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Decisão de Toffoli incentiva leniência com corrupção

Por Editorial / O GLOBO

 

Faz um ano que o ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), vem anulando decisões da Operação Lava-Jato e de outras operações de vulto contra a corrupção em decisões individuais, com a anuência da maioria da Segunda Turma da Corte. A última, anunciada na semana passada, beneficiou Leo Pinheiro, ex-presidente da construtora OAS. Réu confesso, Pinheiro relatou propinas na Petrobras e as reformas no apartamento do Guarujá e no sítio de Atibaia que levaram aos processos, depois anulados, contra o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

 

Toffoli acatou a versão da defesa, segundo a qual Pinheiro, condenado a mais de 30 anos de prisão, foi vítima de “ilegalidades processuais”. Sozinho, cancelou todas as ações contra ele. Tem sido esse o procedimento-padrão no desmonte da maior operação contra corrupção da História do Brasil. Nada de debate no plenário, nenhuma possibilidade de a população ouvir opiniões divergentes. É difícil pensar que isso contribua de algum modo para a confiança dos brasileiros no Judiciário.

 

Em setembro do ano passado, Toffoli invalidou as provas do acordo de leniência firmado pela Odebrecht (hoje Novonor). Tornou nulos todos os dados obtidos pelos sistemas de informação do “departamento de propinas” da empreiteira. Cinco meses depois, suspendeu o pagamento das multas. Em maio, anulou as decisões da Lava-Jato contra o também réu confesso Marcelo Odebrecht, ex-presidente da empreiteira. Ele baseou seu despacho nas mensagens trocadas pelo então juiz Sergio Moro e integrantes do Ministério Público. Obtidas de forma ilegal, elas mostraram cooperação entre os responsáveis pela acusação e o juiz. A partir da decisão que beneficiou a Odebrecht, sabia-se que haveria uma avalanche de pedidos de condenados.

 

De acordo com a advogada de defesa de Pinheiro, Maria Francisca dos Santos Accioly, “todas as barbáries e ilegalidades processuais sofridas por Marcelo Odebrecht vitimizaram igualmente Leo Pinheiro”. Ao concordar com essa tese, Toffoli voltou a mencionar as conversas obtidas ilegalmente. “Diante do conteúdo dos frequentes diálogos entre magistrado e procurador especificamente sobre o requerente, fica clara a mistura da função de acusação com a de julgar, corroendo-se as bases do processo penal democrático”, disse o ministro. Na semana passada, a defesa do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró protocolou pedido a Toffoli para também ser beneficiado. A lista é grande.

 

Como era de esperar, as decisões tomadas no STF têm repercutido nas instâncias inferiores. Em agosto, o juiz Guilherme Roman Borges, da 13ª Vara Federal Criminal de Curitiba, arquivou uma ação penal por organização criminosa, lavagem de dinheiro e evasão de divisas envolvendo executivos da Braskem. No início de setembro, mandou a União devolver R$ 25 milhões pagos em multa por Jorge Luiz Brusa, que fechara acordo com o Ministério Público. A lista de recuos da Justiça também é grande — e só faz crescer.

 

Não resta dúvida de que a Lava-Jato cometeu excessos. Mas as decisões de Toffoli livrando de punição réus confessos transmite a mensagem contrária à necessária num país com o histórico de impunidade do Brasil. Pela importância, elas mereceriam um debate mais aprofundado no plenário da Corte, capaz de avaliar se, por mais que haja justificativas processuais, a anulação de todos os casos e provas é a melhor forma de combater a corrupção.

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