Em votação aberta, Senado decide manter prisão de Delcídio
BRASÍLIA - Em sessão histórica, o Senado decidiu, por 59 votos a 13, além de uma abstenção, manter a prisão do senador Delcídio Amaral (PT-MS), referendando a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF). O PMDB liberou a bancada; o PT votou contra a decisão do Supremo; o PDT liberou a bancada, e os partidos de oposição - PSDB, DEM, PSB e REDE -encaminharam pela pela prisão. O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), no entanto, não deixou de expressar sua contrariedade. Ele disse que se curvava à decisão pela votação aberta, mas avisou que seu papel é de defender as prerrogativas do Senado e que não considerava democrático um senador em pleno exercício do mandato ser preso. Renan estava visivelmente irritado com a decisão pela manutenção da prisão.
- Eu me curvo à decisão do Senado, mas, enquanto estiver aqui, vou defender as prerrogativas do Legislativo. Tenho que defender, é meu dever. A polícia vir aqui cumprir mandato é democrático. O que não é democrático é prender um congressista no exercício do mandato. Não posso concordar com isso. O equilíbrio dos Poderes não permite a invasão permanente (das prerrogativas), porque causará no futuro danos à democracia - disse Renan. Para Renan, o Senado, "em boa hora", decidiu pela votação aberta, já que o STF dera liminar neste sentido.
- Mas, com todo respeito, o Supremo não precisaria decidir isso. O Legislativo tem que ser Legislativo, quem quiser abrir mão das prerrogativas, que abra. Essa Praça aqui, essa Praça dos Três Poderes, não colocou nenhum Poder no meio. De cada lado fica um Poder. A ocupação deste espaço deve ser harmônica - disse Renan.
Os senadores, apesar de referendar a prisão do senador Delcídio Amaral (PT-MS), fizeram um desabafo sobre o constrangimento de estar votando contra um colega.
O presidente nacional do DEM, senador José Agripino (RN), disse que o momento é o de maior constrangimento de sua vida.
- Estou vivendo o maior constrangimento da minha vida parlamentar. De estar votando contra o coração, mas a favor da razão. Custei a acreditar: que o meu amigo Delcídio Amaral estava preso - disse Agripino.
O líder do PT no Senado, Humberto Costa (PE), defendeu a favor de Delcídio, para sua liberação.
- A posição da nossa bancada é de votar contra (a decisão do Supremo). O que está em discussão é se um Poder pode mandar prender um parlamentar no exercício do seu mandato. É isso que está em discussão. Posso até estar dando adeus à minha vida pública, espero que não. Mas jamais poderia dar adeus à democracia e à Constituição - disse Humberto Costa.
O senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP) expressou o sentimento dos senadores da oposição.
- É com profundo sofrimento que tenho que encaminhar essa questão. O Delcídio é uma pessoa valorosa. O PT, em sua nota, foi incapaz de reconhecer o seu valor. Não fosse sua atuação como líder do Governo, seguramente o governo teria sofrido muito mais derrotas aqui. Ele merece a consideração da nossa bancada pela função que cumpre e cumpriu aqui - lamentou Aloysio.
Renan Calheiros (PMDB-AL), chegou a decidir por votação secreta, mas resolveu colocar essa decisão em votação do Plenário, que encaminhou pelo voto aberto. O líder do PT no Senado, Humberto Costa (PE), foi a única liderença a defender o voto secreto.
Ao mesmo tempo em que o Senado decidiu pelo voto aberto, o ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou o voto aberto em resposta ao mandado de segurança impetrado pela oposição.
Delcídio foi preso na manhã desta quarta-feira acusado de conluio com o banqueiro André Esteves, do BTG Pactual, e o advogado Edson Ribeiro para que o ex-diretor internacional da Petrobras Nestor Cerveró não firmasse acordo de delação premiada na Lava-Jato.
RENAN CRITICOU NOTA DO PT
Renan Calheiros foi aplaudido ao criticar a nota do presidente nacional do PT, Rui Falcão, sobre a prisão do senador.
- A nota do PT, além de intepestiva, é uma nota oportunista e covarde.
Em seguida, o líder do PT no Senado, Humberto Costa (PE), disse que a nota não representava a posição da bancada do PT. E encaminhou a favor da decisão de Renan pela votação secreta.
- Essa nota (de Rui Falcão) não passou pelo PT, mas o presidente tem o dever de se posicionar. Mas não necessariamente reflete o posicionamento da nossa bancada. Temos absoluta convicção de que os fatos são gravíssimos. Mas encaminhamos em favor de sua decisão (de fazer votação secreta) - disse Humberto Costa.
O líder do PMDB, senador Eunício Olveira (CE), liberou a bancada do PMDB. Ou seja, nem o partido de Renan referendou a decisão do presidente da Casa.
Logo no início da sessão, os senadores Cássio Cunha Lima (líder do PSDB), Randolfe Rodrigues (líder da Rede) e o senador Reguffe (PDT-DF) apresentaram questão de ordem a Mesa presidida por Renan Calheiros (PMDB-AL) pedindo a aplicação do artigo 53 da Constituição, que foi alterado para derrubar o voto secreto. O argumento é o mesmo usado no mandado de segurança impetrado no STF pelos partidos de oposição para garantir o voto aberto.
