Coronavírus: Bolsonaro inclui salão, barbearia e academia como 'atividades essenciais'
Por Guilherme Mazui e Pedro Henrique Gomes, G1 — Brasília
O presidente Jair Bolsonaro incluiu nesta segunda-feira (11) as atividades de salões de beleza, barbearias e academias de esportes na lista de "serviços essenciais". Isso significa que, no entendimento do governo federal, as atividades podem ser mantidas mesmo durante a pandemia do coronavírus.
O decreto foi publicado em uma edição extra do "Diário Oficial da União" no fim da tarde. Com essa inclusão, o número de atividades consideradas essenciais chegou a 57.
Liberação não é automática
Ainda que o governo federal estabeleça quais atividades podem continuar em meio à pandemia, o Supremo Tribunal Federal (STF) já decidiu que cabe aos estados e municípios o poder de estabelecer políticas de saúde – inclusive questões de quarentena e a classificação dos serviços essenciais.
Ou seja, na prática, os decretos presidenciais não são uma liberação automática para o funcionamento de serviços e atividades.
No último dia 29, ao incluir outros 14 setores como serviços essenciais, o governo federal afirmou no decreto que a lista "não afasta a competência ou a tomada de providências normativas e administrativas pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos Municípios, no âmbito de suas competências e de seus respectivos territórios".
Sem participação de Teich
Nos três novos itens, o texto do decreto afirma que precisam ser "obedecidas as determinações do Ministério da Saúde".
Questionado sobre o tema no mesmo instante em que o texto foi publicado, entretanto, o ministro Nelson Teich disse não ter relação com a autorização.
"Isso não é atribuição nossa, é decisão do presidente. A decisão de atividades essenciais é uma coisa a ser definida pelo Ministério da Economia. O que eu realmente acredito é que qualquer decisão que envolva a definição, de uma atividade ser essencial ou não, passa pela tua capacidade de fazer isso de uma forma que proteja as pessoas", afirmou.
Teich foi questionado, em seguida, se não seria recomendável que o Ministério da Saúde participasse desse debate. O ministro ficou em silêncio por alguns segundos e, depois, disse que precisaria "pensar melhor" sobre o tema.
"Honestamente, tenho que pensar melhor nesta pergunta. Neste momento, a resposta seria não, porque é uma atribuição do Ministério da Economia. Vejo a Saúde participando sempre, a partir do instante que ela ajuda a definir formas de fazer que possam proteger as pessoas", disse.
O ministro não detalhou quais seriam essas "determinações do Ministério da Saúde', citadas no decreto presidencial, para garantir a segurança de clientes e funcionários em academias, salões e barbearias.
'Um milhão de empregos'
Antes da publicação oficial, Bolsonaro adiantou a liberação das categorias durante conversa com jornalistas na porta do Palácio da Alvorada, residência oficial da presidência.
“Essas três categorias juntas dão mais de um milhão de empregos. Pessoal, vou repetir aqui, vou apanhar de novo. A questão da vida tem que ser tratada paralelamente a questão do emprego”, disse o presidente.
Questionado, o presidente negou que as sucessivas inclusões na lista de serviços essenciais sejam uma tentativa de burlar as regras locais.
“Eu não burlo nada. Se você está me acusando disso, você me desculpa, você se equivocou aí. Saúde é vida. Quem está em casa, agora como sedentário, por exemplo, está aumentando o colesterol dele, problema de estresse, um monte de problema acontece. Se ele puder ir numa academia, logicamente, de acordo com as normas do Ministério da Saúde, ele vai ter uma vida mais saudável”, argumentou.
Bolsonaro também foi questionado se deseja incluir outros serviços no rol de atividades essenciais.
“Se eu tenho na cabeça? Tenho. Vamos esperar o que acontece nessas de hoje para a gente publicar esse demais aí”, afirmou, sem especificar quais seriam as atividades em estudo.
Após anulação no STF, sucessor de Moro volta a condenar ex-presidente da Petrobras na Lava Jato
Após ter sua sentença anulada pelo STF (Supremo Tribunal Federal) em 2019, o ex-presidente da Petrobras Aldemir Bendine foi novamente condenado na Lava Jato nesta segunda-feira (11), agora pelo sucessor do ex-juiz Sergio Moro na operação.
