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É vital fechar fábricas clandestinas de armas para o crime organizado

Por  Editorial / O GLOBO

 

Em agosto, a Polícia Federal apreendeu num galpão industrial de Santa Bárbara D’Oeste, interior de São Paulo, dez máquinas de última geração usadas para fabricar ilegalmente fuzis AR-15 — havia 40 deles no local. Um dia depois, o Grupo de Atuação de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) descobriu uma fábrica de munição caseira com mais de cem armas em São Roque, também no interior paulista. Não bastassem o tráfico de armas que circulam sem embaraço pelas fronteiras e o desvio de armas compradas legalmente, tem crescido o fornecimento doméstico do crime organizado por meio de usinas camufladas que produzem armamento “fantasma”.

 

Essas linhas de fabricação clandestina têm se destacado no abastecimento dos arsenais do crime, segundo artigo dos pesquisadores Bruno Langeani e Natália Pollachi, do Instituto Sou da Paz, publicado em revista científica da London School of Economics. Eles verificaram que, entre 2019 e 2023, a quantidade de metralhadoras e submetralhadoras apreendidas aumentou 17,8% (de 790 para 931), e a de fuzis 44,8% (de 1.139 para 1.650). O mais preocupante é que 39% dos fuzis não tinham indicação de fabricante. Eram fantasmas — evidência do funcionamento das fábricas ilegais de armas. É, de acordo com os pesquisadores, um percentual muito alto, mesmo levando em conta as dificuldades da polícia para identificar as armas corretamente.

 

Não é de hoje que o crime organizado busca fontes próximas de abastecimento para seus arsenais. O próprio crescimento da criminalidade incentiva o surgimento dessas fábricas. Estudos forenses já mostravam a prevalência de armas de fabricação “privada” nas apreensões. Um deles revelou que 48% das submetralhadoras apreendidas em São Paulo em 2011 e 2012 eram armas artesanais, sem componentes industriais.

 

Livre de regulações, o mercado americano de armamentos é a principal fonte de partes e peças montadas nas linhas de produção clandestinas. O Paraguai costuma ser escala nas rotas de contrabando, tanto das armas originais quanto das montadas, por vezes com peças de fabricantes conhecidos. Os pesquisadores citam um caso ocorrido entre Pedro Juan Caballero, no Paraguai, e Ponta Porã, no Brasil, cidades divididas apenas por uma avenida. Segundo o relato, a polícia parou o carro de uma família e notou que as portas do veículo pareciam pesadas demais. Dentro delas estavam sete pistolas Glock e quatro fuzis fantasmas, fornecidos por linhas de montagem que funcionam ao longo da fronteira.

 

Há inúmeras evidências de como a criminalidade passou a obter acesso a armas legais em virtude da política armamentista equivocada vigente durante o governo Bolsonaro (2019-2022). Agora, com a revogação do afrouxamento nas regras pelo atual governo, ganhou impulso a produção clandestina. Na repressão ao crime organizado, uma das prioridades deve ser cortar tais linhas de suprimento. As facções criminosas não podem se tornar autossuficientes no acesso ao principal recurso que usam para matar.

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