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Liberação de gasto expõe incúria fiscal do governo

Por  Editorial / O GLOBO

 

A decisão do governo de liberar o gasto de R$ 20,7 bilhões que estavam congelados é uma chance perdida — mais uma — de buscar o equilíbrio das contas públicas. Com a medida, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva comprova não dar a devida atenção à gravidade da situação fiscal.

De normal, o endividamento brasileiro nada tem. Mantido o rumo atual, a dívida bruta deverá crescer 10 pontos percentuais no atual mandato e chegar, pelos cálculos oficiais, a 82% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2026, bem acima da média dos países emergentes (65%). Preocupado em se reeleger, o presidente prioriza o curto prazo, com mais dinheiro sendo usado para manter a economia aquecida. Mas não é tão difícil entender por que tal situação é insustentável e desastrosa. Uma hora a conta do endividamento descontrolado chega, com investimentos inibidos e queda na criação de postos de trabalho de qualidade.

 

A ilusão de que tudo está no seu lugar se manifesta na insistência de fechar ano após ano no vermelho. Pelas regras do arcabouço fiscal concebidas pela equipe econômica, a meta pode ser considerada cumprida se ficar dentro de uma faixa equivalente a 0,25 ponto percentual do PIB, tanto para cima como para baixo. Na teoria, a banda serviria para acomodar choques inesperados. Na prática, o governo tem sempre mirado o piso.

Em 2024, o centro da meta era o equilíbrio entre receitas e despesas, mas o ano fechou com déficit. Em 2025, o objetivo continua o mesmo, e, após a liberação de gasto anunciada nesta semana, o consenso é que o governo repetirá o erro, deixando que a trajetória da dívida pública siga em alta.

 

Um agravante é o roteiro trágico das decisões. Entre as justificativas para o descongelamento, uma não é recorrente (a injeção de receita de leilão do pré-sal previsto para novembro), e a outra é prejudicial para o ambiente de negócios (o aumento de arrecadação causado em parte pela alta da tributação).

 

Nada de avanço em reformas estruturais capazes de gerar dinâmicas positivas e duradouras. Nenhum sinal do debate sobre a necessidade de desvincular o mecanismo de reajuste do salário mínimo dos benefícios previdenciários, situação que eleva os gastos do INSS e implode as despesas obrigatórias.

 

A inação é catastrófica, mas o governo consegue ir além. A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 66/2023 é um pacotão de leniência fiscal. Aprovada na Câmara na semana passada, voltou ao Senado, onde deveria ser esquecida. O texto impõe limite anual ao pagamento de dívidas de estados e municípios reconhecidas pela Justiça sem possibilidade de recurso — os precatórios. A lógica do “devo, não nego, um dia eu pago” é um incentivo à irresponsabilidade fiscal.

 

Para o governo federal, a PEC permite o envio ao BNDES de recursos presos em fundos públicos. Como ressalta o economista Marcos Mendes, em vez de reduzir o endividamento, esse dinheiro será emprestado de forma subsidiada pelo Tesouro. Tem mais. A PEC abre espaço no teto fiscal para gastos extras de R$ 12 bilhões. É evidente a falta de compromisso do Executivo e do Congresso na busca por soluções de um problema que só aumenta.

 

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