Governo deve fazer mais pela segurança dos povos indígenas
Por Editorial / O GLOBO
O ataque a tiros contra dez guaranis-caiouás na Terra Indígena Panambi-Lagoa Rica, em Douradina (MS), no último sábado, chamou a atenção do país mais uma vez para as ameaças à segurança dos povos indígenas. Ao menos três baleados estão internados. Segundo o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), a violência teve início após a saída de agentes da Força Nacional do local.
As agressões acontecem apesar das promessas do governo. Depois de relegados a segundo plano na gestão passada, os indígenas ganharam visibilidade. Até foi criado um ministério dedicado a eles. Mas só criar ministérios não basta. Em 2023, segundo dados do Cimi, os assassinatos de indígenas cresceram 15,5%, de 180 para 208.
As mortes se distribuíram principalmente pelos estados de Roraima, Mato Grosso do Sul, Amazonas, Maranhão e Rio Grande do Sul. O relatório do Cimi também registra que, apesar do crescimento nos assassinatos, as agressões contra indígenas recuaram levemente. O dado considera, além dos homicídios, casos de abuso de poder, ameaças, lesões corporais, racismo, tentativa de assassinato e violência sexual. De 2022 para 2023, as ocorrências caíram de 416 para 404. Em contraste, na comparação com o ano anterior, os suicídios de indígenas aumentaram em 2023, mesmo entre os jovens de até 19 anos.
O estopim da violência contra indígenas costuma ser o avanço sobre seus territórios por desmatadores em busca de madeira, expansão de pastagens, extração de areia ou outros recursos minerais. A mais ativa fronteira de avanço sobre terras indígenas é o garimpo ilegal. É o que acontece no território ianomâmi, em Roraima e no Amazonas.
Logo após a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, houve intensa mobilização para afastar os garimpeiros da região. Passados alguns meses, eles voltaram. O garimpo ilegal, em aliança com o crime organizado, também contamina rios e peixes com mercúrio.
A reação do governo foi apenas citar ações que executa. A Força Nacional, segundo o Ministério da Justiça, atua em terras indígenas para “manter a ordem pública e garantir a segurança e integridade das pessoas e do patrimônio”. Nas operações realizadas em 21 territórios indígenas, diz ter apreendido quase 6 toneladas de metais preciosos, 300 animais, 4,3 mil litros de combustível e R$ 1,1 milhão de origem ilícita. Garante estar hoje em operação nos territórios ianomâmi, caripuna, arariboia, caiapó, mundurucu, Trincheira- Bacajá e Uru-Eu-Wau-Wau.
Ainda assim, o Estado brasileiro continua em dívida com os povos indígenas. É preciso fazer mais e melhor. A violência parece ter se tornado corriqueira em diversas regiões do país. Já era tempo de o poder público ter desenvolvido políticas para combatê-la. Na mediação de conflitos de terra, como acontece em Mato Grosso do Sul, é preciso garantir direitos aos indígenas e aos produtores rurais.
Para além dos discursos, o governo precisa reagir com medidas concretas e eficazes. O relatório do Cimi não pode ficar esquecido nas prateleiras e gavetas da burocracia em Brasília.