Brasil é escolhido para projeto inédito no semiárido nordestino
Por Ancelmo Gois / o globo
O Brasil de Lula foi escolhido pela FAO, Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura, para um projeto pioneiro no semiárido nordestino. Serão beneficiadas, inicialmente, 250 mil famílias. Os recursos virão do fundo internacional FIDA.
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Juiz da UE espera onda de litígios de gigantes da tecnologia contra nova lei
Gigantes da tecnologia provavelmente contestarão uma nova lei da União Europeia destinada a controlar seu poder, com os primeiros casos em uma potencial onda de litígios prevista para o final do ano, disse um dos principais juízes do bloco nesta sexta-feira (17).
A Lei de Mercados Digitais (DMA, na sigla em inglês), que entrou em vigor em novembro, vai classificar as plataformas online com mais de 45 milhões de usuários como "gatekeepers", entre outros critérios.
Os gatekeepers —empresas que controlam dados e acesso a plataformas— estão sujeitos a uma lista de coisas que devem fazer, como tornar seus serviços de mensagens interoperáveis, e não fazer, inclusive não favorecer seus produtos e serviços em suas plataformas
A lista de gatekeepers aos quais a DMA se aplicará deve ser anunciada em 6 de setembro e provavelmente incluirá Google, da Alphabet, Meta, Amazon, Apple e Microsoft.
As empresas que discordam da classificação e dos requisitos provavelmente levarão sua reclamação ao Tribunal Geral com sede em Luxemburgo dentro de alguns meses, disse seu presidente, Marc van der Woude.
O Tribunal Geral faz parte do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) e lida com casos que vão desde o direito da concorrência ao comércio e meio ambiente.
"Provavelmente no final deste ano ou no início do ano que vem, poderemos ver os primeiros casos e não acho que irão parar", disse ele em uma conferência organizada pela Comissão Europeia.
Algumas empresas, como Google e Apple, fizeram lobby intenso contra a lei.
"Continuamos preocupados com o fato de algumas disposições da DMA criarem vulnerabilidades desnecessárias de privacidade e segurança para nossos usuários, enquanto outras nos proibirão de cobrar por propriedade intelectual na qual investimos muito", afirmou a Apple em março de 2022.
O Google ecoou esses sentimentos e disse que também estava preocupado que as novas regras pudessem reduzir a inovação.
Mas van der Woude disse que a legislação ainda estava evoluindo e que as áreas de disputa provavelmente se concentrarão na designação do gatekeeper, nas especificações de suas obrigações e durante a aplicação da nova lei.
Lula acumula gafes desde a campanha eleitoral, de escravidão a Covid; veja
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) se tornou alvo de críticas de opositores em redes sociais por declarações dadas nesta semana sobre escravidão e obesidade. Gafes, no entanto, se acumulam desde a campanha, no ano passado.
Em evento público nesta quarta (15), o petista falou sobre a obesidade do ministro da Justiça, Flávio Dino (PSB), em um evento público. O presidente classificou a obesidade como uma doença que causa tanto mal quanto a fome e disse que o ministro agora estaria andando de bicicleta, por estar acima do peso.
A declaração provocou reações de opositores. O deputado federal Kim Kataguiri (União Brasil-SP), por exemplo, escreveu: "Alô galerinha chata que acha obesidade lindo: o Lula falou o óbvio aqui. Vão chamá-lo de gordofóbico também? Ou vão parar de glamourizar uma doença?"
A declaração de Lula ocorreu dois dias após outra, também polêmica. Na segunda (13), o presidente foi alvo por romantizar a miscigenação brasileira.
"Resolveram contar a história que os índios eram preguiçosos e, portanto, era preciso trazer o povo negro da África para produzir nesse país. Ora, toda a desgraça que isso causou ao país causou uma coisa boa, que foi a mistura, a miscigenação", disse Roraima.
Entre os críticos, o ex-prefeito de Manaus Arthur Virgílio (PSDB) afirmou que nada justifica o processo de servidão estabelecido no Brasil por séculos. "Então, o senhor acha que a ‘preguiça dos índios’ levou à escravidão de negros, africanos, e que isso foi bom, porque provocou a miscigenação? Presidente, nada justifica a escravidão. A ditadura, que o senhor não combateu, submeteu os brasileiros a um tipo específico de escravidão", escreveu.
