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A cada tijolo que cai, uma agonia - ZEINA LATIF

Temos assistido a situações de fraqueza e desvio institucional — talvez retrocesso —, em várias frentes. Não se trata apenas do funcionamento de órgãos de controle e instituições democráticas, mas também do respeito às regras do jogo que promovem o bem comum.

Garantir boas práticas na ação estatal é o que falta neste momento, afetando a confiança da sociedade e de agentes econômicos, e a imagem do país.

A anulação das condenações de Lula, por erros formais de jurisdição, e as possíveis decisões para invalidar processos da Operação Lava-Jato, por ação inadequada de juízes e promotores, poderiam ter sido evitadas caso as instituições tivessem funcionado como deveriam anos atrás.

Enquanto a Lava-Jato tornava-se “patrimônio nacional”, parte da classe jurídica criticava seus métodos e apontava equívocos. Não houve, porém, reação devida de entidades civis relevantes — como a OAB —, do próprio Ministério Público e dos poderes Judiciário e Legislativo.

Em que pese sua grande contribuição, faltaram os saudáveis freios e contrapesos à Operação.

Salta aos olhos a mão forte do aparato estatal contra as liberdades de expressão de cidadãos, de pensamento nas universidades e de imprensa, com uso indevido da Lei de Segurança Nacional.

Enquanto isso, a sociedade convive com os excessos de Bolsonaro, que passam incólumes, apesar de as palavras de um presidente terem peso infinitamente maior. Liberdade de expressão e alto cargo público não combinam.

Na saúde, o país deveria há muito estar discutindo alguma intervenção no Ministério da Saúde e meios legais para frear as falas e atitudes do presidente que são um desserviço ao combate à pandemia. O silêncio dos demais poderes revela sua fraqueza institucional.

Na política econômica, dois temas — já discutidos neste espaço — se destacam. Primeiro, a volta de intervenções indevidas nas principais estatais, levando à saída de seus presidentes. Isso afasta investidores e, ao longo do tempo, reduz o retorno financeiro ao Tesouro, conforme se prejudica a gestão dessas empresas.

Segundo, a mudança promovida no regime fiscal, para pior: a regra do teto de gastos foi flexibilizada para o pagamento do auxílio emergencial sem medidas compensatórias adequadas. Abriu-se um precedente perigoso. O problema não foi descumprir a promessa de manter os gastos da pandemia circunscritos a 2020, mas não se preparar para 2021, apesar dos alertas.

Mesmo que venham a ser desvios temporários, e não retrocessos, corroem a confiança de agentes econômicos e podem ter difícil correção adiante. Um exemplo seria o preço ainda pago pelo desrespeito à Lei de Responsabilidade Fiscal — uma regra básica na gestão das contas públicas — no governo Dilma.

Uma situação que poderia ter sido evitada caso os órgãos de controle e o Congresso tivessem cumprido bem seu papel de monitorar e cobrar correções. Foi desvio para todo lado, contribuindo, em grande medida, para jogar o país na grave recessão de 2015-16.

A estabilidade institucional (o que não significa seu engessamento) é um fator que distingue as nações ricas das pobres. A construção de credibilidade e legitimidade das instituições decorre do acúmulo de experiências, de quilometragem.

Trata-se de um jogo repetitivo que consolida valores e boas práticas — quando é o caso, jurisprudência —, levando ao amadurecimento institucional de um país. Quando há muitos desvios, com regras do jogo que se alteram com frequência e sem critério claro e defensável, a contribuição das instituições para o desenvolvimento das nações é prejudicada.

Um ponto central nessa construção é o comportamento de lideranças políticas e agentes públicos no respeito às limitações impostas pelas instituições. Não se trata apenas de respeitar as leis escritas, mas o seu espírito, exercitando a necessária autocontenção, em benefício do bem comum.

Legalmente, não é proibido desqualificar as orientações de profissionais da saúde, atacar inimigos imaginários e intervir equivocadamente na economia, mas deveria ser fortemente evitado. Além disso, diante de dilemas e escolhas difíceis, é preciso buscar o diálogo e o debate honesto para a construção de soluções que não enfraqueçam as instituições.

Esses dois atributos de um estadista faltam a Bolsonaro.

Precisamos a cada dia colocar mais um tijolo no fortalecimento institucional do país, mas o quadro atual é de desconstrução.

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