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A visão, muito particular, do Supremo sobre o que é um conflito de interesses

Por Carlos Andreazza / O ESTADÃO DE SP

 

Reportagem de Weslley Galzo informa que “ministros do STF participaram de quase dois eventos internacionais por mês no último ano”, alguns dos quais custeados por grupos com interesses em ações julgadas na Corte.

 

O tribunal respondeu. A nota – desaforada e mal escrita, também modalidade de desaforo – exige análise do discurso.

“Ministros do Supremo conversam com advogados, com indígenas, com empresários rurais, com estudantes, com sindicatos, com confederações patronais, entre muitos outros segmentos da sociedade.”

 

Conversam demais. Circulam demais. Saudoso o tempo em que o “segmento” da impessoalidade conhecido por comedimento tinha alguma vez. Sendo certo que o local onde se conversa agrava o vício. Não conversarão com indígenas em visitas às tribos. Maior a chance de que se encontrem na Europa. Nada contra o Velho Continente. Foi no Brasil que Barroso, em ato da UNE, festejou o “nós derrotamos o bolsonarismo”.

 

“E muitos participam de eventos organizados por entidades representativas desses setores, inclusive por órgãos de imprensa.”

 

Se houvesse alguma dúvida sobre o equívoco-armadilha em que consiste convidar ministros do STF a tomar lugar em debates promovidos pela imprensa, nesta zoada estaria mais uma evidência. O jornalismo sem autoridade para criticar – lê-se.

 

“Naturalmente, os organizadores dos eventos pagam as despesas.”

 

Construção-esculacho própria a uma ilha da fantasia, lá onde será natural que empresa com pleito no Supremo patrocine viagens e hospedagens de ministros do Supremo. Naturalmente, na ilha da fantasia não há povo nem república. Só organizadores. (E hotéis e restaurantes estrelados.)

 

“Quando um ministro aceita o convite para falar em um evento – e a maioria dos ministros também tem uma intensa atividade acadêmica –, ele compartilha conhecimento com o público do evento.”

Quando aceita convite para falar num evento privado em cujo pacote vai espécie de imersão, com charutadas restritas, o ministro compartilha acesso. A chance de ser acessado. Outro tipo de conhecimento. Com tantos compromissos, é impossível que sobre intensidade para a academia.

 

“Por isso, a questão não está posta da maneira correta, não se pode considerar a participação do ministro no evento como um favor feito a ele pelo organizador”.

 

Pode-se considerar qualquer coisa, inclusive a hipótese de troca de favores. Posta de maneira corretíssima – o que importa a esta análise – a desconfiança que tais jornadas aprofundam na sociedade.

 

“Por essa razão, não há conflito de interesses.”

Por essas razões, difícil será encontrar definição prática mais precisa para conflito de interesses.

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Opinião por Carlos Andreazza

Andreazza foi colunista do jornal O Globo e âncora da Rádio CBN Rio, além de ter colaborado com a Rádio BandNews e com o Grupo Jovem Pan. Formado em jornalismo pela PUC-Rio, escreve às segundas e sextas.

 

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