Já durante a campanha eleitoral, Lula foi cobrado por apoiadores após escorregões na linguagem inclusiva. As queixas, geralmente feitas em privado, giravam em torno do uso de palavras como "índio" (em vez de indígena) e "escravo" (no lugar de escravizado) e de referências que contrariam, por exemplo, os veganos, com repetidas alusões a churrasco e picanha.
Relembre gafes cometidas por Lula:
VANTAGEM DO CORONAVÍRUS (20.MAI.2020)
Em 2020, Lula afirmou que o surgimento da pandemia do coronavírus foi positivo para alertar o governo Bolsonaro sobre a importância de um Estado forte para conter o avanço da crise econômica.
O petista falou sobre o tema em uma entrevista à revista Carta Capital.
"O que eu vejo? Quando eu vejo essas pessoas acharem que tem que vender tudo que é público e que tudo que é público não presta nada... Ainda bem que a natureza, contra a vontade da humanidade, criou esse monstro chamado coronavírus, porque esse monstro está permitindo que os cegos enxerguem, que os cegos comecem a enxergar, que apenas o estado é capaz de dar solução a determinadas crises."
POLICIAL X GENTE (30.ABR.2022)
Em abril de 2022, Lula cometeu uma gafe sobre policiais no momento do discurso em que fazia uma série de críticas a Jair Bolsonaro (PL).
"Hoje temos um presidente que não derramou uma lágrima pelas vítimas da Covid ou com a catástrofe que houve em Petrópolis, no Rio de Janeiro. Ele não tem sentimento. Ele não gosta de gente, ele gosta de policial. Ele não gosta de livros, ele gosta de armas", disse o petista na ocasião, em um evento com mulheres na zona norte de São Paulo.
No dia seguinte, Lula pediu desculpas pela fala.
Naquela semana, Lula afirmou que o mundo "está chato para cacete" e pesado porque todas as piadas viraram politicamente erradas. "Então não tem mais graça. Se você quer dar risada é nesses programas de humorismo chatos pra cacete na televisão", disse o petista.
CHAMA SEQUESTRADORES DE 'MENINOS' (17.JUN.2022)
Uma fala de Lula sobre sua atuação para a extradição dos sequestradores do empresário Abílio Diniz, ocorrida há mais de 23 anos, virou nova munição de Bolsonaro e seus aliados contra o petista na corrida eleitoral pelo Palácio do Planalto.
Durante um ato político em Maceió, Lula relembrou em discurso como intercedeu junto ao então presidente Fernando Henrique Cardoso, em dezembro de 1998, para que atendesse às reivindicações de oito presos por aquele crime.
Na época, o grupo de sequestradores estava havia 46 dias em greve de fome e ameaçava iniciar uma greve seca, com a interrupção de ingestão de água. Sete estrangeiros pediam a extradição para seus respectivos países (Chile e Argentina), e o brasileiro, transferência para seu estado de origem (Ceará).
O episódio já era conhecido, e a fala foi feita pelo petista para ilustrar sua antiga relação com o senador Renan Calheiros (MDB-AL), à época ministro da Justiça de FHC.
"Depois de uma longa conversa com o Renan, ele disse: ‘Lula, vai conversar com o Fernando Henrique Cardoso que eu tenho toda disposição para mandar soltar o pessoal’. Fui ao Fernando Henrique Cardoso: ‘Fernando, você tem a chance de passar para a história como um democrata ou como um presidente que permitiu que dez jovens que cometeram um erro morram na cadeia’", relatou o petista na ocasião.
"Ele disse: ‘Se você conversar com eles, e eles acabarem com a greve de fome, eu solto eles’. Eu fui na cadeia no dia 31 de dezembro e falei com os meninos: ‘Vocês vão ter que dar a palavra para mim e garantir que vão acabar com a greve de fome agora e vocês vão ser soltos’. Eles respeitaram a proposta, pararam a greve de fome, foram soltos e não sei onde estão agora."
MANDA MILITÂNCIA PRESSIONAR FAMÍLIAS DE DEPUTADOS (06.ABR.2022)
Em abril de 2022, Lula foi criticado por defender, em evento da CUT (Central Única dos Trabalhadores), que a militância sindical procurasse deputados e seus familiares na casa deles para pressionar a favor de propostas que interessassem ao setor em um eventual governo petista a partir de 2023.
"Se a gente mapeasse o endereço de cada deputado e fossem 50 pessoas na casa, não é para xingar não, é para conversar com ele, com a mulher dele, com o filho dele, incomodar a tranquilidade dele, surte muito mais efeito do que fazer a manifestação em Brasília", disse naquele momento.