Bendine havia sido condenado por corrupção e lavagem em 2018, mas sua condenação foi revista em agosto do ano passado pelo Supremo por causa da ordem de fala de delatores e delatados no processo.
O caso teve etapas anuladas pela corte, incluindo a sentença em primeira instância e o julgamento da apelação em segunda instância.
Agora, com fases refeitas, o ex-executivo foi novamente condenado pelo juiz federal Luiz Antonio Bonat, que está à frente da Lava Jato na vaga que era de Moro.
A sentença de Bonat nesta segunda fixa a pena em seis anos e oito meses de prisão, dos quais serão descontados o período em que o réu já ficou preso. Bendine esteve na cadeia preventivamente de julho de 2017 a abril de 2019.
A condenação expedida por Moro estabelecia condenação de 11 anos de prisão, pena que passou para sete anos e nove meses de prisão na decisão de segunda instância.
O ex-presidente da Petrobras é acusado de receber propina da Odebrecht. Ele sempre negou ter cometido crime.
A decisão do Supremo que anulou a sentença de Bendine foi à época uma das principais derrotas da Lava Jato, uma vez que o procedimento que provocou a nulidade foi adotado em praticamente todas as sentenças da Lava Jato no Paraná.
Advogados de alvos da operação argumentaram ao STF que réus delatores e réus delatados se manifestavam nos processos nos mesmos prazos, o que, para eles, prejudicava o direito à ampla defesa.
Em julgamento em plenário, os ministros da corte concordaram com essa tese. Até hoje, porém, ainda não foi definido de que forma essa decisão terá seus efeitos estendidos a outros processos já julgados. Uma das sentenças potencialmente afetadas é a que condenou o ex-presidente Lula por corrupção e lavagem no caso do sítio de Atibaia (SP).
Bolsonaro promove corrupção brasileira do furto para o assalto à mão armada
O ex-deputado Roberto Jefferson postou uma foto em que carrega um fuzil e se diz pronto para defender o Brasil do comunismo sob as ordens de Jair Bolsonaro.
Sem querer, produziu a melhor síntese do bolsonarismo até agora: o bolsonarismo é o momento em que a corrupção brasileira passou do furto ao assalto à mão armada.
Não foi, a propósito, o primeiro contato do ex-deputado com a extrema direita. Vamos lá, tente adivinhar, o que foi que Roberto Jefferson fez antes com a extrema direita? Resposta no próximo parágrafo.
Você acertou, ele roubou da extrema direita. Em 19 de março de 2010, Jefferson publicou um artigo na seção Tendências/Debates deste jornal, em que argumentava que era a ideologia esquerdista que fazia o PT roubar. Não se sabe que ideologia o inspirou nesse caso, mas o fato é que o artigo era roubado: era plágio de um artigo de Olavo de Carvalho, que escreveu à Folha no dia seguinte reclamando. Jefferson colocou a culpa em “um antigo colaborador”.
O centrão, a propósito, sempre teve uma facção armada, a bancada da bala.
O sujeito ouve “bancada da bala” e pensa, “nossa, deve ser tudo capitão Nascimento, tudo sujeito violento, mas honesto”. Não, filho. O chefe da bancada da bala, deputado Alberto Fraga, foi gravado em 2009 reclamando que um de seus assessores, Júlio Urnau, estaria, supostamente, recebendo mais suborno do que ele. Ao fim da conversa, concluía: “E eu com cara de babaca aqui, entendeu?”.
Jair Bolsonaro sonha em dar um ministério para Fraga. Pensou em entregar-lhe o Ministério da Segurança Pública como forma de enfraquecer Sergio Moro. E nós com cara de babaca, aqui, entendeu?
Mas se engana quem pensa que tudo isso faz do bolsonarismo “mais do mesmo”.
Bolsonaro é muito pior do que “o mesmo”. Os outros governos compravam o centrão burlando as regras da democracia, mas preservavam a democracia.
Ao contrário do PT, por exemplo, Bolsonaro poderia, se quisesse, ter construído uma maioria parlamentar ideologicamente coesa. A esquerda sempre foi muito minoritária no Parlamento, mesmo quando vencia a eleição presidencial. Mas o atual Congresso Nacional é o mais conservador de todos os tempos.
O PSL poderia ter facilmente se tornado um partido grande, se o próprio Bolsonaro não o tivesse rachado ao meio. Partidos como o DEM poderiam ter fornecido quadros liberais para uma coalizão que se contentasse em ser conservadora dentro da democracia.
