“Não vão me tirar daqui”, diz Bolsonaro a religiosos na frente do Planalto
O presidente Jair Bolsonaro provocou mais uma vez aglomeração entre seus apoiadores. O episódio ocorreu na tarde deste sábado, 18, na frente do Palácio do Planalto. Na aparição, de cerca de 20 minutos, o presidente atacou governadores e afirmou que o Supremo Tribunal Federal (STF) lhe tirou o poder de revogar as medidas de restrição, adotadas após a chegada ao país da pandemia do novo coronavírus. “Não vão me tirar daqui”, chegou a afirmar o presidente.
Por volta das 16 horas, Bolsonaro apareceu na rampa do Palácio para saudar um pequeno grupo de religiosos que seguravam cartazes contra o aborto. Acompanhado de seguranças e do deputado federal Hélio Lopes (PSL-RJ), o presidente foi ao encontro dos apoiadores e fez um discurso em defesa da volta à normalidade no país. Afirmou que o Brasil está mergulhando no caos, que milhões de pessoas estão perdendo sua fonte de renda e o orçamento não vai suportar essa conta.
“Não estou defendendo a economia, estou defendendo o emprego”, afirmou. Segundo o presidente, idosos e portadores de doenças devem ser protegidos, mas os demais não podem se “acovardar” e devem voltar ao trabalho.
Bolsonaro chegou a defender a volta dos campeonatos de futebol. “Tem time aí que vai decretar falência”, disse. Sem as partidas e com os estádio vazios, na sua avaliação, os clubes “que têm folhas de pagamento milionárias”, não conseguirão honrá-las.
Sem mencionar nomes, o presidente criticou os governadores que decidiram “bloquear tudo” — apesar de nenhum estado ou município ter declarado isolamento total, também chamado de lockdown, em inglês. Atualmente, o estado de São Paulo, governado pelo tucano João Doria, considerado pelo presidente um de seus principais adversários, tem tido dificuldades para alcançar 50% de isolamento.
Bolsonaro também fez questão de afirmar aos manifestantes que o STF lhe tirou poder. “O Supremo falou que eu não tenho autoridade”, disse, referindo-se à decisão unânime tomada pelo colegiado na quarta-feira, 15. O entendimento dos ministros foi que, além do governo federal, os governos estaduais e municipais têm poder para determinar regras de isolamento, quarentena e restrição de transporte e trânsito em rodovias em razão da epidemia do coronavírus.
De acordo com o presidente, a política de isolamento “começou a mudar um pouco, a partir de ontem, com a mudança”, referindo-se ao novo ministro da Saúde, Nelson Teich, que assumiu ontem a pasta, no lugar de Luiz Henrique Mandetta.
“Ei, ei, ei, Jesus é o nosso rei” e “Fora Maia”
Antes de descer a rampa do Planalto, o presidente aguardou alguns minutos, até que o número de apoiadores aumentasse. Enquanto isso, o grupo de manifestantes intercalou palavras de ordem de cunho religioso: “Jesus, eu confio em vós”, “Ei, ei, ei, Jesus é o nosso rei” e “Inha, inha, inha, Maria é nossa rainha”.
Após a aproximação de Bolsonaro, o coro passou a entoar gritos de guerra, como “Fora Maia”, disparados logo depois que o presidente afirmou que ninguém o tiraria da presidência da República. Bolsonaro tem dito abertamente que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, conspira contra a sua permanência no comando do Executivo.
Em outro momento, enquanto Bolsonaro falava que os governadores estão arrastando o país para o “caos econômico”, um apoiador gritou: “Nós vamos para a rua abrir o comércio”. Por fim, o presidente deu “parabéns” a quem está indo para a rua se manifestar pela volta à normalidade. VEJA
Presidente está preocupado com corrupção na Saúde
O presidente Jair Bolsonaro recebeu informações de que há corrupção no Ministério da Saúde. Como quem fez as denúncias não apresentou provas, o comitê de crise comandado pelo general Braga Netto, ministro-chefe da Casa Civil, reuniu um grupo de agentes da Abin e oficiais da inteligência do Exército para apurar as suspeitas. Um dos casos investigados envolve pagamentos milionários a uma clínica de radioterapia que sequer existiria.