VIOLÊNCIA CONTRA MULHERES (20.AGO.2022)
Em comício realizado no Vale do Anhangabaú, em São Paulo, o petista cometeu uma gafe ao condenar a violência contra as mulheres. "Quer bater em mulher? Vá bater em outro lugar, mas não dentro da sua casa ou no Brasil, porque nós não podemos aceitar mais isso."
Esse trecho do discurso foi levado à televisão pela campanha de Bolsonaro na propaganda eleitoral para atacar o petista.
Em abril, durante ato da pré-campanha, Lula chegou a afirmar que Bolsonaro "não gosta de gente, ele gosta de policial" —e se desculpou aos policiais pela declaração no dia seguinte.
ASSOCIA CAPIAU DO INTERIOR A PESSOA IGNORANTE (23.SET.2022)
Em setembro de 2022, Lula se referiu a Bolsonaro como "ignorante" e associou esse termo ao "capiau do interior de São Paulo", o que pode ser considerado mais um deslize do petista na campanha eleitoral.
As declarações foram dadas em sabatina com o apresentador Ratinho, no SBT, num momento em que Lula criticava o atraso do governo Bolsonaro na compra de vacinas da Covid-19.
"É uma estupidez de alguém que é um pouco ignorante, é o que ele é mesmo, um pouco ignorante. Aquele jeitão bruto dele, de capiau lá do interior de São Paulo, aquele capiau de Registro [no Vale do Ribeira], bem duro assim, bem ignorante", disse Lula.
"Porque tem gente que acha que ser ignorante é bonito e não é. O que é bonito é você ser educado, ser um cara refinado como eu", seguiu.
ESCRAVIDÃO X MISCIGENAÇÃO BRASILEIRA (13.MAR.2023)
O presidente Lula foi alvo de críticas ao relacionar escravidão com a miscigenação brasileira.
"Resolveram contar a história que os índios eram preguiçosos e, portanto, era preciso trazer o povo negro da África para produzir nesse país. Ora, toda a desgraça que isso causou ao país causou uma coisa boa, que foi a mistura, a miscigenação. Da mistura entre indígenas, negros e europeu, permitiu que nascesse essa gente bonita aqui", afirmou o petista enquanto visitava a terra indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima.
OBESIDADE DE FLÁVIO DINO (15.MAR.2023)
Lula falou sobre a obesidade do ministro da Justiça, Flávio Dino (PSB), em um evento público e foi alvo de críticas de opositores em redes sociais.
Lula classificou a obesidade como uma doença que causa tanto mal quanto a fome, sendo necessário cuidado do Estado para este problema, e disse que Dino agora estaria se exercitando, andando de bicicleta, por estar acima do peso.
"Aqui ninguém está com excesso de magreza, a não ser o nosso poeta. O restante está tudo com um pouco de obesidade, que também é uma doença que nós precisamos cuidar. A nossa médica que é ministra da Saúde sabe perfeitamente bem que a obesidade causa tanto mal quanto à fome. E por isso que o Flávio Dino está andando de bicicleta, porque ele sabe que isso vai precisar que o Estado cuide com muito carinho desse mal", disse.
