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Pesquisa mostra que 87,5% das pessoas em área de litígio preferem continuar no CE

Por Gleydson Silva / ALECE

 

- Foto: José Leomar

 

A Assembleia Legislativa do Estado do Ceará (Alece), por meio do Comitê de Estudos de Limites e Divisas Territoriais do Ceará (Celditec), e o Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Estado (Ipece) apresentaram, na manhã desta terça-feira (20/02), no Museu da Arte e do Som Chico Albuquerque (MIS), a “Pesquisa socioeconômica na área de litígio entre o Ceará e o Piauí: avaliação de serviços públicos e percepção dos moradores quanto ao sentimento de pertencimento”.

A pesquisa do Celditec e do Ipece foi realizada seguindo um plano de amostra, em um quantitativo de 417 domicílios, em 136 localidades, dos 13 municípios que estão na área de litígio. Entre os questionamentos da pesquisa nas localidades que podem ser afetadas está a indagação: “Caso venha a ser necessário escolher, gostaria de pertencer a qual estado?”. O resultado foi que 87,5% dos moradores expressaram preferência por pertencer ao estado do Ceará, enquanto 12,5% manifestaram preferência pelo Piauí. 

O levantamento, que foi apresentado pelo pesquisador de políticas públicas Cleyber de Medeiros, do Ipece, integrante do grupo de trabalho (GT Litígio) criado pelo governador Elmano de Freitas em 2023, com coordenação da Procuradoria-Geral do Estado (PGE) e Celditec, traz ainda outras informações importantes que podem subsidiar a defesa do Ceará na Ação Cível Originária n.º 1831. Entre elas, a que mostra que 90% dos entrevistados afirmam que suas propriedades (residências/fazendas) localizam-se no Ceará, sendo que 97,2% possuem escritura ou documento que atribui jurisdição de suas propriedades ao Estado cearense. 

Um importante dado revelado pela pesquisa mostra que, nos domicílios entrevistados, há pelo menos um morador que estuda em escola pública. Desses, 92,7% estudam somente em escola administrada pelo Governo do Ceará, enquanto 3,5% em instituições administradas pelo Governo do Piauí. Outros 3,9% alegam estudar em escolas dos dois municípios. Das 747 escolas mapeadas nos 13 municípios da região, 48 instituições de ensino e anexos escolares estão na área de litígio. 

Quando há uma ocorrência criminal na localidade do domicílio, 96,9% dos entrevistados revelaram que buscam a polícia ou uma delegacia do Ceará, o que sugere uma forte identificação da população com a jurisdição administrativa do Ceará. A população dessa área conta ainda com 14 unidades de saúde da rede estadual ou de um dos municípios cearenses.

Na infraestrutura, o estudo aponta que 96,6% do abastecimento de água feito pela rede geral, cisterna ou carro-pipa é feito pelo estado do Ceará ou município cearense. A distribuição de energia, por sua vez, é feita pela Enel em 95,9% dos lares. A empresa possui ainda 6.443 unidades de postes de energia na área reivindicada pelo Piauí. 

Foram mapeados nessa área ainda, conforme dados de 2022, 15 locais de votação, 589,3 km de rodovias (61,6 km de federais, 60,7 km de estaduais e 467 km de rodovias não pavimentadas), 291 torres de energia eólica, 775 km de rede de energia elétrica, 174 poços ou chafarizes mantidos pelo Ceará, quatro terras indígenas, 18 sítios arqueológicos, entre outros equipamentos.

Cleyber de Medeiros observou que os dados reiteram o pertencimento da população com o Ceará, além de reforçarem o sentimento e reconhecimento dos moradores com os serviços públicos oferecidos pelo estado do Ceará. “Nós identificamos que a grande maioria da população é atendida pelo Ceará e seus municípios, inclusive no tocante a educação, saúde, segurança pública, infraestrutura hídrica, rodoviária e energética. A maioria da população opta por ser cearense e continuar no Ceará”, disse. 

Segundo Cleyber de Medeiros, com a atual malha de divisas que vem sendo praticada pelo IBGE nos seus censos demográficos, foi identificado que cerca de 24% da área reivindicada pelo Piauí já é administrada pelo próprio estado vizinho. O analista do Ipece destacou ainda que a pesquisa rebate as teses atribuídas ao Piauí de que “a área de litígio é abandonada e carente de serviços públicos”, afinal os dados mostram que os serviços públicos disponibilizados na área são majoritariamente ofertados pelo estado do Ceará.

