não tinha efeito positivo como aumentava a letalidade, em mais de 20% o que provocou um impacto enorme, inclusive por causa da politização do assunto e o desejo de deixar Donald Trump em apuros – com o equivalente brasileiro, claro.
Os perfis profissionais de pessoas no comando do site Surgisphere foram criados há apenas dois meses e incluem uma modelo de fotos de “conteúdo adulto”.
“Muitos pacientes leram a respeito. Milhares estavam fazendo os testes. Como poderiam continuar?”, disse Chaccour, o médico que já havia tido suspeitas sobre o estudo com a outra substância, o invermectin, também baseado num banco de dados improvável.
Em honra da ciência amparada na ética e nas práticas consagradas, o estudo foi imediatamente repudiado por médicos e pesquisadores, inclusive contrários ao uso da hidroxicloroquina.
A Organização Mundial de Saúde, cuja reputação foi arruinada sob o atual diretor, o etíope Tedros Adhanom, tomou a medida mais precipitada: anunciou imediatamente que estava suspendendo seu estudo internacional, o mais amplo, sobre a droga antimalária. Depois, voltou atrás.
Mais um vexame na conta da OMS, que se deixou alegremente enganar pelos chineses no começo da epidemia.
Tudo que foi escrito acima não significa que a medicação funcione ou não no tratamento de infectados pelo novo coronavírus.
Outro estudo recente, de Oxford, defende que é um medicamento inútil para tratar a Covid-19.
Mas é prudente saber como existem elementos e interesses comprometidos com outras causas que não a seriedade em relação a uma doença que já matou mais de 400 mil pessoas e derrubou a economia do mundo ocidental.
Os dados utilizados pela Surgisphere são simplesmente furados, como apontaram os pesquisadores e médicos que os denunciaram de imediato.
“Se achávamos que o nível de confusão sobre a hidroxicloroquina havia atingido o ápice, estávamos errados”, comentou o jornal francês Le Figaro.
A França é um dos países onde o assunto é mais controvertido por causa de um conhecido defensor do remédio para uso na Covid-19, Didier Raoult, um médico marselhês de cabelo comprido que já foi chamado de charlatão, entre outros xingamentos.
No começo de abril, Emannuel Macron fez uma visita a Raoult da qual nada transpirou.
O simples fato de que o presidente saiu de Paris, no auge da epidemia, já foi suficiente para provocar uma enxurrada de especulações.
“O castelo de cartas desabou”, comemorou Raoult sobre o estudo micado da Lancet.
A revista fez o que tinha que fazer e se retratou da publicação repleta de dados falsificados.
Três dos quatro autores também retiraram seus nomes.
Entre outras afirmações, o estudo dizia que tinha sido baseado em dados de 96 mil pacientes em 12 mil hospitais ao redor do mundo.
Como uma start-up iniciante poderia ter tido acesso a uma base de dados tão grande e variada, inclusive em hospitais africanos sem as mínimas condições de conectividade?
Entre as inconsistências: o estudo dizia ter analisado os dados de 600 pacientes e 73 mortos por Covid-19 na Austrália. Na data fornecida, havia 67 óbitos no país.
Um hospital australiano mencionado informou jamais ter tido contato com o banco de dados.
O cardiologista Mandeep Mehra, o autor principal , pediu verificação dos dados em que tinha se baseado para assinar o estudo.
“Agora ficou claro para que, na minha esperança de contribuir para essas pesquisas num momento de grande necessidade, não tive o rigor necessário com a base de dados”, desculpou-se.
Os dominós – ou cartas, como disse o médico francês – foram caindo.
Qual seria o interesse da start-up em se envolver em enganos que, inicialmente, escaparam do rigor da revisão pelos pares?
Sapan Desai, seu criador, é um cirurgião vascular baseado nos Estados Unidos. Sua reputação está destruída.
Além da politização a respeito de um medicamento – absurda, mas inteiramente de acordo com o atual espírito dos tempos –, existem interesses geopolíticos gigantescos em tudo o que se refere à pandemia.
A China tem um regime que certamente entende a extensão dos danos à imagem do país pela forma como manipulou as informações sobre o novo vírus.
Para recuperá-la, entre outras manobras, está distribuindo ajuda em máscaras e outros equipamentos – com MADE IN CHINA escrito bem grande – até via terceirizados.