PALAVRAS DA DISCÓRDIA NA CAMPANHA DE LULA
Tesão
Aparece em um raciocínio que virou uma espécie de bordão, quando Lula diz que, apesar de ter 76 anos de idade, está com "tesão de 20". Ele usou a analogia para destacar sua vontade política de transformar o país. Militantes se incomodaram por considerar o termo depreciativo para o conjunto das mulheres, com perpetuação de estigmas como a submissão feminina
Índio
O termo é visto como desrespeitoso. O mais recomendado é falar "indígena" (ou "povos indígenas", quando a referência for ao conjunto dessa população). Lula passou a usar as palavras indicadas depois de conselhos, mas ainda comete deslizes. Em abril, ao prometer criar um ministério para a área caso fosse eleito, disse que ele "terá que ser [assumido por] um índio ou uma índia"
Escravo
Ativistas da causa racial afirmam que a expressão reduz as vítimas de escravidão a uma condição perene e ignora sua subjetividade, amenizando o fato de que foram submetidas forçadamente a esse processo. Por isso, recomendam a substituição por "escravizado". Lula disse em 2021 que, na visão da elite após a abolição no Brasil, os negros "deixaram de ser escravos para virar vagabundos"
Escurecimento
A palavra foi usada pela apresentadora do evento que oficializou a chapa com Alckmin, no último dia 7. Ao dar uma explicação ao microfone, a cantora Lika Rosa anunciou: "Quero aqui fazer um escurecimento, ou esclarecimento". Ela, que é parda, diz que a mudança foi iniciativa sua, como manifestação por mais representatividade. Bolsonaristas ridicularizaram a fala e atacaram o PT
Picanha
A carne é usada por Lula como exemplo de uma prosperidade que ele promete devolver aos brasileiros mais pobres. Embora continuou em seus discursos, a referência passou a ser acompanhada de menções ao consumo de vegetais e à agricultura orgânica, após reclamações de apoiadores que militam pelo veganismo e pelos direitos dos animais
Eu melhorei meu discurso. Não falo só do pessoal voltar a comer churrasco, mas também o pessoal vegetariano, que não come carne, poder comer uma boa salada orgânica, estimularmos uma agricultura mais saudável no nosso país
Negro como vítima
A fala de Lula, no podcast de Mano Brown em 2021, de que "há uma evolução política dos negros [...] adquirindo a consciência de que não basta ficar achando que é vítima", foi repudiada por membros do movimento antirracista. Eles viram reforço ao discurso de vitimismo, tido como simplista por transferir para os alvos de preconceito a responsabilidade sobre a opressão
O assalto de Lira à Constituição
Por Carlos Andreazza / o globo
Fala-se muito sobre o que seria uma guerra entre Arthur Lira e Rodrigo Pacheco relativamente à tramitação de medidas provisórias no Congresso. A questão é muito importante, lateralmente obstruindo o andamento da parca possível pauta de votações no Parlamento. De novo, a respeito do rito para medidas provisórias: tem a ver com a (saúde da) República. Com a impessoalidade. De forma que: menos Lira versus Pacheco; e mais o equilíbrio entre as Casas que esses tipos comandam.
Qual a crise? Do que se trataria?
Antes, vamos à Constituição. Precisamente ao artigo 62.
Quando o presidente da República edita uma MP, a matéria passa a valer imediatamente – pelo prazo (renovável) de sessenta dias. Imediatamente também, o texto é encaminhado ao Parlamento, que constituiu comissão mista, com senadores e deputados, alternada a relatoria. (A alternância da relatoria – e sua supressão corrente – é elemento central para a compreensão da dita guerra.)
Cabe a este colegiado receber e analisar inicialmente o texto remetido pelo Executivo. Em caso de alterações na comissão, a medida provisória avança transformada em projeto de lei de conversão – para ser apreciada, pela ordem, por Câmara e Senado. Registre-se que os plenários igualmente podem mexer no texto. Ordinariamente, a partir de destacamentos feitos na comissão. Ou, extraordinariamente, em função de acordo. Uma vez aprovado, e quando com modificações, volta ao Planalto para sanção presidencial (ou não).
Quando, no entanto, o parecer for aprovado pela comissão mista sem mudanças, e da mesma forma nos plenários, sempre pela ordem, da Câmara e do Senado, a matéria será promulgada pelo Congresso Nacional.
Isto é o que diz a Constituição. Sob lógica que balanceia o trânsito entre as Casas legislativas.
Veio a pandemia, porém. E, com a peste, o ato conjunto número 1, de março de 2020; do qual destaco o seguinte trecho:
“Enquanto durar a Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional e o estado de calamidade pública decorrente da Covid-19, as medidas provisórias serão instruídas perante o Plenário da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, ficando excepcionalmente autorizada a emissão de parecer, em substituição à Comissão Mista, por parlamentar de cada uma das Casas designado na forma regimental.”
Suspensa a comissão mista, ficou com a Câmara a responsabilidade de analisar primeiro as MPs. Mas, claro, mantida a participação do Senado, conforme expresso, pelo ato acima citado, na emissão de parecer “por parlamentar de cada uma das casas”. Com prazos estabelecidos e, pois, limite para envio do texto à outra casa. Solução emergencial, sim; que, contudo, manteve o espírito do disposto na Constituição.
Ocorre que esse rito – essa distribuição de tempos – foi de todo deturpado por Lira, tendo como consequência, na prática, que a Câmara seja a única a se debruçar sobre os textos, gerindo e tomando/comprimindo o correr dos dias, transformado o Senado (que tem recebido as matérias à véspera de as medidas provisórias caducarem) em mera instância chanceladora. Mera instância carimbadora de MPs relatadas sempre por um deputado.
