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Afinal, o que é a PEC 241, que limita os gastos públicos?

Dyelle Menezes

camara

A Câmara dos Deputados concluiu na madrugada de hoje (11) a votação, em primeiro turno, da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que estabelece um teto para o aumento dos gastos públicos pelas próximas duas décadas. O texto é polêmico e gerou discussões até mesmo na base aliada do governo. Dessa forma, o Contas Abertas explica o que exatamente foi aprovado no começo do dia.

Denominada “Novo Regime Fiscal”, a proposta somente é válida para União e órgãos federais com autonomia orçamentária e financeira, e vigorará a partir de 2017 até o exercício de 2036, com duração de vinte anos, com possibilidade de revisão a partir do décimo ano de vigência.

O regime alcança apenas as despesas primárias (não financeiras) no âmbito do orçamento fiscal e da seguridade social. O governo adota, como estratégia central para conter o déficit e a dívida, o controle duradouro da despesa pública, na medida em que considera que a carga tributária já se encontra bastante elevada, e que o controle de despesa melhora a qualidade do gasto.

Em relação à vigência, o governo alega que o prazo de 20 anos é suficientemente longo para garantir o bom funcionamento do regime, sendo que trabalha com a hipótese de estabilizar os gastos, para depois reduzi-los, assinalando que a despesa pública no Brasil cresceu quase 6% acima da inflação, em termos médios, no período de 1997 a 2015. Ademais, argumenta que a medida possibilita menores taxas de juros na negociação dos títulos públicos, o que permitirá a redução das despesas financeiras, fundamental para a recuperação da confiança do investidor e do consumidor.

Nota técnica da consultoria de orçamento da Câmara aponta que, a despeito desse propósito, o termo final fixado para o Novo Regime Fiscal (20 anos) parece excessivo, diante da realidade econômica e social, considerando-se que o ajuste toma como base a despesa pública em um exercício – 2016 – relativamente atípico no ciclo de crescimento do Brasil, com grande queda do PIB e da arrecadação, fato que aumenta o grau de incerteza. “De outra parte, é verdade que a tendência atual de elevação da despesa combinada com a grande queda do PIB e os déficits primários exigem alterações que requerem tempo razoável para produzir efeitos”, aponta.

O governo espera, com a PEC, queda gradual e persistente da despesa primária/PIB. Um primeiro ensaio simplificado e atemporal, indica que, para diferentes hipóteses de crescimento médio do PIB (0 %, 1 %, 2 %, 2,5% e 3 %), a tendência de redução da participação da despesa primária, em % do PIB, tomando-se como premissa, no exercício de referência (ano 1), uma despesa primária equivalente a 19 % do PIB.

O ensaio reforça o que o governo espera, ou seja, uma trajetória decrescente da despesa primária em percentual do PIB. Por outro lado, a persistência do cenário de baixo crescimento econômico faz com que a participação da despesa em relação ao PIB continue crescendo (como ilustrado na hipótese de crescimento de menos 1 %).

“Assim, o modelo apresentado, ainda que preserve a correção pela inflação, não permite ampliação real da despesa, independentemente do crescimento da economia e da melhoria das contas públicas. O congelamento da despesa em termos reais faz com que a mesma ocupe fatias decrescentes do PIB. De outro lado, autoridades do governo esperam que o esforço fiscal do setor público, diante da atual recessão, será mais do que recompensado porque criará condições para a retomada do investimento e do crescimento econômico do País”, explica o estudo da Câmara.

Deve-se salientar que a PEC prevê a possibilidade de alteração a partir do décimo exercício de vigência da Emenda Constitucional. Ressalte-se, no entanto, que a mudança restringe-se ao “método de correção”, e não ao regime em si. Ademais, a revisão não é obrigatória, sendo de iniciativa exclusiva do Executivo.

Ao se prever alteração do texto constitucional por meio de lei ordinária, depois de 10 anos de vigência da PEC, a matéria (método de correção) pode deixar de ter estatura constitucional, caso aprovado o projeto.

A nota técnica destaca que a definição trazida no texto da PEC que institui um “novo” regime fiscal pode gerar dúvidas em relação à validade das disposições do atual regime. A legislação vigente, com destaque para a Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF, estabelece várias medidas voltadas à disciplina fiscal, a exemplo: da fixação de metas de resultado fiscal na LDO, da elaboração e execução do orçamento de forma compatível com as metas fiscais; da obrigatoriedade da avaliação de receitas e despesas durante a execução, com a fixação de cronograma e de limites de empenho e pagamento compatíveis com a obtenção da meta.

“Assim, é preciso esclarecer que a PEC não afasta a necessidade de observância dos limites e das regras fiscais previstas na legislação existente. Registre-se ainda que foi noticiado que os Estados e o Distrito Federal, que vêm se deparando com crise fiscal similar, também poderiam vir a ser incluídos na referida PEC, no bojo da renegociação da dívida com a União”, aponta a nota técnica da Câmara.

Cabe ressaltar que foi fixado o ano de 2017 como referência para os gastos em educação e saúde. A mudança na base das despesas com as duas áreas era uma demanda de diversas bancadas, já que o ano de 2016 é considerado ruim. Hoje, os gastos nessas áreas são vinculados à receita, que está em queda.

