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Haddad entra na campanha

Por Notas & Informações / O ESTADÃO DE SP

 

O governo Lula da Silva bloqueou mais R$ 1,4 bilhão do Orçamento em setembro, elevando de R$ 10,7 bilhões para R$ 12,1 bilhões o total de gastos congelados no ano. Sem surpresas, os dispêndios com o Benefício de Prestação Continuada (BPC), pago a idosos vulneráveis e a pessoas com deficiência, foram o principal motivo a justificar a necessidade de um novo bloqueio, apesar das ações do Executivo e do Judiciário para conter o ritmo de concessões do benefício.

O avanço das despesas, como até as pedras sabem, é o maior problema das contas públicas. Por isso, o que surpreendeu, na divulgação do relatório bimestral do Orçamento, foi o discurso da equipe econômica, que assumiu um tom bem mais político do que o que vinha sendo adotado na área fiscal. Ao contrário do que se presumia, durante a entrevista coletiva, o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Dario Durigan, expressou mais preocupação com o comportamento das receitas do que com o dos gastos.

 

Ao todo, a arrecadação projetada para o ano recuou R$ 1,9 bilhão, puxada pelas receitas com impostos e contribuições, que, pelas projeções, ficarão R$ 12 bilhões abaixo do que se esperava. Para Durigan, isso se deve à desaceleração da atividade econômica, consequência de uma política monetária “bastante restritiva”, cuja “dose do remédio” preocupa o governo como um todo.

 

No dia seguinte, a Receita Federal divulgou que a arrecadação teve uma queda real de 1,5% em agosto ante o mesmo mês do ano anterior, a primeira nesse tipo de comparação desde novembro de 2023, ainda que a arrecadação no acumulado do ano tenha registrado um aumento real de 3,73% em relação ao mesmo período do ano passado.

 

O dado de agosto não parece ser um ponto fora da curva. O chefe do Centro de Estudos Tributários e Aduaneiros da Receita, Claudemir Malaquias, disse que a desaceleração da atividade econômica já pode ser observada em indicadores como produção industrial, consumo e vendas no varejo, ainda que, ao menos por enquanto, não tenha afetado nem os serviços nem a massa salarial.

 

Embora incipientes, esses sinais bastaram para que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, embarcasse de vez na estratégia política do governo. Após a divulgação da ata do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC), Haddad disse não haver justificativa para os juros estarem em 15% ao ano. O ministro vinha evitando críticas mais duras à política monetária, mas a inflexão, neste momento, é até compreensível. Se uma economia mais fraca prejudica a arrecadação, ela sepulta os planos de um governo que tentará a reeleição.

 

A investida também se deu no Congresso. Ao participar de audiência pública na Comissão de Agricultura da Câmara, Haddad fez mais do que defender a medida provisória que taxa títulos isentos, como as Letras de Crédito do Agronegócio (LCAs) e as Letras de Crédito Imobiliário (LCIs), e aumenta a tributação sobre as bets. Disse que a rejeição da proposta poderá afetar o Plano Safra no ano que vem, afirmou que as operações da Receita Federal estão chegando aos “verdadeiros ladrões da Pátria” e classificou de “vagabundagem” o fato de o ex-presidente Jair Bolsonaro não ter corrigido a tabela do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) durante seu governo.

 

No fundo, o ministro bem sabe que o arcabouço não foi capaz de controlar as despesas, o que só reforçou sua busca obsessiva por novas receitas e lhe rendeu o apelido pejorativo de “Taxad”. Mas, por ora, Haddad quer mesmo é terceirizar responsabilidades para chegar até o fim de 2026 sem ter de assumir o ônus político de alterar as metas fiscais.

Já está claro que, para isso, o governo não hesitará em recorrer a manobras como o pagamento de dividendos pelas estatais, o uso de fundos para financiar políticas públicas e a obtenção de recursos extraordinários por meio de leilões de petróleo e gás. Culpar governos anteriores, instar o Banco Central a reduzir as taxas de juros e jogar duro com o Congresso são parte desse teatro no qual discussões sobre a qualidade e a eficiência do gasto ficam sempre para depois.

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