Contra onda antipetista, Haddad esconde Dilma e a estrela do PT na campanha
Determinado a chegar ao segundo turno explorando o discurso de que é o “homem do Lula”, o ex-ministro Fernando Haddad concluiu sua campanha na TV ontem ignorando dois ícones do petismo. Repetindo a cada programa o nome de seu padrinho, Haddad deixou de fora da sua propaganda a figura da ex-presidente Dilma Rousseff, que deixou o governo rejeitada pela maioria da população, e a simbólica estrela do PT, marca da crescente onda antipetista nesta campanha.
Primeira mulher a presidir o país, Dilma é candidata ao Senado por Minas Gerais, e lidera a disputa – com 27% das intenções de voto no último Datafolha – fazendo uma campanha pautada no impeachment que sofreu em 2016. Em todos os discursos, ela se diz vítima de um “golpe”, defende a liberdade de Lula e pede votos para o governador Fernando Pimentel (PT), que tem 21% das intenções de voto, lembrando que seu adversário, o senador Antonio Anastasia (PSDB), que lidera a disputa com 32%, foi o relator do impeachment.
Na campanha presidencial do PT, Dilma foi reduzida pelo marketing petista a citações periféricas de Haddad ao criticar seus adversários por supostamente “darem um golpe” para tirar o PT do Palácio do Planalto. A avaliação de integrantes da campanha de Haddad é de que o discurso de Dilma como “vítima de um golpe” pegou no Nordeste, mas divide opiniões em outras regiões.
Um dirigente petista diz que Dilma não agrega votos a Haddad, como Lula. Por causa disso, a narrativa petista concentrou-se no legado social dos dois primeiros mandatos do ex-presidente. O primeiro governo de Dilma é lembrado apenas na conta matemática feita por Haddad ao destacar avanços do petismo “em 12 anos de governo”.
Para os integrantes da campanha petista, a imagem da ex-presidente segue vinculada à crise econômica do país e à desaprovação de seu ex-vice, o presidente Michel Temer. Em março de 2016, meses antes de ser afastada da Presidência, Dilma comandava um governo com 10% de popularidade. De acordo com pesquisa Ibope divulgada naquele período, a desaprovação de Dilma era de 69%.
Além de não agregar votos ao petista, Dilma tornou-se munição nas mãos dos adversários, que tentam tirar votos de Haddad destacando a má avaliação do governo da petista. Primeiro colocado nas pesquisas, o presidenciável do PSL, Jair Bolsonaro, costuma repetir o bordão de que “a Dilma quebrou o país”.
A ex-presidente também é alvo de críticas de candidatos mais alinhados à esquerda. Em setembro, Ciro Gomes (PDT) disse, em entrevista ao GLOBO, que o “Brasil não aguenta outra Dilma", sobre a substituição da candidatura de Lula por Haddad.
Frase parecida foi usada por Ana Amélia (PP), candidata à vice do tucano Geraldo Alckmin, que chamou o ex-ministro de “nova Dilma”, uma nova tentativa de Lula de colocar um “poste” na Presidência.
Além de não explorar a imagem da petista na propaganda, a campanha de Haddad resolveu “apagar” o último ano da petista na Presidência, criticado pela piora de índices econômicos, como os que medem o desemprego. “Nós fomos bem em muita coisa durante os três governos do PT”, disse Haddad, ao falar sobre educação, em uma entrevista.
Não foi a única vez em que o ex-prefeito de São Paulo deixou de incluir o último mandato de Dilma nas contas sobre a temporada do partido à frente do Palácio do Planalto.
A estratégia foi lançada por Lula, que costuma contar 12 anos do PT na Presidência. Dilma foi afastada do Planalto em maio de 2016, um ano e quatro meses depois de assumir seu segundo mandato. Na soma dos mandatos, o PT passou pouco mais de 13 anos no comando do país.
“Em 12 anos, fizemos mais escolas técnicas do que eles fizeram em 100 anos. Em 12 anos, colocamos mais jovem na universidade do que eles colocaram em 100 anos”. As frases são de Lula e estão em destaque no site oficial da campanha de Haddad
"Governo inviabilizado"
Um petista próximo ao ex-presidente nega que o partido esteja tentando “apagar” o último mandato de Dilma. Ele repete o discurso de que, depois de perder nas urnas, o senador Aécio Neves (PSDB), junto ao então presidente da Câmara, Eduardo Cunha (MDB), impediram a ex-presidente de governar o país. Essa “defesa” petista sobre o último ano do governo Dilma, que deixou o Planalto com 11 milhões de desempregados, começou ainda durante o processo de impeachment. Ao se defender para os senadores, em agosto de 2016, ela disse:
– Deve ser também ressaltado que a busca de reequilíbrio fiscal, desde 2015, encontrou forte resistência na Câmara dos Deputados, à época presidida pelo deputado Eduardo Cunha. Os projetos enviados pelo governo foram rejeitados, parcial ou integralmente; pautas-bombas foram apresentadas e algumas aprovadas.
O próprio Haddad repetiu o argumento em entrevista ao Jornal Nacional, no mês passado. Disse que o fracasso do governo petista foi influenciado por ações da oposição liderada por Eduardo Cunha. Na entrevista, ele defendeu Dilma, dizendo que ela não é ré em nenhum processo. Durante a campanha, o ex-ministro participou de atos em Belo Horizonte, ao lado da petista.
A assessoria da ex-presidente informou que ela não comenta o assunto. A assessoria da campanha de Haddad não retornou à reportagem.
"Vítima do golpe"
Nesta quinta-feira, Dilma Rousseff participou de caminhada no Alto Vera Cruz, um dos bairros mais pobres de Belo Horizonte.
— Nunca houve uma eleição tão importante no nosso país. É uma eleição que, de um lado, tem aqueles que defendem o povo brasileiro e o mineiro. E que defendem todas as conquistas que tivemos antes desse golpe dado por Aécio Neves e Anastasia. Eles se aliaram a Temer, o governo ilegítimo, que tem tirado nossos direitos – disse Dilma, para uma plateia de cerca de 50 pessoas.
A ex-presidente faria uma pequena caminhada pelo bairro, entre uma praça e a sede de um projeto social do rapper Renegado, no bairro. Havia um pequeno grupo de apoiadores do presidenciável do PSL, Jair Bolsonaro, xingando a ex-presidente. Diante do clima hostil, a campanha preferiu que ela fizesse o trajeto em um carro. Dilma foi protegida por uma barreira humana formada por integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra. O GLOBO