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Estados e municípios poderão se endividar em mais R$ 12 bi após esgotar R$ 16 bi

Idiana Tomazelli / FOLHA DE SP

 

O CMN (Conselho Monetário Nacional) decidiu nesta quinta-feira (24) ampliar em R$ 12 bilhões o limite para estados e municípios contratarem novas operações de crédito ainda em 2023 —o que proporciona um aumento de 75% no limite atual, que é de R$ 16 bilhões e já está esgotado.

A medida significa que governadores e prefeitos poderão ter acesso a dinheiro novo nos próximos quatro meses. A medida vale a partir de 1º de setembro. Desse valor, R$ 9 bilhões poderão ter a União como fiadora, enquanto outros R$ 3 bilhões serão operações sem garantia do governo federal em caso de inadimplência.

A decisão ocorre num momento em que o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) costura uma série de medidas para facilitar o acesso desses entes a fontes de financiamento. Os créditos podem ser usados para custear obras e outros investimentos, o que está em sintonia com o desejo do governo federal de induzir maior crescimento econômico do país.

A medida também é anunciada em um contexto de penúria das prefeituras. Como mostrou a Folha, o aumento no número de municípios com as contas no vermelho no primeiro semestre de 2023, a um ano das eleições municipais, mobiliza centenas de prefeitos em busca de nova ajuda financeira da União.

Segundo levantamento da CNM (Confederação Nacional dos Municípios), 2.362 cidades registraram déficit primário nos primeiros seis meses de 2023 —ou seja, gastaram mais do que arrecadaram. O número é quase sete vezes o registrado em igual período do ano passado (342).

A pauta prioritária dos prefeitos é ampla e inclui reivindicações como a ampliação permanente dos repasses para o FPM (Fundo de Participação dos Municípios). Mas a concessão de novos empréstimos pode garantir algum fôlego de curto prazo, como fonte alternativa para financiar investimentos já contratados.

Por outro lado, a cada R$ 1 de empréstimo usado para um gasto novo, haverá uma piora adicional de R$ 1 nas contas dos estados e municípios, impactando a dívida pública que o próprio Ministério da Fazenda almeja controlar.

O CMN, colegiado que tomou a decisão, é formado pelos ministros Fernando Haddad (Fazenda), Simone Tebet (Planejamento e Orçamento) e pelo presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto.

"A orientação para a ampliação do volume de operações com garantia da União foi motivada pelo custo significativamente menor dessas operações para os entes subnacionais, bem como pelo novos instrumentos de garantias às Parcerias Público Privadas (PPPs) ofertados pelo Tesouro Nacional", diz a Fazenda em nota.

A ampliação dos limites é uma forma de o governo antecipar o efeito prático de medidas anunciadas há um mês pelo Ministério da Fazenda e que buscam justamente flexibilizar a concessão de financiamentos a estados e municípios.

Uma das medidas anunciadas mudar as regras de avaliação da saúde financeira de estados e municípios, sintetizadas em uma nota conhecida como Capag (capacidade de pagamento).

O Tesouro calcula a nota de classificação de risco com base em três indicadores (endividamento, poupança corrente e liquidez). Pelas regras atuais, apenas estados e municípios com notas "A" e "B" têm acesso a crédito com aval da União, numa escala que vai até "D".

A proposta do governo é introduzir um critério alternativo para que mais estados e municípios alcancem a nota máxima. A intenção é avaliar a chamada resiliência financeira: se o saldo de caixa livre for maior que 7,5% da RCL (receita corrente líquida), o ente com nota "B" poderá ser reclassificado com Capag "A".

De acordo com o governo, a mudança beneficiaria estados como Ceará, Bahia, São Paulo e Paraná e mais de 400 municípios, incluindo as capitais Belo Horizonte, Porto Alegre, Salvador, Curitiba e outras.

Além de flexibilizar os critérios para obter nota "A", o governo quer isentar essa categoria dos limites hoje definidos pelo CMN para a concessão de operações de crédito —e agora ampliados para o ano de 2023. Na prática, estados e municípios com nota máxima poderiam contratar operações sem precisar observar o teto definido pelo colegiado.

As medidas foram submetidas pelo Tesouro Nacional a uma consulta pública, ainda em curso. Ex-secretários, especialistas e até mesmo técnicos dos estados ouvidos sob reserva pela Folha receberam as propostas com preocupação, dada a intenção do governo de afrouxar a concessão de um tipo de crédito que já contribuiu para desequilíbrios no passado.

Além da consulta pública, outra parcela das medidas ainda depende de envio de projeto ao Congresso Nacional e apreciação pelos parlamentares, o que leva tempo. A resolução do CMN garante fôlego novo para governadores e prefeitos ainda este ano.

A medida também demonstra maior disposição da União em atuar como fiadora dos estados e municípios. Até então, a maior parte do limite (R$ 10 bilhões) estava alocada em operações sem garantia, enquanto uma fatia menor (R$ 6 bilhões) era destinada a financiamentos com aval da União.

Com os novos valores, o governo passa a conceder garantias de até R$ 15 bilhões neste ano, contra R$ 13 bilhões em operações sem ter o Tesouro como fiador.

A garantia ajuda a baratear o custo do financiamento para os estados e municípios, mas também traz um risco para a União, que precisa honrar os pagamentos em caso de calote. Os contratos preveem que o governo federal pode se ressarcir posteriormente, bloqueando repasses dos fundos de participação, mas isso não vem ocorrendo na prática.

Relatório do Tesouro com dados de julho mostra que o governo já honrou, desde 2016, R$ 59 bilhões em empréstimos de estados e municípios, mas só recuperou R$ 5,47 bilhões, seja porque os estados estão no RRF (Regime de Recuperação Fiscal), seja porque há decisões judiciais impedindo a execução das chamadas contragarantias.

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