Na semana passada, logo depois de demitir Mandetta, o presidente estabeleceu alguns critérios para a escolha do novo ministro da Saúde. Um deles, chamou a atenção dos auxiliares. Em uma reunião, Bolsonaro disse que o futuro ministro tinha de ser alguém com perfil técnico, com ampla experiência internacional, favorável à flexibilização da quarentena e que “fosse muito rico”.
Para Bolsonaro, essa última exigência era inegociável. Devido ao avanço da pandemia no país, o ministério da Saúde ganhou um reforço extraordinário em seu caixa e recebeu uma carta branca para fechar contratos sem licitações e com cifras vultosas. O oncologista Nelson Teich atendeu a todos os requisitos de Bolsonaro, especialmente o último.
Empresário e com doutorado internacional em economia da saúde, o novo ministro foi um dos fundadores das Clínicas Oncológicas Integradas (COI), vendida em 2015 para a Amil, que hoje pertence ao grupo americano UnitedHealth (UHG).
O substituto de Mandetta tem um bom trânsito entre empresários e médicos. Ele foi indicado por Fabio Wajngarten, chefe da Secretaria Especial de Comunicação Social (Secom) da Presidência e chancelado pelo ministro da Economia, Paulo Guedes. Bolsonaro escalou o almirante Flávio Rocha, chefe da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE), para ajudar o novo ministro a fazer uma varredura nos contratos da pasta. VEJA
Surpresa e achaque político: a reação de Guedes às críticas de Maia
A entrevista do presidente Rodrigo Maia a VEJA pegou o secretariado do Ministério da Economia de surpresa. A belicosidade das falas de Maia em relação ao ministro Paulo Guedes foi interpretada como um movimento político, em desavença à posição do ministro quanto à aprovação do auxílio a estados e municípios, e como retaliação aos recentes achaques públicos do presidente Jair Bolsonaro ao mandatário da Câmara. A equipe econômica defende a transferência direta de 40 bilhões de reais como alternativa ao projeto aprovado na Câmara que destina 86,9 bilhões às contas estaduais e municipais para o combate ao coronavírus (Covid-19). Em reunião com os secretários, o ministro Paulo Guedes ignorou a entrevista de Maia pela manhã da sexta-feira 17. Preferiu focar na apresentação de resultados marcada para a tarde, quando a equipe apresentou os resultados das políticas econômicas para mitigar os impactos da doença.
O ministro não entendeu as críticas feitas pelo presidente da Câmara à revista e, para não aumentar as tensões, resolveu não responder às alfinetadas duras de Maia. Às Páginas Amarelas, o presidente da Casa disse que o ministro “não é sério” e pôs em xeque os números engendrados pela pasta sob o comando de Guedes, indagando a “previsão” de que os governos estaduais e municipais teriam receitas oriundas de ICMS e ISS neste ano, causando um rombo de 285 bilhões de reais às contas da União. Um assessor do ministro mostrou descontentamento com a fala de Maia. “Maia não era o Senhor Reformas? Agora virou o Senhor Pautas-Bomba?”, indagou. Integrantes da área técnica da pasta explicam que os números, consolidados pelo secretário de Tesouro, Mansueto Almeida, não preveem arrecadação zero das unidades da federação, mas apenas explicitam o potencial estrago para a gestão federal.
Membros do Ministério da Economia entendem que os governadores estão utilizando os gastos destinados ao combate à Covid-19 como mecanismo para desanuviar anos a fio de irresponsabilidade fiscal. O secretário de Fazenda, Waldery Rodrigues, vem classificando os gastos como de potencial destrutivo à gestão do orçamento público. Para isso, o Senado aprovou, na sexta-feira 17, o projeto apelidado de Orçamento de Guerra, que desvincula os gastos engendrados para enfrentar a pandemia das contas da União, autorizam o Executivo a desrespeitar amarras orçamentárias e dão prerrogativas novas ao Banco Central para servir como fiador de ações contra o coronavírus, como VEJA explicita na edição desta semana.
Guedes sempre foi um interlocutor confiável para o presidente da Câmara dentro do governo. Apesar das dificuldades de articulação política do governo para a aprovação da reforma da Previdência, o ministro e Maia incumbiram-se da missão de aprovar o texto. “Esse não é o Maia com quem negociamos a aprovação das reformas”, afirmou outro executivo do Ministério da Economia. A relação entre o Executivo e o Legislativo sempre foi, minimamente, espinhosa, mas ganhou novos contornos nas últimas semanas.