Despesas excluídas dos limites

De acordo com o art. 102. § 6º, do ADCT, com redação dada pela PEC, no cálculo do limite, são excluídas as seguintes despesas primárias:

a) transferências constitucionais;
b) outras transferências obrigatórias derivadas de lei que sejam apuradas em função de receita vinculada;
c) créditos extraordinários;
d) despesas com realização de eleições pela justiça eleitoral;
e) despesas com aumento de capital de empresas estatais não dependentes.

As transferências constitucionais abrangem aquelas determinadas por comandos da Carta Magna, que podem estar condicionadas ou não à edição de lei. São elas:
a repartição de receitas tributárias, nos termos dos arts. 157 a 159 da Lei Fundamental;

b) a compensação financeira para os estados, municípios, Distrito Federal e órgãos da administração direta da União pelo resultado da exploração de petróleo ou gás natural, de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica e de outros recursos minerais no respectivo território, plataforma continental, mar territorial ou zona econômica exclusiva, ou compensação financeira dessa exploração, instituída pela Lei nº 7.990, de 28 de dezembro de 1989;

c) o Fundo Constitucional do Distrito Federal (FCDF), instituído pela Lei nº 10.633, de 27 de dezembro de 2002;

d) as cotas estaduais e municipais da arrecadação da contribuição social do salárioeducação (Lei nº 9.424, de 24 de dezembro de 1996);

e) a complementação da União ao FUNDEB.

A maior parte dos recursos envolvidos no financiamento dessas despesas apenas transita pelo orçamento da União, na medida em que pertencem a outros entes da Federação, como consta da Constituição. Tanto que esses valores, nos demonstrativos de apuração do resultado primário, são deduzidos na apuração da receita primária da União.

Justifica-se, também, a exclusão de despesas derivadas de créditos extraordinários, aquelas com realização de eleições pela justiça eleitoral e as despesas com aumento de capital de empresas estatais não dependentes em razão da eventualidade e sazonalidade. Destaca-se que, no caso dos créditos extraordinários, pode-se atribuir o atributo da excepcionalidade, uma vez que sua edição depende de situações fáticas imprevisíveis e de extrema gravidade, como guerra, comoção interna ou calamidade pública, que demandem a ação imediata do Estado a fim de minimizar as consequências.

Observe-se que o atendimento dos requisitos constitucionais para abertura de créditos extraordinários tem sido interpretado de forma estrita no âmbito do STF. Quanto às “outras transferências obrigatórias derivadas de lei que sejam apuradas em função de receita vinculada”, a redação não é precisa quanto ao seu alcance, devendo ser aperfeiçoada. De acordo com o Executivo, trata-se de despesas que apenas transitam pelo orçamento da União, como é o caso da multa de 10% sobre demissões sem justa causa, arrecadada pela União e repassada ao FGTS, ou a compensação paga à previdência social por desoneração da contribuição previdenciária.

A abrangência das expressões “transferências obrigatórias” e “receitas vinculadas” pode levar a que a norma seja interpretada de forma ampliativa, ainda que a intenção tenha sido a de excluir apenas categorias específicas. . Deve-se ainda esclarecer se a exceção se limita ou não às transferências vigentes na data de promulgação da PEC, para que a hipótese não venha a se transformar em válvula de escape ao Novo Regime Fiscal.

Obstrução

A oposição tentou obstruir os trabalhos desde as primeiras votações, no início da tarde desta segunda-feira (10), apresentando vários requerimentos protelatórios. Entretanto, os trabalhos prosseguiram com sessões sucessivas até a conclusão da análise dos destaques na madrugada desta terça.

O principal destaque apresentado, do PT, pretendia retirar do texto todo o artigo sobre o novo regime fiscal, mas 357 deputados votaram por manter o trecho contra o voto de 98 que queriam retirá-lo.

Também foi rejeitada, por 327 votos a 90, emenda da deputada Erika Kokay (PT-DF) que pretendia limitar o pagamento de juros da dívida pública e retirar do teto despesas com saúde, educação e assistência social. “Os cinco maiores bancos do País tiveram um lucro líquido de R$ 29 bilhões no ano passado. Impostos para os ricos o País não tem, mas tem imposto para o pobre”, afirmou.

Para o relator da matéria, deputado Darcísio Perondi, a redução das despesas primárias não significa que haverá cortes. “O limite individualizado vai ser corrigido pela inflação. Os dissídios coletivos que, neste ano, foram corrigidos abaixo da inflação, serão corrigidos pela inflação no ano que vem”, argumentou Perondi, rebatendo as críticas de que a PEC representa cortes para servidores públicos.

Já a líder da Minoria, deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), disse que esse é o segundo momento mais grave da democracia brasileira, depois do impeachment. “É o desmonte do Estado e do sistema de proteção social do brasileiro. Teremos mais contração, mais recessão e mais desemprego”, sustentou.

O líder do PMDB, deputado Baleia Rossi (SP), argumentou que a aprovação da PEC é necessária para a reação da economia. “Esse novo regime fiscal vai devolver credibilidade ao País, o que será muito importante para os próximos desafios, para a geração de novos empregos, para garantir trabalho e renda para a população”, disse. CONTAS ABERTAS

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