Arthur Lira dominou os tempos e aterrou a alternância de relatoria entre as Casas.
O modelo atual dá superpoderes à Câmara, ao autoritário Lira, designador supremo de relatores, e esvazia o Senado de prazos, de meios, para debater e propor consistentemente alterações nas matérias.
Essas são as razões por que o senador Alessandro Vieira impetrou mandado de segurança no Supremo. Pela restituição do que diz a Constituição. Que tal? Lira atropelou a Carta e sustenta o atropelamento em nome da permanência de camada adicional a seus já superpoderes.
Trata-se de nova etapa na concentração de poder pelo senhor do Congresso, agora pela imposição de exercício bruto para suprimir prerrogativas do Senado.
É tema de natureza republicana, problema urgente, grave, derivado de um presidente da Câmara autoritário haver assaltado a Constituição Federal.
Anderson Torres evita incriminar Bolsonaro em depoimento ao TSE
Por Rafael Moraes Moura — Brasília / o globo
No depoimento ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), nesta quinta-feira (16), o ex-ministro da Justiça Anderson Torres evitou incriminar Jair Bolsonarona ação que pode declarar o ex-presidente inelegível e impedi-lo de disputar eleições pelos próximos oito anos. Torres depôs por 90 minutos na condição de testemunha numa ação movida pelo PDT contra o ex-ocupante do Palácio do Planalto.
Anderson Torres não explicou a autoria do texto que criava um certo "estado de defesa" no TSE, dando poderes ao ex-presidente Jair Bolsonaro para interferir na atuação da Corte – o que é flagrantemente inconstitucional.
O ex-ministro da Justiça também foi perguntado três vezes no depoimento se Jair Bolsonaro sabia da minuta golpista.
Torres disse que nunca falou sobre o assunto com Bolsonaro e insistiu que o documento não foi entregue para o ex-presidente da República. Alegou apenas que recebeu a minuta golpista de sua assessoria, mas não deu o nome de ninguém. Também foi confrontado com a sua própria alegação de que o texto era “folclórico", "loucura" e "lixo". Ora, apontaram os advogados do PDT, se o texto era “folclórico” e um “lixo”, por que estava guardado em sua casa, conforme descoberto por agentes da Polícia Federal?
Anderson Torres procurou então minimizar a gravidade do episódio. Disse que só tinha lido o início da minuta, que nem tinha se dado ao trabalho de fazer a leitura de todo o documento. “Comecei a ler, era uma loucura”, desconversou, segundo relatos.
E insistiu na tese de que a minuta havia sido guardada em sua casa para “descarte”. Admitiu, contudo, que não era comum receber esse tipo de documento durante o período em que atuou no governo Bolsonaro.
O ex-ministro da Justiça ainda foi cobrado no depoimento quanto ao dever funcional de alertar as autoridades sobre o teor da minuta, considerando a ameaça à democracia e o seu potencial de tumultuar o processo eleitoral.
“Anderson Torres não deu explicação sobre o documento, que não é apócrifo e foi feito pelo governo. Há uma tentativa de não dar nome a quem forjou isso. O depoimento não explica por que um texto tão grave contra a democracia esteve nas mãos de um ministro de Estado”, disse à equipe da coluna o advogado do PDT Walber Agra.
Ao final do depoimento, a defesa de Jair Bolsonaro avisou que pediria ao TSE para que o teor da fala de Anderson Torres fosse mantido sob sigilo. Antes, os advogados do ex-presidente haviam tentado impedir a realização da oitiva.
Nomeado para a Secretaria de Segurança Pública do DF, Anderson Torres foi preso por decisão do STF após os atentados terroristas que culminaram com a invasão e depredação da sede dos três poderes. Ele está detido num batalhão da Polícia Militar no Guará, região administrativa da capital federal, de onde prestou depoimento ao TSE, por videoconferência.
Em janeiro, a defesa de Bolsonaro alegou ao TSE que a minuta golpista encontrada na casa do ex-ministro é “apócrifa”, nunca foi publicada e “nunca extravasou o plano da cogitação”.
Anderson Torres prestou depoimento ao TSE no âmbito de uma ação que investiga a reunião do ex-presidente com embaixadores em que ele fez ataques ao sistema eleitoral, em julho do ano passado.
É o mais adiantado dos processos do TSE que podem levar Jair Bolsonaro à inelegibilidade. Segundo integrantes do TSE, o caso deve tramitar por pelo menos mais um mês antes de ser liberado para julgamento.