Se quisesse, Bolsonaro poderia ter montado um governo mais limpo, não por ser mais honesto –nunca, em hipótese alguma– mas porque há muitos deputados que defendem pautas conservadoras mais ou menos de graça.
Bolsonaro não quis compor uma maioria conservadora dentro da democracia.
Fez guerra ao DEM e ao PSDB o tempo todo, e ainda faz, mesmo quando eles defendem propostas do governo. Se Bolsonaro topou entregar todos os cargos que o centrão quis, mas não os que o DEM quis, é porque não está comprando votos para aprovar reformas liberais.
Bolsonaro está comprando o centrão para aprovar pautas autoritárias e, sobretudo, para evitar o impeachment. Ele sabe que a República qualquer dia desses acorda. E que, quando acordar, vai querer saber por que tem dez mil filhos a menos.
Prefeitos podem adiar pagamento da Previdência e deixar rombo de R$ 18 bi
10 de maio de 2020 | 22h30
BRASÍLIA - O Congresso Nacional abriu uma brecha para que as prefeituras possam suspender o pagamento de sua parte na contribuição previdenciária aos regimes próprios de servidores municipais de março a dezembro de 2020. Se todos os municípios elegíveis aderirem, 2,1 mil prefeitos jogarão para os sucessores uma bomba de R$ 18,5 bilhões.
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O problema é que muitos desses regimes previdenciários já estão desequilibrados, e o Ministério da Economia vê risco até de faltar dinheiro para o pagamento de benefícios.
O dispositivo foi inserido pelo Senado Federal no projeto de socorro aos Estados e municípios, aprovado por senadores e deputados e que agora está na mesa do presidente Jair Bolsonaro para sanção. A área técnica deve recomendar veto ao presidente, segundo apurou o Estadão/Broadcast, mas o Planalto pode ou não acolher a orientação. Um veto também pode ser derrubado no Congresso Nacional.
Entidades municipais negam qualquer interesse eleitoreiro na medida, desenhada, segundo eles, para dar alívio às prefeituras num momento de sobrecarga dos sistemas de saúde e assistência para o combate à pandemia do novo coronavírus.
A área econômica do governo, porém, viu na ação uma tentativa de aproveitar a calamidade pública e o afastamento de dispositivos da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) para ajudar os prefeitos a fechar as contas no período final de mandato.
Pagamentos adiados
Além de beneficiar as prefeituras que têm regimes próprios, o projeto também permite a municípios que contribuem ao INSS adiar pagamentos das prestações de dívidas refinanciadas em 2017. Naquele ano, uma lei permitiu às prefeituras parcelar cerca de R$ 75 bilhões em débitos, com descontos em multas juros, por um prazo de até 200 meses.
Com a lei aprovada esta semana no Congresso, os pagamentos das parcelas ficam suspensos também entre março e dezembro de 2020. Essas prestações vão para o fim da fila, ou seja, serão quitadas apenas ao final do contrato, que dura até 16 anos e meio. A Confederação Nacional dos Municípios (CNM) estima um alívio de R$ 5 bilhões com essa medida.
Procurada, a Secretaria de Previdência do Ministério da Economia informou que “avalia como tecnicamente preocupante a suspensão do pagamento das contribuições previdenciárias devidas pelos municípios”. Segundo o órgão, a iniciativa vai aumentar o endividamento previdenciário dos municípios que recolhem ao INSS e o déficit atuarial dos que têm regime próprio. O déficit atuarial reflete o rombo que sobraria nos cofres caso a prefeitura tivesse que desembolsar hoje todos os benefícios previstos para o futuro.
“Alguns municípios, cujos RPPS (regimes próprios) possuem reservas financeiras muito baixas, poderão inclusive enfrentar dificuldade para o pagamento de seus aposentados e pensionistas”, alerta o órgão em nota.
Segundo a Secretaria de Previdência, se todos os municípios aprovarem lei suspendendo as contribuições aos regimes próprios, a folga pode chegar a aproximadamente R$ 18,5 bilhões, “agravando a situação do desequilíbrio financeiro e atuarial desses RPPS e o risco de não pagamento de benefícios”.
