Exigir qualidade nos cursos de medicina
Não é de hoje que meios acadêmicos e órgãos de classe discutem estabelecer parâmetros ante a propagação indiscriminada de faculdades de medicina pelo país, sob o risco de formação inadequada desses novos profissionais. É alvissareiro, portanto, o anúncio do Ministério da Educação de que irá suspender o vestibular e vetar a ampliação de cursos mal avaliados.
Por meio do Exame Nacional de Avaliação da Formação Médica (Enamed), que será aplicado no dia 19 de outubro aos estudantes do último ano, as universidades que registrarem conceito 1 ou 2 na prova, em uma escala até 5, passarão por uma "supervisão estratégica" em 2026, relatou o ministro Camilo Santana.
Ainda segundo o MEC, cursos com conceito 2 terão redução de vagas para o ingresso; já a instituição com nota 1 não poderá receber novos alunos. Estão previstas, ainda, suspensão de contratos de financiamento estudantil, como o Fies, e participação no Prouni, que concede bolsas integrais e parciais na graduação.
Caso mantenha nota baixa em testes posteriores, o curso poderá até mesmo ser extinto. O plano do ministério inclui visitas técnicas para vistoriar as faculdades —que poderão apresentar defesa, mas sem prazo determinado para afastar as punições.
A multiplicação vertiginosa foi aferida pelo Censo da Educação Superior. Dados relativos a 2023 apontam que havia 46.152 vagas de medicina em cursos privados, além de 14.403 em escolas públicas. Já em 2012, eram somente 10.217 disponíveis no primeiro modelo e 7.424 no segundo.
À primeira vista, pode ser questionável criar mecanismos para conter a formação de profissionais num país que tem grave déficit de acesso à assistência médica, sobretudo em áreas remotas.
Ocorre que essa leva de novos médicos tem se mostrado ineficaz para equilibrar a distribuição regional. O Brasil tem 2,6 profissionais por mil habitantes, índice semelhante ao dos EUA, mas a cobertura no Distrito Federal, por exemplo, é cinco vezes a do Pará.
Ou seja: o país ampliou a formação de médicos, mas boa parte tem se estabelecido em serviços privados em capitais e grandes centros, com nível de proficiência no mínimo questionável.
Muitas dessas instituições mais recentes não dispõem de professores qualificados e enfrentam limitação de ambulatórios e hospitais para treinamento —e não cabe ao SUS exercer esse papel.
A batalha pela universalização da saúde é contínua, mas a medicina, diante da missão de zelar pela vida, não é atividade para ser regulada apenas pelo mercado.