Depois da demissão de Luiz Henrique Mandetta (DEM-MS) da chefia do Ministério da Saúde, os presidentes da Câmara e do Senado, Maia e Davi Alcolumbre, ambos correligionários do ex-ministro, divulgaram uma nota conjunta contra a demissão de Mandetta. Em entrevista à CNN Brasil, Bolsonaro respondeu que o Maia atua para derrubá-lo e “esculhambar a economia para que eles possam voltar em 2022”. Em retaliação, Alcolumbre tirou a votação da medida provisória da Carteira Verde e Amarela da pauta de votação. A MP flexibiliza obrigações trabalhistas para fomentar a contratação de jovens entre 18 a 29 anos e pessoas acima dos 65 anos. A validade da medida, que já passou pela Câmara, é até segunda-feira, 20. Oficialmente, a posição do Senado é de focar na votação de matérias emergenciais, ou seja, medidas de combate aos danos da pandemia do novo coronavírus. VEJA
Ministério da Saúde enviou respiradores sem peças para o Amazonas
Primeiro estado a sofrer um colapso na saúde, o Amazonas vive um drama para controlar a expansão do coronavírus. Em uma semana, o número de vítimas letais cresceu 360%, para 124 mortes, e os casos confirmados da doença aumentaram 192%, para 1719 infectados. A falta de leitos e equipamentos acenderam o sinal de alerta do Governo Federal, que decidiu ajudar.
O Ministério da Saúde, ainda sob o comando de Luiz Henrique Mandetta, enviou vinte aparelhos respiradores para o estado. No entanto, metade deles não funcionava, porque não tinha dois tipos de acessórios essenciais: traqueia e cabo de força. O restante dos equipamentos era destinado a transporte – e não para leitos. Essa falha foi listada num dossiê elaborado pela Casa Civil da Presidência e usada para desgastar o ex-ministro Luiz Henrique Mandetta, conforme VEJA revelou.
“Demos um jeito de driblar essa situação. Tive que improvisar alguns equipamentos de última hora”, conta o governador Wilson Lima (PSC). “Utilizei as traqueias e os cabos de forças de outros respiradores antigos e os instalei nos que foram enviados pelo ministério da Saúde”, explica ele.
Antes dessa gambiarra, o governo do Amazonas havia recebido 15 aparelhos respiradores do Ministério da Saúde, emprestados de uma rede privada de hospitais. A ideia era ampliar o número de leitos de UTI (Unidade de Terapia Intensiva), mas cinco equipamentos não estavam funcionando – e se estão em manutenção.
Mandetta foi demitido na última quinta-feira. Procurado, o Ministério da Saúde confirma que cinco aparelhos “estavam com algum problema de funcionamento e podem ser recuperados”. A pasta ainda diz que “enviou mais 20 respiradores em perfeitas condições”, mas não esclareceu se esses equipamentos estavam sem dois acessórios. “Até 30 de abril mais 20 respiradores estão previstos para serem enviados para Manaus”, afirma. VEJA
Bolsonaro diz que, com estados parados, pode faltar dinheiro para pagar servidor
Marcello Corrêa e Luísa Martins* / O GLOBO
BRASÍLIA - O presidente Jair Bolsonaro disse neste sábado que a paralisação da atividade econômica causada pelas restrições em estados e municípios para conter o coronavírus podem afetar o pagamento de salários de servidores públicos.
A declaração foi dada a um grupo de apoiadores no Palácio do Planalto. O presidente criticou as medidas de isolamento social adotadas por gestores locais.
— Desde o começo, sozinho, venho falando dos dois problemas, o vírus e o desemprego. O desemprego já se faz presente no seio da sociedade. Os informais cresceram muito, são quase 40 milhões no Brasil. O pessoal celetista também milhões já perderam seus empregos. A economia não roda dessa forma. Vai faltar dinheiro para pagar servidor público, e o Brasil está mergulhando num caos — afirmou o presidente.
A queda na arrecadação de impostos é um dos efeitos da paralisia na atividade econômica. Para mitigar esse problema, estados e prefeitos querem que a União compense os governos locais pelas perdas, conforme projeto aprovado por deputados semana passada e criticado pelo governo.