Na competição pela vacina, que passa por uma uma espécie de geopolitização, a China pode até pular a fase final de testes de alguma de suas cinco candidatas e lançar uma novidade em setembro. De vilã passaria a benfeitora da humanidade.
A Índia, com sua enorme capacidade de produção de remédios, a maior do mundo em genéricos, aposta na hidroxicloroquina e outros tratamentos sem patente.
Políticos de todo o mundo podem ter seus destinos atrelados à doença e seus efeitos.
Estudos científicos e seus autores não são absolutamente imunes a interesses políticos, geopolíticos e financeiros – inclusive no financiamento de publicações médicas. E de universidades também.
Quem não quer ser enganado tem que ficar esperto. VEJA
Manifestantes lançam fogos de artifício em direção ao STF
Um grupo de manifestantes lançou fogos de artifício em direção ao prédio do Supremo Tribunal Federal no fim da noite deste sábado, 13, em Brasília.
O protesto ocorreu no mesmo dia em que o governo do Distrito Federal desmontou um acampamento de apoiadores do presidente Jair Bolsonaro. “Houve diversas tentativas de negociação para a desocupação da área, mas, infelizmente, não houve acordo. Os acampamentos foram desmontados sem confronto”, informou a Secretaria de Proteção da Ordem Urbanística do Distrito Federal, explicando que os manifestantes ocupavam área pública na Esplanada dos Ministérios, o que não é permitido, com um acampamento irregular.
Vídeos divulgados nas redes sociais mostram ameaças e xingamentos contra o governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha e ministros do STF: “Se preparem, Supremo dos bandidos, aqui é o povo que manda. Está entendendo o recado?”
Bolsonaristas simulam ataque ao Supremo Tribunal Federal (STF) após polícia retirar o acampamento denominado “300 pelo Brasil”
“Notaram que o ângulo dos fogos está diferente da última vez? Se preparem, Supremo dos bandidos!”
De acordo com a Polícia Militar do Distrito Federal, o grupo, que tinha cerca de 30 pessoas, realizou um culto na Praça dos Três Poderes antes de lançar os fogos.
Para evitar novas manifestações, o governador Ibaneis Rocha decretou o fechamento da Esplanada dos Ministérios para veículos e pedestres até 23h59 deste domingo. Já a Secretaria de Segurança Pública do DF informou que a Polícia Civil vai instaurar um inquérito para apurar os responsáveis pelo ato.
A decisão leva em consideração as aglomerações verificadas na Esplanada nos últimos dias, que contrariam as normas sanitárias de combate ao novo coronavírus. Além disso, o decreto diz que parte das manifestações realizadas nessas aglomerações tem declarado conteúdos anticonstitucionais e há ainda “ameaças declaradas, por alguns dos manifestantes, aos Poderes constituídos.”
De acordo com o governo do DF, qualquer manifestação na Esplanada dos Ministérios poderá ser admitida, desde que comunicada com antecedência e devidamente autorizada pelo secretário de Segurança do Distrito Federal, cargo hoje ocupado pelo delegado da Polícia Federal, Anderson Gustavo Torres.
A organização e fiscalização do trânsito será feita pelo Departamento de Trânsito (Detran) e pelo Departamento de Estradas de Rodagem (DER) do DF. A fiscalização no local caberá aos órgãos de segurança pública.
Com Agência Brasil / VEJA
Como as manifestações na pandemia, esquerda faz o que criticava
[RESUMO] Nas manifestações deste domingo (7), lideranças de esquerda aderiram animadas à promoção irresponsável de aglomerações durante a pandemia, atitude recorrente de Jair Bolsonaro nos últimos meses que tanto condenavam.
Nos últimos três meses, quando a escalada da Covid-19 no Brasil tornou-se incontornável, assistiu-se à regular participação do presidente da República e de seu rebanho na promoção de aglomerações e manifestações públicas. O espetáculo da irresponsabilidade bolsonarista foi também regularmente acompanhado pela indignação de amplos setores da mídia, especialistas em saúde pública e opositores políticos, entre os quais representantes da esquerda.
Passada a fase inicial da pandemia, no momento em que o Brasil parece ser o epicentro da propagação do novo coronavírus, com mortes que se contam a cada minuto, eis que organizações e lideranças que acenam a bandeira do antifascismo, adversárias viscerais de Bolsonaro, decidem convocar manifestantes às ruas.
