Sem metas de emissões, COP30 será frustrante
Por Editorial / O GLOBO
Acabou na semana passada o prazo oficial para entrega das novas metas de emissões voluntárias de gases de efeito estufa estipuladas pelo Acordo de Paris, conhecidas pela sigla NDC (National Determined Contribution). Dos 195 signatários, apenas 56 cumpriram o prazo, necessário para a apresentação do relatório-síntese da COP30, a conferência do Clima da ONU em Belém daqui a cerca de um mês. É esse relatório que dirá quão distante está o planeta de atingir o objetivo de manter o aquecimento global até o fim deste século a apenas 2oC, ou desejavelmente 1,5oC, acima do nível pré-industrial. Sem as metas, os cenários traçados ficarão imprecisos.
Embora o total de países que prometeram entregar suas NDCs até a COP30 seja estimado em uma centena, oficialmente o relatório deverá ser elaborado com aqueles que cumpriram o prazo. Há quatro anos, quando foi elaborado o último relatório-síntese, foram apresentadas 113 NDCs, permitindo uma visão mais fidedigna da evolução do combate ao aquecimento global. Um relatório-síntese deficiente embaralha os sinais econômicos emitidos a setores que dependem de previsibilidade para investir na descarbonização da economia. Investidores e reguladores olham para as NDCs como indicadores de risco: onde há meta clara, há preço de carbono, infraestrutura e inovação; onde há silêncio, há incerteza e capital em fuga.
As ausências não são periféricas. Entre as mais marcantes não estão apenas os Estados Unidos, que anunciaram novamente sua saída do Acordo de Paris depois da posse de Donald Trump, mas também Índia e União Europeia, dois dos maiores emissores globais (ambos prometeram enviar NDCs até a conferência). A China, a maior de todos os emissores, apenas ventilou suas metas, mas ainda não entregou oficialmente sua NDC. Xi Jinping anunciou que o país reduzirá até 2035 entre 7% e 10% das emissões em relação ao pico histórico. Apesar do inegável engajamento chinês na transição energética, o número decepcionou. De acordo com as avaliações mais recentes, o mundo está muito distante da meta traçada em Paris, provavelmente já apontando aquecimento ao redor de 3oC. Sem compromissos precisos, fica difícil até avaliar o que é viável.
A recalcitrância dos países omissos pode ser explicada pela crise enfrentada pelo multilateralismo na geopolítica global. Mas há também fatos novos. Em parecer consultivo recente, a Corte Internacional de Justiça afirmou que os Estados têm obrigações jurídicas relativas às metas com que se comprometem, ainda que anunciadas voluntariamente. Quem adia a entrega pode se proteger de sanções futuras, mas acaba por esvaziar o relatório-síntese.
O clima não espera. Belém precisa transmitir uma mensagem inequívoca, com metas na mesa e execução mensurável. Cabe ao Brasil, como anfitrião, lançar mão da diplomacia para obter o compromisso dos países em dívida. Ainda dá tempo de evitar a frustração. Para isso, as prioridades devem ser: fortalecer o multilateralismo; tentar usar em benefício do clima o arcabouço internacional já existente — como Banco Mundial, organizações privadas etc. —; e, por fim, traduzir ao público a importância prática das COPs no desenvolvimento de tecnologias e instrumentos de combate ao aquecimento global. Todos devem entender que, sem ação conjunta e determinada, o planeta corre risco seriíssimo.