Frente Nacional dos Prefeitos vê 'alívio necessário'
O vice-presidente da Frente Nacional dos Prefeitos (FNP), Firmino Filho, de Teresina (PI), diz que a suspensão das contribuições é um “alívio necessário” diante da perda de receita. Ele refutou os cálculos do governo de que a folga pode chegar a R$ 18,5 bilhões e disse que a conta está superestimada. “É um auxílio pequeno.”
Para Firmino Filho, as críticas à medida partem de quem “não entendeu o momento que estamos vivendo”. “Tem muito burocrata em Brasília que vive distanciado da província”, afirma. Ele também refuta o risco de calote no pagamento dos benefícios e garante que os prefeitos “terão responsabilidade” para assegurar os repasses.
O presidente da Confederação Nacional de Municípios (CNM), Glademir Aroldi, diz que haverá regulamentação do Ministério da Economia para evitar desvios no uso da folga que será aberta no Orçamento das prefeituras com a medida. Segundo ele, a ideia é prever que o dinheiro só poderá ser usado para repor perdas na arrecadação, auxiliar no pagamento da folha ou para bancar ações de combate à pandemia.
“Não vai acontecer isso (uso para fins eleitorais), não há essa possibilidade”, afirma Aroldi. Segundo ele, não haverá sequer espaço para prefeitos flertarem com aumento de gastos supérfluos como plataforma de campanha, porque as dificuldades permanecerão até o fim do ano.
Nos cálculos da CNM, os municípios devem ter até o fim do ano uma perda de R$ 74,5 bilhões em receitas com a crise de gerada pela pandemia. O socorro federal, por sua vez, garantiu um repasse de R$ 23 bilhões às prefeituras, cerca de um terço do buraco. “O prefeito que usar o espaço pela suspensão das contribuições previdenciárias para obras não atenderá às pessoas nas áreas de saúde e assistência”, diz Aroldi.
O aval à suspensão de pagamentos das prefeituras à Previdência aprovada pelo Congresso permite que os municípios interrompam o recolhimento de contribuições tanto regulares quanto extraordinárias, na avaliação de técnicos ouvidos pelo Estadão/Broadcast.
As alíquotas extraordinárias são bancadas pelo município quando há necessidade de sanar um desequilíbrio atuarial no fundo responsável por pagar aposentadorias. É o chamado plano de equacionamento, espécie de esforço feito agora para evitar que falte dinheiro para benefícios no futuro.
Uma das cidades que têm plano de equacionamento vigente é Santa Maria (RS). Lá, a prefeitura precisa desembolsar todo mês 18% sobre a folha a título de contribuição regular e mais 33,46% sobre a mesma base como alíquota extraordinária. Em 2029, a cobrança extra chegará a 111,08% da folha para dar conta do buraco, segundo o plano aprovado no fim de 2018.
A avaliação na área econômica é que os municípios já têm um cenário delicado para honrar os compromissos com a Previdência no futuro. Por isso, adiar esse tipo de pagamento apenas “joga a bomba” para os sucessores. No caso dos pagamentos aos regimes próprios, a lei sequer diz quando os valores devidos serão regularizados.
'Quem dará habeas corpus ao Supremo?', questiona general
11 de maio de 2020 | 08h30
Caro leitor,
Horas depois de o ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), ameaçar buscar debaixo de vara os ministros e generais Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional), Walter Braga Netto (Casa Civil) e Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo) uma tempestade desencadeou-se em grupos de WhatsApp e em conversas privadas de militares. Ela chegou aos ouvidos civis, na maioria das vezes, por meio de entrevistas ou pelo texto de repúdio do Clube Militar, a chamada Casa da República, no Rio.
Uns poucos escreveram sobre o episódio. O general Luiz Eduardo Rocha Paiva, que tem cargo de assessor no Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, distribuiu aos amigos um artigo. Após afirmar que a crise entre os Poderes ruma "em direção à ruptura" em meio a uma emergência sanitária, ele adverte: se tudo desaguar "em convulsão social e anomia", os militares vão intervir. "Essa indesejável presença irá acontecer para salvar o próprio Estado de Direito, a democracia e a paz interna."