Sob a alegação de que seriam tomadas precauções, que não resistiram ao teste da realidade, como uso de máscaras (por si insuficiente como proteção) e distância entre as pessoas, a esquerda aderiu animada ao que condenava —o que não chega a ser uma novidade em termos históricos.
O líder do MTST e ex-candidato do PSOL à Presidência, Guiherme Boulos, por exemplo, foi um dos protagonistas do festim —contra, aliás, ponderações mais sensatas de parte de seus apoiadores e companheiros de partido. No ato, para o qual carreou pessoas pobres ligadas ao movimento dos sem-teto, tentou se justificar: “Ninguém queria estar na rua agora. Todo mundo queria estar em casa se protegendo”... E completou: “O problema é que criou-se uma escalada fascista no Brasil. Por isso essas manifestações têm que acontecer”.
O raciocínio é roto. O que Boulos e outros chamam de “escalada fascista” precede a pandemia. Não se discute que a radicalização bolsonarista subiu de tom recentemente, mas soa infantil a crença de que levar alguns poucos milhares de pessoas ao largo da Batata ou equivalentes em outras cidades vá fazer a diferença.
Precipitadas, as manifestações de domingo não mudaram e provavelmente não vão mudar nada, a não ser, quem sabe, a contaminação entre aquelas pessoas e seus parentes. Sintomático que parte do séquito nas redes sociais tenha esquecido o que se disse sobre as aglomerações bolsonaristas e suspirado: “Foi lindo!”
Talvez incentivada pela explosão antirracista nos EUA, que reflete acontecimentos bem definidos, nossa esquerda simplesmente passou a chancelar, indiretamente que seja, mas de maneira insofismável, a campanha pelo “foda-se” defendida desde sempre por algumas autoridades obtusas e setores do empresariado —que eram acusados de querer levar os trabalhadores para o matadouro. O fato é que os rebanhos estão soltos. E esse passou a ser nosso novo normal de lidar com a pandemia.
Marcos Augusto Gonçalves é editor da Ilustríssima e editorialista da Folha.
‘Me inclua fora dessa’, diz ACM Neto sobre Centrão
14 de junho de 2020 | 05h00
No momento que o Centrão recebe cargos no governo federal, o prefeito de Salvador e presidente nacional do DEM, ACM Neto rechaçou em entrevista ao Estadão o bloco parlamentar que hoje dá sustentação ao Palácio do Planalto. Apesar do seu partido ocupar o maior número de ministérios e avançar no 2.°escalão da máquina federal, Neto disse que o Democratas não faz parte do Centrão. “Os quadros do partido que estão no governo foram escolhidos por Bolsonaro”, afirmou.
O DEM é do centrão?
Me inclua fora dessa. Nós não integramos o Centrão. O Democratas deixou claro ao presidente da República desde o processo de transição em 2018 que não participaria da indicação de cargos e não aceitaria discutir espaços no governo. Os quadros do partido que estão no governo foram escolhidos pelo próprio presidente Bolsonaro, que quando quis também tirou, a exemplo do ministro (da Saúde, Luiz Henrique) Mandetta. O presidente o demitiu e não teve que dar nenhuma satisfação ao partido, como não deu quando na hora que escolheu. Não vamos participar dessa política de negociação de espaços.
Qual o papel que o sr. acha que o Centrão cumpre hoje?
Eu não gosto de generalizações. Existem situações diferentes entre os partidos chamados de Centrão. Mas é evidente que alguns desses partidos foram governistas com Fernando Henrique Cardoso, Lula, Dilma, Temer e agora com Bolsonaro. Eles serão governo com qualquer um que chegar à presidência da República. Esse é um traço que distingue o Democratas. Nós fizemos oposição ao PT durante todo o período que o partido esteve no governo. Temos uma linha ideológica e de princípios muito clara. Existe um jogo de interesses muito claro de lado a lado que torna conveniente a relação, mas ela não é baseada em crenças comuns e em princípios. Portanto não tem a solidez necessária para a articulação de um governo com o Congresso Nacional.
O DEM não foi consultado sobre os cargos oferecidos aos integrantes do partido, também não censurou ou desautorizou quem aceitou.
