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Senado deveria marcar sabatina de André Mendonça

O senador Davi Alcolumbre (DEM-AP), presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, marcou para terça-feira a sabatina do procurador-geral da República, Augusto Aras, indicado pelo presidente Jair Bolsonaro a mais um mandato de dois anos. Mas decidiu segurar a do ex-ministro da Justiça e ex-advogado-geral da União André Mendonça, indicado à vaga aberta no Supremo Tribunal Federal (STF) com a aposentadoria do ministro Marco Aurélio Mello. Depois que Bolsonaro enviou ontem ao Senado o pedido de impeachment do ministro Alexandre de Moraes, Alcolumbre afirmou a senadores que não pautará a sabatina de Mendonça se não houver distensão.

A decisão carece de sentido. Mendonça foi indicado ao Supremo em 12 de julho, nove dias antes de Aras. Se Alcolumbre considera que Aras deverá enfrentar menos resistência entre os senadores ou acha que precisa enviar um recado a Bolsonaro, isso não lhe dá o direito de postergar a sabatina de um e acelerar a do outro. Ele tem o dever institucional de marcar ambas, e os senadores têm a obrigação de examinar os candidatos com rigor para avaliar se estão à altura dos cargos.

A sabatina não deveria ser mera formalidade com aprovação automática, como tem sido (desde o governo de Floriano Peixoto, jamais o Senado vetou uma indicação presidencial ao Supremo). É uma oportunidade para os senadores, como representantes legítimos da população, avaliarem se o candidato tem — além de mais de 35 anos, reputação ilibada e notório saber jurídico, como exige a Constituição — o conhecimento, a experiência jurídica e o prestígio necessários ao cargo.

Bolsonaro tem o mandato para (e o dever de) indicar quem quiser ao Supremo. Nada mais natural que, dadas as suas inclinações, escolha um conservador religioso como Mendonça. Os senadores, em contrapartida, têm a obrigação de proceder à sabatina com seriedade, avaliando o candidato não pelas preferências políticas ou religiosas, mas sobretudo pela competência jurídica. Se fizerem isso com zelo, poderão chegar à conclusão de que Mendonça tem até mais razão para estar no STF do que Aras para comandar a PGR, transformada nos últimos dois anos em caixa de repique do bolsonarismo.

Se Bolsonaro está em pé de guerra com o Supremo a ponto de querer o impeachment de ministros que o incomodam, isso em nada tira a legitimidade da indicação de Mendonça. Ela é, ao contrário, o caminho institucional correto para a visão conservadora estar mais representada na Corte.

Alcolumbre repete o erro cometido nos Estados Unidos pelo republicano Mitch McConnell, que se recusou a marcar a sabatina de Merrick Garland, indicado por Barack Obama à Suprema Corte, mas se apressou em sabatinar Amy Coney Barrett, indicada por Donald Trump, para garantir uma longeva maioria conservadora no tribunal. O custo da manobra para a democracia americana foi enorme.

O exemplo americano mostra que Alcolumbre não deveria usar sua atribuição temporária no comando da CCJ para atingir objetivos políticos. Ao agir assim, viola não apenas seu dever, mas também a regra implícita da democracia que preconiza convívio harmônico entre os Poderes. Num momento em que Bolsonaro não cessa de fazer acenos golpistas, ele põe em risco a credibilidade do Senado e só contribui para agravar a tensão institucional. O GLOBO

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