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“A tese do golpe chega a ser ofensiva” - ISTOÉ

Aos 83 anos, o jurista Sydney Sanches acompanha o seu segundo processo de impeachment. Como presidente do Supremo Tribunal Federal, ele comandou o julgamento da cassação do ex-presidente Fernando Collor em 1992. Agora, avalia de uma posição privilegiada o julgamento de Dilma Rousseff.

 

Para ele, os argumentos de que há um golpe em andamento chegam a ser ofensivos ao Judiciário e ao Legislativo. “Não há qualquer aceleração do processo de cassação. O roteiro aprovado pelo Supremo Tribunal Federal, seguindo a Constituição Federal e a Lei do “Impeachment”, foi respeitado”, afirma. 

 

Há elementos que justifiquem o processo de impeachment da presidente afastada Dilma Rousseff?

O artigo 85 da Constituição Federal de 1988 considera crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentem contra a Constituição e, especialmente contra, dentre outras hipóteses, o cumprimento das leis e a probidade na administração pública. Os fatos apresentados contra a presidente, em tese, constituem crime de responsabilidade por atentarem contra a Constituição e pela falta de decoro no exercício do mandato, tudo conforme a Lei do Impeachment, artigo 9º, inciso 7. Agora, é o Senado Federal que deve examinar se tais fatos realmente ocorreram. Não o STF nem qualquer outro órgão do Judiciário.

Defensores da petista dizem que o impeachment é político. Por mais que o julgamento seja presidido pelo chefe do Judiciário não é natural que ele seja político, já que é votado e acolhido pelo Legislativo?

A denúncia é examinada por políticos, obviamente com seus critérios de interpretação política, não estritamente jurídica. Acho que, na denúncia, há imputação de fatos que caracterizam crime de responsabilidade. E só cabe ao Senado verificar se tais fatos ocorreram, ou não. Não cabe a qualquer Jurista ou Órgão Judicial. De qualquer maneira, posso opinar: se tais fatos ficaram provados nos autos, a condenação da presidente está justificada.

Como o senhor vê as acusações de aliados da presidente de que os trâmites do processo foram acelerados e não cumpriram os aspectos legais exigidos?

No caso Collor, dois meses na Câmara dos Deputados e mais dois meses no Senado foram suficientes. Neste, já se passou mais do que o dobro. Não há, portanto, qualquer aceleração. O roteiro aprovado pelo Supremo Tribunal Federal, seguindo a Constituição Federal e a Lei do Impeachment, foi firmemente respeitado até aqui.

Então, é errado o discurso de que há um golpe em curso.

Não há golpe de Estado. O que há é o cumprimento da Constituição Federal, e da Lei do “Impeachment”, com as instituições funcionando normalmente e com ampla defesa da denunciada. De certa forma, a tese do golpe chega a ser ofensiva aos poderes Legislativo e Judiciário.

A decisão dos aliados da presidente de recorrer à Organização dos Estados Americanos (OEA) foi uma afronta a estes Poderes?

Acho que há, sim, uma afronta ao Judiciário e ao Legislativo. De qualquer modo, a OEA não tem o poder de alterar uma decisão do Senado Federal. Cabe exclusivamente aos senadores a competência constitucional para fazer o julgamento do impeachment.

Quais as principais semelhanças entre o julgamento atual e aquele que o senhor presidiu?

No caso Collor, havia quase uma unanimidade, entre a opinião pública, a imprensa, os parlamentes da Câmara e do Senado no sentido do cabimento e procedência do pedido de impeachment. Collor, eleito por um partido pequeno, perdera apoio em ambas as casas. No caso Dilma, já houve e ainda está havendo enorme resistência de um partido grande e alguns aliados, além de algumas entidades sindicais e os chamados movimentos sociais. Isso explica a demora do presente processo.

Não é perigoso o País passar por dois processos de impeachment em duas décadas?

Os presidentes que sucederam Collor, Fernando Henrique Cardoso e Lula, sofreram pedidos de impeachment que não prosperaram. Não foram admitidos pela Câmara. E, antes mesmo de Collor, o mesmo ocorreu com José Sarney. Penso que os processos de “impeachment” só devem ser admitidos e julgados apenas quando estiverem presentes os pressupostos constitucionais. Não apenas por divergência entre partidos políticos. Nesse sentido, não devem ser vulgarizados.

Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil

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