Eu não sou oposição. O Democratas não é oposição. Temos uma postura de independência. Quando a agenda tiver confluência com o partido nós vamos apoiar. O maior exemplo é a reforma da Previdência. O Democratas foi o partido mais importante para assegurar essa vitória do governo. Não vamos para oposição. Não existe isso. Em hora nenhuma eu constrangi os ministros. Não vejo motivos para impedir que eles contribuam para o governo. Mandetta, Tereza, Onyx: todos têm trabalhos muito bem reconhecidos, mesmo o Mandetta que acabou sendo demitido. Ele foi um quadro que o País descobriu. Não censurar nenhum quadro do partido que queria contribuir com o partido e ajudar o governo. Mas isso não significa que foi uma indicação do partido. Agora, isso é muito diferente do modelo de negociação que um presidente de partido indica um assessor ou o primo de um parlamentar. Não é o nosso quadro.
O que acha dos recentes movimentos e manifestos de oposição?
Os movimentos de um lado e de outro fazem parte da democracia. Sempre respeitei a liberdade de opinião e de manifestação, independente de ser esquerda ou direita, desde que sejam pacíficas e não preguem qualquer coisa que possa colocar em risco a democracia. A democracia é inegociável. Qualquer movimento que atentar contra a democracia nós estaremos contra. O momento no País é muito preocupante. Nós estamos vivendo uma crise saúde pública sem precedentes. Estamos caminhando para a maior recessão das últimas décadas. E para tornar o cenário mais complicado temos questionamentos sobre a estabilidade institucional que não poderiam existir nesse momento. Se impôs um antagonismo entre o governo federal e a grande maioria dos governadores.
Qual avaliação o sr. faz do desempenho do presidente?
É óbvio que em relação a pandemia eu tenho uma visão antagônica à do presidente. Defendi desde o princípio a adoção de medidas de isolamento social. Não era razoável viver a polêmica economia versus saúde pública. Eu, como prefeito, acho que seria mais útil ao País que o governo tivesse coordenando ações com Estados e municípios. O ministério da Saúde tinha que cumprir esse papel. Não gosto de ficar fazendo avaliação de governo dando nota porque não sou jurado. O governo não assumiu seu papel de grande articulador.
Qual avaliação o sr. faz da abertura de comércio no pior momento da pandemia?
Como prefeito eu me reservo a opinar às decisões de Salvador. No meu caso tenho tomado decisões técnicas e com base em dados. A regra em Salvador tem sido o isolamento social. Na última segunda-feira prorroguei as medidas até 15 de junho. Não funcionam bares e restaurantes, shopping center, escolas e as praias estão interditadas. Adotei desde o começo uma estratégia setorial. Não trato a cidade toda de uma mesma forma.
Pretende abrir quando em Salvador?
Está tudo suspenso até o dia 15 e inclui algumas atividades, poucas, em exceções: clínicas, lavanderias e concessionárias. Mas foram poucas inclusões.
Defende mudança no calendário eleitoral?
Não se pode cogitar prorrogação de mandato e coincidência de eleições com 2022. Isso seria inconstitucional e antidemocrático. A eleição tem que acontecer esse ano. O grande desafio não é o dia da votação, que pode ser ocorrer em 4 dias ou dois finais de semana. A questão é: como fazer campanha? As pessoas que hoje defendem o isolamento não podem que dia 20 de julho tenha convenções. Defendo um adiamento curto, com o 1° turno no dia 15 de novembro e o 2° no dia 30. Eu disse no Democratas: esqueçam a campanha no modelo tradicional, com corpo a corpo e comícios.
Rosely Sayão, O Estado de S.Paulo
Receio de ser infectado, medo de morrer – e de ficar sozinho no hospital –, tristeza por estar distante de colegas e de amigos por tanto tempo, insegurança com o que acontecerá amanhã, angústia por pouco saber a respeito do vírus e do que acontecerá no futuro próximo etc.
Muitos experimentam algumas dessas emoções ora alternadas, ora juntas, e cada um usa as defesas pessoais que construiu até então para se proteger delas o suficiente para não esmorecer, para não se entregar nesse período de tanta instabilidade e de tantas crises ao nosso redor.
Algumas pessoas são resilientes. Essas, desenvolveram a capacidade de enfrentar as adversidades que a vida lhes apresenta como desafios e de aprender com elas e, sobretudo, de se adaptar rapidamente ao contexto que vive no momento. Alguns acreditam que ser resiliente é ser otimista, mas parece que ser realista faz mais sentido nesse caso, já que é preciso não negar a realidade. Resiliência se constrói durante a vida toda, desde a infância, e é uma característica que tem permitido a muita gente seguir em frente de maneira saudável nesse período tão conturbado que vivemos.
