As horas que antecederam a decisão
O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), chegou ao trabalho pouco depois das 9h da quarta-feira 2. Como é possível perceber na foto acima, do lado de fora do gabinete do peemedebista, a movimentação àquela altura já era atípica. Naquele mesmo horário, do outro lado da Praça dos Três Poderes, um de seus principais aliados, o deputado André Moura (PSC-SE), iniciava no 4º andar do Palácio do Planalto mais uma conversa com o ministro da Casa Civil, Jaques Wagner. Nas últimas semanas, os dois se encontraram várias vezes. A versão oficial é a de que as reuniões foram pautadas para discutir detalhes de assuntos relativos ao ajuste fiscal. Na verdade, Moura e Wagner buscavam promover a salvação tanto de Cunha, como da presidente Dilma Rousseff.
Quarta -FEIRA 02 9H00 Na antesala do gabinete de Cunha a movimentação já estava acima do normal. O deputado aguardava a última conversa de um aliado com o ministro Jaques Wagner
O presidente da Câmara foi denunciado ao Conselho de Ética, acusado de mentir a seus pares sobre ter contas secretas na Suíça e, portanto, incorrer na quebra de decoro — um pecado capital na Casa. Na mesa do peemedebista repousava o pedido de impeachment contra Dilma por manobras ilegais no Orçamento de 2015. O que Wagner e Moura procuravam, na verdade, era um acerto que blindasse tanto Cunha como Dilma. Até a terça-feira 1 tudo indicava que a definição parecia ficar para 2016. O ambiente, no entanto, se deteriorou. Cunha manobrou explicitamente contra os trabalhos no Conselho de Ética. O PT, por sua vez, num movimento que ignorou o desejo de Dilma, liberou seus deputados para votar contra Cunha no Conselho de Ética. Por essa razão, a movimentação no corredor que leva ao QG de Cunha na Câmara era intensa na manhã da quarta-feira. De seu gabinete e antes mesmo de Moura encerrar a conversa com Wagner, o presidente da Câmara ligou para o também peemedebista e vice-presidente Michel Temer e afirmou que iria disparar sua maior munição: a abertura do procedimento de impeachment.
Depois de falar com Temer, Cunha ouviu os últimos informes de Moura e avisou a auxiliares que no final da tarde concederia entrevista coletiva no Salão Verde, a antessala do plenário. As negociações entre Moura e Wagner não avançaram. A bancada petista na Casa se reuniria na hora do almoço para confirmar posição contrária ao peemedebista no Conselho de Ética. Quando a informação de que haveria uma entrevista coletiva de Cunha passou a circular, líderes dos principais partidos de oposição fizeram uma romaria à Presidência da Câmara. Estiveram com Cunha e foram comunicados que haveria finalmente uma definição. Foi um frenético entra e sai de aliados. Estiveram com ele, entre outros, Rodrigo Maia (DEM-RJ) e Paulinho da Força (SD-SP). Alguns representantes dos partidos de oposição prometeram baixar o tom nas cobranças públicas por eventuais manobras que o presidente da Câmara lançaria mão para protelar seu processo. Cunha gostou do afago. Nem para almoçar ele saiu. Teve quentinha no gabinete. Políticos contrários ao pedido de impeachment também bateram à porta do presidente da Casa. O líder do PMDB na Casa, Leonardo Picciani (RJ), foi um deles. O petista José Mentor (SP) também o visitou. No início da tarde, no entanto, o impeachment já era assunto corrente no Salão Verde, no plenário e no cafezinho.
Quarta -FEIRA 02 18H30 Depois de receber telefonema de Cunha, o ministro Jaques Wagner deixa sua sala e vai para o gabinete da presidente Dilma para dar a notícia do impeachment
Como os votos do PT contra o peemedebista no Conselho de Ética só seriam consumados na próxima reunião do Conselho de Ética, prevista para a terça-feira 8, haveria ainda uma última rodada de negociações entre Cunha e o Palácio do Planalto. Por volta das 17h, André Moura atravessou a rua novamente e foi conversar mais uma vez com o ministro Jaques Wagner. Uma hora depois Moura estava no gabinete de Cunha com a notícia de que nada avançara.
O presidente da Câmara, então, começou a se preparar para fazer o anúncio mais importante da sua vida pública. Telefonou novamente para Temer, que àquela altura já mantivera conversas com diversos líderes da oposição e do próprio PMDB. Também para o ministro Jaques Wagner e comunicou que não esperaria mais uma semana. Ajeitou o nó da gravata, penteou os implantados fios prateados e se dirigiu ao Salão Verde. Anunciou o recebimento do pedido de impeachment assinado pelos juristas Hélio Bicudo, Miguel Reale Jr. e Janaína Paschoal. “Não tenho nenhuma felicidade de praticar esse ato”, disse. “(Minha) decisão é de muita reflexão e de muita dificuldade.” Às 18h30, enquanto Cunha se dirigia para o Salão Verde, Wagner caminhava para o Gabinete de Dilma. Bateu na porta, e comunicou à presidente que era oficial. Cunha havia acolhido o pedido de impeachment. ISTOÉ