Rocha Paiva continua. Enxerga excessos nas ações dos Supremo para conter os ímpetos de Jair Bolsonaro. "Quem tem certeza da própria autoridade moral não precisa decidir com ameaças provocativas e inúteis. Serenidade e bom senso é o que se espera das autoridades da República, ao invés de egolatria nociva e disruptiva em momento tão delicado." Ocorreu ao general lembrar a famosa indagação atribuída ao marechal Floriano Peixoto, quando este soube da hipótese de ministros do Supremo soltarem os envolvidos na Revolta da Armada. "Não sei amanhã quem lhes dará o habeas corpus de que, por sua vez, necessitarão."
A exemplo dos generais – como Ajax Pinheiro, hoje no STF – que enxergavam uma conspiração no Brasil para tornar o País em uma Venezuela – plano que o governo parece executar –, Rocha Paiva e seu texto foram vistos como uma ameaça. "Os generais precisam ler o Código de Processo Penal. Nele está o artigo 218, que autoriza, no caso de a testemunha deixar de comparecer sem motivo justificado, o juiz a requisitar que ela seja conduzida por oficial de Justiça, que poderá solicitar o auxílio da Força Pública", diz o procurador de Justiça João Benedito de Azevedo Marques. Ele prossegue: "Generais não são imperadores. São cidadãos e, como todos os demais, devem se submeter ao texto da lei."
É conhecido o fato de que a República nasceu sob o signo do soldado-cidadão. Era ele que reivindicava o direito de ser ouvido e respeitado no Império, bem como contribuir para a progresso da Nação. Se então se acumulavam os agravos aos homens das armas, também incomodava à mocidade militar o privilégio, em todas as suas relações com a sociedade, como se dizia à época. E entre os privilégios, o maior de todos eles: o monástico, que se afirmava inviolável e irresponsável. A defesa da honra militar era usada ainda pelos republicanos para galvanizar a guarnição do Rio.
Oliveiros Ferreira, em sua obra Elos Partido, aborda o tema que alguns pretendem pôr na mesa da atual crise: o papel da honra, em vez da legalidade, na vida militar. É ela que fez o general e deputado federal Roberto Peternelli (PSL-SP) considerar que o agravo de Celso de Mello aos três generais-ministros atingia a todos do estamento. Um colega seu, também general de divisão, afirmou que "cabe ao comandante do Exército, como chefe de fato e de direito de todos os militares da ativa e da reserva do Exército Brasileiro, exigir respeito, rejeitar os termos da convocação e, se assim for, fazê-la cumprir pelos meios julgados adequados".
A República, assim, parece se transformar em um grande Conselho de Justificação, o tribunal de honra cuja decisão final deve ser homologada pelo comandante da Força. E as questões do Direito – nas palavras de Azevedo Marques – seriam apenas um problema dos paisanos, dos civis, reduzidos à condição de cidadãos de segunda categoria, aos quais se obriga o cumprimento da lei. É verdade –e assim enxergam criminalistas ouvidos pela coluna – que a citação à condução debaixo de vara não era obrigatória. Chegou-se a um limite? Àquele pretendido por Bolsonaro para mostrar que a vara do Supremo é curta? "Onde o ministro quer chegar? Vai prender o Exército?" questionou Peternelli.
O que uns poucos militares – sob a condição de anonimato – se perguntam é por que os generais-ministros não pensaram, antes de aceitarem o convite para participar deste governo, que a vida pública reserva esse tipo de dissabor aos que nela se aventuram. Nada mais longínquo das situações resolvidas pela ordem, pela disciplina e hierarquia do que o ambiente dos embates parlamentares. Não calcularam os três que a relação com um presidente como Bolsonaro – com sua personalidade errática, impulsiva e indisciplinada –poderia lhes render intimações e o envolvimento em ações judiciais? Quem preza pela sua honra, deve zelar pela suas escolhas.
Atribuir ao Supremo e ao Congresso os dissabores proporcionados pelo descontrole de Bolsonaro em meio à pandemia e ao deboche presidencial diante de 11 mil mortes no País, é enxergar os problemas no telhado do vizinho de forma estranhamente nítida, sem perceber que a própria vidraça está quebrada. E quem jogou a pedra não tinha braço forte o suficiente para arremessá-la desde o outro lado da Praça dos Três Poderes. Foi a mão amiga do presidente que fez o estrago. "Como dizer que se defende a democracia e os poderes constituídos quando se comparece à manifestação pedindo um golpe?" pergunta-se o procurador Azevedo Marques.