De acordo com o coordenador do Celditec, Luís Carlos Mourão, a equipe de pesquisa passou 38 dias em campo para elaborar esses dados importantes, que devem subsidiar ainda mais a defesa do Ceará nessa ação. 

Para ele, é importante dar voz a essa população que pode ser impactada. “Nós vimos as pessoas, fomos nas comunidades, conversamos com elas. A gente criou um vínculo com o pessoal dessas áreas. Já sabíamos dessa questão do pertencimento, então fomos mais para trazer para a sociedade cearense, aos deputados, aos senadores, aos ministros, enfim, a todos que se habilitaram nesse processo e fazem parte dele, mostrar o que pensa a sociedade, o que pensa esse pessoal dessas áreas, porque eles, de certa forma, não estão sendo ouvidos”, pontuou Mourão.

PERTENCIMENTO

Para o procurador-geral do Ceará, Rafael Machado Moraes, além dos argumentos históricos, que são consistentes, há um argumento que é incontestável, que é o sentimento de pertencimento da população, e que precisa ser levado em consideração para a resolução desse processo. “Nós não podemos analisar o processo de forma justa, a fim de que se tenha uma decisão justa, sem levar em consideração não somente aspectos cartográficos, documentos históricos de mais de 100 anos, sem levar em consideração, agregado a esses fatores, a voz da população”, ressaltou.

A professora Eliane Tabajara, da escola indígena na Aldeia Cajueiro, fala do sentimento de pertencimento da comunidade ao território do Ceará - Foto: José Leomar

A professora Eliane Tabajara, da escola indígena na Aldeia Cajueiro, em Poranga, afirmou que a comunidade vê o litígio com sentimento de tristeza e apreensão. Ao longo dos anos e governos cearenses, mesmo com o litígio, essas comunidades nunca foram esquecidas. “A gente participou de políticas públicas vindo do estado do Ceará, então nós pertencemos ao estado do Ceará. E a gente sempre vai ficar na luta, porque são nossas memórias, nossa história, a nossa identidade, não só a nossa identidade étnica, mas a nossa identidade de pertencimento ao território da Aldeia Cajueiro, ao território de Poranga, ao território do estado do Ceará”, afirmou. 

Eliane Tabajara acrescentou que nunca seus antepassados mencionaram sobre o pertencimento ao estado vizinho. “A gente sempre recebeu as políticas públicas do Governo do Ceará. Então, em nenhum momento eu ouvi dos meus ancestrais, as pessoas mais velhas – algumas delas que já se foram –, dizendo que nós somos o Piauí. Esse amor ao estado do Ceará é porque realmente nós pertencemos ao estado do Ceará e nós iremos continuar firmes e fortes na luta, porque nós não nos vemos em outro estado a não ser no Ceará”, enfatizou a professora.

O LITÍGIO

O processo ajuizado pelo Piauí envolve áreas de 13 municípios cearenses (Carnaubal, Crateús, Croatá, Granja, Guaraciaba do Norte, Ibiapina, Ipaporanga, Ipueiras, Poranga, São Benedito, Tianguá, Ubajara e Viçosa do Ceará) e abrange três regiões de planejamento do Ceará: Litoral Norte (Granja), Sertão dos Crateús (Crateús, Poranga, Ipaporanga, Ipueiras) e Serra da Ibiapaba (Carnaubal, Croatá, Guaraciaba do Norte, Ibiapina, São Benedito, Tianguá, Ubajara e Viçosa do Ceará).

Em 2011, o Piauí iniciou uma Ação Cível Originária no Supremo Tribunal Federal (STF) pleiteando áreas dos municípios cearenses citados, dos quais oito estão na Serra da Ibiapaba. A área pleiteada totaliza quase três mil quilômetros quadrados (km²). O processo está sob a relatoria da ministra Cármen Lúcia.

A defesa do Ceará no processo da ACO n.º 1831 está baseada na análise técnica de documentos e mapas históricos que comprovam a posse do território ao Ceará e em outras variáveis que são relacionadas ao direito da população que habita os municípios cearenses envolvidos na disputa.

Entre os participantes do evento de apresentação da pesquisa realizada pelo Celditec e o Ipece estavam secretários de Estado, como Socorro França, da pasta de Direitos Humanos; a defensora-geral do Ceará, Sâmia Farias; o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil no Ceará (OAB/CE), Erinaldo Dantas; lideranças e moradores das regiões em litígio. 

Edição: Clara Guimarães

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