Há também os que conseguem lidar com essas emoções usando o autoconhecimento e o consequente respeito consigo mesmo para seguir, passo a passo, caminhando na vida e realizando o que precisa. O autoconhecimento é ferramenta pessoal das mais preciosas e, à semelhança da resiliência, também se desenvolve durante toda a vida já que somos dinâmicos e mudamos sempre.
Há os que buscam ajuda, seja ela profissional ou esteja mediada pelas artes e pela cultura, há os que passam a viver mais no mundo virtual, há os que se entregam a múltiplas atividades incansavelmente, por exemplo.
E há também os que recorrem ao uso de drogas para enfrentar melhor a pandemia e o isolamento. É o que tem acontecido com pelo menos metade dos jovens brasileiros, segundo levantamento realizado recentemente pelo Centro de Convivência É de Lei, apoiado pelo Grupo de Pesquisa em Toxicologia e pelo Laboratório de Estudos Interdisciplinares sobre Psicoativos, da Unicamp.
Não é de hoje que o uso de drogas por adolescentes e jovens – tanto as lícitas quanto as ilícitas – é preocupação da sociedade. É nessa faixa de idade que mais se observa o uso dessas substâncias, e o início está cada vez mais precoce, entre os 12 e os 16 anos, mais ou menos.
As drogas lícitas mais usadas por eles são o álcool e o tabaco, mas não podemos ignorar o crescente uso de medicamentos – sim, remédios são drogas que, usados adequadamente produzem benefícios ao organismo, mas usados sem acompanhamento médico e para resolver situações difíceis, produzem muitos efeitos negativos.
Ainda não conseguimos estabelecer políticas públicas e educacionais que colaborem com essa questão, apesar de esse não ser um problema novo. Estamos, quase sempre, oscilando entre a repressão e a moralização desse uso, o que o tempo tem mostrado que não são medidas efetivas.
As escolas, por exemplo, são, em sua maioria, ocupadas 100% de seu tempo no ensino de conteúdos escolares. Disciplinas humanistas e artísticas, que ajudariam muito no desenvolvimento pessoal e social, não costumam ser populares, nem entre as famílias, para falar a verdade. E são elas as maiores colaboradoras no trabalho indireto de prevenção ao uso de drogas.
Vivemos numa sociedade que, mesmo sem querer e sem perceber, estimula o uso das drogas, considerando aqui o seu conceito amplo. Usamos muito agrotóxicos para ter à mesa verduras e legumes vistosos, não suportamos nem pequenas dores, físicas ou psíquicas, sem recorrer ao uso de medicamentos, entre outras coisas.
Dessa maneira, aos poucos os mais novos vão apreendendo e aceitando como normal o conceito de uso das drogas: “quando queremos melhorar nosso desempenho, cognitivo ou social, ou quando um mal-estar qualquer nos assalta, certamente encontraremos uma substância que irá aliviar o que de desagradável nós sentimos e/ou irá melhorar nossa atuação”. É ou não é isso?
Não é à toa que adolescentes e jovens usam muita bebidas alcoólicas em festas e fazem um verdadeiro tráfico de medicamentos estimulantes em épocas de provas consideradas decisivas para eles.
Nada mais desafiador para todos enfrentar a pandemia e o distanciamento social e as emoções e os sentimentos que ela provoca e, para os jovens, o desafio é ainda maior, tanto quanto o estresse, a angustia e a ansiedade.
A família que percebe ou desconfia que os filhos adolescentes ou jovens estão no uso, beirando o abuso, de drogas pode ajudá-los? Sim, pode.
Primeiramente, é preciso ceder à tentação de aplicar punições. Precisamos entender que, neste momento, ao usar drogas, eles estão buscando ajuda para enfrentar a situação. Também é importante reconhecer que nem todo usuário de qualquer droga se tornará dependente dela: há jovens que usam drogas para recreação, por exemplo.
Conversar com os filhos é importante contribuição: dar escuta às suas dores, reclamações e pesares e dialogar com seus argumentos é a base dessa troca de ideias. E manter-se sempre como mãe e pai em quem eles podem sempre poderão confiar. Vínculo amoroso é o que torna isso possível.
*É PSICÓLOGA