Um dos generais que se revoltara com o despacho do Supremo, lamentou: "Uma pena que falte a Bolsonaro tato político, que ele não tem, e se comporta como um macaco na casa de louças". Sabem, portanto, os militares as fontes dessa crise. E é sob o signo dos princípios da República que os generais-ministros de Bolsonaro vão depor amanhã. Trata-se da igualdade perante à lei, aquela que inexistia no Império e, assim, vedava ao Judiciário alcançar a figura de dom Pedro II. É este o princípio que aqueles que buscaram no passado fugir do exame dos tribunais por meio de infindáveis recursos sempre quiseram driblar. E aqui, cada vez mais, o governo atual não só parece emular seus antecessores. Pior, segundo Sérgio Moro, ele os ultrapassa.
Peternelli diz que amanhã será um dia de escolhas difíceis para os generais em Brasília. Eles não têm nada contra a intimação – diz –, mas têm a honra a preservar. Há três semanas, foi a vez de Moro. Em 2002, fora a vez de Azevedo Marques, que se demitira da Secretaria Nacional de Justiça, porque o governo não quis intervir no Espírito Santo para combater o crime organizado. Cumprir a ordem do Supremo será mais um lance no xadrez dessa crise. E ele será dado por um governo que não conta mais com o consenso que manteve na caserna, desde seu primeiro dia. Os últimos acontecimentos, da queda de Moro à entrega de cargos e verbas ao Centrão, romperam sua imagem de moralidade aos olhos verde-oliva. Mas não só. As críticas se multiplicaram.
Uns se ofenderam com as insinuações golpistas do presidente. Duas dezenas de oficiais da ativa compartilharam em suas redes sociais a nota do Ministério da Defesa desmentindo que as Forças Armadas fossem um instrumento de governo. Um general mudou o nome de seu perfil e o protegeu antes de compartilhar crítica ao comportamento do presidente na pandemia. Outro oficial, um tenente-coronel de Cavalaria, escreveu ao lado da foto de Moro: "A minha melhor continência a esse Patriota!" E repetiu sua frase: "Faça a coisa certa, sempre". Um slogan que, em 2022, pode dizimar Bolsonaro e seu governo, cada vez mais entregue ao deboche de ministros, como o dançarino Weintraub. Os militares voltaram à política. E não parecem dispostos a deixá-la.
CGU analisa denúncias de desvios na pandemia
A Controladoria-Geral da União analisa 400 denúncias de supostos desvios de verba pública no combate ao coronavírus. Os casos foram apresentados por cidadãos a uma plataforma digital criada pela CGU específica para essas manifestações, a Fala.BR. Algumas denúncias já estão em fase de apuração, outras, em “coleta de materialidade”. Segundo o mais recente relatório, o órgão contabilizou um total de 3,7 mil comunicações de irregularidades e 855 denúncias, em um mês e meio de operação da plataforma. Todos os casos serão analisados.
Por todos… Segundo Gil Castello Branco, da ONG Contas Abertas, a maior preocupação é com a transparência nos gastos públicos, em especial, de municípios.
…os lados. Numa comparação com a Copa de 2014, a diferença hoje é que o volume de recursos é dez vezes maior e sua distribuição está mais pulverizada.
Olha aí. “Além disso, as facilidades para que os desvios ocorram são muito maiores porque os preços estão atípicos. Compras estão exigindo pagamento antecipado, os gastos são variados, houve dispensa de licitação e, principalmente, com enorme velocidade de gasto”, diz Castello Branco.
Help. Dos 36 tópicos de comentários possíveis na página da CGU sobre a covid-19, praticamente um terço das quase 13 mil manifestações é sobre pedidos e dúvidas a respeito do benefício de R$ 600 a informais.
Help 2. O documento relata que as linhas disponíveis para tirar dúvidas não funcionam e que há “grande quantidade de reclamações sobre demora no recebimento do benefício”.
SINAIS PARTICULARES
Nelson Teich, ministro da Saúde
Bola… Nelson Teich convidou e desconvidou Mauro Junqueira, secretário executivo do Conasems (Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde), para assumir uma das principais secretarias de seu ministério: a de Atenção Especializada à Saúde (SAES).
… fora. Junqueira chegou a avisar a alguns interlocutores que esperava só a nomeação para assumir. Não imaginava que o cargo estivesse na mira do Centrão. O Planalto, por isso, barrou. A triste notícia foi dada ao técnico pelo próprio Teich.