O líder tucano argumentou que a intenção do legislador em 2001, ao derrubar a possibilidade de voto secreto para os casos de prisão de parlamentar, era instituir o voto aberto e excepcionalizar apenas para aprovação de autoridades. Na revisão constitucional de 2001, o legislador retirou o adjetivo “secreto” e, segundo Cunha Lima, a intenção era instituir o voto aberto.
- Caso a Mesa caminhe para a votação secreta, esses votos poderão ser revelados futuramente, o voto secreto pode ser aberto. A intenção do legislador foi nítida e transparente ao retirar o adjetivo secreto para permitir o voto aberto, o que passou a ser a regra. A melhor trilha é a da Constituição. Esse não é o momento de confrontar as instituições. Temos que agir com absoluta prudência e serenidade - discursou Cássio Cunha Lima ao defender sua questão de ordem.
O líder da Rede, Randolfe Rodrigues, que também assinou o mandado se segurança impetrado no Supremo, encaminhou a mesma questão de ordem no plenário.
- Vivemos um momento dramático no Congresso Nacional. Esse não é um momento de agradar os amigos do senador Delcídio, o momento é de separar as relações pessoais e o espírito de corpo para preservar as instituições e o estado de direito. Os ministros do Supremo decidiram a prisão em sessão aberta, pelo voto aberto. Não é prudente que nós, que viemos para cá pelo voto popular, decidamos essa questão pelo voto secreto - defendeu Randolfe Rodrigues.
O senador Reguffe apoiou as duas questões de ordem de Cássio e Randolfe, e apresentou uma terceira, pedindo que, em caso de a Mesa decidir pelo voto secreto, que o plenário delibere sobre essa decisão, e valeria a vontade da maioria, sobre o uso do voto aberto ou fechado.
- Se aparecer ali o voto secreto, o povo tem o direito de pensar que o meu voto sim, no fundo possa ser um voto não . Enfrentemos de peito aberto a Justiça dizendo que quer vê-lo solto. Ou enfrente de peito aberto o Delcídio ao dizer que quer que ele continue na prisão. Eu quero que meu eleitor saiba como eu votei. Quero ser fiscalizado e quero meu voto aberto -apelou o senador Cristovam Buarque (PDT-DF).
JADER E LÍDER DO GOVERNO DEFENDEM VOTO SECRETO
Preso em 2002 como ex-senador, Jader Barbalho (PMDB-PA) subiu a tribuna da Casa para defender abertamente a votação secreta. Como argumento, afirmou que hoje o Senado aprecia a questão da prisão de Delcídio, mas, depois, pode ter de se debruçar sobre casos de outros senadores. Além disso, declarou que não se deve dar atenção à opinião pública.
- O que está em jogo não é o drama que passa Delcídio Amaral, mas a vida do Senado - discursou.- Este é o episódio de hoje, mas Deus poupe o Senado de viver outros episódios. Deus queira que não tenhamos a dificuldade de examinar outros episódios.
Lembrando o caso da cassação do senador Demóstenes Torres (DEM-GO), a quem não citou nominalmente, mas qualificou como falso moralista, Jader disse ter ojeriza às palmatórias do mundo.
- Tenho ojeriza a palmatórias do mundo, particularmente os moralistas e falsos moralistas. O cemitério está cheio de insubstituíveis e vaidosos.
Jader disse que esperou que outro colega subisse a tribuna para defender o voto secreto, mas, como ninguém o fez, ele se animou. E afirmou que não teme a opinião pública.
- Não tenho dono na opinião pública. Não preciso ser fiscalizado, guiado, para dizer que represento o povo do meu estado e do meu país.
No início da sessão, o documento do Supremo Tribunal Federal (STF) foi lido pelo senador João Alberto, presidente do Conselho de Ética do Senado.
O líder do governo no Congresso, senador José Pimentel (PT-CE), também defendeu a votação secreta. Ele disse que o Regimento do Senado é claro ao prever votação secreta em casos de prisão por crime inafiançável.
- Não vale priorizar a vontade do legislador em detrimento do que a lei determina. O Regimento é claro. Devemos ficar com a legislação para dar segurança jurídica - disse Pimentel.
RENAN QUESTIONA PRISÃO EM FLAGRANTE
Renan Calheiros abriu a sessão afirmando que a decisão cabe ao Senado e apresentou argumentos contestando a avaliação de que se tratou de uma prisão e flagrante e que tenha sido crime inafiançável.
O presidente do Senado citou trechos de despacho do próprio procurador-geral da República, Rodrigo Janot, sobre a dificuldade de configurar a prisão de flagrante.
— Diz o artigo 53, da Constituição, que os membros do Congresso não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável. Cabe a este Plenário e não ao presidente do Senado, exclusivamente a esse Plenário, decidir, nos autos em questão, onde está e se está configurada a flagrância do ato. A decisão de Teori Zavascki não fala em prisão flagrante, mas apenas em prisão cautelar, que é provisória. Saliento, e isso é muito importante, que o Ministério Público que fosse determinada em prisão preventiva, que é cautelar. E, quanto ao caráter inafiançável do delito, não é inafiançável. No entanto, o Supremo lançou mão do artigo 324 para caracterizar o caráter inafiançável — disse Renan, acrescentando:
— No entanto, pelo ineditismo de um tal precedente, essa Casa deve decidir sobre a amplitude da Suprema Corte.
Em seguida, Renan diz que "o próprio Ministério Público reconhece a dificuldade de decretar a prisão em flagrante".
— O próprio procurador reconhece na sua petição a dificuldade inédita de fazer a prisão preventivamente de um congressista e requer outras medidas — disse Renan.4