O bode expiatório dos Correios
Por Notas & Informações / O ESTADAÕ DE SP
O presidente dos Correios, Fabiano Silva dos Santos, entregou sua carta de demissão na semana passada. O pedido ainda será analisado pelo presidente Lula da Silva, mas sua renúncia se tornou questão de tempo depois que a empresa registrou um prejuízo de R$ 1,7 bilhão no primeiro trimestre deste ano. Seria fácil culpar Fabiano Silva dos Santos por um resultado tão desastroso – e, em última instância, a responsabilidade é mesmo do presidente da empresa –, mas também seria incoerente, pois, não faz muito tempo, o governo defendeu sua atuação.
Em janeiro, a ministra da Gestão e da Inovação, Esther Dweck, deu uma entrevista coletiva para justificar o estrondoso déficit de R$ 6,7 bilhões registrado pelas empresas estatais federais que não dependem do Tesouro Nacional para se sustentar. Desse total, os Correios foram responsáveis por R$ 3,1 bilhões. À época, a ministra, ao lado de Fabiano, diminuiu a importância do rombo. Segundo ela, os Correios estavam com um plano de investimentos em curso para ampliar sua presença no mercado e em breve retomariam sua trajetória positiva.
Mais que uma promessa, era puro devaneio. O problema dos Correios era bem maior do que o governo estava disposto a admitir. A culpa não foi apenas da famosa “taxa das blusinhas”, que o governo impôs sobre importações de produtos chineses baratos e que, de fato, teve impacto no faturamento. Tampouco foi o custo de manutenção dos milhares de imóveis que a empresa tem em todo o País. A questão central é que as receitas da empresa simplesmente não são suficientes para arcar com o tamanho de suas despesas, e isso não se reverteria mesmo que os Correios investissem pesadamente em tecnologia, logística e centros de distribuição para disputar o mercado com concorrentes de peso.
A vacância da presidência dos Correios será politicamente útil neste momento. Aparentemente, o ministro da Casa Civil, Rui Costa, enxerga na saída de Fabiano uma chance de posar de fiscalista. Teria partido dele a exigência de que os Correios adotassem o plano de reestruturação ao qual Fabiano demonstrou resistência. É de perguntar por que o mesmo governo concordou com a realização de um concurso público dos Correios no fim do ano passado. Também cabe questionar se o Executivo acha mesmo que fechar algumas agências, vender imóveis e abrir programas de demissão voluntária, como quer Rui Costa, vai salvar a empresa.
O mais provável é que o erro de Fabiano tenha sido a admissão de que os Correios precisarão de um aporte bilionário para conseguir se sustentar neste ano e no próximo, como revelou a Folha de S.Paulo. É o tipo de notícia da qual o governo Lula da Silva não precisava neste momento, pois evidencia que nada mudou na visão que o PT tem sobre o papel das empresas públicas na economia.
Tidas pelo lulopetismo como um vetor do desenvolvimento, as estatais são estimuladas a gastar muito além de suas possibilidades, independentemente dos resultados financeiros. Mas há uma diferença considerável entre não dar lucro e gerar um prejuízo bilionário. Em uma empresa privada, isso seria intolerável para os acionistas e o Conselho de Administração. Em uma empresa pública, no entanto, o PT avalia que é obrigação do governo socorrê-la com dinheiro do contribuinte.
O pior é que, na situação em que os Correios estão, nem mesmo um aporte bilionário pode ser suficiente. Se o dinheiro for utilizado para bancar despesas correntes, a empresa passará a ser dependente do Tesouro Nacional. E para fazer isso sem descumprir as regras fiscais, o Executivo teria de cortar R$ 20 bilhões para incorporar todos os gastos da empresa ao Orçamento-Geral da União, o que não parece crível para um governo que faz malabarismos para tentar cumprir a meta de déficit fiscal zero neste ano.
É difícil acreditar que Fabiano Silva dos Santos, advogado que participou da equipe de transição do governo e que está à frente dos Correios desde janeiro de 2023, tenha feito algo na empresa sem o conhecimento e o aval de Lula da Silva. Fato é que o insaciável presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), tem a pretensão de indicar um sucessor na empresa, e o governo precisa desesperadamente de um bode expiatório.