Governo não pode ser hospital de empresas
Está aberta a temporada de pedidos de socorro ao governo federal por parte de setores empresariais diversos. Os demandantes se queixam de dificuldades causadas por fatores em tese externos a sua atividade, de oscilações de custos e receitas ou, em escala menor, de problemas regulatórios.
A agropecuária reclama de perdas de safras devido a eventos climáticos, da baixa do preço de grãos, do custo de produção e, pois, da dificuldade de honrar o pagamento de dívidas, com os bancos estatais em especial.
Reivindica-se a renegociação desses compromissos e instrumentos de garantia de preços mínimos e compra de estoques pelo governo federal, além de mais subsídio para seguros. O Ministério da Agricultura afirma que, até março, haverá um pacote para o setor, que dispõe de uma bancada poderosa instalada no Congresso.
Também na fila, as companhias aéreas apontam custos altos, em particular dos combustíveis, crédito caro e até excesso de judicialização devido a demandas de passageiros —que, no entanto, pesam apenas 1% em suas despesas.
O pedido de recuperação judicial da Gol nos Estados Unidos impulsionou o pleito pela baixa do preço do querosene —até com questionamento de um monopólio da Petrobras— e por financiamento barato do BNDES, o banco oficial de fomento. Especula-se sobre socorro direto do Tesouro Nacional.
O Ministério de Portos e Aeroportos prevê que, até o fim de fevereiro, haverá um plano de ajuda. Fala-se em um fundo de até R$ 6 bilhões para crédito, entre outros benefícios também reivindicados por pilotos, comissários de bordo e outros trabalhadores do setor.
Já a pasta da Fazenda afirma que não haverá recursos do Tesouro e que estuda um programa de "reestruturação", de formatação ainda obscura. O BNDES pode ofertar crédito, mas quer garantias, que dependem de mudança legal.
A velha ideia do governo como hospital de empresas está de volta, como se vê. Trata-se, como sempre, de um risco para o erário e para a economia como um todo.
Em casos extremos, como foi a pandemia de Covid-19, pode-se considerar um auxílio estritamente temporário e sujeito a avaliação de custos e vantagens para a sociedade. No mais, contudo, o pleito é ou iníquo ou inviável.
Não é possível bancar todos os socorros ou, ainda que a ajuda pudesse ser extensa, a providência seria deletéria para o funcionamento do mercado, com efeitos daninhos para a eficiência. Empresas não raro se tornam dependentes do Estado e mobilizam lobbies pela perpetuação do privilégio.