Até aqui, o relator das 16 ações que investigam a campanha de Bolsonaro, o ministro Benedito Gonçalves, tem dado ritmo célere aos casos, inclusive já submetendo aos colegas questões preliminares que poderiam levar à anulação dos processos mais à frente.
O objetivo é reduzir o espaço de manobra se Bolsonaro quiser apontar alguma questão processual para implodir as investigações.
Em novembro, as ações sairão das mãos de Benedito Gonçalves e irão para Raul Araújo, ministro que tem tomado decisões mais próximas do que desejam os bolsonaristas. Por isso é que o PT quer que os casos sejam julgados ainda neste semestre, ou no mais tardar antes de Gonçalves deixar o tribunal, conforme informou a coluna.
'Fui colocado para fora pela equipe do GSI', diz ex-chefe operacional da PM-DF, na CPI dos atos golpistas
Por Alfredo Mergulhão e Julio Cesar Lyra — Rio de Janeiro / o globo
Em depoimento na CPI dos atos antidemocráticos na Câmara Legislativa do Distrito Federal, nesta quinta-feira, o coronel Jorge Eduardo Naime, ex-chefe do Departamento Operacional da Polícia Militar no DF, disse ter sido expulso de uma área do Palácio da Alvorada dias antes dos ataques golpistas. Segundo o oficial, às vésperas da posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, cerca de 15 agentes do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) da Presidência da República impediram seu acesso à área de segurança, que estava aberta ao público.
— O GSI abriu para o público, bem próximo da posse. Tinha várias delegações de outros países hospedadas, inclusive no Blue Tree, e recebemos várias reclamações no 190. Eu estava em reunião, saí da reunião e fui lá ver o que estava acontecendo. E aí fui acessar a área que toda a população estava acessando. Devidamente fardado, com viatura caracterizada, com um patrulheiro ao meu lado. Fui abordado por um soldado do Exército que colocou a mão no meu peito, me proibiu de entrar e chamou uma guarnição do GSI. Vieram mais ou menos uns 15, a comando do Capitão Roma — relata Naime.
Segundo ele, as pessoas vieram atrás dos agentes e começaram a xingá-lo. Ele afirma, no depoimento, que a área reservada é de responsabilidade do governo, e que, quando aberta ao público, está sujeita à fiscalização dos órgãos do Distrito Federal — Detran, PM e Polícia Civil.
— Um sargento começou a falar comigo de uma forma totalmente fora do conceito militar, apontando dedo na minha cara. Fui colocado para fora da área pela equipe do coronel Roma do GSI — diz.
O GSI era comandado, à época, pelo general Augusto Heleno.
Alvo de operação da PF
O ex-chefe do departamento operacional foi preso em fevereiro, na operação Lesa Pátria. O militar, que era responsável pela corporação no dia dos ataques golpistas de apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro à Praça dos Três Poderes, é investigado por suspeita de omissão no planejamento dos atos. Ele foi afastado do cargo pelo ex-interventor federal Ricardo Cappelli, no dia 10 de janeiro, dois dias após os ataques.
O militar tinha pedido folga do trabalho às vésperas dos ataques golpistas e estava fora capital federal no momento do incidente, precisando ser chamado às pressas para conter os invasores. Ele fez a solicitação de folga no dia 3 de janeiro. No pedido, o oficial demandava a dispensa até 8 de janeiro. A aprovação do pedido foi assinada no dia 5 pelo gabinete do então comandante-geral da PM-DF, Fábio Augusto Vieira. Vieira foi exonerado e preso por suspeita de omissão, mas depois o ministro do STF Alexandre de Moraes revogou a prisão de Vieira.
Em nota, a defesa do coronel afirmou, na época, que “Naime agiu conforme a lei e a técnica, realizando todas as prisões ao alcance das condições materiais com as quais contava no momento” e que “o avanço das investigações demonstrará a inocência do Coronel, que há 30 anos presta serviços relevantes à população do Distrito Federal”.
A mulher do coronel, Mariana Adorno Naime, mantinha um cargo de coordenadoria no Ministério da Justiça durante a gestão de Anderson Torres, que também está preso sob a acusação de omissão. Ela foi nomeado três meses depois que Torres assumiu a pasta, em junho de 2021, para o cargo de “coordenador da política de integração da Coordenação-Geral de Políticas para as Instituições de Segurança Pública”. Deixou o posto em março de 2022, quando foi exonerada a pedido, segundo o Diário Oficial da União.