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CUT vende prédio, demite e afunda na maior crise sindical já vivida

Cleide Carvalho / ÉPOCA

Vagner Freitas, presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), está cada vez mais longe do poder e mais perto de Deus. Para fazer dinheiro, a entidade — a maior das centrais sindicais, braço político do petismo agora derrotado — sairá do prédio próprio no bairro do Brás, em São Paulo, sua sede há 23 anos, para um endereço no centro antigo da cidade. No fim de julho, a Executiva da CUT aprovou a venda do local. Avaliado em R$ 40 milhões, o imóvel com sete andares está sendo negociado com a Igreja Mundial do Poder de Deus, que ocupa um quarteirão inteiro do outro lado da rua. O negócio ainda não foi fechado, mas Freitas já decidiu pela saída do Brás, o berço do sindicalismo paulista. O fim da contribuição sindical obrigatória, levado a cabo pela reforma trabalhista do governo Michel Temer, levou a CUT à bancarrota.

 

Apesar de todo o simbolismo da mudança, a decisão pela venda da sede parece fácil, quase corriqueira, diante do desafio de encarar o futuro governo de Jair Bolsonaro. Freitas lembrou o dia da votação do impeachment de Dilma Rousseff, quando deputados justificavam seus votos em voz alta no plenário. Um deles, Fernando Francischini, então do PSD, votou “pelo fim da CUT e seus marginais”. Francischini é um parlamentar próximo ao presidente eleito.

Fernando Francischini, que em seu voto a favor do impeachment de Dilma defendeu
Fernando Francischini, que em seu voto a favor do impeachment de Dilma defendeu "o fim da CUT e seus marginais", foi eleito deputado estadual pelo PSL Foto: Reprodução

Numa sexta-feira nublada do começo de novembro, um almoço de trabalho de Freitas com dirigentes dos maiores sindicatos filiados à central sindical avançou pela tarde. Químicos, bancários e metalúrgicos, entre outros, discutiam como dar a volta por cima diante de um governo assumidamente de direita, eleito com uma agenda liberal e com uma pauta que vai contra tudo o que os sindicatos cutistas defendem. Preocupam os discursos cada vez mais frequentes contra direitos como 13º salário, apelidados por bolsonaristas de “jabuticabas” — por existirem somente no Brasil, assim como a fruta. “Não é terrorismo, não é ameaça. Ele fala o que vai fazer, e não tenho dúvida de que fará. A reforma trabalhista aprovada pelo Michel Temer, para ele, é tímida, e o que ficou ele vai tirar”, disse.

A sede da CUT no Brás. Mais um prédio na mão de uma igreja evangélica Foto: Eduardo Anizelli / Folhapress
A sede da CUT no Brás. Mais um prédio na mão de uma igreja evangélica Foto: Eduardo Anizelli / Folhapress

Freitas não vê possibilidade de moderação por parte do novo governo, mas ele próprio pregou o radicalismo. À época do impeachment da petista Dilma Rousseff, falou em pegar em armas contra a deposição da presidente. Hoje atribui sua afirmação a um “jargão sindical”. “Era a arma da greve, da manifestação e de ocupar Brasília democraticamente. Essa fala ficou démodé”, desconversou.

As idas e vindas do governo Bolsonaro sobre a manutenção ou a extinção do Ministério do Trabalho são uma demonstração do desdém do eleito com os direitos dos trabalhadores, reclamou Freitas. Para o presidente da CUT, o contraste dos tempos atuais com os do governo de Luiz Inácio Lula da Silva não poderia ser maior. O PT, que nasceu das greves dos trabalhadores do ABC paulista já na fase final da ditadura militar, era praticamente a CUT no poder. Com a vitória de Lula em 2002, os sindicalistas ganharam acesso livre aos corredores de Brasília. Ao mesmo tempo, diminuíram a presença nas ruas. Quando lembrado dessa época, Freitas disse que, ao assumir a presidência da CUT, em 2013, já não era mais Lula no poder — e sim Dilma. A presidente era mais protocolar e seca, mas Freitas não tem do que se queixar. Um ano antes do impeachment, em fevereiro de 2015, ele foi ao Palácio do Planalto para uma audiência agendada com o então secretário-geral da Presidência, Miguel Rossetto, e acabou sendo recebido pela presidente num momento em que as centrais sindicais brigavam, no Congresso, para derrubar Medidas Provisórias (MPs) de interesse do governo. As MPs alteravam regras trabalhistas de forma muito mais branda que a reforma trabalhista de Temer. Na época, o Palácio do Planalto classificou o encontro não agendado como “uma cortesia”.

Apesar da amabilidade, Dilma nunca chegou a ter a intimidade de Lula com o movimento sindical. Nem sempre havia entendimento, e a presidente sempre impôs um distanciamento respeitoso. Quem presenciou esse tipo de encontro afirmou que não era raro Dilma encerrar a discussão estabelecendo limites: “Só posso ceder até aí”, avisava.

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