A ideia tem o apoio do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Ao fazer referência indireta a Maia, Bolsonaro afirmou que não vão tirá-lo do cargo.
— Eu quero crer que não seja apenas má vontade desses políticos que não vou nominar aqui querer abalar a Presidência da República. Não vão me tirar daqui — disse o presidente, enquanto manifestantes gritavam 'Fora, Maia'.
Na última quinta-feira, Bolsonaro acusou Maia, em entrevista à CNN, de "conduzir o Brasil para o caos", ao criticar o texto de ajuda aos estados.
Na ocasião, o presidente afirmou ainda que a proposta equivale a "matar a galinha dos ovos de ouro", em referência ao impacto da medida sobre as contas do governo federal.
'Mudamos a política', diz em referência a Teich
Bolsonaro voltou a defender a flexibilização das medidas restritivas, mas lembrou que o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que cabe a governadores e prefeitos decretar o isolamento.
— O Supremo falou que eu não tenho autoridade para isso, o Supremo disse isso, no que depender de nós, nós vamos começar a flexibilizar — disse o presidente.
Ele sinalizou ainda que espera mudanças nas diretrizes sobre isso do novo ministro da Saúde, Nelson Teich, que tomou posse nesta sexta no lugar de Luiz Henrique Mandetta.
— Mudamos a política um pouco agora, a partir de ontem, né, começa a mudar um pouquinho nossa política.
'Não tem dinheiro para tudo isso'
Mais cedo, em conversa com jornalistas, Bolsonaro já havia criticado o Legislativo por ter aprovado a recomposição de impostos a estados e municípios.
— Não tem dinheiro para tudo isso. Vão ficar querendo que o contribuinte pague esta conta até quando? — disse ele a jornalistas neste sábado, da rampa do Palácio odo Planalto.
Em relação à crise com Maia, Bolsonaro afirmou que é o presidente da Câmara que vem o atacando "há dias". Questionado se conversou com o presidente Davi Alcolumbre (DEM-AP) sobre a votação, prevista para segunda-feira, da medida provisória que cria o Contrato Verde e Amarelo, desconversou:
— Não tenho nada contra ele, o Davi é meu chapa.
Bolsonaro ainda afirmou que o avanço dos casos de covid-19 no país é um problema tão grave quanto o desemprego causado pelo fechamento do comércio.
— Alguns milhões de empregos formais foram destruídos, fora os informais — disse, criticando o governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), que vai manter a medida pelo menos até 3 de maio.
O presidente também criticou a mais recente pesquisa Datafolha, segundo a qual 64% da população considera que ele errou ao demitir o então ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta.
— Datafolha é pesquisa do Zé do botequim da esquina. Não tô preocupado com Datafolha, mas com o Brasil. O resultado mesmo do Datafolha mesmo é isso aqui — disse, apontando para cerca de 20 apoiadores que o aplaudiam em frente ao Planalto.
(*) do Valor /
Coronavírus: como o Brasil começa a corrida para testar a população
Chamando a atenção de quem chega ao Rio de Janeiro pela Avenida Brasil, o castelo em estilo mourisco fincado no alto de um morro sedia a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), um complexo de laboratórios que são referência internacional em pesquisa de saúde pública. Ali, no 5º andar de um prédio moderno com ares de ficção científica, enfileiram-se os tubinhos mais falados do momento: testes para a detecção do novo coronavírus, dos quais a Fiocruz é o maior produtor nacional, responsável por abastecer toda a rede pública de saúde. A reportagem de VEJA acompanhou uma manhã de trabalho na “fábrica” e testemunhou o excepcional esforço da equipe que organiza o mais ambicioso salto da história da instituição: nos próximos dias, a produção semanal vai decuplicar, passando de 20 000 para 200 000 kits. A iniciativa, espetacular, ainda está longe de suprir a demanda que o combate à pandemia requer, mas segue corretamente na direção que o Brasil precisa. A experiência em outras nações mostrou que testar, testar e testar, na definição da OMS, é a chave para exercer algum controle na fase de subida para o pico da curva da doença e, no momento seguinte, para ter um mínimo de segurança no processo de volta à vida normal. Hoje, ainda apresentamos números modestos na distribuição do teste que salva. Mas, com produção local e importações feitas por empresas públicas e privadas, esse panorama começa a mudar.